ANÁLISES QUALITATIVAS NOS ESTUDOS ORGANIZACIONAIS: AS VANTAGENS NO USO DO SOFTWARE NVIVO®

QUALITATIVE ANALYSES IN ORGANIZATIONAL STUDIES: THE ADVANTAGES OF USING THE SOFTWARE PROGRAM NVIVO®

ANÁLISIS DE CALIDAD EN ESTUDIOS ORGANIZACIONALES: LAS VENTAJAS EN EL USO DEL SOFTWARE NVIVO®

Anelise Rebelato Mozzato
Universidade de Passo Fundo, Brasil
Denize Grzybovski
Universidade de Passo Fundo, Brasil
Alex Niche Teixeira
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil

ANÁLISES QUALITATIVAS NOS ESTUDOS ORGANIZACIONAIS: AS VANTAGENS NO USO DO SOFTWARE NVIVO®

Revista Alcance, vol. 23, núm. 4, pp. 578-587, 2016

Universidade do Vale do Itajaí

Recepción: 17 Julio 2016

Aprobación: 11 Octubre 2016

Resumen: Este ensayo teórico demuestra las ventajas del uso del software NVivo® para el análisis cualitativo de texto, sonido, imagen y vídeo en los estudios organizacionales. Este tipo de software es aún poco utilizado en Brasil, sobre todo en los estudios organizacionales. El uso de software en la investigación cuantitativa no es nuevo; sin embargo, en los estudios organizacionales brasileños, en los cuales los investigadores tradicionalmente adoptan un enfoque cualitativo, el uso ha sido limitado. Toma nota de la necesidad de superar las debilidades de análisis, especialmente los derivados de un proceso manual de organización y análisis de datos cualitativos. Siguiendo esta lógica, se trabajan aquí las estructuras y las características básicas del NVivo®, identificándose las ventajas de su uso. Se concluye que el NVivo® ayuda al investigador a lo largo del proceso de investigación, sobre todo en los análisis, mejorando e intensificando el alcance y la profundidad, lo que permite una mayor explotación de la complejidad de los datos. Su utilización tiene como objetivo agilizar y mejorar el material de análisis, lo que facilita el proceso de análisis en la investigación cualitativa en los estudios organizacionales.

Palabras clave: Estudios de organización, Investigación cualitativa, Análisis de datos, Software NVIVO®.

Resumo: Este ensaio teórico demonstra as vantagens na utilização do software NVivo® para análise qualitativa de texto, som, foto e vídeo nos estudos organizacionais. O referido software ainda é pouco utilizado no Brasil, sobretudo nos estudos organizacionais. A utilização de softwares em pesquisas quantitativas não é novidade; entretanto, nos estudos organizacionais brasileiros nos quais, tradicionalmente, os pesquisadores adotam abordagem qualitativa dos dados, o uso tem sido limitado. Observa-se a necessidade de superação das fragilidades analíticas, em especial aquelas que derivam de um processo manual de organização e análise de dados qualitativos. Nessa lógica, as estruturas e os recursos básicos do NVivo® são aqui trabalhados, identificando-se as vantagens da sua utilização. Conclui-se que o NVivo® auxilia o pesquisador em todo o processo da pesquisa, principalmente nas análises, potencializando e intensificando alcance e profundidade, permitindo maior exploração da complexidade dos dados. Sua utilização visa agilizar e qualificar o material de análise, facilitando o processo analítico em pesquisas qualitativas nos estudos organizacionais.

Palavras-chave: Estudos organizacionais, Pesquisas qualitativas, Análise de dados, Software NVivo®.

Abstract: This paper demonstrates the advantages of using the software program NVivo® for qualitative analysis of text, sound, picture and video in organizational studies. This software is still little used in Brazil, especially in organizational studies. The use of software in quantitative research is not new; however, its use has been limited in organizational studies in Brazil, where researchers traditionally adopt a qualitative approach. There is a need to overcome the analytical weaknesses, especially in relation to the manual process of organizing and analyzing qualitative data. In this logic, the structures and basic features of NVivo® are analyzed in this study, identifying the advantages of its use. It is concluded that NVivo® helps the researcher in each stage of the research process, particularly in the analyses, boosting and increasing their scope and depth, and enabling further exploration of the complexity of the data. Its use also aims to streamline and enhance the analytical material, facilitating the process of analysis in qualitative research conducted in organizational studies.

Keywords: Organizational studies, Qualitative research, Data analysis, NVIVO® software.

1 INTRODUÇÃO

Este ensaio teórico tem o propósito de demonstrar as vantagens da utilização do software NVivo® para análise qualitativa de texto, som, foto e vídeo nos estudos organizacionais, pois o referido software ainda é pouco utilizado no Brasil, sobretudo nos estudos organizacionais. O software NVivo® consiste num sistema de indexação e de categorização de dados não-estruturados, o que possibilita a descoberta e a exploração dos sentidos das informações alfanuméricasi. Dessa forma, auxilia o pesquisador em todo o processo da pesquisa, inclusive no momento da definição e da organização das categorias e das subcategorias analíticas, na organização dos dados coletados em múltiplas fontes e, principalmente, no processo de análise, potencializando e intensificando alcance e profundidade, o que permite maior exploração da complexidade dos dados.

A utilização de softwares em pesquisas quantitativas não é novidade, talvez por isso seja mais bem aceita no meio acadêmico. Afinal, sua origem está nas chamadas “ciências naturais”, nas quais o “rigor científico” está associado à capacidade de mensurar e aferir com precisão (processo de quantificação) os resultados da pesquisa (SANTOS, 2001), e que ganhou maior relevância com a evolução da tecnologia para processamento de grandes volumes de dados (HAIR JR. et al., 1995).

Contudo, nos estudos organizacionais brasileiros, nos quais tradicionalmente os pesquisadores adotam abordagem qualitativa dos dados, o uso de softwares tem sido limitado, talvez por desconhecimento operacional, pelos custos de sua aquisição ou hábito, razão pela qual tem sido tema recorrente nos debates nos principais eventos científicos da área no Brasil e, em periódicos nacionais, há mais de uma década (ROCHA, 2005; MOZZATO; GRZYBOVSKI, 2011a, b; VERGARA, 2011; FREITAS, 2011; KIRSCHBAUM, 2013). No estágio que ora se encontram os estudos organizacionais brasileiros, de maturidade e aprimoramento qualitativo, observa-se a necessidade de superação das fragilidades analíticas (ROCHA, 2005), em especial aquelas que derivam de um processo manual de organização e análise de dados de entrevistas e de observações, por meio da utilização de softwares apropriados para pesquisas qualitativas.

Dado o fato de que a utilização de softwares (NVivo®, SPSS®, Sphinx®, outros) visa, justamente, agilizar e qualificar o material de análise (MOZZATO; GRZYBOVSCKI, 2011a), tais questões são salientadas neste trabalho. Como evidenciam Weitzman (2000) e Flick (2009), na tentativa de facilitar a análise das comunicações, têm-se buscado algumas alternativas em meios informacionais, dentre os quais se destaca o software NVivo®, constituindo-se em meio válido na análise qualitativa de dados.

Assim como Freitas, Cunha Júnior e Moscarola (1997), Weitzman (2000), Creswell (2007), Bandeira-de-Melo (2006), Teixeira (2011) e Mozzato e Grzybovski (2011a; 2011b), acredita-se na importância do auxílio de programas computacionais que otimizam tempo, dinamizam e qualificam o processo das análises qualitativas. Portanto, este ensaio teórico se propõe a apresentar quais são as vantagens no uso do software NVivo® para as análises qualitativas nos estudos organizacionais.

Com este propósito, este ensaio teórico está organizado em quatro seções, além desta introdução. Na seção 2, o software qualitativo NVivo® é apresentado como facilitador do processo das pesquisas qualitativas nos estudos organizacionais, com a exposição do referencial teórico norteador. Na seção 3 discutem-se as estruturas e os recursos básicos do NVivo®, seguido da seção 4, que demonstra especificamente as vantagens na utilização do mesmo. Na seção final são apresentadas as considerações finais e indicam-se direcionamentos para novos estudos.

2 O USO DE SOFTWARES NO PROCESSO DE ANÁLISE QUALITATIVA DE DADOS

Partindo do princípio de que tanto a pesquisa quantitativa como a qualitativa têm validade (KIRSCHBAUM, 2013), desde que conduzidas com rigor científico (SANTOS, 2001), inclusive na sua complementaridade, entende-se que a pesquisa qualitativa é muito profícua para os estudos organizacionais (SHAH; CORLEY, 2006), facilitando correlações importantes e interessantes para pesquisas de fenômenos sociais (GODOI; BANDEIRA-DE-MELLO; SILVA, 2006). Para muitos autores, a exemplo desses últimos e, também, Denzin e Lincoln (2011), a pesquisa qualitativa está cada vez mais se mostrando mais consistente, demonstrando rigor científico no processo de análise. Nessa lógica, entende-se que a utilização consciente de softwares, na visão de que consistem em ferramentas de auxílio ao pesquisador, qualifica ainda mais as pesquisas qualitativas, reduz o tempo gasto na organização dos dados, bem como a perda quando há grande volume de dados gerados (TEIXEIRA; BECKER, 2001), principalmente oriundos de entrevistas.

Por mais que haja uma série de programas de computador orientados para o auxílio na análise qualitativa de dados (Computer-aided qualitative data analysis software – CAQDAS) desde a década de 1980 (KELLE, 1997), ainda se observam obstáculos em sua viabilização operacional (TEIXEIRA; BECKER, 2001; LAGE; GODOY, 2008; LAGE, 2011) e limitações na compreensão de que são apenas ferramentas, ou seja, meios facilitadores, não um fim em si mesmo (TEIXEIRA; BECKER, 2001; TEIXEIRA, 2011). Nesse sentido, é recomendável seguir os princípios do uso de CAQDAS para a utilização de software em diferentes contextos analíticos, apontados por Silver e Lewins (2014).

Mesmo ainda pouco utilizados nos estudos organizacionais, sobretudo no Brasil, como evidencia Flick (2009), algumas alternativas têm sido buscadas, visando facilitar a análise das comunicações no processo de pesquisa com abordagem qualitativa, com o uso de CAQDAS. Como refere Yin (2016, p. 160), o CAQDAS diz respeito aos "diversos programas de computador que se enquadram sob um rótulo genérico, conhecido com software de 'Análise de dados qualitativos assistida por computador'", inclusive incluindo programas menos especializados.

Mozzato e Grzybovski (2011b) referem que existem mais de 25 programas para análise qualitativa na atualidade, enquanto que Bandeira-de-Mello (2006) identificou 22 softwares para análise textual e os apresentou em quatro grupos. O NVivo® encontra-se no grupo de softwares disponíveis, cuja finalidade é “buscar, categorizar, organizar e registrar interpretações” (p. 431). Flick (2009), por sua vez, menciona: NUD*IST (gerenciador de referências para biblioteca pessoal), ATLAS*ti (planejar projetos) e MAXqda (para importar e exportar materiais de diferentes fontes). A maioria dos pesquisadores concorda quanto à importância da utilização de softwares para as análises em pesquisas qualitativas, com a devida ressalva de que o papel do pesquisador precede aos múltiplos recursos oferecidos (LAGE; GODOY, 2008), pois é o pesquisador que realiza toda a reflexão (YIN, 2016). Ciente da existência de um número significativo de softwares que possibilitam e facilitam a análise qualitativa, neste ensaio teórico tem-se como foco de análise o NVivo®, o qual, de acordo com Lage (2011, p. 201) consiste num

(...) dos softwares mais utilizados no ambiente acadêmico brasileiro, tendo sido adotado por centros de pesquisa da maioria das grandes universidades, como a Unicamp, a USP, a UFRGS, entre outras. No entanto, ainda é baixo o número de pesquisas qualitativas que usam algum tipo de software de apoio.

Em pesquisas qualitativas, o material a ser analisado “pode ser melhorado com o uso de programas de computador com software qualitativo” (CRESWELL, 2007, p. 197). Também Bardin (2009, p. 37) admite as novas tecnologias como facilitadoras nos processos de coleta e análise de dados. Portanto, o NVivo® consiste numa ferramenta que auxilia o pesquisador nas várias etapas da pesquisa qualitativa: organização da fundamentação teórica; definição e procedimentos da amostragem inicial; definição e organização das categorias e subcategorias analíticas; organização dos dados coletados em múltiplas fontes; análise dos dados; desenvolvimento teórico e apresentação dos resultados; potencialização e intensificação do alcance e profundidade das pesquisas; permissão de maior exploração da complexidade dos dados; na validação dos resultados das pesquisas, gerando confiabilidade.

Nesta lógica, fica evidente que a análise qualitativa dos dados é um processo complexo, que exige pensamento objetivo por parte do pesquisador (DENZIN; LINCOLN, 2008), o qual não fica livre de criar inconsistências. Afinal, as técnicas de pesquisa qualitativa não mudam em função do CAQDAS utilizado (TEIXEIRA; BECKER, 2001) e o NVivo®, ou outro software com a mesma finalidade (BANDEIRA-DE-MELLO, 2001), pode ser útil também na identificação de (in)consistências metodológicas já na fase inicial da análise, como no processo de codificação, inclusive, facilitando a análise de múltiplas fontes de evidências.

Sabe-se que o corpus (dados brutos) de uma pesquisa só terá sentido ao ser trabalhado pelo pesquisador, de acordo com a técnica de análise apropriada. A aplicação dessa técnica, com a utilização de um software, auxilia muito o processo analítico, a exemplo da utilização do NVivo® na realização da "análise de conteúdo", como indica Bardin (2009), do mesmo modo que o Atlas/ti apoia a grounded theory, como indica Bandeira-de-Mello (2001). Contudo, o processo de análise dos dados qualitativos é “uma atividade exclusiva do elemento humano” (BANDEIRA-DE-MELLO, 2001, p. 433).

A análise de conteúdoii constitui-se num conjunto de técnicas de análise de comunicações, cujo objetivo ultrapassa as incertezas e enriquece a leitura dos dados coletados imprimindo, como pontua Bardin (2009), o rigor da objetividade, da cientificidade e a riqueza da subjetividade. Dessa forma, certas “regras” (atenção às diferentes fases e etapas) devem ser consideradas, mas não imprimindo a ideia de modelo exato e rígido. A este respeito, afirma Mozzato e Grzybovski (2011a, p. 736), é preciso “ultrapassar o senso comum do subjetivismo e alcançar o rigor científico necessário, mas não a rigidez inválida, que não condiz mais com tempos atuais”. Assim, evita-se cometer “usos e abusos” na adoção dos métodos qualitativos (ROCHA, 2005) nos estudos organizacionais, considerando as implicações da escolha de um determinado método (qualitativo, quantitativo, misto), como aponta Kirschbaum (2013).

Deste modo, especificamente na realização de análise de conteúdo com o auxílio do NVivo®, os dados coletados são rapidamente organizados e sua apresentação demonstra qualidade superior ao daquela manualmente realizada pelo pesquisador e seus aprendizes (TEIXEIRA; BECKER, 2001), possibilitando e auxiliando no trabalho com as três fases propostas por Bardin (2009):

  1. 1. pré-análise;
  2. 2. exploração do material;
  3. 3. tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

Assim, é possível explorar a complexidade dos dados, utilizando-se o método “análise de conteúdo”.

A análise de conteúdo nos estudos organizacionais cada vez mais tem adquirido legitimidade, evoluindo em virtude da preocupação com a qualidade das pesquisas qualitativas. No entanto, a constituição de novos paradigmas científicos exige revisitar as abordagens metodológicas (MOZZATO; GRZYBOVSKI, 2011a; 2011b; FREITAS, 2011; VERGARA, 2011) e sua aplicação. Para tanto, o NVivo® desponta como um dos softwares que disponibiliza ferramentas peculiares para decodificação das comunicações, sejam elas em forma de texto, som e imagens em foto ou vídeo, auxiliando na extração do sentido dos dados. Por outro lado, por si só, não aumenta ou diminui a qualidade de uma pesquisa, a qual "está diretamente relacionada à qualidade dos dados e à adequação dos procedimentos metodológicos ao problema a ser investigado, além da experiência do pesquisador" (LAGE, 2011, p. 224).

Diante de tais prerrogativas, torna-se pertinente abordar a estrutura e os recursos básicos do software NVivo®, mesmo que não se tenha como pretensão a exposição completa do programa.

3 AS ESTRUTURAS E OS RECURSOS BÁSICOS DO SOFTWARE NVIVO®

O NVivo® é um software que pertence à família dos programas geradores de teoria a partir de codificação, assim como o Atlas/ti, NUD*IST, QCA, The Ethnograph e outros. Os softwares desta família “permitem tratar os códigos criados na análise como elementos constitutivos” de uma teoria (BANDEIRA-DE-MELLO, 2001).

Inicialmente lançado no Brasil apenas na versão em inglês, o programa NVivo® encontra-se em português desde a versão 9, lançada em 2010, o que facilitou ainda mais a sua utilização. Com o avanço das versões do software, novos recursos são incluídos além do aprimoramento dos já existentesiii.

Na utilização do NVivo®, o pesquisador reúne todos os seus materiais de pesquisa num só lugar e de maneira segura, desde os materiais de origem até os pensamentos analíticos. Este “lugar seguro” é o espaço de trabalho apresentado na Figura 1, referente a um projeto de pesquisa em desenvolvimento com o referido software.

Espaço de trabalho do software NVivo®
Figura 1
Espaço de trabalho do software NVivo®
Fonte: Arquivo dos autores.

Primeiramente, chama-se a atenção para a faixa de opções na parte superior da tela do programa, a qual é semelhante ao sistema Windows, auxiliando na localização de todos os comandos do NVivo® por parte do usuário. Na realidade, toda a tela é muito similar ao sistema Windows. Entretanto, isso não exime o pesquisador de ter que conhecer toda a terminologia utilizada pelo software, como pontua Yin (2016).

No canto inferior esquerdo observam-se as sessões, cujos conteúdos, no formato de pastas, são apresentados no espaço acima, à esquerda. Os itens armazenados nestas pastas são visualizáveis no painel superior direito e, uma vez abertos, podem ser navegados no painel abaixo à direita. Este fluxo da informação respeita o padrão do espaço de trabalho de vários outros programas de uso mais difundido, como navegadores de e-mails, por exemplo. Seguindo ainda o modelo visual dos programas da família Microsoft Office®, o NVivo® dispõe uma faixa com botões de recursos e comandos na parte superior do espaço de trabalho.

As três principais instâncias de gerenciamento das informações no NVivo® são as fontes, os nós e as classificações. Não por acaso estas sessões aparecem, nesta ordem, como as três primeiras no espaço a elas destinado no ambiente de trabalho do programa.

As fontes são os materiais empíricos, os dados brutos. Tratam-se do ponto de partida do trabalho em seus diversos formatos de arquivos: textos (doc, docx, rtf, txt, PDF); imagens (bmp, gif, jpg, tif), áudios (mp3, wav), vídeos (mpeg, avi, mov) e, ainda, conjuntos de dados (xls, xlsx, odbc).

Os nós (nodes) representam os temas, categorias ou conceitos de um projeto e servem para armazenar a codificação. São recipientes para armazenamento de informações codificadas e podem assumir significados diferentes, dependendo da abordagem metodológica utilizada na pesquisa. Por exemplo, se for utilizada análise de conteúdo, os “nós”receberão os códigos (fragmentos de textos) formando categorias de informação. A codificação, portanto, consiste em localizar passagens no material empírico e a elas atribuir os significados correspondentes aos nós. Os códigos resultantes, por sua vez, são índices de referência adicionados a porções de material empírico: trechos de texto, porções de fotos, sons e imagens ou, ainda, células em uma planilha de dados (TEIXEIRA, 2015, p. 5). Cabe salientar que, havendo a necessidade de alguma correção, a descodificação pode ser realizada a qualquer momento.

Os nós (nodes) destinados à codificação de temas ou categorias podem ser organizados em subníveis de especificação, apresentando uma estrutura hierárquica, se os objetivos da pesquisa assim exigirem. Existem ainda os nós chamados casos que podem receber atributos (DEAN; SHARP, 2006; JOHSTON, 2006). Assim, numa pesquisa que investiga o posicionamento de empresas sobre sustentabilidade, cada empresa poderia ser um caso, e a esse caso poderiam ser associados atributos, como “tipo” ou “porte” da empresa ou quaisquer outras características que fossem necessárias no processo de análise (LAGE, 2011, p. 203).

A estrutura que permite vincular casos a atributos chama-se classificação. Trata-se de um recurso no formato de tabelas de dados, cujos casos são informados nas linhas e seus atributos correspondentes figuram nas colunas, exatamente como em um banco de dados convencionalmente usado nas pesquisas quantitativas. No NVivo® é possível manter várias tabelas de classificação para acomodar diferentes arranjos de casos (pessoas, instituições, etc.), bem como classificações de fontes. Este último recurso pode ser particularmente útil para a organização e análise de fontes bibliográficas, fazendo do NVivo® uma ótima ferramenta não só para análise de dados empíricos, como também revisão da literatura.

Embora não exista um procedimento padronizado na condução de análises qualitativas com o auxílio de softwares, alguns passos podem ser indicáveis a título de sugestão: inicia-se o projeto com a importação e o gerenciamento dos dados bibliográficos, seguindo com a importação e a codificação das fontes para reunir materiais em temas (nós). Os nós são organizados em níveis e subníveis, criando hierarquias que atendam às questões do projeto. Os nós de caso são definidos e classificados, visando reunir informações descritivas sobre as unidades empíricas de análise. Assim, torna-se possível a realização de consultas que revelam as tendências e como os dados se relacionam, possibilitando visualizar várias e novas perspectivas sobre o material, por meio de árvores de palavras, nuvens de termos, mapas de árvores e análises de cluster. Por fim, as descobertas das pesquisas podem ser compartilhadas como um todo ou por meio da execução de relatórios personalizados.

A matriz de codificação no NVivo® possibilita, por exemplo, análises e explorações das codificações realizadas em diversos temas ou temas e perfis de respondentes (atributos de casos) de forma cruzada, auxiliando a procura de sobreposições e interseções entre elas. Tais codificações constituem-se na reunião de todo o material sobre um tema, ideia ou tópico. Assim, as consultas às matrizes de codificação permitem comparações entre o material codificado para mostrar tipos específicos de associações entre itens de pesquisa.

O NVivo® ainda conta com os recursos "memos" e "links”, os quais auxiliam o pesquisador na organização das suas análises e no armazenamento de insights. Os memos são espaços destinados ao registro de reflexões que podem estar associadas às fontes ou aos “nós”. Também podem ser criados links diretamente relacionados a um memo diretamente no texto que estiver sendo codificado, por meio da marcação de um trecho de texto num documento ou de uma parte numa imagem, por exemplo.

Outro aspecto importante a destacar no NVivo® é o fato de um projeto (arquivo com extensão “.nvp”) poder ser salvo e armazenado em meios móveis, como em pen-drive, CD-Rom, enviado por e-mail como arquivo ou nas “nuvens”iv.

4 VANTAGENS DO USO DO NVivo®

Quando o NVivo® é utilizado de forma apropriada, constitui-se numa ferramenta poderosa que facilita a organização da fundamentação teórica, a definição e os procedimentos da amostragem inicial, a análise dos dados, o desenvolvimento teórico e a apresentação dos resultados. Inclusive, a adequada utilização do NVivo® também culmina numa forma de validação dos resultados das pesquisas, gerando confiabilidade.

Pontualmente, destacando as vantagens da utilização do software NVivo®, inicia-se salientando que ele auxilia o pesquisador em todo o processo da pesquisa e na sua organização desde o planejamento inicial. Como bem pontuam Teixeira e Becker (2001), com o auxílio do NVivo®10, os dados coletados podem ser mais bem organizados, auxiliando o pesquisador desde o início de um projeto.

Também fica evidenciada a vantagem de as análises serem gerenciadas em um só local, com a possibilidade de importar e analisar qualquer combinação de documentos: PDFs, planilhas, bancos de dados. Ainda, além da importação de materiais de diversas fontes, os dados podem ser exportados e utilizados em outros aplicativos, tais como Word, Excel, SPSS e ATLAS*ti.

Assim, desde o início a análise teórica é facilitada, potencializando também o momento da definição das categorias e das subcategorias analíticas. Ainda, viabiliza a necessária transdisciplinariedade, principalmente em razão do grande volume de dados.

Quanto ao processo de análise, essa é potencializada com a possibilidade da realização rápida de relações entre os dados, auxiliando o pesquisador a refletir sobre eles (YIN, 2016). Assim, há uma intensificação do alcance e da profundidade das análises, além da redução do tempo para tal, sem perder a exploração da complexidade dos dados (TEIXEIRA; BECKER, 2001; TEIXEIRA, 2011, 2015).

Soma-se a essas vantagens a possibilidade da realização de consultas para revelar tendências ou verificar como as ideias se relacionam, servindo também para a obtenção de diferentes perspectivas para melhor exposição dos dados. Por fim, salienta-se que o software NVivo® permite que o pesquisador gere relatórios finais para a consulta de quem interessar, além de servir para a prestação de contas, quando necessário.

Destacadas as potencialidades, salienta-se que é a argumentação e a descrição do percurso metodológico que trazem consistência para qualquer análise qualitativa. Entretanto, a correta utilização de tal software otimiza tempo, além de dinamizar e qualificar o processo da análise de dados em pesquisas qualitativas. Para obtenção de tais vantagens, como afirmam Mozzato e Grzybovski (2011a, p.743), "como qualquer programa computacional, além da necessidade da utilização correta, os dados que o alimentam têm de ser apropriados, sob o risco de se ter um corpus falho".

Reitera-se que o software NVivo® não substitui o trabalho analítico e criativo do pesquisador, mas potencializa os resultados da pesquisa, pois força o envolvimento do pesquisador com o material empírico, estimulando-o a pensar acerca das informações (TEIXEIRA, 2011). Para tanto, o pesquisador deve “possuir amplo campo de clareza teórica. Isto é, não será possível a inferência, se não dominarmos os conceitos básicos das teorias” (TRIVIÑOS, 1987, p. 160). Como salienta o autor, não será possível a inferência dos dados, sem domínio dos conceitos. Além disso, para a operacionalização dos dados, o pesquisador necessita criar, codificar e tratar os nós para as análises, sistematizando os dados e as buscas por meio de classificações e atributos correspondentes, além da possibilidade de trabalhar com "memos" e "links", relacionando e criando modelos analíticos. Todo esse processo é facilitado pelos mecanismos de pesquisa e codificação automática na base de dados, gerando resultados e relatórios com disposições diversas, claras e atrativas.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegando ao final deste ensaio teórico, entende-se estar contribuindo para o avanço das pesquisas qualitativas na área da Administração, principalmente nos estudos organizacionais, uma vez que foram evidenciadas as principais vantagens na utilização do software NVivo® para a análise qualitativa de dados de pesquisa no formato de texto, som, foto e vídeo. Assim, acredita-se estar colaborando para com o avanço na utilização de tecnologias nas pesquisas qualitativas, as quais ainda são pouco empregadas no Brasil, sobretudo em pesquisas na área dos Estudos Organizacionais.

Apoiando-se em publicações anteriores sobre o tema, com destaque para Freitas, Cunha Júnior e Moscarola (1997), Weitzman (2000), Creswell (2007), Bandeira-de-Melo (2006), Flick (2009), Mozzato e Grzybovski (2011a; 2011b) e Teixeira (2015), e nos apontamentos aqui apresentados, conclui-se que a utilização de softwares específicos para a análise qualitativa se reveste de importância nas pesquisas da Ciência da Administração. Esses softwares, por otimizar o tempo do pesquisador, dinamizam e qualificam o processo de análise dos dados com abordagem qualitativa, sobretudo na etapa de seleção dos elementos analíticos, formação das categorias e incorporação das evidências empíricas ao processo cognitivo do pesquisador ao analisar os dados.

O NVivo® consiste numa ferramenta sofisticada de análise de texto resultado de entrevistas, técnica de coleta de dados muito utilizada nos Estudos Organizacionais, a qual traz vantagens tanto para qualificar os resultados da pesquisa, quanto para os pesquisadores, minimizando a influência positivista que ainda faz parte do método de análise de conteúdo, originalmente apresentada por Laurence Bardin. De maneira sintética, afirma-se que a correta utilização do software aumenta a clareza teórica das pesquisas, auxilia no rigor científico necessário, potencializa as análises qualitativas, aumenta a percepção dos dados “ocultos”, em especial nas imagens e sons, auxilia na triangulação dos dados que se encontram dispersos em diferentes fontes e otimiza o tempo, qualificando todo o processo das análises qualitativas.

Entretanto, como bem pontua Yin (2016), diferente dos softwares quantitativos, os qualitativos não servem para o pesquisador se esconder atrás de um enunciado de utilização de determinado software; ele tem que deixar claras a lógica e a validade de todo o seu trabalho na utilização do mesmo. Apesar das vantagens evidenciadas, não se nega que o pesquisador se depara com certa dificuldade operacional ao começar a trabalhar com o NVivo®, a qual tende a ser superada com o seu uso contínuo. Portanto, o conhecimento do software faz-se necessário, proporcionando ao pesquisador segurança no estabelecimento das suas estratégias analíticas, até mesmo na definição dos tipos de materiais empíricos passíveis de análise e as estratégias para tal.

Ainda cabe enfatizar que o software não fará o trabalho do pesquisador (transcrição das entrevistas, definição das categorias analíticas, etc.), cuja atividade depende da capacidade intelectual e cognitiva de quem está realizando a investigação. Contudo, entende-se como válido esse esforço inicial no sentido de "apropriação" do software, dada a sua importância para o avanço e a robustez das pesquisas qualitativas. Inclusive, as publicações dos resultados qualitativos com a utilização do NVivo® tem ganho espaço em periódicos nacionais e internacionais.

Por fim, destaca-se a necessidade contínua de estudos que tenham como intuito melhorar os processos de pesquisas qualitativas. O NVivo® é uma possibilidade em ação e entende-se como oportuna a ampliação consciente de pesquisas empíricas com a sua utilização.

Referencias

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Notas de autor

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