Secciones
Referencias
Resumen
Servicios
Descargas
HTML
ePub
PDF
Buscar
Fuente


A SÍNDROME DE BURNOUT E O TRABALHO DE TÉCNICOS DE ENFERMAGEM EM UM HOSPITAL PRIVADO
BURNOUT SYNDROME AND THE WORK OF THE NURSING TECHNICIANS AT A PRIVATE HOSPITAL
EL SÍNDROME DE BURNOUT Y EL TRABAJO DE LOS TÉCNICOS DE ENFERMERÍA EN UN HOSPITAL PRIVADO
Revista Alcance, vol. 26, núm. 1, pp. 061-076, 2019
Universidade do Vale do Itajaí



Recepção: 29/08/2018

Aprovação: 18/02/2019

DOI: https://doi.org/alcance.v26n1(Jan/Abr).p061-076

Resumo: Este estudo objetivou analisar como se encontram configuradas as variáveis da Síndrome de Burnout em técnicos de enfermagem de um hospital privado localizado na cidade de Belo Horizonte - MG. A abordagem teórica ancorou-se em aspectos relacionados à influência do trabalho na vida do ser humano e suas consequências para o indivíduo, como o estresse e a Síndrome de Burnout. Em termos metodológicos, a pesquisa foi descritiva, de abordagem qualitativa. Foram entrevistados 10 técnicos em enfermagem de um hospital privado. Os resultados demonstraram o desgaste emocional enfrentado por estes profissionais, como também o sentimento de querer abandonar a profissão. A família foi utilizada como uma estratégia no combate ao sofrimento e, a despersonalização, uma das variáveis que caracteriza a síndrome, se mostrou reduzida em relação aos profissionais estudados.

Palavras-chave: Síndrome de Burnout, Técnicos em enfermagem, Sofrimento do trabalhador.

Abstract: This study analyzes how the variables of burnout syndrome are configured in nursing technicians at a private hospital in Belo Horizonte, in the state of Minas Geras. The theoretical approach was anchored in aspects related to the influence of work on human life, and its consequences for the individual, such as stress and burnout syndrome. Methodologically, the research was descriptive, with a qualitative approach, through interviews with ten nursing technicians at a private hospital. The results showed the emotional exhaustion faced by these professionals, as well as a feeling of wanting to abandon the profession. The family was used as a strategy in the fight against suffering, and depersonalization, one of the variables that characterizes the syndrome, was low among the professionals studied.

Keywords: Burnout syndrome, Nursing technicians, Suffering of workers.

Resumen: Este estudio objetivó analizar cómo se encuentran configuradas las variables del Síndrome de Burnout por el Trabajo en los técnicos de enfermería en un hospital privado ubicado en la ciudad de Belo Horizonte - MG. El enfoque teórico se ancló en aspectos relacionados con la influencia del trabajo en la vida del ser humano y sus consecuencias para el individuo, como el estrés y el síndrome de burnout. En términos metodológicos, la investigación fue descriptiva, de abordaje cualitativo, siendo entrevistados 10 técnicos en enfermería de un hospital privado. Los resultados demostraron el desgaste emocional enfrentado por estos profesionales, así como el sentimiento de abandonar la profesión, utilizando la familia como una estrategia en el combate al sufrimiento y, la despersonalización, una de las variables que caracteriza el síndrome se mostró reducida en relación a los profesionales estudiados.

Palabras clave: Síndrome de burnout, Técnicos de enfermería, Sufrimiento del trabajador.

1 INTRODUÇÃO

Identificam-se, no Brasil, importantes transformações das características do mercado de trabalho, como também a instabilidade dos contratos e do recrutamento. Esses fenômenos, associados ao cotidiano agitado dos indivíduos, podem ter contribuído para o aumento da vulnerabilidade dos trabalhadores ao estresse, com consequências para a saúde, dentre elas o estresse ocupacional (França & Rodrigues, 1999; Montero-Marín et al., 2012).

Segundo Lorenz, Benatti e Sabino (2010) e Sousa e Costa (2017), o estresse ocupacional é uma realidade vivenciada dentro das organizações hospitalares pela equipe de enfermagem. Especialmente na área de saúde, objeto de análise desse trabalho, o estresse ocupacional pode ser desencadeado por vários motivos, dentre eles: as longas jornadas de trabalho a que os profissionais são submetidos, os trabalhos em turnos que se alternam, as tarefas fragmentadas, a falta de reconhecimento, o relacionamento problemático entre as equipes multidisciplinares e a baixa remuneração destes profissionais.

Neste contexto, os profissionais que trabalham na área de saúde estão sujeitos a patologias relacionadas às atividades laborais, dentre elas a Síndrome de Burnout que, segundo Maslach e Leiter (2016), é considerada como um estado de estresse, no qual o organismo tenta reagir aos primeiros sintomas, tais como: dores de cabeça, fadiga crônica, desordens gastrointestinais, tensão muscular, hipertensão e distúrbios do sono. Estes sintomas, por sua vez, interferem nas capacidades do indivíduo de executar o trabalho.

Destaca-se que, embora existam indicadores que apontem casos de sintomas depressivos de menor incidência nestes profissionais, há pesquisas que relatam aspectos mais marcantes da doença, como ansiedade, estresse e Síndrome de Burnout com maior frequência em diversas áreas de atuação (Lorenz, Benatti & Sabino, 2010; Hunsaker, Chen, Maughan & Heaston, 2015; Maslach & Leiter, 2016).

A definição da Síndrome de Burnout é entendida como um processo caracterizado por três dimensões (Maslach, Schaufeli & Leiter, 2001). A primeira delas, denominada exaustão emocional, é caracterizada pela sensação de esgotamento e falta de entusiasmo; despersonalização, caracterizada pelo distanciamento e pela falta de sensibilidade do trabalhador para com as pessoas envolvidas no trabalho, sejam clientes ou colegas; e falta de realização pessoal no trabalho, quando o trabalhador não se reconhece no seu trabalho e se sente insatisfeito com o seu desenvolvimento profissional.

Desta maneira, este estudo objetivou identificar e analisar como se configuram as variáveis da Síndrome de Burnout em técnicos de enfermagem que atuam em um hospital privado que direciona os atendimentos a pacientes de classes média e alta, localizado na cidade de Belo Horizonte. Para tanto, traçaram-se os seguintes objetivos específicos: a) identificar a presença de características da Síndrome de Burnout nos técnicos de enfermagem; b) descrever as três dimensões da Síndrome de Burnout (exaustão emocional, despersonalização e baixa realização profissional no trabalho) que estão presentes no trabalho de técnicos de enfermagem; c) identificar os mecanismos de defesa utilizados pelos pesquisados para lidar com a manifestação de Burnout no trabalho.

Este estudo contribui academicamente com as discussões e as publicações relacionadas à Síndrome de Burnout, especialmente às relacionadas aos profissionais enfermeiros. Uma das questões importantes a se comentar é que o estudo se diferencia em seu objeto de análise, uma vez que o hospital tem suas estratégias priorizadas para o atendimento a pacientes de classes média e alta.

No âmbito organizacional, o trabalho se justifica por evidenciar questões que ameaçam interferir no desempenho do trabalho dos técnicos de enfermagem, pois, por meio do conhecimento dos níveis de estresse e suas manifestações, as organizações podem direcionar seus programas de treinamento para acompanhar, tratar e prevenir estas manifestações, diminuindo estes problemas relacionados aos processos de trabalho.

Este trabalho está estruturado, além desta seção introdutória, nos pressupostos teóricos relacionados à temática do estudo; na descrição da metodologia aplicada; na análise dos resultados encontrados e, por fim, são apresentadas considerações finais do estudo, seguido das referências.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

A seguir, é tratada a teoria que embasou o estudo. Discutem-se as abordagens relacionadas às concepções referentes ao significado do trabalho para o indivíduo; o estresse ocupacional no contexto das relações vivenciadas pelo indivíduo em seu ambiente de trabalho; a Síndrome de Burnout, abordando os conceitos mais amplos sobre a doença; e, por fim, são apresentados aspectos sobre a Síndrome de Burnout focando na área da enfermagem.

2.1 O SIGNIFICADO E A IMPORTÂNCIA DO TRABALHO PARA O SER HUMANO

Entre os significados da palavra trabalho, é possível encontrar associações que evidenciam o sofrimento, partindo da concepção que este se difere do lazer, por exemplo. Sua origem surgiu da palavra tripalium, que vem do latim, nome dado a um instrumento que era usado para torturar, utilizado pelos romanos (Bonzatto, 2011).

Segundo Duarte e Mendes (2014), o ato de trabalhar era considerado sofrimento e punição, causando sentimento de dor. Atualmente, o trabalho é considerado elemento central para as pessoas, a partir do qual elas idealizam a profissão como fonte de realização. Nesse aspecto, é possível que a expectativa que as pessoas criam em torno do trabalho seja responsável pelas suas frustrações. Ainda segundo os autores, trabalhar era considerado um castigo inevitável que todos tinham que passar para conquistar objetivos, e muitos o definiam como luta ou como uma obrigação.

O trabalho sempre esteve presente na vida dos homens, de várias formas, e vem se modificando com o passar do tempo, passando de distinção entre escravos e nobres para, na atualidade, novos significados (Duarte & Mendes, 2014). Na construção desses significados, estudos realizados pelo grupo Meaning of Work (MOW) indicam que esses abarcam tanto experiências individuais quanto os contextos organizacionais e ambientais aos quais os indivíduos vivenciam (Mow, 1987). Ressalta-se, nesse contexto, que o trabalhador, quando se insere (ou é inserido) em determinada organização, é portador de uma história de vida pregressa, constituída por suas experiências pessoais e profissionais. Contudo, a construção organizacional também possui configurações e arquétipos que são únicos e independem da vontade do trabalhador (Dejours & Abdoucheli, 1994).

Para Duarte e Mendes (2014), há de se considerar que as formas de trabalhar e como o indivíduo se sente representado pelo ofício que exerce tem se alterado e se reconstruído frequentemente. O que antes era tido apenas como uma forma de assegurar a sobrevivência, tem se tornado razão de viver e motivo de realização pessoal.

Portanto, o trabalho contribui com o indivíduo na construção da sua identidade na sociedade, pois pode fazer com que o homem se sinta digno e orgulhoso no papel que nela exerce por meio da profissão. O trabalho pode ser considerado o fator que distingue os homens dentre os animais irracionais, tendo em vista que este, por sua vez, transforma a natureza de maneira consciente, proposital e antecipada (Rodrigues, Barrichello, Irigaray, Soares & Morin, 2017).

Rodrigues et al. (2017), por exemplo, ao estudarem o sentido do trabalho para servidores peritos da Polícia Federal, argumentam que esses percebem utilidade social em suas funções laborais, além da possibilidade e do acesso ao desenvolvimento profissional proporcionado pelo cargo que exercem. Tal fato contribuiria, portanto, para a ausência de sofrimento e vivência de bem-estar psíquico.

Em outra perspectiva, por exemplo, ao se tratar do ambiente hospitalar, como no caso do presente estudo, Silva, Gonçalves e Zonatto (2017) observam que este proporciona insegurança aos empregados, uma vez que estes convivem com doenças e perdas. Tais situações podem proporcionar estresse ocupacional, conforme descrito na seção seguinte.

2.2 O ESTRESSE OCUPACIONAL

As novas metodologias aplicadas e o avanço das tecnologias, associados às exigências pela qualidade total e polivalência, exigem muito do profissional e isso acaba aumentando seu nível de estresse. A consequência disso pode ser a redução da qualidade de vida e o aumento de casos de estresse (Limongi-França, 2003).

Selye (1936) foi o primeiro pesquisador a utilizar o termo stress. Segundo Selye (1956), o estresse pode ser conceituado como modificações e respostas orgânicas e psíquicas decorrentes das exigências do contexto organizacional.

O estresse pode ser classificado como agudo ou crônico, de acordo com sua duração. Os sintomas no nível agudo duram horas, dias, duas ou três semanas e depois acabam. Já no estado crônico, os sintomas duram por mais tempo e podem prejudicar a saúde do indivíduo (Goto, Souza & Lima-Junior, 2009).

Quando o estresse se torna crônico, pode acarretar problemas de saúde física ou mental sérios, causando acidentes, diminuindo a eficiência e prejudicando a produtividade no trabalho. Estes aspectos causam sérias repercussões negativas para os indivíduos, às suas famílias, às organizações que trabalham e toda a sociedade (Fascina et al., 2009).

Segundo França e Rodrigues (1999), existem alguns recursos para lidar com o estresse no trabalho, entre eles estão técnicas para relaxar, manter uma alimentação adequada, fazer exercício físico, repousar, ter momentos de lazer e diversão, ter horas de sono adequadas às necessidades e, se necessário, uso de medicamentos.

Para Maslach, Shaufeli e Leiter (2001), entre os fatores que causam sobrecarga laboral nas organizações estão a escassez de inovação, a falta de autonomia, as relações negativas entre os colegas e os superiores, problemas com os clientes, pressões sofridas no ambiente de trabalho e a falta de feedback dos chefes. Especialmente no âmbito do trabalho hospitalar, Sousa, Costa e Melo (2017) observaram intensa agitação cotidiana, associada à pressão por atender normas internas e satisfazer aos pacientes. Nos trabalhos administrativos, esses são identificados como causa de estresse para profissionais que dividem suas atividades entre atendimento aos pacientes e rotinas ditas burocráticas.

O estresse ocorre quando o organismo corresponde à pressão utilizando o corpo, a mente e o coração do indivíduo em relação às condições inadequadas de vida, especialmente quando essas ocorrem de forma contínua ou muito intensa. As suas consequências nocivas são variadas e dentre elas está a Síndrome de Burnout (França & Rodrigues, 2011).

2.3 SÍNDROME DE BURNOUT: CONSIDERAÇÕES GERAIS E CONCEITUAIS

O Burnout é uma síndrome caracterizada por três aspectos básicos definidos como exaustão emocional, despersonalização, redução da realização pessoal e profissional. Tais dimensões são decorrentes de uma resposta do indivíduo advinda do estresse crônico decorrente do ambiente de trabalho, gerando manifestações como insatisfação, desgaste, falta de comprometimento, redução do desempenho e aumento do absenteísmo (Malash & Jackson, 1981; Maslach, Shaufeli & Leiter, 2001).

Em virtude da carga emocional e do intenso contato constante com pessoas, em especial aquelas que estão vivenciando algum sofrimento, o indivíduo pode desencadear a exaustão emocional. O profissional se sente esgotado, com a energia reduzida para o dia seguinte de trabalho e a impressão que ele tem é que não irá conseguir recuperar a sua energia novamente. Nesse estado os profissionais ficam menos tolerantes, nervosos e se irritam facilmente, isso ocorre tanto no local de trabalho quanto fora dele (França & Rodrigues, 1999).

Quanto à despersonalização, França e Rodrigues (1999) afirmam que é o distanciamento emocional do profissional, como quando ele demonstra frieza ou indiferença pela necessidade do outro. O contato desse profissional com as pessoas é movido por atitudes por uma visão e atitudes negativas que podem ser interpretadas como desumanizadas. Neste sentido, há deterioração da qualidade do trabalho, realização pessoal e profissional do trabalhador acometido pelo Burnout.

Nessa perspectiva, os três componentes essenciais do Burnout estão interligados por uma relação assimétrica, na qual o esgotamento emocional desencadeia as outras duas características, a despersonalização e a falta de realização profissional . Portanto, a Síndrome do Burnout é um processo contínuo, que pode ser apresentado em diversos níveis de intensidade, ressaltando um ou outro aspecto no indivíduo, de acordo com as suas características ou a situação de estresse. Uma pessoa pode sentir os três aspectos da síndrome diversas vezes em épocas diferentes de sua vida, podendo ser no mesmo ou em outros trabalhos (Malash & Jackson, 1981).

A Síndrome de Burnout é uma reação ao estresse crônico laboral e pode ser caracterizada pela desmotivação e pela insatisfação no trabalho e, dependendo do grupo ou da categoria profissional, pode afetar em maior ou menor grau. A diferença entre o estresse e o Burnout é que o estresse pode apresentar pontos positivos, já o Burnout traz sempre um aspecto negativo e está sempre relacionado às atividades ocupacionais (Campos, 2005).

As características pessoais dos indivíduos não são desencadeadoras da síndrome (Campos, 2005), mas funcionam como inibidoras ou facilitadoras dos agentes que causam a doença. O Burnout pode ter mais relação com fatores da organização, entre eles: “ambiente físico, mudanças organizacionais, normas institucionais, clima, burocracia, comunicação, autonomia, recompensas, segurança”, do que com os fatores pessoais do indivíduo, como “idade, sexo, nível educacional, filhos, lazer” (França et al., 2012, p. 72).

As fontes de pressão e insatisfação, segundo Ferreira e Assmar (2008), têm origens ambientais, como o próprio contexto e a organização onde o trabalho é desenvolvido, ou seja, barulho em excesso, riscos à segurança do profissional, sobrecarga no trabalho, tempo inadequado para concluir as atividades, turnos de trabalho longos, baixo controle que o indivíduo exerce sobre suas atividades, falta de autoridade nas decisões sobre suas tarefas, dentre outras que surtem efeitos na saúde física e psíquica dos profissionais.

Os profissionais de nível operacional geralmente sentem mais os impactos da insatisfação no trabalho e do desenvolvimento da Síndrome de Burnout, conforme afirmam. Portanto, ressalta-se a importância de a organização estimular as estratégias individuais e coletivas para o enfrentamento do sofrimento relacionado ao trabalho (Garcia et al., 2016).

A presença desta síndrome no profissional de enfermagem pode afetar a qualidade dos serviços prestados, fazendo necessárias intervenções de forma pontual e preventiva desta manifestação. Sendo assim, esse tema passou a fazer parte do mundo laboral à medida que o Burnout começou a explicar as consequências que o estresse ocupacional causa para o trabalhador e para as empresas (Campos, 2005).

2.3.1 Síndrome de Burnout em técnicos de enfermagem

Segundo Rodrigues e Barrichello (2015), historicamente a escolha pela profissão de técnico de enfermagem é orientada pela vocação. Porém, o autor afirma que, ao longo da pesquisa que foi realizada, ele pode conhecer mais sobre o que leva os técnicos de enfermagem a escolherem essa profissão. Para a maioria dos profissionais, essa decisão foi tomada porque procuravam por um curso que oferecesse mais vagas de emprego. Portanto, o curso técnico de enfermagem é interpretado como oportunidade para um futuro melhor.

Pode-se observar que exaustão emocional tem uma porcentagem maior nos enfermeiros quando comparada a outras dimensões. Os enfermeiros e os técnicos de enfermagem sentem exaustão e despersonalização na sua profissão, mesmo quando se sentem realizados profissionalmente e até quando têm uma boa relação com os colegas de trabalho (Fascina et al., 2009).

Segundo Campos (2005), os profissionais de enfermagem são os que ficam por mais tempo ao lado do paciente e da sua família, sendo assim eles vivem situações de estresse junto a eles. Esses profissionais estão presentes no momento da realização de diagnósticos, procedimentos e quando as decisões a respeito do paciente são tomadas. Porém, nem sempre os profissionais estão psicologicamente preparados para essa situação.

Santos e Zille (2014) afirmam que os técnicos são submetidos, constantemente, à exigência de alta produção e não participam das decisões que referem aos processos e à organização do trabalho, contribuindo para o esgotamento físico-emocional dos indivíduos. Estes profissionais encontram-se expostos a fatores determinantes do estresse, bem como o autoesgotamento emocional e a despersonificação (Silva et al., 2015).

Segundo Fascina et al. (2009) e Fang (2017), além disso, existem vários agentes estressores na área de enfermagem que refletem a organização do trabalho, entre eles, estão as relações de conflito e ambiguidade de papéis, plantões, longas jornadas de trabalho e rodízios, número insuficiente de profissionais, falta de recursos, falta de treinamento diante das novas tecnologias e clima tenso de trabalho, como também conflitos com a família relacionados ao trabalho.

Ao avaliar a prevalência da Síndrome de Burnout e suas relações com variáveis demográficas e funcionais, em estudo em um hospital de Singapura, Ang et al. (2016) descrevem que estes profissionais possuem alto nível de exaustão emocional e baixa realização profissional. O estudo também encontrou relações de incidência da síndrome em enfermeiros mais jovens, ou seja, idade inferior a trinta anos.

Segundo França et al. (2012), os profissionais, ao se sentirem sobrecarregados, encontram dificuldades para relaxar e acabam ficando mais exaustos, o que resulta em um estado de fadiga diário. Quando esses trabalhadores ficam exaustos, seus recursos internos ficam reduzidos e acabam não conseguindo enfrentar as situações vivenciadas no trabalho.

Andrade et al. (2012) afirmam que o nível da Síndrome de Burnout, tanto nos hospitais públicos quanto nos privados, são moderados, porém, nas instituições públicas, a sua incidência é maior. Quanto ao suporte social no trabalho, os funcionários dos hospitais privados percebem mais a sua existência. Em relação ao esgotamento emocional, quanto mais os indivíduos possuem informações sobre o ambiente do trabalho e confiam na equipe e nos seus chefes, este nível será menor.

Segundo Maslach e Leiter (2016) e Sun et al. (2017), as relações interpessoais no contexto organizacional e os modelos de gestão são fatores preponderantes para a incidência da Síndrome de Burnout em enfermeiros. Portanto, faz-se importante valorizar o profissional da saúde, bem como capacitá-lo, pois o sentimento de prazer no trabalho tem ligação direta com o reconhecimento do indivíduo, seja ele pelo chefe, pelos colegas de trabalho ou até mesmo pelos pacientes (Garcia et al., 2012; Hunsaker et al., 2015).

Ainda, existe a necessidade de instrumentar estes profissionais, capacitando-os para desenvolver resistência aos agentes estressores, realizando um trabalho de intervenção e prevenção contra o estresse nas instituições da área da saúde. Para isso, serão necessários investimentos e estratégias voltados para a diminuição da predisposição da Síndrome de Burnout (Lima, Silva & Souza, 2009).

Neste sentido, existe uma prática profissional voltada para garantir a eficácia no atendimento do paciente, porém a desvalorização das condições de trabalho que são essenciais para a saúde do trabalhador é perceptível nas organizações da saúde. Os profissionais ficam expostos a situações que exigem uma alta demanda emocional por um período longo de tempo (Maslach & Jackson, 1985).

Atualmente existe uma maior preocupação com a saúde dos indivíduos que exercem suas atividades em organizações de saúde. A instituição hospitalar representa um contexto de risco à saúde ocupacional porque possui uma estrutura organizacional complexa quanto aos profissionais, aos papéis, à estrutura, à divisão de trabalho, às metas, à hierarquia e às normas que a regulam (Maslach & Jackson, 1985; Maslach & Leiter, 2016).

Há uma necessidade de discutir as condições de trabalho do enfermeiro, independentemente da unidade onde ele atua, seja numa instituição particular ou privada. Isso porque essa área torna-se cada vez mais propensa ao estresse e ao adoecimento; dessa forma, merece maior atenção tanto por parte do profissional quanto da instituição em que ele trabalha (Lima et al., 2009).

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa compreendeu um estudo de caso de caráter descritivo, desenvolvida por meio da abordagem qualitativa, uma vez que analisou como se encontram configuradas as variáveis da Síndrome de Burnout na equipe de técnicos de enfermagem de um hospital privado localizado em Belo Horizonte – MG.

Para a coleta dos dados, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 9 técnicas e 1 técnico em enfermagem. O roteiro de entrevista utilizado foi o proposto por Araújo (2011) e adaptado para este estudo. A seguir, o Figura 1 apresenta as categorias de análise que foram definidas a priori para a execução deste estudo:


Figura 1.
Dimensões da análise de conteúdo
Fonte: Elaborada pelas autoras (2018).

Após a transcrição das entrevistas, foi realizada análise do conteúdo (Bardin, 2006), procurando interpretar os dados colhidos por meio das categorias e das subcategorias de análise de acordo com os objetivos do estudo. Foi permitido aos entrevistados elucidarem seus discursos acerca de suas experiências laborais, como técnicos de enfermagem e suas implicações no cotidiano. Além disso, trechos dos depoimentos colhidos com os entrevistados foram utilizados para ilustrar o fenômeno da investigação.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Para análise dos dados, foram entrevistadas nove técnicas de enfermagem e um técnico em enfermagem, funcionários dos setores de Centro de Terapia Intensiva (CTI), Serviço de Apoio Diagnóstico Terapêutico (SADTS) e Serviço de Arquivo Médico (SAM) em um hospital privado de Belo Horizonte, no estado Minas Gerais. A seguir, apresenta-se o perfil dos pesquisados por meio do Figura 2.


Figura 2.
Perfil dos entrevistados
Fonte: Dados da pesquisa (2018).

De acordo com os dados constantes na Figura 2, dos técnicos participantes da pesquisa, a maioria é do sexo feminino, com idade média de 25 anos. Com relação ao estado civil, a maioria é solteira e, no que diz respeito à formação, a maior parte possui curso técnico completo, e quatro técnicos em enfermagem possuem curso superior em andamento. Quanto ao tempo de trabalho, a maioria dos entrevistados atua na área há mais de 3 anos.

A seguir, discute-se sobre o estresse laboral percebido pelos entrevistados e os mecanismos de defesa utilizados contra o Burnout.

4.1 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E OS IMPACTOS NA SAÚDE DO TÉCNICO EM ENFERMAGEM

Os entrevistados foram questionados sobre os motivos que os levaram a escolher essa profissão. Sete deles afirmaram que gostam de trabalhar cuidando das pessoas e que amam essa profissão. Somente E3 escolheu a profissão pensando no salário, e E5 afirmou não saber por que escolheu essa área.

Escolhi essa área porque gosto de trabalhar com pessoas, cuidando do outro, isso me faz feliz, para mim é gratificante (E1).

Foi uma busca por um salário melhor (E3).

Escolhi por amor à enfermagem mesmo (E4).

Por motivos pessoais mesmo, porque eu tenho aptidão para a área da saúde, amo essa área (E9).

Não sei dizer por que escolhi essa profissão, está aí uma boa pergunta. Talvez tenha sido porque fui criada por uma enfermeira, isso pode ter me influenciado (E5).

O relato da maioria dos entrevistados vai ao encontro da afirmação de Rodrigues e Barrichello (2015), quando identificaram que a escolha pela profissão, na maioria dos casos, se dá pelas oportunidades de emprego que disponibiliza. Diferentemente, no presente estudo, há fatores de ordem subjetiva presentes nos discursos.

No que se refere às condições de estrutura física do hospital, os entrevistados demonstraram satisfação com o que a organização oferece quanto ao espaço físico, ao considerá-lo adequado para a realização das tarefas.

O ambiente que trabalho é adequado para as atividades realizadas, não posso reclamar dos recursos oferecidos pelo hospital (E2).

O ambiente é adequado, tenho todos os recursos que preciso (E4).

Acho que uma das melhores coisas oferecidas pelo hospital são os recursos, o hospital tem uma estrutura muito boa (E9).

Os depoimentos reforçam a importância de o hospital oferecer um ambiente físico adequado para a realização das tarefas, pois as fontes de pressão e de insatisfação, segundo Ferreira e Assmar (2008), têm origens ambientais, como o próprio ambiente físico onde o trabalho é desenvolvido, o barulho em excesso e os possíveis riscos à segurança do profissional. Destaca-se que o hospital em questão direciona seus atendimentos a pacientes de classes média e alta, o que corrobora para a presença de estrutura de física de melhor qualidade.

No que se refere ao desgaste físico e mental, observou-se nos relatos que este está relacionado à sobrecarga de trabalho, à cobrança excessiva e à falta de reconhecimento. Somente E4 e E6 afirmam que não se sentem assim, a maioria das respondentes manifestou frustração, incapacidade quanto à dimensão exaustão emocional. Os relatos a seguir ilustram a percepção dos entrevistados:

Sim, me sinto assim várias vezes, a sobrecarga, ter que lidar com paciente, supervisor cobrando, familiares dos pacientes cobrando, é bem complicado (E3).

Até o momento não tive ainda esse sentimento de desgaste, o trabalho é um pouco estressante, mas ainda não cheguei a esse ponto (E4).

Me sinto assim diariamente, o tempo todo, aqui tem muita cobrança e ainda tem a falta de reconhecimento (E5).

Sim, estou fazendo faculdade em administração justamente por causa disso, eu decidi sair da área da enfermagem, atualmente eu trabalho como técnica dando apoio na parte administrativa. Apesar de eu amar essa área, ela é muito desgastante, quando eu trabalhava na assistência eu tinha que trabalhar nos feriados, no sábado e domingo, eu sempre perdia as festas e reuniões de família por causa do trabalho. Além disso, eu sempre ficava esgotada no final do plantão, porque não tinha trabalho em equipe, as tarefas eram muito mal divididas e sempre alguém trabalhava mais (E7).

Quando apontada a possibilidade de mudar de emprego, seis entrevistados afirmaram que já desejaram/desejam abandonar o trabalho e três relataram que não têm vontade de mudar de emprego. Esse resultado se reflete no depoimento das entrevistas quando elas dizem:

Até o momento ainda não pensei em mudar de emprego, gosto muito de trabalhar aqui no hospital (E4).

Estou no caminho para abandonar a área técnica, estou fazendo faculdade de enfermagem, não vejo a hora de mudar logo de emprego (E5).

Não, o que eu quero é me desenvolver aqui dentro da empresa, trabalhei mais de um ano na área assistencial e hoje fico mais no administrativo do setor (E6).

Sim, apesar de eu ser técnica de enfermagem, eu trabalho atualmente na parte administrativa com auditoria de prontuários, eu estou fazendo faculdade em administração porque, além do salário ser melhor, a experiência que tenho é que a área é menos estressante (E7).

Quanto às compensações de trabalhar na empresa, os entrevistados citaram o fato de a empresa ser grande, ter boa estrutura, compensação pessoal e oportunidades oferecidas. Apenas E3 afirmou que a única compensação é o salário.

A empresa é de grande porte, o nome tem peso no mercado, a estrutura é muito boa, tudo o que precisamos é disponibilizado. Tive muitas oportunidades aqui dentro, comecei como estagiária, depois fui promovida para bolsista e hoje sou uma técnica contratada (E4).

Para mim são mais compensações pessoais, como cuidar do outro, ajudar quem precisa me faz muito bem (E1).

A única compensação que vejo em trabalhar aqui é o salário, não é muito alto, mas ainda é um pouco mais do que o dos outros hospitais (E3).

No que se refere aos pontos negativos de se trabalhar na organização, foram citados o salário baixo, a falta de reconhecimento pelo trabalho, a carga horária pesada, o excesso de pressão e a cobrança vindos tanto da instituição quanto dos pacientes.

A má gestão do setor é a pior coisa da empresa, cobram muito da gente e não temos um pingo de valor aqui dentro, não fazem nada para motivar a equipe (E2).

Cobrança excessiva, temos uma carga de trabalho pesada demais, eu trabalho 12/36, a minha carga horária é de 12 horas por dia, mas ficamos mais do que isso. Eu moro longe do trabalho pra ter só um dia de folga é bem puxado e o pior é que ainda recebo pouco (E3).

O trabalho é muito estressante porque além da gente trabalhar cuidando das pessoas, nós ainda temos que mostrar resultados de produtividade. Fazemos algumas atividades voltadas para o faturamento, ou seja, temos que fazer atividades da parte administrativa também como por exemplo ficar lançando medicamentos na conta dos pacientes (E5).

Muita cobrança em cima da enfermagem, por ser uma rede privada, temos que aceitar as humilhações que os pacientes fazem com a gente (E9).

As fontes de pressão e insatisfação, segundo Ferreira e Assmar (2008) e Fang (2017), têm origens oriundas da sobrecarga no trabalho, tempo inadequado para concluir as atividades, turnos de trabalho longos, baixo controle que o indivíduo exerce sobre suas atividades, falta de autoridade nas decisões sobre suas tarefas, dentre outras que surtem efeitos na saúde física e psíquica dos profissionais.

Já no que refere ao reconhecimento, verificou-se que esse aspecto está associado à não valorização do técnico de enfermagem, seja pela sociedade, seja pelos pacientes ou pela organização. Foi observado que E1, E6, E8 e E9 afirmaram que se sentem valorizadas no trabalho, vale ressaltar que essas entrevistadas trabalham há um ano na empresa, aquelas que estão lá há mais tempo já não se sentem valorizadas e reconhecidas.

Sim, tanto é que passei por várias fases na empresa, comecei como estagiária, depois fui promovida para bolsista e hoje sou contratada como técnica de enfermagem (E1).

Nessa profissão ninguém é valorizado (E2).

Não me sinto nem um pouco reconhecida e valorizada (E3)

Sempre tem uma pessoa ou outra que elogia nosso trabalho no setor vindo tanto dos pacientes quanto dos funcionários (E8).

Na maior parte do tempo não me sinto valorizada (E9).

Nesse aspecto, Garcia et al. (2012) afirmam que é importante valorizar o profissional da saúde, bem como preocupar em capacitá-lo, pois o sentimento de prazer no trabalho tem ligação direta com o reconhecimento do indivíduo, seja ele pelo chefe, pelos colegas de trabalho ou até mesmo pelos pacientes.

Para a maioria dos técnicos os seus objetivos pessoais não estão sendo alcançados por meio do trabalho. Somente para E6 os objetivos pessoais foram completamente alcançados dentro da Instituição.

Estou tentando alcançar aos poucos, mas ainda não (E2).

Mais ou menos porque o salário que recebo aqui é o que faz a minha renda mensal girar, mas a gente sempre quer um pouco mais (E3).

Como pessoa sim, porque gosto do que faço, mas financeiramente não alcancei meus objetivos ainda (E5).

Com certeza os meus objetivos são alcançados, primeiramente eu quis aprender a área assistencial e depois a administrativa. Inicialmente foi um impacto grande passar da assistência para o administrativo e eu aprendi muito, muito mesmo, em cada uma das áreas, em questão de cuidados de lidar cuidando das pessoas e agora é mais diferente, tenho que ter cuidado com o prontuário de cada paciente e resguardar isso, então eu cresci muito aqui dentro em situações diferentes (E6).

Os depoimentos anteriores reforçam os argumentos de França e Rodrigues (1999, p.50), quando afirmam que “diante de tal deterioração da qualidade da atividade, a realização pessoal e a profissional ficam extremamente comprometidas”.

Apesar de situações indesejadas, a maioria dos entrevistados que afirmaram estar satisfeitas trabalham na empresa há um ano, além destas, a E4 que trabalha na instituição há três anos também afirmou estar satisfeita com alguns aspectos e insatisfeita com outros.

Não estou satisfeita, como eu estou estudando, a minha rotina com o trabalho está muito puxada, estou dormindo muito pouco, às vezes, vou dormir uma hora da manhã e acordo às cinco horas da manhã para ir trabalhar. Acordo muito cedo porque meu horário de trabalho é de 7:00 às 17:00, acho o horário que pego serviço muito cedo (E7).

Esse aspecto ainda está em construção, apesar de eu gostar da empresa, ainda não estou satisfeita (E5).

Sim, como eu sempre falo, eu aprendi muito e estou aprendendo aqui dentro, como crescimento profissional e o ambiente em que trabalho é agradável (E6).

Sim, porque acho que todos nós precisamos de trabalho e quando a pessoa acha um trabalho que ela gosta, mesmo não sendo valorizada e reconhecida, ela se sente bem ao sentir que está no caminho certo (E9).

Em alguns pontos estou satisfeita como por exemplo as oportunidades que tive aqui, mas em relação à gestão do setor estou muito insatisfeita (E4).

Ao perguntar para as técnicas o que elas fariam se pudessem mudar três coisas no seu ambiente de trabalho, foram identificadas respostas similares para os funcionários do CTI, quando afirmaram que mudariam a gestão do setor. As outras técnicas mudariam a organização do setor, a equipe, o horário de trabalho, etc.

Melhoraria a organização do setor, apesar de termos muitos profissionais no setor, ainda temos muitos problemas na hora de apresentar os resultados, isso por causa da falta de organização (E5).

Primeiro mudaria a gestão do meu setor, depois colocaria uma supervisora que desse mais apoio para a equipe e, por último, colocaria o acompanhamento da diretoria mais próximo do setor (E4).

Mudaria a equipe, eu colocaria uma equipe mais qualificada, melhoraria a comunicação entre os profissionais do setor, e a forma de tratamento dos pacientes, acho que todos devem ser tratados iguais, independente da sua classe social (E9).

Eu mudaria os horários, o horário que vou embora é muito tarde, o horário da agenda vai até muito tarde e eu acabo ficando sempre um pouco mais. E organizaria mais a agenda dos exames, a agenda tem horários muito curtos e acabamos não conseguindo atender o paciente na hora marcada e isso gera muito transtorno (E6).

O que chamou a atenção foi que somente E2 e E7 afirmaram que não estão bem fisicamente, porém todos os demais afirmaram que frequentemente não se sentem bem psicologicamente.

Eu estive 15 dias de atestado porque machuquei a coluna quando estava trocando a roupa de um paciente, eu estava com outra técnica me ajudando porque ele era obeso, ele jogou o peso dele em cima de mim e eu ouvi minha coluna estalar. Psicologicamente depende do dia, mas na maioria das vezes estou mal (E2).

Não estou me sentindo bem, como eu estudo e trabalho eu durmo tarde e acordo muito cedo e por causa disso tenho tido muita enxaqueca, eu tomo remédio para dor de cabeça e não resolve. Na semana passada peguei três dias de atestado, eu tive estafe, meu corpo parou completamente, psicologicamente estou me sentindo bem. Eu estou trabalhando há dois anos seguidos, trabalhei três meses como estagiária não remunerada, depois oito meses no estágio remunerado e mais um ano como contratada, não vejo a hora de tirar férias (E7).

A respeito disto, Campos (2005) destaca que a principal característica da síndrome é o contato direto entre o profissional com as pessoas, o que gera disfunção psicológica e física, e está na lista das doenças que estão relacionadas ao trabalho. Para França e Rodrigues (1999), a carga emocional e o intenso contato constante com pessoas, em especial aquelas que estão vivenciando algum sofrimento, podem desencadear no indivíduo a exaustão emocional.

4.2 MECANISMOS DE DEFESA CONTRA O BURNOUT

Ao analisar os mecanismos utilizados pelos profissionais contra as manifestações da Síndrome de Burnout, foi observado que as entrevistadas que trabalham no CTI relataram que estão mais sujeitas ao ambiente em sua volta, já as entrevistadas que trabalham no Serviço de Arquivo Médico (SAM) e no Serviço de Apoio Diagnóstico Terapêutico (SADTS) afirmaram ter mais domínio sobre os fatos à sua volta.

Eu costumo deixar me envolver nos problemas (E2).

Nem sempre me envolvo com os problemas, mas às vezes eu me deixo levar pelas opiniões dos colegas (E3).

Tenho domínio, não deixo os problemas me abalarem (E5).

Estou mais sujeita ao ambiente, dependendo do que acontece no setor eu acabo me afetando (E4).

Tenho domínio dos fatos, não me deixo envolver com as situações no trabalho (E9)

A maioria dos entrevistados procura apoio em outras pessoas, como cônjuges, amigos, terapeutas, para poder aliviar o estresse e a tensão, enquanto E2 e E4 acreditam que desabafar não vai ajudar a resolver os problemas.

Quando tinha tempo, eu fazia terapia uma vez na semana, sempre tive apoio em casa, eu sempre busco apoio na minha mãe (E1).

Não, meus amigos e familiares não podem fazer nada para resolver os problemas, infelizmente não tem solução (E2).

Sim, quando estou muito tensa ou me sentindo muito pressionada tento desabafar com alguém, falar dos problemas, mas gosto de conversar mais com meus amigos da área que me entendem e passam pela mesma situação, levar pra casa não adianta muita coisa (E3).

Não ia adiantar nada desabafar em casa, porque não vai resolver (E4).

A gente se apoia muito um com o outro aqui no setor, seria muito bom se o hospital oferecesse um suporte psicológico pra gente (E5).

Eu prefiro não ficar falando com outras pessoas, gosto muito de conversar com Deus e pedir força para suportar a pressão. Acho que desabafar com outras pessoas não vai resolver, mas não fico guardando pra mim, eu busco apoio na minha religião (E7).

Sim, na minha família e no meu namorado, eles me dão muito apoio (E9).

Diante da situação, Lima et al. (2009) asseguram que existe a necessidade de instrumentar estes profissionais, capacitando-os para desenvolver resistência aos agentes estressores, realizando um trabalho de intervenção e prevenção contra o estresse nas instituições da área da saúde. Para isso são necessários investimentos e estratégias voltadas para diminuir ou evitar a predisposição da Síndrome de Burnout. A família também é um agente de conflito no que se refere às relações de trabalho, conforme descreve Fang (2017).

Quanto a conseguir separar os problemas pessoais dos profissionais, todos os entrevistados afirmaram que conseguem separar um do outro e que não levam problemas do trabalho para casa, porém a E7 afirma que isso é difícil de controlar.

Eu não me envolvo emocionalmente com nenhum paciente, tem alguns casos que me abala, mas é muito esporádico, normalmente não me envolvo com eles, eu separo muito as coisas (E5).

Eu aprendi a separar o pessoal do profissional, vejo que amadureci muito, eu chego em casa, esfrio a cabeça. As situações difíceis sempre vão existir em todas as áreas, mas depende da maneira como encaramos os problemas, a gente não pode desesperar (E6).

Eu tento focar no trabalho, quando estou no trabalho tento esquecer meus problemas pessoais e tento não levar os problemas do trabalho para minha vida pessoal, mas às vezes é difícil controlar (E7).

No que se refere a momentos dedicados ao lazer, todos os entrevistados afirmaram que têm algum tipo de hobby nas suas folgas, seja com namorado/marido, amigos ou familiares.

Sim, gosto de andar de bicicleta, estar com minha família e meu namorado (E1).

No meu tempo livre gosto de ler, estudar e gosto de sair com meu namorado, geralmente vamos ao cinema, parque, lanchonete, lugares desse tipo (E7).

Sim, adoro assistir seriados e sair nos finais de semana com meu namorado e às vezes com amigas, vamos a barzinhos e cinema (E9).

Gosto de passear com meu marido e minha filha no tempo livre (E8).

Os trechos transcritos reforçam França e Rodrigues (1999), quando os autores afirmam que existem alguns recursos para lidar com o estresse no trabalho. Entre eles estão técnicas para relaxar, manter uma alimentação adequada, fazer exercício físico, repousar, ter momentos de lazer e diversão, ter horas de sono adequadas e, se necessário, uso de medicamentos.

5 CONCLUSÃO

Este estudo objetivou analisar como se encontram configuradas as variáveis de Burnout nos técnicos de enfermagem em um hospital privado em Belo Horizonte. Para o alcance dos objetivos propostos pela pesquisa, realizou-se um estudo de caso descritivo de abordagem qualitativa com 10 técnicos de enfermagem. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas abordando o contexto do trabalho e as dimensões da Síndrome de Burnout, conforme roteiro estruturado por Araújo (2011) e adaptado para este estudo. O tratamento e a análise dos dados ocorreram por meio da estratégia de análise de conteúdo das opiniões dos entrevistados, recorrendo-se a critérios de repetição e frequência dos relatos.

No que se refere à exaustão emocional, a primeira categoria da dimensão da síndrome, de acordo com relatos dos entrevistados, relacionou-se ao desgaste psicológico, ao desejo de abandonar a área e ao modo como os técnicos reagem às situações cotidianas. Foi percebida a manifestação de frustração por parte dos técnicos em relação à carga horária pesada, à pressão no trabalho, à cobrança excessiva tanto dos pacientes quanto dos superiores, à falta de reconhecimento, à desmotivação e às humilhações sofridas.

Quanto à despersonalização, foi relatado nos depoimentos que esse sentimento decorre em alguns entrevistados quando se sentem humilhados pelos pacientes e pela falta de reconhecimento da profissão, estes foram os aspectos mais comentados pelos técnicos que os levam a adotarem a despersonalização como um meio para suportar os problemas no trabalho. Tais inferências mostraram consequências na realização profissional dos entrevistados.

Foram relatadas estratégias de combate ao estresse, como procurar apoio em outras pessoas, como cônjuges, amigos, namorados e familiares. A maioria dos técnicos afirmou que não leva os problemas para casa, não misturando o pessoal com o profissional. Ainda, que tem domínio sobre os fatos que acontecem no trabalho, além de diversos hobbies e passatempos nas horas livres.

Os participantes da pesquisa demonstraram nas entrevistas formas diferentes de percepção da prática vivenciada como técnico em enfermagem. Apesar de possuírem algumas particularidades similares e de estarem atuando no mesmo hospital, os técnicos mostraram opiniões únicas no que diz respeito à profissão como escolha.

Entende-se que os objetivos propostos neste trabalho foram atingidos, a despeito das seguintes limitações: a dificuldade para se realizar as entrevistas na empresa e a permissão dos entrevistados em gravar as entrevistas.

Para futuras pesquisas, sugere-se aumentar o escopo das entrevistas, abrangendo um número maior de pessoas e que seja realizada em uma instituição pública, para comparação de resultados.

Referências

Andrade, T., Hoch, R. E. E., Vieira, K. M., & Rodrigues, C. M. C. (2012). Síndrome de Burnout e Suporte Social no Trabalho: a percepção dos profissionais de enfermagem de hospitais públicos e privados. Organizações & Sociedade, 19(61).

Ang, S. Y., Dhaliwal, S. S., Ayre, T. C., Uthaman, T., Fong, K. Y., Tien, C. E., & Della, P. (2016). Demographics and personality factors associated with burnout among nurses in a Singapore tertiary hospital. BioMed research international.

Bardin, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2006.

Bonzatto, E. A. (2011). Tripalium: O trabalho como maldição, como crime e como punição. Letras, 270.

Campos, R. G. de. (2005). Burnout: uma revisão integrativa na enfermagem oncológica. Dissertação (Mestrado em Enfermagem Fundamental) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, University of São Paulo, Ribeirão Preto, 2005. doi:10.11606/D.22.2005.tde-11052005-112045. Acesso em: 2018-07-25.

Dejours, C., & Abdoucheli, E. (1994). Itinerário teórico em psicopatologia do trabalho (D. M. R. Glina, trad.). In C. Dejours, E. Abdoucheli & C. Jayet (Orgs.), Psicodinâmica do Trabalho: contribuições da Escola Dejouriana à análise da relação prazer, sofrimento e trabalho (3ª ed.) (pp. 119- 145). São Paulo: Atlas.

Duarte, F. S., & Mendes, A. M. B. (2014). Da escravidão a servidão voluntária: perspectivas para a clínica psicodinâmica do trabalho no Brasil. Farol-Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, 2(3), 71-134.

Fang, Y. X. (2017). Burnout and work-family conflict among nurses during the preparation for reevaluation of a grade A tertiary hospital. Chinese Nursing Research, 4(1), 51-55.

Fascina, L. P., Guimarães, C. P. A., Hidaka, K. S., Mekler, P. L., & Rezende, F. (2009). Avaliação do nível da síndrome de Burnout na equipe de enfermagem da UTI-adulto In: Encontro Anual da Associação Nacional dos Cursos de Pós-Graduação em Administração e Pesquisa-EnANPAD, 33., 2009, São Paulo. Anais... São Paulo: ANPAD.

Ferreira, M. C., & Assmar, E. M. L. (2008). Fontes ambientais de estresse ocupacional e burnout: tendências tradicionais e recentes de investigação. Estresse e Cultura Organizacional. São Paulo: Casa do Psicólogo/All Books.

Garcia, A. B., Dellaroza, M. S. G., Haddad, M. D. C. L., & Pachemshy, L. R. (2012). Prazer no trabalho de técnicos de enfermagem do pronto-socorro de um hospital universitário público. Revista Gaúcha de Enfermagem, 33(2), 153-159.

Goto, A. K., Souza, M. T. S. D., & Lima Junior, J. V. (2009). Um estudo sobre o estresse em profissionais da área de logística da indústria automobilística. Revista Psicologia Política, 9(18), 291-311.

Hunsaker, S., Chen, H. C., Maughan, D., & Heaston, S. (2015). Factors that influence the development of compassion fatigue, burnout, and compassion satisfaction in emergency department nurses. Journal of Nursing Scholarship, 47(2), 186-194.

Lima, C. F., Silva, É. S., & Souza, R. K. S. (2009). Síndrome de Burnout em Enfermeiros: a Influência da Unidade de Atuação no Desgaste Profissional. XXXIII Encontro Anual da Associação Nacional dos Cursos de Pós-Gradução em Administração e Pesquisa - EnANPAD. Anais... São Paulo.

Limongi-França, A. C. (2003). Qualidade de vida no trabalho: conceitos e práticas nas empresas da sociedade pós-industrial. São Paulo: Atlas.

Lorenz, V. R., Benatti, M. C. C., & Sabino, M. O. (2010). Burnout e estresse em enfermeiros de um hospital universitário de alta complexidade. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 18(6), 1084-1091.

Maslach, C., Schaufeli, W. B., & Leiter, M. P. (2001). Job burnout. Annual review of psychology, 52(1), 397-422.

Maslach, C., Jackson, S. E., Leiter, M. P., Schaufeli, W. B., & Schwab, R. L. (1986). Maslach burnout inventory (Vol. 21, pp. 3463-3464). Palo Alto, CA: Consulting Psychologists Press.

Maslach, C. & Leiter, M. P. (2016). Understanding the burnout experience: recent research and its implications for psychiatry. World Psychiatry, 15(2), 103-111.

Montero-Marín, J., Araya, R., Blazquez, B. O., Skapinakis, P., Vizcaino, V. M., & García-Campayo, J. (2012). Understanding burnout according to individual differences: ongoing explanatory power evaluation of two models for measuring burnout types. BMC Public Health, 12(1), 922.

Mow. International Research Team. (1987). The meaning of working. Academic Pr.

Rodrigues, A. L., & Barrichello, A. (2015). Em busca da substantivação do conceito de sentidos do trabalho: um estudo com profissionais de enfermagem XXXIX Encontro Anual da Associação Nacional dos Cursos de Pós-Graduação em Administração e Pesquisa-EnANPAD. Anais... Belo Horizonte.

Rodrigues, A. L., Barrichello, A., Irigaray, H. A. R., Soares, D. R., & Morin, E. (2017). O Trabalho e seus Sentidos: Um Estudo com Peritos Criminais da Polícia Federal. Revista de Administração Pública, 51(6), 1058-1084.

Santos, C. C., & Zille, L. P. (2014). Estresse ocupacional: estudo com técnicos de enfermagem em um hospital público federal de Minas Gerais. Anais... XXXVIII Encontro da ANPAD. Rio de Janeiro, v. 13.

Selye, H. (1936). A syndrome produced by diverse nocuous agents. Nature, 138(3479), 32.

Selye, H. (1956). The stress of life McGraw-Hill. New York.

Silva, J. L. L. D., Soares, R. D. S., Costa, F. D. S., Ramos, D. D. S., Lima, F. B., & Teixeira, L. R. (2015). Psychosocial factors and prevalence of burnout syndrome among nursing workers in intensive care units. Revista Brasileira de terapia intensiva, 27(2), 125-133.

Silva, A., Gonçalves, M., & da Silva Zonatto, V. C. (2017). Pleasure and pain in determining hospital work: An analysis in the light of the work psychodynamic theory. BASE-Revista de Administração e Contabilidade da Unisinos, 14(3), 197-212.

Sousa, C., & Costa, P. B. (2017). Prazer e Sofrimento no Trabalho: Um estudo de caso com profissionais da enfermagem de um hospital privado de Belo Horizonte. Revista de Administração da UNIFATEA, 14(14).

Sousa, C. V., Costa, P. B., & Melo, M. C. O. L. (2017). No cotidiano de um pronto socorro: Um estudo sobre prazer e sofrimento com profissionais da enfermagem de um hospital privado. Anais... VI Encontro de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho – EnGPR, Anpad, Curitiba – PR.

Sun, J. W., Bai, H. Y., Li, J. H., Lin, P. Z., Zhang, H. H., & Cao, F. L. (2017). Predictors of occupational burnout among nurses: a dominance analysis of job stressors. Journal of clinical nursing, 26(23-24), 4286-4292.

Autor notes

Mestranda
Mestranda
Mestranda


Buscar:
Ir a la Página
IR
Visualizador XML-JATS4R. Desarrollado por