Resumo: Algumas das mais vigorosas economias mundiais, como a Coreia do Sul e, antes dela, o Japão, e mais recentemente a China, reconheceram que a mudança do modelo econômico vigente para o industrial exigiria redirecionamento nos padrões educacionais, sobretudo, em áreas estratégicas ao desenvolvimento nacional. A opção foi assegurar a formação de uma mão de obra de alta qualificação, em especial, no campo das Engenharias que, uma vez inserida do mercado de trabalho, se incumbiria de colocar em prática processos de produção, indicadores e modelos de gestão equiparáveis às nações mais competitivas, agregando produtividade, valor e sofisticação aos produtos, processos e serviços. Porém, os dados obtidos na pesquisa documental, de natureza qualitativa, indicam que há insuficiência na formação de mão obra e nos requisitos de educação de qualidade, configurando um cenário futuro de grandes dificuldades para inserção da economia brasileira dentre aquelas mais desenvolvidas.
Palavras-chave:educação tecnológicaeducação tecnológica,inovaçãoinovação,competitividade nacionalcompetitividade nacional.
Abstract: Some of the most vigorous economies, such as South Korea, Japan, and more recently China, acknowledged that the economic transition to the model of industrial competitive economy would go through a strong change in educational standards, especially in strategic areas to national development. The strategic option was to ensure the formation of a high labor qualification, in particular, in the field of Engineering that, once inserted in the labor market, could put into place production processes, indicators and management models equivalent to the more competitive Nations, adding productivity, value and sophistication of products, processes and services. However, the data obtained in documentary research, and qualitative, pointed out there are no sufficient education and training aiming to develop the labor force and the requirements of quality education, setting up a future of great difficulties for insertion of the Brazilian economy among those more developed.
Keywords: technological education, innovation, national competitiveness.
EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA, INOVAÇÃO E GERAÇÃO DE EMPREGO: ALAVANCAS PARA O PROGRESSO DAS ORGANIZAÇÕES, PESSOAS E NAÇÕES
TECHNOLOGICAL EDUCATION, INNOVATION AND JOB CREATION: LEVERS TO THE PROGRESS OF ORGANIZATIONS, PEOPLE AND NATIONS
Recepción: 29 Noviembre 2018
Aprobación: 16 Septiembre 2019
O art. 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgado pela Organização das Nações Unidas (Organização das Nações Unidas, 1948), estabelece que “todo ser humano tem direito a instrução” e considera que “a instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, (sendo) essa baseada no mérito”. Considera-se que a educação deva ser orientada pelo “sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais”. E, assim, o Estado assume o papel de cocriador da sociedade que o representa e apoia.
O Estado deve oferecer educação fundamental gratuita, para que cada habitante possa garantir, para si e sua família, “saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu alcance” (ONU, 1948, art. 25). Educação e trabalho são formas de obter essa garantia, e são essenciais ao desenvolvimento socioeconômico. E, se o Estado descumprir o seu papel de provedor da educação de qualidade, os cidadãos estarão condenados ao futuro incerto e, reproduzirão as mesmas condições de vida que seus pais tiveram. Apesar da controvérsia sobre a educação na mobilidade social, como um fator isolado (Lemos, Dubeux, & Pinto, 2009).
O papel do poder público no fortalecimento das garantias institucionais e o acesso ao trabalho passa pela educação de qualidade como meio de assegurar ao cidadão a liberdade substantiva, segundo a qual, os indivíduos são capazes de decidir seu futuro e adotar as ações que resultem condições de alcance. Segundo Pinheiro (2012, p. 16):
As liberdades substantivas dos indivíduos – por exemplo, a capacidade de evitar a fome, a desnutrição, as doenças e a morte prematura, bem como a possibilidade real de ser alfabetizado, de participar politicamente das decisões públicas, de dizer o que se pensa e não ser censurado, dentre outras – constituem a essência mesma do desenvolvimento. Neste sentido, diz-se que as liberdades substantivas desempenham um papel constitutivo no conceito de desenvolvimento e avaliativo do processo de desenvolvimento.
Pinheiro (2012) refere-se ao desenvolvimento humano. É evidente que a capacidade de fazer escolhas perpassa pela capacidade de análise, que exige desenvolvimento cognitivo em diferentes campos do saber. O Estado deve propiciar meios para que os cidadãos possam devolver à sociedade um ambiente civilizado, igualitário e promissor, escolhendo de acordo com a norma do que é bom para si e para a coletividade. Daí inferir sobre papel efetivo do Estado na educação exige adequado endereçamento de soluções para a gestão da saúde pública, visando o aumento das capacidades cognitivas da sua população.
O Banco Mundial (2016, p. 18) enfatiza que nenhuma sociedade “consegue alcançar seu potencial ou enfrentar os desafios do século XXI sem a participação plena e igual de todas as pessoas – o que requer investimentos no capital humano por meio da educação, do cuidado da saúde, proteção social e emprego”. Portanto, a discussão sobre a educação e o papel do governo é urgente, essencial e um desafio para o projeto de construção de uma nação.
O aumento das capacidades dos recursos humanos constitui um ativo importante para o ambiente de negócios de uma nação, compondo o seu “capital social”. Reconhecido como ativo estratégico para as organizações e para o desenvolvimento nacional, o capital social soma-se aos ativos intangíveis, na perspectiva do conhecimento tecnológico, do ambiente criativo e da cultura inovadora, criando as alavancas necessárias para o crescimento econômico e para a competitividade nacional.
A capacidade de aprendizagem organizacional vem sendo discutida como meio de alcance de eficiência, e antes disso, como uma alavanca para produtividade, na visão do homem-máquina e do trabalho repetitivo. Na década de 1990, ondas evolucionárias alcançaram os ambientes organizacionais e ficou evidente que a capacidade de adaptação rápida às mudanças é um importante ativo na consolidação dos recursos e das capacidades organizacionais, para competir em ambientes de intensa concorrência.
A competitividade de uma nação é a somatória da competitividade dos seus recursos, capacidades e competências das organizações, contemporaneamente traduzida por pessoas capacitadas e criativas, tecnologia e seu efeito sobre a produtividade, capacidade de aprendizado e adaptação às mudanças (Solow, 1957; Gardner, 1993; Nelson & Winter, 1996; Teece, 1998; 2009; Kuhlmann, 2008).
Além disso, a criatividade é uma habilidade geradora de novidades e de inovações. Como habilidade, ela está inserida no ativo “capital humano”, juntamente ao: aprendizado e educação, a experiência e especialização (Zlate & Enache, 2015), e influenciando a gestão do capital estrutural – formado por sistemas e programas; pesquisa e desenvolvimento; direitos de propriedade intelectual – e também do capital relacional, na medida em que orienta a formação de alianças estratégicas, define a relação da empresa com os stakeholders, e impacta o desempenho organizacional, a produtividade, a lucratividade e o valor de mercado.
A criatividade e a inovação resultam das capacidades humanas, tanto da inteligência formal quanto da prática, que se somam ao conteúdo aprendido para dar forma, volume e densidade aos saberes que a decisão de aplicá-los demanda. A percepção das oportunidades de usar os conhecimentos para formatar novos produtos e serviços é dependente das habilidades de aprender e interpretar os sinais de mudança do ambiente e os seus impactos.
A educação é uma importante alavanca do desenvolvimento socioeconômico e um dos fatores condicionantes dos sistemas nacionais de inovação. E esses sistemas devem atender às necessidades perenes de geração de conhecimento e de inovação tecnológica, de forma a atender as demandas socioeconômicas atuais e futuras criando uma capacidade industrial vigorosa, além de constituir um acervo de novos conhecimentos em áreas críticas ao desenvolvimento nacional.
No caso brasileiro, a educação tecnológica deve abrigar avanços na proteção das suas riquezas – espaço, terra, pessoas e recursos naturais – o que aponta para altos e continuados investimentos, visando à inserção do país entre aqueles com sistemas de inovação maduros. Assim, deve combinar domínio tecnológico e capacidade industrial em setores de interesse nacional, vislumbrando as assimetrias socioculturais e econômicas que caracterizam o país
A Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2016-2019 (Brasil, 2016; 2017), destaca a educação de qualidade para o emprego alicerçado na capacidade científica e tecnológica, e complementa que a inovação deve difundir-se “por todos os níveis e setores econômicos, por todas as regiões do país, contribuindo para a geração de empregos qualificados, o combate à pobreza e à desigualdade social, o fortalecimento do regime democrático, a universalização da educação de qualidade (notadamente a científica) e a consolidação do bem-estar geral da população” (Brasil, 2016, p. 6).
Assim, a fórmula utilizada pelos países que investiram na educação tecnológica como meio de alcance da competitividade industrial é, também, o caminho para o progresso científico. Dessa inferência deriva o problema de pesquisa: “o ensino tecnológico é condição suficiente para o atendimento imediato das necessidades da indústria brasileira?”.
Este trabalho visa analisar o quadro da educação tecnológica no Brasil e identificar gaps que deverão ser superados para alcance dos objetivos de combate à pobreza e à desigualdade social no país, como preconiza a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2016-2019.
Embora haja consenso sobre a influência das instituições de ensino superior na formação de sistemas regionais de inovação, especialmente o ensino tecnológico, persiste o dilema entre o conhecimento gerado na acadêmica e o seu valor utilitário imediato para as indústrias, o que tem sido uma expectativa desde o enunciado do Triângulo de Sábato, os modelos de interação inovativa, pautados por Eitzkovitz e Leydsdorff (2000) aos ecossistemas de inovação. Em todos eles, o papel do Estado é crucial.
Prokopenko, Omelyanenko e Eremenko (2014, p. 4-7) avaliam que o Estado deve criar políticas de inovação orientadas pela necessidade de estimular a economia nacional, pela perspectiva de continuidade dos processos de inovação inseridos nos recursos-chave do desenvolvimento nacional, pela necessidade de gerar demanda de educação superior e pós-graduada; para assegurar os avanços no plano de desenvolvimento e da projeção econômica com base na atividade inovativa, além do engajamento nos processos de transferências tecnológicas internacionais.
Mazzucato (2014) destaca o papel do Estado como agente financiador, capaz de assumir o risco do desenvolvimento da pesquisa básica, transferindo novos conhecimentos e soluções para a pesquisa aplicada e Pesquisa e Desenvolvimento Industrial (P&DI), da qual derivam novos produtos e serviços. Investir na ciência básica traduz a posição que os países lograram constituir um ecossistema nacional de inovação, a partir de esforços acadêmicos.
Segundo estudo de Caniels e Van den Bosch (2011, p.272), “os investimentos em P&D acadêmico contribuem apenas em uma parcela bem delimitada do desenvolvimento e crescimento de uma região ou nação”. A educação tecnológica superior, se dirigida aos setores de interesse nacional, propiciam a difusão e transferência de novas tecnologias.
A formação do capital humano tem sido apontada como um fator de atratividade do capital produtivo desde David Ricardo (1772-1823) e tem seus contornos mais destacados pelo trabalhador do conhecimento, em uma sociedade mobilizada por redes de conhecimento e de informação (Castells, 2016). Sobre essa temática, a experiência descrita por Saxenian (1994) em relação à formação das competências tecnológicas regionais no Vale do Silício e da Rota 128, destaca a influência vital da presença de instituições de ensino superior de alto nível e do relacionamento entre os profissionais como um fator que contribuiu para a formação do cluster tecnológico naquelas regiões.
Santos e Paula (2012) examinaram as competências tecnológicas regionais derivadas da presença de universidades em duas cidades brasileiras, Santa Rita do Sapucaí (MG) e São José dos Campos (SP), concluindo que a especialização oferecida pelas instituições ali presentes moldam a formação de um ambiente de negócios pautado pela tecnologia, nos setores de eletrônica e aeronáutico, respectivamente; com desdobramentos para os setores de telecomunicações, aeroespacial e automobilístico. Seu reflexo pode ser observado pela evolução dos indicadores socioeconômicos, expressos no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), especificamente, 0,721 para Santa Rita, e 0,807 em São José dos Campos (Santos, 2010-2017).
Quando examinados os fatores que compõem o IDHM de Santa Rita do Sapucaí – Figura 1 – e de São José dos Campos – Figura 3, observa-se que o fator de maior crescimento no IDHM, nos dois casos, nos últimos 20 anos, foi a educação.
Observa-se, desde 1991, que os esforços que resultaram em crescimento mais marcante ocorreram no quesito Educação, ainda que os demais quesitos tenham também crescido.
No caso de São José dos Campos, mesmo com a privatização da maior empregadora local, os indicadores mantiveram-se em crescimento. A qualificação dos recursos humanos locais pode explicar, em parte, o fenômeno. Por exemplo, o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) tem formado profissionais, os quais são rapidamente absorvidos pelos setores financeiros e de serviços. Também cresceu o número de colégios privados que preparam estudantes para o vestibular do ITA e para instituições de primeira linha, inclusive fora da região e do estado. São Paulo e Rio de Janeiro, que rivalizavam em número de estudantes aprovados, dividem com o Ceará as taxas de ocupação das vagas.
Quatro categorias de fatores cooperam para formação da capacidade de inovação nacional. São eles: a) condicionantes técnicas e tecnológicas que se referem aos sistemas estruturados de Gestão do Conhecimento, e capacidade tecnológica e humana; b) condicionantes institucionais, ou a existência de um ambiente legal e regulatório e de fomento financeiro às atividades de Pesquisa e Desenvolvimento; c) condicionantes estruturais, que se referem à infraestrutura de serviços públicos de apoio à atividade industrial; e d) as condicionantes econômicas que refletem a capacidade de articular produção e mercado externo, e inserção em cadeias produtivas. A Figura 3 apresenta os fatores condicionantes.

A educação constitui um fator habilitador dos sistemas de inovação e de produção, e uma força indutora da competitividade. A escola destaca-se na Figura 3, tanto como formadora de capital intelectual como pelas estruturas que lhe dão forma, direção e significado. As condicionantes cumprem a função de catalisar esforços e ampliar recursos.
a) Condicionantes Técnicas e Tecnológicas
A precarização da educação no país, em todos os níveis, trouxe consequências adversas ao modelo industrial vigente. A massificação do ensino, como se vê no país, tem projetado a formação insuficiente de força de trabalho em relação às demandas futuras em setores-chave.
O Censo Educacional de 2015 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) aponta que foram oferecidas 8.531.655 vagas ensino superior. Dessas, 764.616 (8,96%) foram oferecidas por instituições de ensino superior privadas (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2015). O Instituto considera a idade universitária entre 18 e 24 anos. Nessa faixa, o número de jovens é de 10.340.513 (INEP, 2015, p. 6). O estado não dá conta da dinâmica demográfica. E isso cria oportunidade de exploração, o que justifica o volume de instituições privadas.
A população na faixa etária para o ensino médio, entre 15 e 19 anos, e para o ensino superior, entre 20 e 24 anos, respectivamente 8,4% e 7,9%, totalizam 16,3% da população brasileira, com forte concentração nas regiões mais produtivas do país – sul e sudeste, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2013).
Com exceção dos setores aeroespacial e aeronáutico; saúde e o setor de biotecnologia, a indústria brasileira se encontra premida em um vácuo, “não tem a capacidade de concorrer por preço” como as indústrias asiáticas, sobretudo chinesas, “nem tem a capacidade de concorrer por diferenciação de produto como tem a indústria, por exemplo, da Alemanha ou a de TICs software norte-americana” (Salerno, 2012, p. 48).
b) Condicionantes Institucionais
Referem-se à existência de um ambiente legal e regulatório estimulante ao ingresso de recursos estrangeiros para a produção, e de fomento financeiro às atividades de Pesquisa e Desenvolvimento. Tais condicionantes incluem a disponibilidade de instrumentos sólidos para a gestão da inovação, começando por uma política de governo nacional e abrangente; mecanismos de regulação e coordenação, e a gestão de fundos que financiam a pesquisa básica e a aplicada, a existência de garantias legais sobre a propriedade intelectual, fluxos contínuos de informação entre diferentes agentes da inovação, como entre pesquisadores, entre centros de pesquisa e destes com as indústrias; e no acesso aos recursos científicos e tecnológicos, o que ser objeto de apoio também governamental (Santos, 2015).
Os fundos setoriais, criados no final da década de 1990, estabeleceram um novo marco na política de fomento à pesquisa no país com ênfase aos projetos de desenvolvimento tecnológico e na interação entre os Institutos de Ciência e Tecnologia e as empresas, cuja proximidade com a indústria influenciou a redução dos ciclos de P&D e de retorno sobre o investimento público, gerando novos empregos que, com apelo das novas tecnologias, demandaram mão de obra de qualidade, o que desdobraria seus efeitos também sobre a renda.
O reconhecimento de que uma economia estável e competitiva passaria pelo robustecimento das capacidades em inovação repercutiu em vários âmbitos do governo. Arcuri (2016, p. 585-586) apresenta os impactos observados:
Formulação de políticas setoriais e na adequação e formulação de leis de incentivo ao setor produtivo. Como exemplo, podem ser citadas a elaboração da Política de Ciência, Tecnologia e Inovação (PNCT&I), em 2003, o lançamento da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (Pitce), em 2004, a retomada de políticas setoriais (energia, informática, saúde etc.) e a instauração de um novo ambiente regulatório, no qual se destaca a criação da Lei do Bem, da Lei de Inovação, da Lei de Biossegurança, entre outras. A marca desse novo período é a concentração dos esforços no fomento às atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) nas empresas e o incentivo à intensificação das relações entre universidades, empresas e ICTs.
Naturalmente, os esforços de fomento à P&D inovativa e do uso de recursos dos fundos setoriais, bem como o investimento privado, apresentada na Figura 4, não resistiram à situação de crise vivida pelo Brasil nos últimos anos, com a inevitável restrição do uso das verbas de investimento em inovação.

c) Condicionantes Estruturais
Referem à infraestrutura de serviços públicos de apoio à atividade industrial. Por exemplo, a existência de instituições de ensino tecnológico, de pesquisa aplicada e os fatores locacionais que formam a atratividade para o investimento em atividades tecnológicas. Portanto, afetam tanto os sistemas de inovação quanto os de produção.
Kuhlmann (2008, p. 48) denomina essas condicionantes como “condições estruturais”, nas quais inclui: o ambiente financeiro, a política de tributação e de incentivos, a propensão a inovar, o empreendedorismo, e a mobilidade e as subordina ao sistema político, coordenado pelo governo, pelos agentes que detêm a governança do sistema de inovação, como o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações e é delimitada pelas políticas de ciência, tecnologia e inovação.
Há consenso sobre a importância da interação entre diferentes atores econômicos e agentes institucionais para alçar graus superiores de desempenho no ambiente produtivo orientado pela tecnologia e pela inovação tecnológica. Essa interação é um importante fator de atualização tecnológica necessária ao fortalecimento das instituições de pesquisa.
Os Sistemas Nacionais de Inovação cooperam para mudanças também na sociedade, à medida que o conhecimento gerado nas estruturas de Ciência e Tecnologia flui para o processo produtivo. E “a competitividade de um país no mercado internacional também depende de vários fatores ligados à conjuntura econômica desse mercado, a ações de seu governo e ao estágio de seu mercado interno” (Arcuri, 2016, p. 583).
d) Condicionantes Econômicas
Reúnem as condições de articular produção, via cadeias produtivas e mercado externo. Tigre (2006, p. 83-85) destaca os aspectos dos custos da difusão das novas tecnologias que podem elevar os custos da inovação; a decisão de adotá-las segundo a lógica da economia de escala e de escopo; e os seus impactos sobre as exigências de mercados externos e mesmo no ingresso ou em cadeias produtivas tecnologicamente orientadas.
As condicionantes econômicas tratam das implicações do aumento das capacidades e os recursos da firma, tendo em vista a sua competitividade e expansão da capacidade de atendimento de novos mercados, o que também, integra a tipologia da inovação, requerem investimentos em educação e treinamento da mão de obra e, ao longo do tempo, aumentando o estoque de profissionais qualificados para o gerenciamento dos custos de operação.
Em suma, a educação de caráter tecnológico é fator comum a cada conjunto de fatores condicionantes da inovação. Mas não há aprendizado sem que condições essenciais sejam atendidas, como a educação fundamental e a saúde. E da análise entre fatores, decorre a contribuição desta pesquisa, que se refere à capacidade de inovação em um país com tantas assimetrias sociais e econômicas e que, de forma alguma pode ser medida com a mesma régua com a qual são investigadas as condições de inovação em países desenvolvidos.
Pela natureza deste trabalho, optou-se por uma abordagem qualitativa, delineada por pesquisa documental em fontes primárias, o que permitiu estabelecer análises comparativas entre os dados obtidos. Para a coleta de dados, optou-se pela adoção dos dados relativos aos pilares da matriz de análise do World Economic Forum (WEF, 2016), circulados em vermelho na Figura 5, cujos índices são confrontados com os dados de relatórios do Banco Mundial, do PNUD/ ONU e de outras instituições.

Aos indicadores destacados em vermelho, serão comparados outros indicadores e índices nacionais e outros globalmente aceitos.
A Figura 6, com base nos empréstimos feitos pelo Banco Mundial (2016, p. 38), para a região da América Latina e do Caribe evidencia a urgência de solução para as demandas por serviços essenciais que deveriam ser atendidas pelos governos dos países. A necessidade de acesso aos serviços essenciais é mundialmente reconhecida e apoiada.
A América Latina e o Caribe detêm um alto Índice do Desenvolvimento Humano (IDH), ou seja, 0,741. Porém, frente ao IDH médio dos países que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), estimado em 0,887 (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2015) o IDH brasileiro perde força. Porém, analisado individualmente, o IDH dos países sul-americanos conta uma história diferente, como se vê na Tabela 1.
A América do Sul possui 17,8 milhões de quilômetros quadrados e 422,5 milhões de habitantes. Comparativamente, o Brasil possui 48% do território sul-americano e cerca de 50% da população do subcontinente, e detém a maior produção industrial em valores nominais, o que não reflete uma melhor condição de vida dos brasileiros: mais de 25% dos municípios brasileiros vive em condição insatisfatória, com IDH-M avaliado como baixo ou muito baixo, como se observa na Tabela 2.

O cálculo da média não permite examinar, a priori, a concentração dos melhores índices do IDH-M na região sul e sudeste, que são as mais industrializadas e contam com maior disponibilidade de recursos infraestruturais e institucionais. Convém ressaltar que o IDH-M é composto por dados de sobre renda, longevidade e educação, exclusivamente para a análise da condição da vida dos brasileiros, por município, como dispostos na Tabela 3.

A taxa de alfabetização no Brasil esconde uma dura realidade. Segundo dados do Instituto Paulo Montenegro (IPM) e da Ação Educativa (2016), a taxa de analfabetos funcionais – totalmente analfabetos e com alfabetização rudimentar – no Brasil é de 27%. Na faixa dos universitários, o índice chega a 38% de analfabetos funcionais, nas diversas áreas de conhecimento. Surpreende que, nas Engenharias, por exemplo, em torno de 25% dos alunos aprovados no vestibular desistem antes do final do curso. Nas Ciências Sociais, 33% dos estudantes aprovados não se formam. Essa é uma fragilidade a ser combatida.
A diplomação superior firmou-se como um passaporte para uma vida melhor e não necessariamente o conhecimento. Assim, tem-se como uma realidade que pessoas que poderiam almejar uma profissão de sucesso, no nível técnico e em escolas tecnológicas que deveriam ser oferecidas pelo governo, acabam orientando sua ação educativa para a obtenção de título da educação superior sem ter tido suficiência no ensino básico e fundamental.
O IPF apurou que apenas 8% das pessoas alfabetizadas têm proficiência no conhecimento esperado pelo nível de escolaridade. Assim, os grandes números, justificados por políticas educacionais falsamente inclusivas, não evidenciam aumento das capacidades. Mas, tendo uma taxa considerável de alfabetização, como estaria distribuída a população economicamente ativa da América do Sul? É o que aponta a Tabela 4.

Apesar da criticidade da alfabetização no país, surpreende que 15,7% da mão de obra estejam alocadas no setor agrícola, pois o setor tem aumentado o uso de recursos tecnológicos, em substituição à mão de obra pouco qualificada. A Tabela 5 contém os dados de análise

Na análise feita com 128 países, o Brasil alcançou a 69ª posição no ranking entre as empresas inovadoras, ficando atrás do Chile (44ª), da Colômbia (63ª) e do Uruguai (71ª), sendo, porém, o país da América do Sul que mais gera riqueza com o setor de serviços, o que é uma condição frequente em países industrializados e com capacidade absortiva de inovações.
Do Produto Interno Bruto (PIB) da América do Sul, qual seja, US$ 5,1126 trilhões, o Brasil responde por 47%. Ainda que a produção de produção nacional de riquezas seja principalmente mobilizada por commodities básicas, o volume da população e extensão do território e os recursos naturais ainda abundantes é necessário investir em educação e inovação para o país possa desenvolver capacidades tecnológicas que o diferenciem na região sulamericana.
Em relação aos dados do World Economic Forum, deve-se considerar que o Brasil ocupava entre os anos de 2012 e 2013 uma posição transitória entre uma economia orientada pela eficiência produtiva (2) e orientada pela inovação (3). Mas, em razão de crise e, mais que isso, da impossibilidade de localizar soluções efetivas, abrangentes e inclusivas, a nação deu um passo para trás, revivendo índices que haviam sido superados, como aponta a Tabela 6.
Somente no índice tamanho do mercado o país apresentou evolução nos últimos anos: o que tende a despertar interesse da indústria e do capital estrangeiro para investimento. Mesmo em situação de crise, é preciso aprimorar capacidades nacionais para que o país que já esteja no estágio intermediário, entre 2 e 3, avance no desafio de tornar-se uma nação inovadora de modo a fazer uso da criatividade, usando os recursos e os talentos naturais, desconstruindo a cultura do “jeitinho brasileiro”. A queda nos índices do país foi seguindo pelo recrudescimento dos índices de corrupção, na razão direta. Este e outros índices são exibidos na Tabela 7.

Os problemas detectados na análise do WEF justificam, em parte, o declínio da competitividade nacional. Ações diretivas podem inverter a tendência de piora, ainda que as dificuldades sejam tidas como históricas. Esses quatro problemas detectados representam oportunidades de melhoria e montaram 53,9%, em 2016; 53%, em 2012; e 54%, em 2008.
A estratégia de Educação deveria estar alinhada às diretrizes do Desenvolvimento Nacional e a meritocracia deveria servir como um instrumento de correção de distorções do sistema educacional. Em uma nação tão cheia de discrepâncias, é preciso olhar para cada parte do território e estabelecer um plano de crescimento socioeconômico que respeite as diferenças, que proteja o cidadão e crie esperança. A ética do trabalho é um resgate que precisa urgentemente ser discutido e inserido no espírito da mudança.
É preciso valorizar o fato de que a educação, e, acima dela, o conhecimento, são recursos transformadores de realidade. E combater com criatividade a fome, o desânimo dos jovens e a falta de horizonte das famílias. O maior índice de abandono escolar, 9,6%, está na faixa etária de 15 a 17 anos, porque o valor percebido na educação, como alavanca de mudança de vida, é mínimo. E é fato que a precarização do ensino segue o agravamento de imagem do país e de suas instituições. Mas a escola deveria ser um espaço seguro de desenvolvimento, de exercício da criatividade e do real espírito de cidadania e igualdade.
O trabalho deve ser visto como uma ferramenta do progresso social, em todos os níveis de ocupação. A inovação é uma decorrência do que se faz com o que se aprende e do poder das regiões em ocupar seus espaços de Ciência e Tecnologia. Experimentação e prática devem despertar o novo que habita em cada estudante e em cada pesquisador.
O conhecimento deve estar ao alcance daquele que sonhe buscá-lo. Qualidade, diversificação e possibilidade de escolha de disciplinas ou de carreira são fatores que podem contribuir para o melhor aproveitamento do investimento público em Educação, preparando adequadamente as gerações futuras para o mercado de trabalho em empregos de qualidade.







