Artigo

CAPACIDADE DE ABSORÇÃO E INOVAÇÃO EM EMPRESAS DE PEQUENO PORTE

ABSORPTION CAPACITY AND INNOVATION IN SMALL COMPANIES

LA CAPACIDAD DE ABSORCIÓN E INNOVACIÓN EN EMPRESAS DE PEQUEÑO PORTE

PATERNOLLI ANDRÉIA
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil
EVERTON LUIS PELLIZZARO DE LORENZI CANCELLIER
Universidade do Estado de Santa Catarin, Brasil

CAPACIDADE DE ABSORÇÃO E INOVAÇÃO EM EMPRESAS DE PEQUENO PORTE

Revista Alcance, vol. 24, núm. 1, pp. 050-065, 2017

Universidade do Vale do Itajaí

Recepção: 10/01/2017

Aprovação: 29/03/2017

Resumo: Neste estudo o objetivo foi analisar a capacidade de absorção de conhecimento de pequenas empresas para inovar em produtos e serviços. Uma forma de a empresa obter vantagem competitiva e garantir sustentabilidade é por meio da inovação, que por sua vez encontra na capacidade de absorção rotinas que facilitam a aquisição, a assimilação, a transformação e a explotação do conhecimento, dimensões sugeridas por Zahra e George (2002). A metodologia de pesquisa utilizada foi qualitativa com entrevistas semiestruturadas gravadas com os empreendedores e colaboradores das empresas. Os resultados demonstram que essas empresas buscam conhecimento no ambiente externo para aplicar em seu processo produtivo, demonstrando o uso das quatro dimensões propostas por Zahra e George (2002); e destacam a importância dos fatores complementares conhecimento prévio, eventos ativadores e integração social na capacidade de absorção das pequenas empresas estudadas.

Palavras-chave: Capacidade de absorção, Inovação, Pequenas empresas.

Abstract: This study analyzes the absorption capacity of small businesses in Florianópolis, in their efforts to generate innovation. A way for the company to gain competitive advantage and ensure sustainability is through innovation, which in turn, lies in the capacity to absorb routines that facilitate the acquisition, assimilation, transformation and exploitation of knowledge – dimensions proposed by Zahra and George (2002). The research methodology used was qualitative, with semi-structured interviews recorded with the entrepreneurs and collaborators of the companies. The results show that these companies are seeking knowledge in the external environment which they can then apply to their production processes, demonstrating the use of the four dimensions proposed by Zahra and George (2002), and they highlight the importance of complementary factors such as prior knowledge, triggering events, and social integration in the absorption capacity of the small businesses studied.

Keywords: Absorption Capacity, Innovation, Small Business.

Resumen: En este estudio el objetivo fue analizar la capacidad de absorción de conocimiento de pequeñas empresas para innovar en productos y servicios. Una de las formas que la empresa tiene para obtener ventaja competitiva es garantizar sostenibilidad por medio de la innovación, que a su vez encuentra en la capacidad de absorción, rutinas que facilitan la adquisición, la asimilación, la transformación y la explotación del conocimiento, dimensiones sugeridas por Zahra y George (2002). La metodología de investigación utilizada fue cualitativa, con entrevistas semiestructuradas grabadas con los emprendedores y colaboradores de las empresas. Los resultados demuestran que esas empresas buscan conocimiento en el ambiente externo para aplicarlo en su proceso productivo, demostrando el uso de las cuatro dimensiones propuestas por Zahra y George (2002). También destacan la importancia de los factores complementarios de conocimiento previo, eventos activadores e integración social en la capacidad de absorción de las pequeñas empresas estudiadas.

Palabras clave: Capacidad de absorción, Innovación, Pequeñas empresas.

1 INTRODUÇÃO

O conceito de capacidade de absorção (Absorptive Capacity – ACAP) está relacionado à busca por novos conhecimentos no ambiente externo da organização para posterior transformação interna e aplicação nos produtos e nos serviços comercializados pela empresa (COHEN; LEVINTHAL, 1990). A capacidade de absorção se apresenta como um fator de vantagem competitiva, pois tem a finalidade de produzir inovação a partir do novo conhecimento adquirido (CAMISÓN; FORÉS, 2010; ZAHRA; GEORGE, 2002) e melhorar o desempenho da organização (TAVANI; SHARIFI; ISMAIL, 2014).

A sustentabilidade da vantagem competitiva depende da inovação alcançada (ZAHRA; GEORGE, 2002). Sustentar uma vantagem competitiva requer investimentos constantes em conhecimento devido à tendência de homogeneização das organizações (DIMAGGIO; POWELL, 1983). Assim, Zahra e George (2002) propõem que uma empresa com a ACAP bem desenvolvida terá a flexibilidade necessária para reconfigurar seus conhecimentos com menor custo que as demais. Essa redução de custos se deve ao fato de a experiência fazer com que a empresa administre suas rotinas com mais efetividade, embora essa redução ocorra apenas até determinado nível de investimento. A partir desse nível, conforme as conclusões de Stock, Greis e Fischer (2001) e de Tavani, Sharifi e Ismail (2014), os retornos com inovação não compensam mais aumentos nos investimentos.

A efetivação da ACAP depende de fatores complementares que demandam estar presentes em cada dimensão. Esses fatores podem ser diversos, porém nesse estudo foram utilizados para análise: eventos ativadores, que fazem a empresa se reposicionar diante de oportunidades ou ameaças (ZAHRA; GEORGE, 2002); mecanismos de integração social, que facilitam a difusão do conhecimento entre os membros da organização (ZAHRA; GEORGE, 2002); relações de poder, que influenciam a absorção do conhecimento (TODOROVA; DURISIN, 2007); e conhecimento prévio, que são tecnologias que a empresa já domina e facilitam o reconhecimento e a aplicação do novo conhecimento (COHEN; LEVINTHAL, 1990).

O estudo foi aplicado em empresas de pequeno porte de Florianópolis. Nessas empresas, a ACAP é importante por estar relacionada ao processo de inovação na medida em que fornece os recursos para a empresa se adaptar às mudanças do mercado (ZAHRA; GEORGE, 2002). Uma maneira de buscar conhecimento é a participação da empresa, de forma colaborativa, em pesquisas com clientes, fornecedores e até concorrentes. A colaboração em pesquisa e em desenvolvimento (P&D) permite a obtenção de experiências que internamente seriam difíceis de conseguir (BECKER; DIETZ, 2004). Outro motivo para estudar a ACAP é a constatação de queda no processo inovativo no Brasil (IBGE, 2014).

A capacidade de reconhecer o valor da nova informação obtida no meio externo não é automática, ela pode ser trabalhada e depender dos valores dos tomadores de decisão (TODOROVA; DURISIN, 2007). Autores revisados argumentam que as inovações radicais são mais raras que as incrementais (LANE; KOKA; PATHAK, 2006), o que torna importante analisar o tipo de inovação ocorrida nas empresas pesquisadas e sua relação com a ACAP. A inovação resultante do processo de ACAP depende de possibilitar a sua exploração comercial de forma que a empresa aumente o desempenho financeiro (COHEN; LEVINTHAL, 1990; KOSTOPOULOS et al., 2011).

Embora existam muitos estudos sobre ACAP, Kostopoulos et al. (2010) recomendam pesquisas usando medidas qualitativas, em especial se realizadas em países em diferentes estágios de desenvolvimento econômico, e a análise dos efeitos da ACAP em diferentes tipos de inovação - radical e incremental. Volberta, Foss e Lyles (2010) afirmam que têm sido negligenciados na literatura estudos acerca dos antecedentes e dos fatores complementares à ACAP. Os autores identificam possibilidades para futuras pesquisas nas quais se analisem a influência do indivíduo e da organização na ACAP; a origem da informação – que pode ser da interação de empregados, de grupos, de setores – e como ocorrem as relações entre eles; e a contribuição dos indivíduos na construção da ACAP.

Este estudo possui uma abordagem qualitativa para investigar a ACAP e seus fatores complementares no processo de inovação radical de empresas de pequeno porte brasileiras. Assim, com esta pesquisa pretende-se responder à seguinte questão: como as empresas de pequeno porte absorvem conhecimento em seus esforços para inovar em produtos e serviços? O objetivo geral é analisar a capacidade de absorção de conhecimento de pequenas empresas para inovar em produtos e serviços.

O presente artigo é composto pela próxima seção, a fundamentação teórica, seguida dos procedimentos metodológicos, dos resultados e das considerações finais.

2 CAPACIDADE DE ABSORÇÃO

O conceito de ACAP foi, inicialmente, desenvolvido por Cohen e Levinthal, e contempla a capacidade de absorção da empresa em identificar, assimilar e explorar o conhecimento proveniente do ambiente externo, aplicando-o em seu processo inovativo com fins comerciais (COHEN; LEVINTHAL, 1990).

Zahra e George (2002, p. 186) definem a ACAP como “um conjunto de rotinas e processos organizacionais por meio dos quais as empresas adquirem, assimilam, transformam e exploram o conhecimento para produzir uma capacidade dinâmica e sustentável”. Para existir ACAP, os componentes não necessitam ocorrer de forma isolada, mas complementarmente. Os autores ainda subdividem a ACAP em Potencial (PACAP) e Realizada (RACAP). A PACAP está relacionada às dimensões adquirir e assimilar e a RACAP às dimensões transformar e explorar. Uma empresa pode ter a PACAP bem desenvolvida e ter deficiência na RACAP, assim a subdivisão auxilia a análise.

Todorova e Durisin (2007, p. 776-7) consideram que as empresas “reconhecem o valor, adquirem, transformam ou assimilam e exploram o conhecimento”. Em seu conceito, os pesquisadores reintroduzem o reconhecimento do valor do conhecimento novo, como definiram Cohen e Levinthal (1990).

Para Lane, Koka e Pathak (2006), a ACAP é a capacidade de a empresa utilizar o conhecimento externo por meio de três sequências de aprendizagem: reconhecendo e entendendo o valor do novo conhecimento (aprendizagem exploratória), assimilando (aprendizagem transformativa) e usando o conhecimento assimilado para criar novos produtos/serviços (aprendizagem exploitativa).

Camisón e Forés (2010) conceituaram capacidade de absorção de forma semelhante a Zahra e George (2002). Eles a definem como uma capacidade sistemática e dinâmica dividida em dois subconjuntos, potencial e realizada.

As quatro dimensões da ACAP serão detalhadas a seguir:

Adquirir – capacidade da empresa de identificar e adquirir conhecimento externo para utilizar em suas operações (ZAHRA; GEORGE, 2002). A busca por informações internas e externas à empresa deve ser clara aos funcionários e realizada de forma efetiva. Com o passar do tempo, essa atividade se torna mais cara e complexa, pois será necessário buscar novas fontes de conhecimento. A aquisição é também uma dimensão de pré-requisito para a assimilação (BRETTEL; GREVE; FLATTEN, 2011).

Assimilar – compreensão e interpretação que a empresa realiza do novo conhecimento adquirido por meio da estrutura cognitiva que já possui. Internalizar e processar o conhecimento obtido dependem da compreensão que a empresa possui sobre o assunto e envolve a discussão com os demais membros da organização (ZAHRA; GEORGE, 2002). Para Todorova e Durisin (2007), ocorre a assimilação quando o novo conhecimento está bem próximo ao que é desenvolvido pela organização.

Transformar - capacidade de a empresa combinar o conhecimento que existe internamente com o adquirido no meio externo e assimilado pela organização (ZAHRA; GEORGE, 2002). A transformação ocorre quando o novo conhecimento é remodelado para se ajustar ao conhecimento dos indivíduos da organização, ou seja, ele muda a estrutura cognitiva individual (TODOROVA; DURISIN, 2007), gerando novas oportunidades para a empresa e estabelecendo novas competências (BRETTEL; GREVE; FLATTEN, 2011).

Explotar - permite à empresa melhorar suas competências com base no conhecimento novo, adquirido e transformado conforme as etapas anteriores. A empresa o aplica em seu processo para gerar inovação e obter ganhos financeiros com a comercialização do novo produto, serviço ou processo (ZAHRA; GEORGE, 2002). Inicialmente os custos desta etapa podem ser maiores, pois é necessário treinar os membros da empresa, caso eles não estejam habituados, e transformar suas ideias para explorá-las comercialmente (BRETTEL; GREVE; FLATTEN, 2011).

Os eventos que contribuem para o desencadeamento das dimensões da ACAP são chamados neste estudo de fatores complementares e podem advir como estímulos internos ou externos. Podem ser representados por crises, por novas legislações, por órgãos reguladores, pela forma de interação entre os membros da organização, por tecnologias já desenvolvidas pela empresa, entre outros. Esses fatores podem estar presentes nas organizações para permitir a efetivação das etapas da capacidade de absorção. Neste estudo foi investigada a presença dos seguintes fatores complementares nas empresas:

Conhecimento prévio – o conhecimento que a empresa possui em uma área é importante para que tenha a capacidade de identificar uma nova informação existente no ambiente externo (COHEN; LEVINTHAL, 1990).

Eventos ativadores – são acontecimentos que estimulam a empresa a apresentar respostas, buscando novos conhecimentos. Podem ser internos, como problemas de produção, redução de vendas, entre outros; ou externos, como crises econômicas, dificuldades com fornecedores, ou com novas legislações. Estão relacionados às dimensões aquisição e assimilação (ZAHRA; GEORGE, 2002).

Mecanismos de integração social – não basta a empresa buscar conhecimento externo, é necessário que compartilhe com os demais membros, a fim de desenvolver novos produtos e tirar proveito comercial deles. Estão vinculados à assimilação e à explotação (ZAHRA; GEORGE, 2002).

Relações de poder – O poder e a política fazem parte do ambiente institucional e fornecem a motivação necessária para o processo de transformação das instituições. O processo de aprendizagem organizacional está estreitamente relacionado ao poder (LAWRENCE et al. 2005), influenciando a ACAP (EASTERBY-SMITH et al., 2008).

Outras pesquisas, como de Moilanen, Østbye e Woll (2014), concluíram que o conhecimento externo possui um forte efeito sobre o desempenho da inovação em empresas que não possuem setor de P&D. Para Debrulle, Maes e Sels (2014), quanto mais conhecimento um proprietário de start up tem acumulado, melhor ele está preparado para os desafios intrínsecos à capacidade de absorção. Patton (2014) também concluiu que os empreendedores precisam reconhecer as lacunas dentro de seus conhecimentos, receber apoio adequado para resolver essas lacunas e, finalmente, através da aprendizagem, aplicar as suas competências melhoradas na gestão da empresa.

A importante influência da ACAP em pequenas empresas também é confirmada pelos estudos de Ah Kim et al. (2014) e de Mcadam et al. (2014), que analisaram o sucesso na implementação de programa Seis Sigma em pequenas empresas utilizando a estrutura da ACAP.

3 ESTUDOS RELACIONANDO CAPACIDADE DE ABSORÇÃO E INOVAÇÃO

Netto (2006) diz que a maioria das empresas brasileiras de pequeno e médio porte não investe em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Isso compromete o desenvolvimento tecnológico e causa baixa competitividade às empresas nacionais. Complementarmente, Kupfer e Rocha (2005) observaram que um maior percentual de funcionários com alta qualificação possibilita maior inovação e maior aprendizado tecnológico, especialmente quando há diversidade profissional. Essa observação é confirmada também por Fósfuri e Tribó (2006), ao argumentarem que empresas envolvidas em P&D desenvolvem uma forte capacidade de entender o meio externo e maior nível de habilidade de assimilação, devido ao conhecimento acumulado na área. Constatação similar à obtida por Cohen e Levinthal (1990) ao afirmarem que o conhecimento é cumulativo e depende de conhecimento prévio presente na organização.

Por outro lado, Varis e Littunen (2010, p. 146) constataram “que diferentes competências internas não estão associadas com a introdução de diferentes tipos de inovação” (produto/ processo/ mercado/ organizacional), porém têm relação com as informações obtidas por meio de diferentes relações de rede de empresas.

Alguns estudos associam a capacidade de absorção com o processo inovador nas organizações. Ritala e Hurmelinna-Laukkanen (2013) verificaram que a ACAP é responsável pela criação de inovações incrementais e também radicais, embora as segundas sejam menos frequentes. Nesse sentido, Deng, Doll e Cao (2008) observaram resultado positivo no compartilhamento de informações a nível individual. Kostopoulos et al. (2011) também confirmaram os efeitos positivos da ACAP na geração de inovação, a qual levou à melhora do resultado financeiro, resultado igualmente confirmado por Tavani, Sharifi e Ismail (2014), que observaram efeito positivo e direto da ACAP em relação à performance financeira da empresa e à agilidade na introdução de inovações. No entanto, estes estudos tiveram um cunho metodológico quantitativo demonstrando a associação entre ACAP e inovação organizacional. Nesta pesquisa, de cunho qualitativo, pretende-se verificar como organizações de pequeno porte absorvem conhecimentos na geração de inovações do tipo radical.

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa possui natureza descritiva e abordagem qualitativa. Descritiva por relatar os fenômenos ocorridos e as relações que desenvolvem entre si. Qualitativa por buscar entender e interpretar os fenômenos em termos dos significados que as pessoas lhe conferem, característica marcante desta abordagem de acordo com Denzin e Lincoln (2006). A presente pesquisa buscou entender como são as rotinas de empresas de pequeno porte inovadoras na busca por novos conhecimentos no meio externo e posterior utilização nos seus produtos/serviços. Com isso, utilizara-se dados textuais, a visão de pessoas ligadas ao contexto estudado, o que caracteriza o método qualitativo (CRESWELL, 2010).

A estratégia de pesquisa é do tipo estudo de caso com corte longitudinal, iniciando na vida acadêmica dos empreendedores até a entrada do produto no mercado. A investigação baseou-se em várias fontes de evidência, convergindo para a triangulação de dados (YIN, 2004). Para isso, a entrevista foi aplicada a mais de uma pessoa de cada empresa e também foram analisados os sites e folders das empresas, com o objetivo de conhecer mais detalhadamente o empreendimento e os produtos. Assumiram-se os produtos inovadores das empresas participantes como unidade de análise e os gestores como informantes principais para o fenômeno.

A delimitação de empresas de pequeno porte adotada foi a mesma utilizada pelo BNDES (2013), que abrange empresas que faturam até dezesseis milhões de reais por ano. As duas empresas estudadas possuem faturamento anual dentro desse limite.

A pesquisa investigou como ocorreu o processo de absorção de conhecimentos para o desenvolvimento de dois produtos em cada organização. A Empresa A (produtos A1 e A2) atua no setor mecânico e a Empresa B (produtos B1 e B2) desenvolveu tecnologia que permite ter clientes em diversos segmentos, destacando-se o cosmético e o têxtil. O Produto A1 é utilizado para conhecer as tensões internas de peças e de dutos, o Produto A2 é um produto que faz brunimentos, o Produto B1 é um insumo que utiliza a nanotecnologia e o Produto B2 é um insumo para tratamento de unhas que também utiliza a nanotecnologia.

As empresas pesquisadas iniciaram suas atividades como empresas incubadas e seus projetos receberam prêmios ligados a incentivos à inovação. Segundo as empresas, os prêmios permitiram a execução de projetos que, com recursos próprios, teriam levado mais tempo para ocorrer. Essas empresas foram criadas a partir de pesquisas realizadas por seus fundadores, quando estudantes de mestrado ou doutorado, cujos estudos demonstraram potencial de serem aplicados industrialmente.

A pesquisa foi realizada por meio de entrevista semiestruturada e gravada, para a qual foi preparado um roteiro prévio com questões que possibilitaram verificar como ocorreu cada dimensão da ACAP e a presença dos fatores complementares. Neste estudo a inovação foi analisada como produto e o tipo de inovação investigado foi o radical.

Foram identificadas empresas com destaque em inovação. Ambas venceram prêmios de inovação, o que denota o espírito inovador e o esforço na busca de conhecimentos para lançar novidades. A empresa A venceu um Edital Finep Inovação e um prêmio Stemmer Inovação. A empresa B venceu dois prêmios de subvenção da FAPESC, um Edital Finep, um prêmio Stemmer, um prêmio Anprotec, além de aporte financeiro do Fundo Criatec. São empresas de pequeno porte e foram selecionadas intencionalmente, pois preencheram os critérios de empresas que desenvolvem inovações radicais.

Na Empresa A foram realizadas três entrevistas com dois sócios ligados ao desenvolvimento dos produtos, o Sócio AA e o Sócio AB, os quais falaram do Produto A1 e do Produto A2. E na Empresa B foram realizadas quatro entrevistas: duas com a Sócia BA, ligada ao desenvolvimento dos produtos; uma com o Sócio BB, gestor da organização; e uma com o gestor do Fundo de Investimento, Entrevistado BC (Quadro 1). As entrevistas foram realizadas até se observar que não acrescentavam novas informações ao que já se possuía, triangulando os dados.

Quadro 1
Entrevistas realizadas
Entrevistas
realizadas
Fonte: Dados da pesquisa (2014).

Os dados foram analisados com base na análise sistemática de conteúdo por meio de categorização. O Quadro 2 apresenta as categorias analíticas do estudo definidas com base na fundamentação teórica. Foi identificada, nas transcrições das entrevistas, a existência de indicadores e de rotinas que se alinhavam com a literatura revisada.

Quadro 2
Categorias de estudo
Categorias de
estudo
Fonte: Dados da pesquisa (2014).

O conceito de ACAP utilizado neste estudo é o proposto por Zahra e George (2002) e foi escolhido por ser seguido pela maioria dos autores que estudaram o tema, como Vega-Jurado, Gutiérrez-Gracia e Fernández-de-Lucio (2008), Camisón e Forés (2010) e Todorova e Durisin (2007). Para o conceito de inovação, foi utilizado o proposto por Crossan e Apaydin (2010), que consideram como inovação de magnitude radical a que induz mudanças fundamentais nas práticas organizacionais existentes, enquanto a incremental representa uma variação nas práticas e nas rotinas atuais. Considerou-se que os produtos estudados atendiam esse conceito, de acordo com a afirmação dos respectivos empreendedores e pelos prêmios de inovação recebidos.

5 RESULTADOS

Nesta seção, serão apresentados os resultados individualizados por empresa e na próxima seção, a discussão envolvendo as duas empresas.

5.1 Empresa A

A empresa apresenta forte conexão com a pesquisa realizada na universidade, tendo em vista que dois sócios são professores universitários e desenvolvem atividades de pesquisa em seu dia a dia, levando as novidades à organização. A empresa está instalada em uma incubadora, nasceu como spin off da Universidade Federal de Santa Catarina e possui, desde o nascimento, profissionais (sócios e colaboradores) com grande conhecimento na sua área de atuação.

O Produto A1 da empresa é um sistema de medição de tensões residuais, presentes internamente em um corpo sólido, originadas, geralmente, durante o processo de fabricação. A medição é feita por tecnologia óptica de holografia eletrônica e permite verifica tensões em até 1 milímetro de material, 50 vezes mais que a tecnologia então existente por raio X. A tecnologia foi tema de estudo dos sócios em suas dissertações de mestrado e tese e com a possibilidade de aplicação industrial surgiu o desejo de desenvolver o produto e a empresa. Para o desenvolvimento inicial houve fomento da FINEP, seguido de aproximação com o primeiro cliente (Petrobras) para aperfeiçoamento de especificações, resultando em melhores aplicações do produto para medir tensões em dutos de petróleo e gás. Por fim, o Produto A1 passou a ser usado pela empresa para prestar serviços de medições a outras empresas do Brasil e Argentina na indústria de petróleo e gás.

O Produto A2 é um sistema inédito para inspeção de cilindros que mede superfícies brunidas por meio de tecnologia óptica. Brunimento é uma operação de usinagem de acabamento superficial e no caso do cilindro de motores, o brunimento insere riscos cruzados, cujo objetivo é reter o óleo lubrificante. O equipamento avalia alguns parâmetros como: ângulos entre riscos do brunimento, distâncias entre riscos, rugosidade e outros elementos. A ideia surgiu de um questionamento da primeira empresa cliente (Mercedes-Benz do Brasil) em uma feira de mecânica: se a tecnologia óptica poderia medir brunimento em motores. O desenvolvimento se deu por relações com a primeira empresa cliente, interações entre os sócios e uso de tecnologia desenvolvida na universidade para solucionar os desafios de captação de imagem, iluminação e software embarcado no produto. Concluído o produto, ele foi patenteado e atualmente é comercializado com outras empresas do setor metalomecânico.

Quanto às dimensões da ACAP, nos dois produtos, a aquisição de conhecimento ocorreu principalmente na fase anterior à constituição da empresa mediante pesquisas acadêmicas. Nessa fase houve a possibilidade de elaboração de um projeto para submeter ao FINEP para captação de recursos que viabilizassem o desenvolvimento do Produto A1. Reuniões periódicas ocorreram entre os futuros fundadores para definir os rumos do projeto. A participação em projeto com parceria da Petrobras e outras empresas também foi uma fonte de informação. Para a comercialização dos produtos foram utilizados diversos meios de divulgação da tecnologia – blogs, e-mails, contatos pessoais, divulgação por meio de livros, etc. –, alcançando diversos possíveis clientes. Os que demonstravam interesse na utilização dos produtos ou serviços foram visitados ou recebidos para maiores esclarecimentos. Em relação ao Produto A2, as informações para o desenvolvimento foram provenientes do conhecimento prévio que a empresa possuía naquela tecnologia e também de especificações fornecidas por um cliente, que assumiu um papel importante na criação do equipamento, representando o evento ativador à medida que foi sendo solicitada a nova aplicação da tecnologia quando a empresa participava de uma feira.

Na assimilação houve a decisão no Produto A1 de levar ao mercado a tecnologia pesquisada na universidade. Houve também discussões com os demais pesquisadores, as quais resultaram na decisão de elaborar um projeto e submetê-lo ao FINEP, dando início à criação da empresa. No caso do Produto A2, a assimilação contou com a decisão de desenvolver o produto solicitado pelo cliente e também de expandir o portfólio de produtos utilizando a tecnologia de medição óptica.

Na transformação, a empresa elaborou o projeto FINEP. Após a aprovação, houve o efetivo desenvolvimento do Produto A1. A utilização de especificações fornecidas por clientes associadas ao conhecimento que a empresa já possuía também faz parte dessa dimensão, bem como o desenvolvimento de ambos os produtos, a solução de problemas voltados à iluminação interna e à câmera utilizada pelo Produto A2 e, finalmente, as pequenas alterações realizadas nos produtos para se adequar ao uso de outros clientes.

A explotação ocorreu como resultado dos processos anteriores: a criação da empresa, a fabricação e a comercialização do Produto A1 e do Produto A2 e a expansão do mercado consumidor para os produtos.

A seguir, o Quadro 3 apresenta as ações realizadas em cada dimensão da ACAP para cada produto da Empresa A.

Quadro 3
Dimensões da ACAP
Dimensões da
ACAP
Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Quanto aos fatores complementares da ACAP, os eventos ativadores para o desenvolvimento do Produto A1 foram o desejo de aplicar os conhecimentos da pesquisa básica à indústria e ao Edital FINEP, viabilizando o investimento inicial; para o Produto A2 foram a demanda de um novo equipamento por cliente durante a participação em feira e a necessidade de aumentar a lucratividade da empresa, contatando potenciais clientes.

A integração social ocorreu nas reuniões e nas discussões frequentes desde o projeto até o desenvolvimento e comercialização de ambos os produtos e na difusão do conhecimento e das informações adquiridas no ambiente externo. O poder não foi possível identificar nas entrevistas realizadas, possivelmente, por ser uma empresa pequena com poucos níveis hierárquicos e o poder concentrado nas mãos dos sócios dirigentes.

O fator conhecimento prévio sempre esteve presente, pois desde a fase pré-empresa os indivíduos acumularam conhecimento por meio de pesquisas acadêmicas. Os desafios diários do desenvolvimento de produtos também mostram a utilização desse conhecimento e a ampliação dele.

No Quadro 4 constam os fatores complementares observados nos dois produtos e para os três períodos.

Quadro 4
Fatores complementares da ACAP
Fatores
complementares da ACAP
Fonte: Dados da pesquisa (2014).

Os fatores complementares foram importantes para a ACAP, pois desencadearam a busca pelo conhecimento novo para desenvolver os produtos (evento ativador) e contribuíram com conhecimentos já dominados pela organização para esse desenvolvimento (conhecimento prévio), além de permitir a difusão das informações entre o grupo (integração social), permeando, assim, a efetivação das dimensões da ACAP.

5.2 Empresa B

A Empresa B começou em uma incubadora e possui, desde o nascimento, profissionais com grande conhecimento na sua área de atuação, que é a encapsulação de ativos. Ativo é o componente que tem eficácia, por exemplo, no caso de um perfume, existe a água e o álcool, que são chamados de veículo, e a fragrância, que faz a perfumação e é chamada de ativo. A finalidade de encapsular os ativos é melhorar a permeação, a disponibilidade e o tempo de vida dos produtos para que estes sejam mais eficazes em menos tempo. A tecnologia é patenteada e seu diferencial é a sintetização de partículas em meio aquoso e não orgânico - que exige solventes – e foi desenvolvida nos estudos da fundadora no mestrado, doutorado e pós-doutorado.

O Produto B1 foi desenvolvido a partir da receptividade da solução para encapsulamento desenvolvida nas pesquisas da fundadora por parte de empresas participantes de uma feira de fornecedores de insumos em São Paulo. A empresa foi aberta e se conseguiram recursos da agência estadual de fomento à pesquisa para comprovação clínica da eficácia do encapsulamento, o que resultou nos primeiros clientes advindos da indústria de cosméticos. Em seguida, os empreendedores realizaram contatos em feiras de vestuário e uma grande empresa nacional do setor se interessou pelo potencial de aplicar a tecnologia em tecidos, surgindo uma parceira que, após muitas interações, resultou em uma solução aplicada a tecidos que alcançasse o desempenho esperado de hidratação da pele do usuário. Mais recentemente, a empresa obteve um aporte de capital de risco, transformando-se em S.A. e mudando sua governança e processos de gestão.

O Produto B2 surgiu de uma visão da empreendedora (Sócia BA) de aplicar produtos naturais no tratamento de unhas, uma vez que princípios ativos orgânicos em contato com o ar oxidam e perdem suas propriedades. Com o encapsulamento eles poderiam manter suas propriedades mesmo após aberto o recipiente. A empresa desenvolveu o produto e realizou testes comprovando sua eficácia e só após frequentou feiras em busca de interessados na inovação. Algumas empresas regionais já a adotaram em seus produtos, demostrando pioneirismo, enquanto muitas outras preferem esperar os resultados se consolidarem no mercado para aderir. No momento da entrevista, a empresa buscava uma negociação com uma grande indústria para disponibilizar a inovação em escala nacional.

As quatro dimensões da ACAP ocorreram nos dois produtos analisados. A aquisição de novos conhecimentos ocorreu principalmente na fase pré-empresa. O conhecimento aplicado em ambos os produtos foi proveniente de pesquisa da fundadora desde o mestrado até o pós-doutorado. Esse conhecimento foi associado à possibilidade de submeter projeto à agência estadual de fomento para obter o recurso financeiro necessário, criar a empresa e desenvolver o Produto B1. O projeto contou com a participação do Sócio BB, que é administrador e trouxe conhecimento de experiências anteriores em projetos na área de gestão de empresas. A realização de pesquisa de mercado pelo administrador contribuiu com informações sobre as possibilidades de sucesso da empresa.

Em relação ao Produto B2, a pesquisadora se baseou em uma filosofia de vida da fundadora, a de utilizar produtos naturais para desenvolver o insumo. A observação dos produtos existentes no mercado foi um recurso para a inovação, na medida em que a escassez de alguns itens foi vista como oportunidade de desenvolver um novo produto. E, finalmente, conversas com clientes para saber de suas necessidades também representaram fonte de ideias para desenvolvimento de novos produtos.

A assimilação no Produto B1 ocorreu na decisão de elaborar o projeto e submetê-lo ao edital da agência estadual e na análise das necessidades dos clientes. Em relação à comercialização, houve a decisão de contratar distribuidor para estar mais próximo do cliente. No caso da expansão do portfólio, houve a decisão de aplicar a tecnologia a novos produtos e também a decisão de misturar diversos ingredientes naturais, resultando no Produto B2.

A dimensão “transformação” para o Produto B1 ocorreu na submissão do projeto ao edital de fomento e, após a aprovação, nos testes de eficácia clínica da tecnologia. Com a comprovação da eficácia, houve a utilização da tecnologia no processo fabril. A mudança de componentes viabilizou a possibilidade de criar novos produtos. Na área comercial, houve a efetiva contratação de distribuidor comercial. No caso do Produto B2, foram realizados testes aplicando a potencialidade da nanotecnologia a um produto para as unhas e também a utilização de óleos essenciais como novo ingrediente.

A “explotação” ocorreu inicialmente na comprovação de eficácia da nanotecnologia e na criação da empresa. Com o decorrer das atividades da empresa, houve “explotação” ao criar produtos inovadores (entre eles o Produto B2), na parceria com outras empresas de outros segmentos e na comercialização por distribuidor.

A seguir, o Quadro 5 apresenta as ações realizadas em cada dimensão da ACAP para ambos os produtos pesquisados na Empresa B.

Quadro 5
Dimensões da ACAP
Dimensões
da ACAP
Fonte: Dados da pesquisa (2014).

Quanto aos fatores complementares da ACAP, os eventos ativadores para o desenvolvimento do Produto B1 foram: a) o desejo de explorar a tecnologia, não deixando o resultado da pesquisa restrito a uma estante de biblioteca; b) o desejo de ter a própria empresa; c) o interesse de clientes em buscar novos insumos; e assim a empresa obteve a oportunidade de inovar. Para o Produto B2, os ativadores foram a necessidade de expansão de mercado, após a constituição da empresa para gerar mais lucratividade; e a escassez de produtos eficazes no mercado, existindo uma oportunidade de a empresa desenvolver produtos num novo segmento.

A integração social ocorreu na medida em que todas as decisões eram discutidas pelos fundadores e levadas aos demais integrantes da empresa, estando presente em ambos os produtos.

O determinante poder relacionado ao meio externo ocorreu mediante a realização de contratos de confidencialidade com funcionários e empresas clientes para todos os produtos.

O conhecimento prévio ocorreu desde o início da empresa. Foi por meio de conhecimentos trazidos da pesquisa acadêmica que a empresa iniciou as atividades e deu continuidade ao desenvolvimento de produtos.

No Quadro 6 constam os fatores complementares observados nos dois produtos.

Quadro 6
Fatores complementares
Fatores
complementares
Fonte: Dados da pesquisa (2014).

Os fatores complementares foram relevantes para a efetivação ACAP da Empresa B, pois desencadearam suas dimensões mediante a busca pelo conhecimento novo em feiras e com clientes (evento ativador), e contribuíram com o conhecimento acumulado pela organização para esse desenvolvimento (conhecimento prévio), e também permitiu a troca de informações entre o grupo (integração social).

6 DISCUSSÃO

As duas empresas estudadas apresentaram produtos inovadores de magnitude radical (CROSSAN; APAYDIN, 2010); assim como apresentaram bastante semelhança na forma que obtiveram conhecimento (por meio de pesquisa acadêmica) e iniciaram os negócios (com elaboração de projetos para receber subvenção econômica). A Empresa A se encontra num ambiente mais estável, enquanto a Empresa B está num ambiente turbulento, visto que afirma que o mercado pede frequentes inovações. Os produtos desenvolvidos dependeram do conhecimento especializado dos empreendedores e demais integrantes que, por possuírem formações diversificadas, enriqueceram o ambiente organizacional, o que se coaduna com o sugerido por Kupfer e Rocha (2005).

Em relação às dimensões da capacidade absortiva, ambas as empresas estudadas apresentaram as quatro dimensões necessárias para fechar o ciclo de absorção – assimilação, aquisição, transformação e exploração –, corroborando o modelo proposto por Zahra e George (2002).

Quanto aos fatores complementares da ACAP, as duas empresas apresentaram semelhanças. Como eventos ativadores partiram do desejo de aplicar os conhecimentos obtidos na universidade com fins comerciais, da aprovação de projetos em programas de fomento e da necessidade de aumentar a lucratividade da empresa. A integração social também esteve presente nas duas empresas. Embora fossem empresas pequenas, com poucos funcionários, realizavam reuniões e conversas constantes entre os sócios, que são os principais funcionários das empresas, e também com outros colaboradores. O fator “poder” não foi observado no ambiente interno, possivelmente por serem empresas com poucos níveis hierárquicos. Finalmente, o fator “conhecimento prévio” foi bastante evidente, visto que ambas as empresas originaram o conhecimento da fase pré-empresa e aplicaram a tecnologia a diversos produtos.

Os estudos de Jansen, Van Den Bosch e Volberda (2005) indicam que fortes laços de integração social são importantes para as unidades assimilarem, transformarem e explorarem o novo conhecimento. Nas empresas pesquisadas a troca de informações com a equipe ocorreu com frequência no caso da Empresa A, conforme declaração do Sócio AB, que afirmou que conversas e discussões ocorriam o tempo todo. O contato frequente com o grupo que trabalhava no desenvolvimento facilitou a assimilação do conhecimento, pois resultou em decisões de elaboração do projeto FINEP, criação da empresa e desenvolvimento de vários produtos inovadores. Em relação à Empresa B, pode-se dizer o mesmo. A partir de conversas envolvendo os dois sócios, a organização chegou a decisões como a elaboração de projeto para submeter ao edital de fomento, fundação da empresa e desenvolvimento de produtos inovadores. Essas reuniões ocorriam após as visitas a feiras e diante de outras situações, conforme relatado pelos entrevistados, o que caracteriza forte integração social.

Para Fosfuri e Tribó (2006), as ligações com o meio externo são importantes no processo de aprendizagem e acumulação da PACAP. A Empresa A recebeu informações de pesquisas realizadas na universidade, as quais utilizou, principalmente, para aprimoramento dos produtos, conforme declaração do Entrevistado AA de que em torno de 20% do conhecimento veio da universidade. Para a Empresa B, o ambiente dinâmico no qual está inserida faz com que observe as tendências de cada segmento. Segundo o Entrevistado BB, a escolha pelo segmento cosmético ocorreu por ser um segmento bastante interessado em inovação, o que sugere que a empresa analisa o meio externo antes de desenvolver um produto voltado para aquela área.

Ritala e Hurmelinna-Laukkanen (2013) argumentam que a ACAP possui um efeito positivo na criação de inovações incrementais e que inovações radicais são menos frequentes que incrementais quando há cooperação de informações entre empresas. Esse resultado foi parcialmente observado na presente pesquisa. No caso da Empresa A, houve inovações incrementais ao utilizar especificações de clientes para o desenvolvimento de software, por exemplo, e também inovações radicais provenientes da cooperação com outras empresas. No caso da Empresa B, também foi observada uma cooperação limitada de outras empresas no desenvolvimento dos produtos, existindo parceria com potenciais clientes, porém a inovação foi gerada no âmbito exclusivo da Empresa B. Em comum nos dois casos, está a participação de potenciais clientes direcionando o esforço de desenvolvimento para funcionalidades desejadas, evitando que as empresas desperdiçassem recursos em ações de baixa aderência de clientes no futuro.

Kostopoulos et al. (2011) argumentam que a ACAP contribui diretamente com a inovação e indiretamente com o desempenho financeiro da empresa. Na busca por maior rentabilidade, a Empresa A aplicou a tecnologia de medição óptica a outros equipamentos inovadores, ampliando o portfólio. A Empresa B também ampliou o portfólio de produtos para diversos segmentos, o que permitiu a expansão do negócio, confirmando os resultados dos autores.

De acordo com a proposta de análise de Volberda, Foss e Lyles (2010), a influência do indivíduo na absorção de conhecimento das empresas analisadas foi fundamental. Para Volberda, Foss e Lyles (2010), as pesquisas em ACAP precisam informar a origem da informação. Nas empresas pesquisadas o conhecimento veio, principalmente, da pesquisa acadêmica realizada pelos empreendedores ao longo dos anos. Outra fonte de conhecimento, no caso da Empresa A, é a universidade, onde dois sócios realizam pesquisas e trazem o conhecimento para a empresa, conforme comentado pelo sócio entrevistado. Clientes também originam conhecimento à empresa na medida em que fornecem especificações para o desenvolvimento dos produtos e dos softwares que os acompanham.

Os sócios são os responsáveis pelas decisões de desenvolvimento de produtos e inovações. Os produtos estudados foram concebidos como ideia dos sócios, o que demonstra a influência do conhecimento individual na ACAP proposta por Volberda, Foss e Lyles (2010). Esse ponto, associado à origem da informação, evidencia que a influência do indivíduo na absorção de conhecimento foi fundamental para as empresas aqui estudadas. No Quadro 7 pode-se observar uma síntese dos resultados obtidos na pesquisa.

Quadro 7
Síntese das contribuições do estudo
Síntese das contribuições
do estudo
Fonte: Dados da pesquisa (2014).

A presente pesquisa contribui para o debate do tema na medida em que analisou as atividades das empresas nas quatro dimensões propostas por Zahra e George (2002) e analisou, também, como os fatores complementares contribuíram para a efetivação do ciclo completo da ACAP.

7 CONCLUSÕES

O objetivo geral desta pesquisa foi analisar a capacidade de absorção de conhecimento de pequenas empresas para inovar em produtos e serviços. Foram pesquisadas duas empresas e analisadas categorias de dimensões e de fatores complementares à ACAP. Os produtos pesquisados em ambas as empresas são de magnitude radical (CROSSAN; APAYDIN, 2010) e, no caso da Empresa A, também apresentou inovações incrementais.

O processo de aquisição, assimilação, transformação e explotação de conhecimentos na inovação em produtos e serviços foi descrito conforme Zahra e George (2002). Ambas as empresas possuem as quatro dimensões bem definidas, destacando-se que o conhecimento prévio, inclusive anterior à fundação das referidas organizações, foi fundamental para a inovação.

Para analisar o processo de ACAP, também foram observados os fatores complementares da ACAP, utilizando-se eventos ativadores, integração social, relações de poder e conhecimento prévio.

Analisando empresas de pequeno porte, foi possível observar que os indivíduos apresentam forte influência, pois as informações que são buscadas no meio externo dependem do pequeno grupo de pessoas que essas empresas possuem. Nas empresas pesquisadas, a formação das pessoas é diversificada, cada uma contribui de acordo com a sua área, conforme sugerido por Kupfer e Rocha (2005). Além disso, as relações de poder não foram observadas, o que sugere que em pequenas empresas esse fator pode não possuir grande influência.

O presente estudo está limitado a apenas duas empresas com contextos semelhantes (pequenas empresas, inovadoras, independentes). Recomenda-se para estudos futuros buscar outros extratos de empresas inovadoras, observando a ACAP em termos de inovação de processo. Esta limitação não permite que o estudo possa ser generalizado, pois analisa um contexto específico, permitindo reflexões da realidade estudada e alguma apropriação em realidades que sejam muito similares: empresas de pequeno porte, desenvolvidas por empreendedores e que possuem alto grau de inovação. As duas empresas estudadas criaram inovações em bens tangíveis. Não se estudaram empresas que possuam inovação em bens intangíveis, que pode ser tema para novos estudos.

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