Resumo: A discussão sobre criação e desenvolvimento de competências preferencialmente tem seguido um foco interno à empresa com grande influência da visão-baseada em recursos. Por sua vez, estudos influenciados pela Economia Industrial indicam o ambiente externo como o aspecto chave para o desenvolvimento de competências e busca de novas tecnologias. Este artigo se propõe a discutir como competências operacionais são desenvolvidas a partir da abordagem de coevolução, que combina aspectos internos e externos como fontes propulsoras para o desenvolvimento de competências nas empresas. A comparação dos quatro níveis dos estágios coevolutivos com os estágios competitivos em operações mostra que em níveis mais avançados há um processo amplo de aprendizado e interação entre os atores envolvidos.
Palavras-chave:competências operacionaiscompetências operacionais, coevolução coevolução, competências dinâmicas competências dinâmicas, novas tecnologias novas tecnologias.
Abstract: The discussion on the creation and development of skills has preferably followed a focus that is internal to the company, with great influence of the resource-based vision. Meanwhile, studies influenced by the Industrial Economy indicate the external environment as the key aspect for the development of skills and the search for new Technologies. This article proposes to discuss how operational competencies are developed, based on the approach of coevolution, which combines internal and external aspects as driving forces for the development of skills in companies. The comparison of four levels of the coevolutive stages with the competitive stages in operations shows that at more advanced levels, there is a broad process of learning and interaction among the actors involved.
Keywords: operational skills, coevolution, dynamic skills, new technologies.
Resumen: La discusión sobre la creación y el desarrollo de competencias ha seguido preferentemente un foco interno a la empresa con gran influencia de la visión basada en recursos. A su vez, los estudios que sufrieron influencia de la Economía Industrial indican el ambiente externo como el aspecto clave para el desarrollo de competencias y búsqueda de nuevas tecnologías. Este artículo se propone discutir cómo se desarrollan las competencias operacionales a partir del abordaje de coevolución, que combina aspectos internos y externos como fuentes propulsoras para el desarrollo de competencias en las empresas. La comparación de los cuatro niveles de los estadios coevolutivos con los estadios competitivos en operaciones muestra que en niveles más avanzados hay un proceso amplio de aprendizaje e interacción entre los actores involucrados.
Palabras clave: Competencias operacionales, Coevolución, Competencias dinámicas, Nuevas tecnologías.
COEVOLUÇÃO E COMPETÊNCIAS OPERACIONAIS: VISÃO PRESENTE E OPORTUNIDADES DE PESQUISAS FUTURAS
COEVOLUTION AND OPERATIONAL SKILLS: PRESENT VIEW AND OPPORTUNITIES FOR FUTURE RESEARCH
COEVOLUCIÓN Y COMPETENCIAS OPERACIONALES: VISIÓN PRESENTE Y OPORTUNIDADES DE INVESTIGACIONES FUTURAS
Aprovação: 24/03/2017
A Estratégia de Operações orienta a busca de novas tecnologias e o desenvolvimento de competências capazes de reduzir custos, melhorar a flexibilidade, tornar as entregas aos clientes mais rápidas e melhorar a qualidade, entre outros resultados relevantes.
Esta discussão tem sido central na área de Gestão de Operações ao longo de décadas. Desde os estudos pioneiros na década de 60 a 80, o entendimento de como a área de Operações pode apoiar a estratégia de negócios e influenciar a competitividade da empresa tem sido expandido. Os estudos variam de um conjunto de decisões operacionais ajustado à visão de planejamento estratégico, como defendiam pioneiros como Skinner (1969) e Wheelwright (1984), até mais recentemente com a discussão acerca de práticas e competências (WU et al., 2010), com raízes na visão baseada em recursos.
Entretanto, novas respostas têm sido necessárias para a área de Gestão de Operações, influenciadas pelo recrudescimento da competição. O recrudescimento é impulsionado por uma miríade de fatores que envolvem tanto o ambiente externo como o ambiente interno das empresas. Estes fatores incluem, por exemplo, a aceleração de avanços tecnológicos, entrada de novos competidores dos chamados BRICS (Brasil, Índia, China e África do Sul) e aspectos institucionais, como os blocos comerciais, entre eles a União Europeia, o Nafta e o Mercosul. Deste modo, uma discussão chave que se apresenta é como a área de Operações pode se adaptar ou se antecipar a um ambiente instável com o objetivo de criar competências capazes de suportar a estratégia de negócios da empresa ou da unidade de negócios.
Vale ressaltar que, ao longo das últimas décadas, tem persistido uma visão mais internalizada da Estratégia de Operações com foco priorizado em processos internos da empresa e como estes seriam capazes de criar ou sustentar a estratégia de negócios. Entretanto, neste novo ambiente, há uma necessidade de entendimento mais amplo que combine a influência externa com os recursos internos para que a empresa crie competências que a habilite a competir em mercados de competição acirrada.
A combinação de aspectos externos com aspectos internos possui ao mesmo tempo elementos de escolha estratégica e de adaptação ao ambiente. Portanto, pode-se afirmar que há uma demanda por lentes teóricas que permitam analisar o tema de Estratégia de Operações sob enfoques mais amplos. Este ensaio teórico se propõe a combinar a abordagem corrente de Estratégia de Operações com elementos da visão coevolutiva. Esta orientação traz à análise tanto a influência interna como a externa que afetam a criação e o reforço das competências operacionais de uma empresa.
Dentro do contexto enfrentado pelas empresas brasileiras, há uma multiplicidade de recursos internos disponíveis e de fatores externos que se modificam continuamente capazes de influenciar conjuntamente o desenvolvimento de competências, como preconiza a abordagem coevolutiva (RODRIGUES; CHILD, 2003). Em relação aos fatores externos, estes podem ser independentes da escolha da empresa, como mudanças nas políticas do governo, como impostos ou taxas de juros, ou do ambiente competitivo, como uma nova tecnologia desenvolvida por um competidor. Por outro lado, os fatores influenciadores também podem ser decorrentes de escolhas da empresa, incluindo, por exemplo, a diversificação de produtos. Entretanto, internamente há duas situações distintas (LEWIN; MASSINI, 2003). Na primeira, a empresa pode ser forçada a adotar novos processos ou tecnologias para responder satisfatoriamente às pressões competitivas. Na segunda situação, a empresa se antecipa desenvolvendo práticas e novas competências, estas no limite serão capazes de influenciar o ambiente competitivo (WU et al., 2012).
Deste modo, uma questão chave para o ambiente competitivo presente é: como o ambiente interno e o ambiente externo influenciam a criação e a adaptação das competências operacionais?
Este artigo se propõe a lançar questionamentos acerca de novas abordagens que indiquem caminhos teóricos possíveis para a pesquisa empírica em Gestão de Operações e outras áreas com temas afins.
Pode-se afirmar que a criação de competências na empresa tem sido entendida preferencialmente a partir de um olhar interno à empresa na área de Gestão de Operações. Há necessidade de se entender como os aspectos internos e externos influenciam simultaneamente a criação e reforço/adaptação de competências a partir da busca externa ou na exploração de recursos internos. Estas buscas permitem à empresa desenvolver novos processos e práticas que estão na base das competências.
A partir da compreensão sobre como as empresas são capazes de desenvolver competências que alavancarão sua vantagem competitiva, torna-se chave na discussão sobre estratégia de Operações. Desenvolver competências de forma antecipada ao ambiente competitivo tem sido reconhecido como uma fonte de vantagem competitiva (HELFAT; PETERAF, 2003). Entretanto, ainda se conhece pouco quanto a possíveis focos preferenciais em critérios competitivos, como custo, qualidade, entrega, flexibilidade ou capacidade de inovar quando se estudam as empresas brasileiras. Além disto, torna-se relevante questionar quais antecedentes internos e externos orientam quando há criação de novas competências ou o reforço/adaptação de competências existentes a partir das tecnologias disponíveis. Quais seriam as decisões e as práticas internas decorrentes destes processos de criação ou adaptação? Estas informações permitirão entender como as empresas brasileiras desenvolvem competências e, assim, como podem habilitá-las a competir em um ambiente de concorrência mais acirrada.
No nível meso, é importante se buscar o entendimento de quais os aspectos do ambiente competitivo influenciam questões como a busca de tecnologias ou o desenvolvimento interno de práticas operacionais chaves para a competitividade.
No campo teórico, persiste uma lacuna de entendimento da simultaneidade de influências internas e externas no desenvolvimento de competências operacionais. Sabe-se que, historicamente, diversos autores têm mencionado a necessidade de utilização de teorias organizacionais mais consolidadas em estudos de Gestão de Operações (AMUNDSON, 1998), e esta situação tem persistido até hoje. Ao mesmo tempo, os avanços presentes a partir da discussão entre práticas e competências ainda focalizam preferencialmente os aspectos internos, como Wu et al. (2010). Deste modo, a utilização da abordagem coevolutiva permite avançar também quanto à pesquisa de lacunas teóricas sobre desenvolvimento de competências operacionais e responder a questões presentes da prática gerencial.
O desenvolvimento de uma Estratégia de Operações ajuda a empresa a concentrar esforços naquelas atividades que podem levar a um desempenho superior nos aspectos relacionados à produção e às suas operações. Esse processo se dá, principalmente, por meio do estabelecimento de prioridades competitivas e de decisões estruturais e infraestruturas, que desenvolvem as competências operacionais (WHEELWRIGHT, 1984; PAIVA et al., 2009).
Essa definição é coerente com a literatura de Estratégia de Operações (HAYES; WHEELWRIGHT, 1984; PAPKE-SHIELDS; MALHOTRA; GROVER, 2006; NASSIMBENI, 2003). Os estudos sobre este tema tiveram sua origem no trabalho seminal de Skinner (1969) e vêm, ao longo do tempo, construindo um corpo teórico que pode ser considerado consistente. Este aspecto é evidenciado por meio da reconhecida importância dos critérios competitivos e das competências operacionais para a Estratégia de Operações (MILLER; ROTH, 1994; FROLICH; DIXON, 2001) embora ao mesmo tempo persista a discussão acerca da existência ou não de trade-off operacionais (NOBLE, 1995; BOYER; LEWIS, 2002; ROSENZWEIG; EASTON, 2010).
Em seu artigo seminal sobre estratégia de manufatura, Wheelwright (1984) defendeu o ajuste entre a estratégia de negócios e estratégia de manufatura, a fim de reforçar a competitividade da unidade de negócio. Os estudos sobre estratégia de manufatura naquele período, tais como Skinner (1969), Wheelwright (1984, 1985) e Hill (1989), seguiam assim uma visão hierárquica do processo de formulação entre as estratégias corporativas e de negócios, os critérios competitivos (custo, qualidade, flexibilidade e entrega) e os seus desdobramentos quanto a processo e produto. Esta orientação hierárquica assumia basicamente uma visão estruturada do processo estratégico e era claramente influenciada pelo planejamento estratégico tradicional. A influência do planejamento estratégico também moldou algumas ferramentas de formulação de Estratégia de Operações, como Platts e Gregory (1990) e Menda e Dilts (1997). Havia, assim, um entendimento que a empresa definia sua estratégia corporativa e de negócios e a área de operações se ajustaria a esta, fazendo escolhas entre os diferentes critérios competitivos. Estas escolhas tinham na sua base o conceito de trade-offs e orientariam as decisões estruturais e infraestruturas da empresa.
Os estudos iniciais sobre Estratégias de Operações com influência de Skinner (1969, 1978), com base no conceito de trade-off, consideravam que não seria possível ter ótimo desempenho em todos os critérios competitivos (custo, qualidade, flexibilidade e entrega) simultaneamente.
Entretanto, Ferdows e De Meyer (1990) questionaram o conceito de escolhas baseadas em trade-offs, pois estes não estariam necessariamente presentes nas empresas mais competitivas. Através de seu modelo do Cone de Areia, os autores afirmavam que as empresas mais competitivas eram capazes de superar os trade-offs e atingir padrões de desempenho mais altos que os concorrentes em todos os critérios competitivos simultaneamente. Para tanto, haveria uma sequência ótima de criação de competências que se iniciaria com qualidade, depois com confiabilidade de entrega, flexibilidade e, por último, custo. Esta sequência trazia no seu cerne a proposta de competências cumulativas. Flynn e Flynn (2004), no entanto, mostraram que não existia um ordenamento único e que fatores externos, como o ambiente competitivo do país da empresa, poderiam alterar a sequência das competências cumulativas. Outros autores, como Corbett e Claridge (2007), não encontraram evidências da relação entre competências cumulativas e desempenho do negócio, embora pudessem existir sinergia entre algumas competências, como qualidade e entrega. Esta é uma discussão ainda em aberto, mas que começou a trazer a questão da interação com o ambiente interno no desenvolvimento de competências; e do ambiente externo, que influenciaria a sequência no desenvolvimento de competências operacionais cumulativas ou sinérgicas ente si.
Mais recentemente, novos estudos analisaram Estratégia de Operações a partir de uma perspectiva menos estruturada, considerando que os desafios enfrentados pelos gestores seriam mais complexos do que uma simples dicotomia entre “forças” e “fraquezas” (CHENG; MUSAPHIR, 1996). Assim, a Estratégia de Operações passa a ser vista como a consistência nas decisões estratégicas em Operações, tendo como base os recursos disponíveis. Nesta categoria incluem estudos, como os de Papke-Shields et al. (2002) e Paiva et al. (2008). Sob este ponto de vista, o resultado da Estratégia de Operações é a criação ou o reforço das competências operacionais criadas a partir dos recursos disponíveis (HAYES; PISANO, 1994; TRACEY et al., 1999). A visão baseada em recursos assim assume um papel preponderante nos estudos sobre Estratégia de Operações, defendendo que os recursos produtivos estariam na base da criação das competências e da vantagem competitiva da empresa (PAIVA et al., 2008).
Mais recentemente, uma vertente tem explorado a criação de competências a partir de práticas operacionais específicas (PENG et al., 2008; WU et al., 2010). Dentro deste entendimento, os recursos se combinariam em práticas correntes da área de Operações, como Gestão da Qualidade ou Just-in-Time.
O primeiro estudo a apontar para as práticas operacionais como chave para a Estratégia de Operações foi de Hayes e Wheelwright (1984). Eles traziam o conceito de melhores práticas em aspectos como habilidades da mão de obra, competência técnica, conformidade de produtos, sistemas participativos, tecnologias proprietárias e melhoria contínua.
Pode-se afirmar que as empresas japonesas influenciaram fortemente os estudos sobre as práticas desde os estudos iniciais empíricos sobre o tema (ver, por exemplo, VOSS; AHISTROM; BLACKMON, 1997). Com o tempo, várias destas práticas foram disseminadas também entre as empresas ocidentais para responder a um ambiente notadamente dinâmico. Cua, Mckone e Schroeder (2001), por exemplo, mostraram que há relação entre o emprego integrado de práticas, como Gestão da Qualidade Total (TQM), Just-in-Time (JIT) e Manutenção Preventiva Total (TPM) e Desempenho. Também Narasimham et al. (2005) argumentaram que há ganhos de desempenho específicos se a empresa alinhar as práticas operacionais às prioridades competitivas.
Estudos recentes defendem que tais práticas estão na base das competências operacionais. Swink et al. (2005) e Wu et al. (2012) identificaram as seguintes práticas operacionais vinculadas à área de Operações: Gestão da Qualidade; JIT (Just-in-Time); Práticas relativas ao atendimento a clientes; Gestão da cadeia de fornecimento; Desenvolvimento de produto e processo; Desenvolvimento de mão de obra; e Práticas de liderança. Recentemente, Bromiley e Rau (2016) sustentaram que uma visão baseada em práticas seria mais adequada para a área de Operações do que a tradicional visão baseada em recursos. No entendimento dos autores, os estudos geralmente buscam entender melhorias de desempenho a partir de adoção de práticas e não o atingimento de vantagem competitiva. Alcançar uma vantagem competitiva por definição do conceito estaria restrito a uma parcela muito pequena de empresas.
Entretanto, diferentemente de autores como Winter (2003) e Peng, Schroeder e Shah (2008), é válido considerar que as competências operacionais são distintas de uma rotina ou de uma prática ou de um conjunto de práticas, ou seja, competências são a combinação de práticas e que levam a um desempenho esperado. As competências representariam também o conhecimento acumulado sobre determinado processo com base em relacionamentos sociais complexos (TEECE; PISANO, 1994). Embora existam várias definições acerca de competências, competência pode ser definida como o “resultado da seleção dos recursos e práticas ... de forma adequada que permite que as atividades sejam realizadas com eficiência e eficácia” (PAIVA et al., 2009, p. 97).
Complementando, Wu et al. (2010) relacionaram seis competências operacionais (operational capabilities) com base na proposta inicial de Swink e Hegarty (1998). Estas podem assim ser descritas:
Melhorias operacionais: ocorrem de forma incremental e podem contribuir para o processo de inovação da organização;
Inovações operacionais: caracterizam-se por mudanças radicais de processo com resultados de maior escala (BENNER; TUSHMAN, 2003);
Tecnologia proprietária: relaciona-se ao desenvolvimento e à implantação de equipamentos e processos considerados exclusivos e capazes de criar vantagem competitiva sustentável (SCHROEDER et al., 2002);
Cooperação operacional: relaciona-se à habilidade em compartilhar dados e informações com as outras áreas funcionais e com agentes externos – fornecedores e clientes;
Capacidade de resposta: refere-se à capacidade dos processos em responder às demandas internas ou externas;
Reconfiguração operacional: relaciona-se às mudanças em práticas, processos operacionais e de aprendizado ante as mudanças no ambiente externo.
As mudanças no dinamismo do ambiente competitivo nas últimas décadas motivaram diferentes autores a defender a necessidade de desenvolver estratégias de negócios mais flexíveis ou dinâmicas (HAMEL, 1997; TEECE; PISANO, 1997).
Neste contexto, a origem da discussão sobre coevolução remonta a visão de adaptação-seleção em relação ao ambiente externo que está presente nos estudos de estratégia (LEWIN; VOLBERDA, 1999). Segundo Lewin e Volberda (1999), coevolução envolveria os resultados de intencionalidade gerencial, ambiente competitivo e efeitos institucionais. Pioneiramente, Kieser (1989) mostrou como as organizações artesanais medievais foram substituídas por fábricas mercantilistas a partir de mudanças de mercado e de tecnologia. Destacando o papel das competências empresariais, Rodrigues e Child (2003) mostraram que estas podem ser criadas ou reforçadas a partir do nível micro ou de processos, do nível meso ou do ambiente competitivo, e do nível macro, no ambiente institucional. Deste modo, Volberda e Lewin (2003) consideram que esta visão múltipla da criação de competências é uma das vantagens do enfoque coevolutivo para o entendimento de estratégias da empresa. Tal abordagem permite analisar como a empresa combina aspectos de escolha/intenção com reforço/adaptação nos diferentes níveis ambientais (micro, meso e macro). Assim, ao mesmo tempo em que a uma competência criada (intencional) pode afetar o ambiente competitivo externo, outras mudanças no nível institucional ou no ambiente competitivo também podem influenciar a criação ou reforço/adaptação das competências da empresa.
Um dos trabalhos clássicos da área da Estratégia de Operações de autoria de Wheelwright e Hayes (1985) definiam quatro estágios competitivos para empresas industriais. Uma empresa estaria em um estágio menos competitivo quando a área de Operações era considerada apenas como um centro de custos que deveria cumprir prazos prometidos, havendo assim pouca vinculação das decisões estruturais e infraestruturas em Operações com a estratégia de negócios. No estágio competitivo mais avançado, a área de Operações seria chave na criação e na sustentação da vantagem competitiva por meio das suas competências operacionais, que criariam novas formas de competir e novos padrões competitivos. Exemplos do último caso são as empresas chamadas world class manufacturing, como a Toyota.
A visão coevolutiva se embasa na perspectiva de seleção e adaptação dentro de uma visão dinâmica de mudanças advindas de iniciativas internas e de influências externas, porém considerando que mudanças no ambiente externo podem ser causadas por mudanças internas nas empresas. Para Lampel e Shamsie (2003), a visão coevolutiva pressupõe interdependência de recursos para a mobilização e transformação das competências da empresa. Dentro desta ideia, Volberda e Lewin (2003) identificaram quatro motores da coevolução. Estes identificariam a forma da empresa responder às necessidades de mudança, e seriam: Seleção Limitada, Seleção Gerenciada, Renovação Hierárquica e Renovação Holística. Os autores, similarmente a discussões correntes em Estratégia de Operações, consideram que há uma interação entre rotinas e competências operacionais (capabilities) e os demais níveis que influenciam o negócio. A interação ocorreria a partir da busca e da retenção de recursos e competências nos ambientes internos (nível micro) e externos (níveis meso e macro). Como rotinas, pode-se entender as chamadas práticas operacionais, que estarão na base das competências operacionais (WU et al., 2010). A proposta dos autores pressupõe a coevolução de competências entre diferentes unidades de negócios da mesma empresa.
No primeiro tipo proposto, denominado de Seleção Limitada (Naïve Selection), há uma limitação (“cegueira”, segundo os autores) ou uma escolha aleatória de práticas e de competências pouco conectada com o ambiente. A seleção de uma nova competência se dá a partir de recursos escassos, e há uma tentativa de manter no longo prazo as rotinas/práticas existentes. Seria o que Wheelwright e Hayes denominaram de Estágio 1 ou internamente neutra: a empresa apenas minimizaria aspectos negativos de seu potencial de operações.
A Seleção Gerenciada (Managed Selection) já pressupõe uma escolha direcionada em relação às práticas existentes, ainda que numa lógica de tentativa e erro. Há um ambiente mais complexo no nível micro que analisa a criticidade em relação aos tempos envolvidos e aos recursos existentes (GALUNIC; EISENHARDT, 1996). Seria equivalente ao Estágio 2 de Wheelwright e Hayes, quando a empresa busca atingir apenas a paridade com seus competidores, denominada de externamente neutra.
Na Renovação Hierárquica (Hierarchical Renewal), há uma clara intenção estratégica na escolha de práticas e competências, que refletem as orientações estratégicas do negócio. Há assim uma orientação top-down no qual o processo coevolutivo é caracterizado como altamente racional, proativo e com metas monitoradas, acessando práticas e competências intra e inter-unidades, com o objetivo de atingir as metas organizacionais. Neste caso, a descrição se aproxima do Estágio 3 de Wheelwright e Hayes, no qual a empresa desenvolve ações na área de Operações, as quais dão suporte à sua estratégia de negócio, sendo chamada de internamente competitiva.
Por fim, a Renovação Holística (Holistic Renewal) pressupõe aprendizagem coletiva entre os diferentes níveis da empresa em vez da orientação top-down da Renovação Hierárquica. Há neste caso uma renovação cíclica que abrange crenças, cultura e práticas desenvolvidas entre períodos de estabilidade e renovação. Aproxima-se claramente do conceito de dynamic capabilities de Teece e Pisano (1997) e da descrição do quarto estágio competitivo de Wheelwright e Hayes (1985), caracterizada pelos autores pela proatividade das empresas no desenvolvimento de suas competências, que cria novos padrões competitivos e leva a mudanças no ambiente competitivo.
De acordo com Huygens et al. (1999), as empresas mais competitivas continuamente se antecipam ao desenvolvimento de novas competências, ao passo que suas competidoras tentarão replicar estas competências a partir de tecnologias disponíveis, se estas forem identificadas como capazes de criar vantagem competitiva. Entretanto, neste processo de busca/desenvolvimento de competências, pode existir uma lógica semelhante à corrida da Rainha Vermelha do livro “Alice no País das Maravilhas” de Lewis Carrol. A rainha argumenta que correr de forma ininterrupta é uma necessidade para se permanecer no mesmo lugar. Assim, há uma situação de busca de paridade competitiva constante ou de rápida erosão de vantagens competitivas criadas (LEWIN; VOLBERDA, 1999).
Deste modo, Huyghens et al. (1999) consideram que algumas empresas assumem o papel de “adaptadores”, que se defendem e se adaptam às mudanças ocorridas, enquanto outras assumem um papel de “manipuladoras”, que assumem as mudanças e os riscos e os ganhos inerentes a estas mudanças.
Para viabilizar a discussão inicial de Estratégia de Operações integrada à abordagem coevolutiva, propõe-se um foco preferencial nos níveis micro e meso, ou seja, no ambiente da firma e no ambiente competitivo.
Para tanto, integra-se desenvolvimento de competências com a busca de tecnologias como aspectos chave para a coevolução das competências nas empresas. Embora originalmente introduzido por Hayes e Wheelwright (1984), a antecipação a novas tecnologias para o desenvolvimento de competências não tem sido plenamente explorada na área. No entanto, este conceito oferece um potencial significativo para se entender como as organizações enfrentam ambientes dinâmicos e competitivos. Hayes e Wheelwright (1984) descreveram antecipação a novas tecnologias como uma característica fundamental das organizações de classe mundial, cuja estratégia competitiva é baseada de forma significativa em suas competências operacionais. Assim, antecipação a novas tecnologias é o grau em que uma organização desenvolve e se apropria de novas tecnologias que serão importantes no futuro e que permitem desenvolver suas competências.
No entanto, a literatura sobre busca de novas tecnologias e desempenho tem rendido resultados inconsistentes, mostrando melhor desempenho em alguns casos (KOTHA; SWAMIDAS, 2000; DAS; NARASIMHAN, 2001) e menor ou nenhuma alteração no desempenho em outros (CORDERO et al., 2009; CAGLIANO; SPINA, 2000). A influência do ambiente externo ocorre a partir da capacidade de identificar e adquirir conhecimento e tecnologias geradas externamente para criação de competências (ZAHRA; GEORGE, 2002).
A Figura 1 sintetiza como a Estratégia de Operações relacionada a competências operacionais (ou capabilities) pode ser integrada à abordagem coevolutiva. A empresa busca continuamente desenvolver novas competências ou reforçar as existentes. No nível micro, a busca de competências, traz mudanças organizacionais e cria as práticas operacionais. As novas competências desenvolvidas internamente serão decorrentes da combinação destas práticas e quando trazem saltos quânticos no desempenho, influenciarão o ambiente competitivo.

No nível meso, ou do ambiente competitivo, a busca por competências existentes tem relação com as tecnologias existentes. A proliferação de competências criadas influencia o acesso a estas tecnologias. Este aspecto afetará o dinamismo competitivo do setor e a velocidade do processo coevolutivo. Uma empresa, ao dificultar que suas competências sejam replicadas ou apropriadas, criará condições de manter sua vantagem competitiva.
O entendimento da criação de competências sob uma perspectiva coevolutiva abre novas perspectivas para a pesquisa em gestão de Operações e em especial no tema Estratégia de Operações.
A consideração que tanto o ambiente interno como o externo podem influenciar o desenvolvimento de competências permite novos entendimentos acerca da criação e da busca de vantagens competitivas pela área de Operações. Além disso, esta abordagem traz uma perspectiva de avanços na qual a empresa coevolui desde um estágio incipiente e reativo até em uma perspectiva de aprendizado constante e ruptura de padrões existentes.
Várias oportunidades de pesquisa aparecem a partir da proposta apresentada. Entre elas, pode-se listar:
como fatores do ambiente externo influenciam o desenvolvimento de competências, podendo-se citar incertezas, questões institucionais, regulações, entre outros aspectos;
como o ambiente interno pode facilitar/dificultar a interação com os aspectos externos para criação reforço de novas competências;
quais mecanismos no nível meso ou macro podem facilitar/dificultar a disseminação de competências;
existe variação na forma de interação entre os níveis micro, meso e macro quanto a setores industriais ou mesmo entre países;
quais características estariam presentes em empresas/organizações no estágio mais avançado de coevolução.
Deste modo, pode-se afirmar que pesquisas futuras de caráter empírico podem dar muitas respostas não apenas em Gestão de Operações, mas também em outras áreas, como Estratégia e Gestão da Inovação. Como todo enfoque teórico ainda pouco explorado, as lacunas ainda são numerosas e as respostas trarão novas luzes para estudos e aplicações que muitas vezes falham por manter um olhar unidirecional na criação e no reforço de competências.
