Resumo: O empreendimento Carqueijo Artesanato nasceu de um sonho empreendedor, em 1997, a partir de uma atividade local, o artesanato. O negócio foi instituído pelo casal Isaias e Raimunda Nonata Sancho, a realização de um sonho de várias gerações da família Sancho. Porém o aperfeiçoamento de todo o processo e a consolidação do negócio foram feitos por Gilmar Sancho, filho do casal. No processo inicial do negócio, muitas dificuldades se apresentaram, dentre elas o fato de Gilmar não ter conhecimento dos fundamentos básicos de um negócio, como administrar, como captar recursos, como lidar com as pessoas, dentre outros aspectos. Tudo era novidade. Gilmar aos poucos foi conhecendo as necessidades e buscou informações e assessoramento do SEBRAE-CE. Considerando o aspecto social e cooperativista, organizou a comunidade em busca de um mesmo objetivo, tornando-a um grande e desenvolvido arranjo produtivo local (APL). O caso para ensino em questão tem como objetivo mostrar como o empreendedorismo pode transformar uma comunidade com dificuldades de sobrevivência e de geração de renda em uma comunidade produtiva, geradora de emprego e economicamente sustentável. Fundamenta-se nas abordagens teóricas de Empreendedorismo, Economia Criativa e APL e envolve as disciplinas de Gestão Empreendedora, Desenvolvimento Local, Gestão Ambiental e Responsabilidade Social.
Palavras-chave:EmpreendedorismoEmpreendedorismo,Desenvolvimento Local e Economia CriativaDesenvolvimento Local e Economia Criativa.
Abstract: The enterprise Carqueijo Artesanato was born out of an entrepreneurial vision, in 1997, based on a local handicraft activity of weaving. The business was set up by the couple Isaias and Raimunda Nonata Sancho, fulfilling a dream of several generations of the Sancho family. But perfecting the process and consolidating the business were the job of Gilmar Sancho, the couple’s son. At the start of this process, there were lot’s of difficulties, such as the fact that Gilmar lacked a knowledge of the basics of how to start up and run a business, how to win resources, and how to manage people, among other aspects. Everything was new to him. But little by little, he learned all that was needed, gaining information and advice from SEBRAE-CE (a non-profit entity that promotes small businesses). Considering the social and cooperative aspects, he organized the community around a single objective, turning it into a large, well-developed local productive arrangement (LPA). The teaching case in question aims to show how entrepreneurialism can transform a community that is struggling to survive and generate income, into an economically sustainable generator of jobs. It is based on the theoretical approaches of Entrepreneurialism, Creative Economy and LPA, and involves the disciplines of Entrepreneurial Management, Local Development, Environmental Management and Social Responsibility.
Keywords: Entrepreneurialism, Local Development and Creative Economy.
Resumen: El emprendimiento Carqueijo Artesanato nació de un sueño emprendedor en 1997, a partir de una actividad local, la artesanía. El negocio fue instituido por el matrimonio Isaias y Raimunda Nonata Sancho, y era la realización de un sueño de varias generaciones de la familia Sancho. Sin embargo, el perfeccionamiento de todo el proceso y la consolidación del negocio se deben a Gilmar Sancho, hijo del matrimonio. En el proceso inicial del negocio se plantearon muchas dificultades, entre ellas el hecho de que Gilmar no tenía conocimiento de los fundamentos básicos de un negocio, cómo administrar, cómo captar recursos, cómo trabajar con las personas, entre otros aspectos. Todo era novedad. De a poco Gilmar fue conociendo las necesidades y buscó informaciones y asesoramiento en el SEBRAE-CE. Considerando el aspecto social y cooperativo, organizó la comunidad en busca de un mismo objetivo, transformándola en un importante y bien desarrollado arreglo productivo local (APL). El caso para la enseñanza en cuestión tiene como objetivo mostrar cómo el emprendedorismo puede transformar una comunidad con dificultades de supervivencia y de generación de ingresos en una comunidad productiva, generadora de empleo y económicamente sostenible. Se fundamenta en los abordajes teóricos de Emprendedorismo, Economía Creativa y APL e involucra las asignaturas de Gestión Emprendedora, Desarrollo Local, Gestión Ambiental y Responsabilidad Social.
Palabras clave: Emprendedorismo, Desarrollo Local y Economía Creativa.
Caso para ensino
TECER PARA VENCER COM CRIATIVIDADE E EMPREENDEDORISMO
Recepção: 20 Dezembro 2015
Aprovação: 04 Abril 2016
Tudo começou em 1997 com o senhor Isaias Sancho e Dona Raimunda Nonata Sancho. Com a chegada do tear eletrônico, o mercado ficou mais restrito para os produtos de tecelagem artesanal e a competitividade ficou muito acirrada, daí a primeira iniciativa da dona Raimunda Nonata Sancho: além das redes de fio de algodão, ela começou a fazer tapetes de tiras de tecidos tamanho 0,50 x 0,80 cm com fios de algodão. O senhor Isaias, como um bom vendedor, saía para vender as peças em Sobral, município próximo a Carqueijo no Estado do Ceará, localidade de origem da família Sancho e onde viviam lutando para manter sua atividade de artesanato, que vem passando de geração em geração. Sua mãe, Dona Ana Sancho Martins, já tinha no artesanato uma forma para subsistência da família.
Carqueijo é um pequeno distrito do município de Mucambo - CE que fica a 300 km de Fortaleza. Nessa comunidade de aproximadamente 1500 habitantes, 30 famílias sobrevivem da produção do artesanato, a principal atividade econômica da localidade. Ao longo dos anos, o artesanato de Carqueijo vem ganhando visibilidade nacional e até internacional. Esse cenário enche de orgulho os moradores, além de despertar o interesse dos mais jovens em continuar na comunidade e manter viva a cultura do artesanato típico da região.
O senhor Isaias, como precursor dessa história, criou a associação do artesanato de Carqueijo. Orientado pelo SEBRAE, começou um processo de articulação entre os artesãos da comunidade, buscou capacitação para os mesmos nas áreas de gestão, associativismo e de qualidade no processo produtivo. Também promoveu uma parceria muito importante com a CEART, que trouxe um apoio significativo para a associação, e o artesanato de Carqueijo passou a ser vendido em Fortaleza, consolidando o processo inicial para a expansão das vendas.
O tempo passou e agora a responsabilidade em dar continuidade está nas mãos do neto Gilmar Sancho.
Gilmar, um rapaz de família humilde e de pouco estudo, nascido na comunidade, cresceu em meio aos teares, nos quais sua avó, pai e mãe fabricavam redes e de lá tiravam o sustento da família. No ano 2000, aos 20 anos de idade, casou-se com Antonia Célia, ficou à frente do seu primeiro dilema, ficar ou partir. Sem muitas opções, sem emprego fixo, a alternativa era “ir embora para a cidade grande ou se envolver e investir no negócio da família”. Gilmar escolheu a segunda opção. Daí em diante, o artesanato de Carqueijo passou a experimentar um capítulo para a história do local, que foi do seu crescimento sustentável.
Com a inquietação própria de um empreendedor e querendo fazer valer a pena sua escolha de ficar na terra natal, Gilmar buscou se profissionalizar nas áreas de gestão, conhecer outros tipos de artesanato, participar de feiras e interagir com artesãos de outras regiões. O SEBRAE foi um grande parceiro nesse processo de desenvolvimento.
Os produtos até então eram redes e tapetes. Nas feiras e eventos promovidos pelo SEBRAE, Gilmar conheceu outros artesanatos produzidos à base de palha e fibras naturais. E começou a se questionar: Como poderia desenvolver novos produtos e diversificar a produção do artesanato de Carqueijo?
Observando o entorno, percebeu que na sua região tinha muita bananeira e coqueiro e que as palhas da bananeira e o talo da palha do coqueiro poderiam ser aproveitados. Surgiu a ideia de desenvolver um jogo americano à base da palha de bananeira e talo da palha do coqueiro, um produto de fibra natural, usando material que anteriormente era descartado, agora transformado em matéria-prima de muito valor para a produção de novos produtos. Primeiramente confeccionou duas peças, com objetivo de avaliar a qualidade.
Numa visita à loja da CEART em Fortaleza em 2000, o produto foi apresentado à primeira dama do estado do Ceará, que se encantou com a qualidade e com as peças. Na ocasião, a primeira dama estava realizando um trabalho junto aos artesãos do Estado, visando valorizar a arte regional e incentivar a cultura local, o que foi muito oportuno para Gilmar. Anteriormente, esse tipo de jogo americano era produzido somente em Minas Gerais, à base de fibra de outros tipos de materiais oriundos daquela região. O reconhecimento da primeira dama despertou o interesse da CEART, que de prontidão encomendou 300 unidades.
Surgiu aí uma nova oportunidade para os artesãos, mas novamente Gilmar estava diante de obstáculos: Onde conseguir crédito para comprar o fio de algodão, um dos materiais necessário na produção dos produtos, e atender esse pedido e os outros que estavam vindo em tabela? Como produzir em grande quantidade?
Dentre as possibilidades, Gilmar buscou aquelas que tivessem retorno rápido sem burocracias: viabilizar crédito junto aos fornecedores, creditando que estes seriam seus possíveis investidores e mobilizar as artesãs da comunidade via associação.
Na ocasião, o pedido foi muito comemorado, pois era um produto pequeno, rápido para produzir e com uma margem de lucro muito superior aos produtos feitos anteriormente.
Gilmar teve o cuidado de ensinar a nova técnica para os artesãos e articular todas as demandas oriundas desta nova conquista, facilitando a entrega das encomendas e garantindo o espaço no mercado da Capital. Esta foi a primeira ação de grande impacto, mas que deu projeção para o empreendedor e para o artesanato de Carqueijo.
Desde então, o SEBRAE promoveu o Gilmar como representante do artesanato do Ceará em feiras de todo o país. Esses eventos, apresentados no Quadro 1, sempre apresentavam novas ideias, novas técnicas, com a possibilidade de apresentar a arte da comunidade de Carqueijo e gerar novos negócios para os artesãos.

A atitude e o empenho de Gilmar Sancho proporcionaram o resgate da cultura de tecelagem da região e o aperfeiçoamento de vários artesãos por meio de parcerias com o SEBRAE, CEART e outras instituições.
Um dos pontos importantes a considerar foi a criação do Centro de Artesanato Ana Sancho, espaço criado em 2008 para reuniões, treinamentos e capacitações dos artesãos da comunidade, além de recepção de visitantes e exposição de produtos. O centro trouxe maior visibilidade ao artesanato da localidade. Por ter criado produtos à base de palha de bananeira e talo da palha do coqueiro, gerou oportunidade de renda para agricultores de outras localidades vizinhas, além de oportunizar o aproveitamento de material orgânico que antes era direcionado somente para o descarte na própria natureza. Tal inovação na fabricação dos produtos tornou o artesanato de Carqueijo reconhecido em nível nacional; isso aumentou o volume de vendas e gerou oportunidade de renda para a comunidade.
Nesse cenário, os jovens da região viram uma oportunidade para continuar junto de suas famílias, exercendo uma atividade laboral com retorno financeiro suficiente para atender suas necessidades.
A mobilização de artesãos para atender a grandes pedidos, como da La Rioja e Natura, gerou oportunidade para profissionais de vários municípios, como: Sobral, Rafael Arruda, Guaraciaba do Norte, Hidrolândia, Caucaia, Icapuí, Santa Quitéria e Viçosa do Ceará, fazendo girar o círculo virtuoso da economia criativa na região e valorizar a cultura local.
Tal fluxo de informações e de possibilidades ajudou na mobilização junto ao então Governador, que autorizou asfaltar a estrada de acesso principal ao distrito de Carqueijo, que antes era de barro, reconhecendo a importância do artesanato para a economia da comunidade, comprovado pelo crescimento de visitantes no distrito. Isso potencializou a atividade da comunidade local, que se viu inserida num cenário de pleno e crescente desenvolvimento.
A dificuldade em atender a demanda crescente fez com que Gilmar buscasse novas fontes de materiais. Foi então que, em sua busca persistente, descobriu um lugarejo no município de Massapê-CE que tinha palha da taboa em quantidade abundante.
Gilmar encontrou uma nova fonte de matéria-prima, todavia faltava testar o novo material no processo e avaliar a aceitação do produto no mercado. Começou a inserir o material em seus produtos de acordo com os pedidos, grau de especificidade e/ou exigências dos clientes. Para sua surpresa, o produto foi mais aceito do que o anterior.
A inovação implementada a partir da palha de bananeira e do talo da palha de coqueiro para a talisca da palha de palmeira e a palha da taboa gerou um grau de aceitação do produto muito maior e impulsionou a conquista de novos clientes e novos pedidos, ampliando a visibilidade do artesanato de Carqueijo no mercado.
Em 2010, após três meses de negociação, conseguiu fechar uma grande venda com a Natura, 45 mil peças. Após uma divulgação precipitada por parte do Carqueijo Artesanato, em mídia nacional, na qual expuseram peças que ainda seriam vinculadas aos produtos da empresa, a Natura cancela o pedido, pois o produto ainda estava em fase de projeto e não estava autorizada a divulgação. Neste momento, a saída foi refazer o projeto do produto e renegociar o contrato com a empresa. A situação foi contornada, porém deixou sérios prejuízos.
Neste mesmo ano, um drama familiar. Gilmar perdeu sua irmã caçula de apenas 17 anos em um acidente. Aliado a isso, um calote de um cliente de grande porte levou Gilmar a uma crise depressiva, iniciando uma fase pessoal muito difícil. Foram dois anos de perdas de cliente e de credibilidade no mercado, além de endividamento pessoal e organizacional.
O arranjo produtivo local sofreu em demasia com toda essa situação, pois viu seu maior organizador e incentivador declinar diante das dificuldades. Isso levou a perda de sua força perante a região e certa desarticulação local. O que parecia estar em fase de expansão, declinou. Todavia, seriam esses espinhos suficientes para fazer o APL sucumbir de vez?
A retomada!
Uma questão de tempo e de esperanças renovadas. Em 2012, após a premiação Aliança de Empreendedorismo Comunitário, Gilmar viu novas oportunidades. Como o próprio Gilmar relatou - Voltei com força total!!!
Deu-se início aí a uma nova fase nos negócios. Nas viagens e feiras, viu a oportunidade do comércio eletrônico. Em parceria com uma empresa paulista, criou a loja virtual. Foi um passo importante para a retomada e ampliação das vendas.
Para garantir o sucesso dessa nova etapa, era necessária a implantação de um estúdio fotográfico. Logo Gilmar pensa nas alternativas. Olhou para um quarto que tinha na sua casa e, com vara de marmeleiro (planta nativa da região) e uma lâmpada, montou um estúdio que garantiu fotos perfeitas para as postagens na loja virtual.
O próximo passo foi apresentar uma proposta para o SEBRAE de ampliação dos negócios da loja virtual. Em prontidão, o órgão disponibilizou um consultor para capacitação, estruturação e ampliação dos negócios virtuais. A modalidade de venda antes feita via site www.carqueijoartesanato.com.br passou também a ser realizada através de lojas virtuais de credibilidade e reconhecimento nacional: Americanas.com, Shoptime, Casas Bahia, Submarino e Ponto Frio são algumas das empresas parceiras em tal iniciativa.
Para Gilmar, é motivo de orgulho entrar em um dos sites das lojas virtuais, digitar o nome “artesanato de carqueijo” e ver a sugestão de venda dos produtos fabricados por eles.
Uma nova oportunidade está surgindo. Graças às participações que fazia em feiras de artesanato em diversas localidades e estados, Gilmar concretiza uma promissora negociação com uma empresa espanhola.
Por intermédio de uma lojista do estado do Rio Grande do Norte, que o apresentou à empresa em questão, Gilmar acredita que, em 2016, conseguirá estruturar esse novo canal de vendas e distribuição de seus produtos, internacionalizando a marca Artesanato Carqueijo por meio de seu portfólio.
Gilmar sabe que terá muitos obstáculos a vencer. Mas estes obstáculos não o intimidam, ele é consciente dos desafios e seu olho brilha cada vez que conta sua história.
Este caso foi desenvolvido para provocar os alunos a discutirem sobre o empreendedorismo, tendo como foco o estudo das atitudes empreendedoras. Dessa forma, busca observar as principais estratégias adotadas para estruturar tais atitudes dentro do contexto de economia criativa. Os alunos devem entender como o conceito de empreendedorismo pode ser desenvolvido numa perspectiva de economia criativa, tendo em vista o desenvolvimento de uma região por meio da instalação de um arranjo produtivo local.
O caso é recomendado para as disciplinas de Gestão Empreendedora, Desenvolvimento Local, Gestão Ambiental e Responsabilidade Social e pode ser utilizado em cursos de graduação ou pós-graduação lato ou stricto sensu.
Tal instrumento didático precisa vir acompanhado de leitura prévia sobre empreendedorismo, associativismo, economia criativa e arranjo produtivo local para que possa proporcionar o entendimento necessário para o estudo do caso.
Os dados que fundamentam este trabalho foram coletados em fontes direta e indireta. Por meio de visita in loco, foi possível realizar uma entrevista que gerou uma hora e dez minutos de áudio, além de fotos (ver anexo) e outros materiais doados pelo próprio empreendedor, como CD e folhetos com informações sobre todos os trabalhos e publicações do artesanato de Carqueijo. Durante o período de dezembro de 2015 a fevereiro de 2016, foram coletadas informações no site da própria associação dos artesãos de Carqueijo, no site do Youtube, citados a seguir, artigos acadêmicos, entre outros. Além disso, foram realizadas duas visitas a comunidade de Carqueijo.
https://www.carqueijoartesanato.com.br
https://www.youtube.com/watch?v=bSZVUaYwJLA
https://www.youtube.com/watch?v=Es9ZFTY4O_0
https://www.youtube.com/watch?v=lFsGagWQEcM
O material foi analisado, considerando a trajetória empreendedora de Gilmar, a capacidade de liderança e o associativismo e a visão de desenvolvimento econômico do empreendedor ao longo dos anos.
Algumas questões são apresentadas para apoiar a discussão do caso:
O conceito de Economia Criativa está em evolução. Baseia-se em ativos criativos que estimulam a geração de renda, a criação de empregos e a exportação de ganhos, além de, concomitantemente, promover inclusão social, diversidade cultural e desenvolvimento humano. E se apresenta como um conceito multifacetado de cunho futurista que tende a garantir um crescimento sustentável nas diversas áreas do conhecimento (UNCTAD, 2010).
Zardo e Melo (2012) afirmam que esta nova economia pode ser entendida como um conceito emergente em escala mundial por conta do potencial crescente das cadeias produtivas observadas anteriormente para o desenvolvimento econômico e social. Desenvolve-se no contexto imaterial do trabalho, em que a sociedade adapta-se a uma economia focada na informação, no conhecimento e no aprendizado, em que as habilidades cognitivas e de comunicação (recursos imateriais) surgem como novos fatores de produção e impõem a releitura de estratégias empresariais, assim como de dinâmicas organizacionais e de modelos de negócios até então vigentes (PIRES; ALBAGLI, 2012).
Também chamados de Indústria Criativa, os setores que a compõem apresentam elevado potencial para a geração de propriedade intelectual, ocupações, renda e desenvolvimento local, seja como propulsor de uma nova classe de trabalhadores e de empreendedores baseados na nova economia do conhecimento e da inovação ou mesmo como fator de valorização das tradições do local em que está inserida (DUARTE; SILVA, 2013). Dentre elas, destaca-se o artesanato, atividade predominantemente manual que exige criatividade, habilidade e destreza (LIMA; AZEVEDO, 1982) e que se destaca pela originalidade e pela representatividade cultural, transformando as peças que produz em artefatos únicos (BARROS, 2006).
Serra e Fernandez (2013) ampliam o conceito quando declaram que a economia criativa, além de tudo o que foi mencionado, também tem forte conteúdo de intangíveis e requer habilidades especiais da força de trabalho, além de apresentar estreita relação com os avanços científicos e tecnológicos.
A cadeia criativa estabelece um conjunto de segmentos dinâmicos que valorizam o capital intelectual e tem a criatividade como principal insumo para a produção de bens e serviços, dentre eles: artes visuais, design, moda, festivais, esporte, museus, bibliotecas, mídias, softwares, telecomunicações, biotecnologia, serviços criativos (arquitetura, publicidade, mercado editorial, pesquisa e desenvolvimento). É assim que a economia criativa consiste em um conjunto de atividades, tendo a criatividade como fator mais expressivo para a produção de bens e serviços, favorecendo o desenvolvimento econômico, promovendo a inclusão social, a diversidade cultural e o desenvolvimento humano.
Na perspectiva do cenário econômico nacional, percebem-se algumas barreiras burocráticas inerentes ao setor da criatividade, como as leis trabalhistas e a falta de incentivos governamentais. Há também que se considerar aspectos sociais, culturais, educação e saúde, que implicam diretamente a mudança de hábitos e costumes.
O Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas e ações 2011-2014 ressalta que o primeiro desafio é pactuar os fundamentos da economia criativa sustentado nos seguintes princípios: inclusão social, sustentabilidade, inovação e diversidade cultural brasileira (IPEA, 2013).
Em se tratando do mercado de trabalho e seus aspectos econômicos, dados sobre o setor revelam que as ocupações criativas tendem a remunerar melhor as pessoas, além de que os empregos estão associados à melhor qualidade de vida e níveis de satisfação superiores às ocupações tradicionais.
Os estudos sobre a economia criativa indicam a existência de dois grandes desafios a serem transpostos no Brasil: a falta de formação em gestão cultural, pública ou privada, bem como a formalização de empresas, que atinge apenas um terço dos empregos gerados. A UNCTAD (2010) recomendou que o governo estimulasse a geração de conhecimento científico e estabelecesse políticas de inovação voltadas para o campo de desenvolvimento da criatividade, especificamente no aspecto da economia criativa.
Dentre as recomendações da UNCTAD (2010) estão as articulações intersetoriais com parceiros institucionais, agências de fomento e desenvolvimento, órgãos bilaterais e multilaterais; no Brasil destacam-se: Entidades do Sistema S: SESC, SESI, SENAI e SEBRAE; Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO); Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP); Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); Banco do Nordeste; Banco do Brasil; Caixa Econômica Federal; Banco do Amazônia; Petrobrás; Correios; Eletrobrás; Furnas; Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); Institutos de Pesquisa Estaduais; Fundação de Apoio à Pesquisa (FAPES); Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Segundo dados do SEBRAE (2008), a região Nordeste do Brasil é a região de maior destaque no artesanato nacional pela variedade e expressividade da sua produção, o que traduz sua grande tradição cultural e turística. Um estudo do Banco do Nordeste (2002) registrou aproximadamente 3,3 milhões de artesãos no Nordeste. Isso demonstra que, além da importância do setor para o Estado, tendo em vista o fluxo turístico que gera e sua respectiva importância à Economia Criativa local, existe também o benefício social da atividade.
De acordo com Silva (2006), a inclusão produtiva de segmentos populacionais menos favorecidos resgata as atividades econômicas no fazer manual e na manufatura primitiva. Para a autora, o fato se reveste de maior importância porque esses artesãos costumam desenvolver atividades no espaço do conhecimento informal, aprendido em relacionamentos primários e pela transmissão transgeracional, quase sempre à margem das políticas de ensino formal e das iniciativas de educação para o trabalho.
Ainda de acordo com o SEBRAE (2008), um dos maiores desafios à prática do artesanato é a sua transformação em atividade econômica sustentável, de cunho empresarial, por meio da organização de produtores e de estruturação de canais de distribuição, tornando a atividade uma cadeia produtiva efetiva. Diante disso, Barros (2006) enaltece a necessidade de desenvolver as habilidades de gestão de negócios dos artesãos, tendo em vista uma melhor administração das relações com o mercado, a integralidade do processo produtivo e a comercialização dos produtos produzidos. Freitas (2006) também alerta sobre a relevância de capacitar os artesãos para ampliar mercados por meio da via associativa e cooperativa, visando ao conhecimento da cadeia produtiva e à inserção de produtos no mercado nacional e internacional.
Infere-se, portanto, que a formação especializada e continuada se apresenta como uma condição de sobrevivência ao longo do tempo para empresas e profissionais que atuam nas áreas de criatividade ou se interessam por elas. Isso certamente contribuirá para o desenvolvimento regional sob o ponto de vista econômico e social, além de considerar as inúmeras possibilidades de geração de resultados financeiros, sociais, culturais e ambientais.
Segundo Costa (2010), os APLs vêm se consumando como um importante meio de promoção da política econômica. O Ministério da Integração Nacional do governo brasileiro considera-os como um dos mais importantes instrumentos de geração de emprego e renda para a estratégia de redução das históricas desigualdades regionais do país (JACOMETTI; GONÇALVES; CASTRO, 2014).
Caporalli e Volker (2004) definem que APLs são aglomerações de empresas localizadas em um mesmo território, que apresentam especialização produtiva e mantêm algum vínculo de articulação, interação, cooperação e aprendizagem entre si e com outros atores locais, tais como governo, associações empresariais, instituições de crédito, ensino e pesquisa.
Jacometti, Gonçalves e Castro (2014) expõem o fenômeno dos APLs como aglomerações de empresas que buscam se desenvolver pelo compartilhamento de conhecimentos ao longo do tempo. Os autores afirmam que, além de aspectos geoeconômicos, envolve uma dimensão simbólica que está implícita na interação social entre os atores imersos e que pode ser apreciada por meio da microanálise. Diante disso, pode-se observar que o conceito de APL representa uma maneira de pensamento estratégico mais que considerável, tanto para a formulação de políticas de desenvolvimento local quanto para a formulação e implementação de estratégias competitivas de empresas, principalmente das micro e pequenas empresas (CASAROTTO FILHO; PIRES, 2001).
Schelemper, Marini e Bernartt (2014) apresentam algumas características comuns presentes em arranjos produtivos, entre as quais: são aglomerações de empresas com especialidade produtiva; estão localizadas em uma concentração geográfica e setorial; possuem vínculos entre os agentes por meio de processos interativos; buscam ganhos de eficiência coletiva; são principalmente formadas por pequenas empresas; possuem instituições de apoio (agentes econômicos, sociais e políticos) e realizam práticas cooperativas, as quais refletem em aprendizagem e capacidade inovativa para a competitividade. Assim, um arranjo produtivo pode ser visto como uma “estrutura intangível” cujas empresas interagem entre si e com atores locais na busca de vantagens competitivas e soluções para problemas comuns (AMARAL, 2013).
No contexto do artesanato de Carqueijo essa aglomeração de especialidades se apresenta por meio dos artesãos. Estes, com suas habilidades e criatividade, compõem um sistema de cooperação, complementando um processo produtivo participativo de atores locais que visam a ganhos coletivos e geram desenvolvimento local no âmbito econômico e social.
Os APLs funcionam por meio de uma lógica relacional que utiliza a competição ligada à cooperação. Abrange a cultura local e a confiança entre os agentes do aglomerado, interligando as entidades de apoio para prestação de serviços, associando-as aos fatores de produção, capital social e as habilidades de governança da sociedade para aumentar a eficiência e a eficácia de seus processos (COSTA, 2010; MASCENA; FIGUEIREDO; BOAVENTURA, 2013).
No contexto dos micro e pequenos negócios, Floriano, Souza e Corrêa (2007) defendem que os APLs podem impulsionar a competitividade, a modernização e a sustentabilidade dos mesmos, ao passo que também estimulam processos regionais de desenvolvimento. Os autores afirmam que, constituindo comunidades mais sustentáveis e com maior capacidade de suprir demandas imediatas, o processo pode provocar o despertar de vocações locais, desenvolvendo potencialidades direcionadas à especialização, mediante a articulação e a convergência de ações de governo e da celebração de parcerias com atores sociais diversos, inclusive empresários.
O empreendedorismo, apesar de não ser recente, é um campo científico que vem ocupando maior destaque no meio acadêmico e na literatura empresarial de modo geral. Talvez tal fato ocorra porque o indivíduo empreendedor pode ser considerado um agente transformador em diversos seguimentos: social, político, estrutural, econômico e psicológico (SILVA, 2010).
De origem francesa, a palavra empreendedor (entrepreneur) quer dizer aquele que assume riscos e começa algo novo (FILION, 2000). Para Dornelas (2008), é viável observar a relação entre o empreendedor com o relacionamento entre indivíduos e processos; juntos, isso pode levar à transformação de ideias em oportunidades.
Dornelas (2008) declara que o empreendedor é capaz de posicionar-se de forma clara e positiva em ambientes incertos e dinâmicos, o que se pode considerar como instáveis, conseguindo gerar e manter equilíbrio no ambiente em que está inserido. O autor também afirma que o empreendedor é capaz de identificar oportunidades, sendo consciente de que quanto mais preparado estiver, em termos de conhecimento, mais terá chances de obter sucesso em suas ações.
Percebe-se no perfil artesão de Gilmar essa característica de se posicionar de forma clara e positiva em ambientes incertos e dinâmicos, além de ser perspicaz na identificação de novas oportunidades que possam alavancar os negócios do Carqueijo Artesanato e, consequentemente, gerar desenvolvimento econômico e social para a comunidade de Carqueijo.
Diante dessa perspectiva, pode-se observar que indivíduos ditos empreendedores são aqueles que apresentam habilidades e competências para conceber, iniciar e gerir uma empresa, com potencial de geração de resultados positivos. Dessa forma, existem aqueles que possuem a intenção de empreender, seja abrindo uma empresa ou inovando no local em que trabalham (DORNELAS, 2008). Isso leva a enxergar a figura do agente empreendedor como sendo aquele que atua como protagonista na criação de novos negócios (DEGEN; 2009; HISRICH, PETERS; SHEPHERD, 2009). Tais negócios funcionam localmente como meio de geração de emprego e renda, estimulando até ações governamentais no sentido de incentivar a presença e a prática destes agentes na região onde estes localizados (DORNELAS; TIMMONS; SPINELLI, 2010; FILION, 1991).
Para Silva (2010), o empreendedor busca recursos para construir um novo cenário econômico, tendo em vista realizar sua intenção empreendedora concebida por meio de sua visão de futuro e planejamento; apresenta-se como agente propulsor da atividade econômica e suas ações, quando bem-sucedidas, traduzindo-as em benefícios para a sociedade em diversos âmbitos, o que é importante para o surgimento de novos empreendedores para a sociedade na qual atuam.
Isso demonstra que a ampliação do foco local surge como desafio primário para que a qualidade do produto acabado, seu acabamento e funcionalidade sejam fatores determinantes para o sucesso do negócio. Observa-se que investir na melhoria contínua das qualidades empreendedoras do artesão configura-se como ponto determinante no desenvolvimento dos mercados (DUARTE; SILVA, 2013).














