EXPULSÃO E POLÊMICA! A GESTÃO DE CRISE DE UMA PARTICIPANTE DE REALITY
EXPULSION AND CONTROVERSY! THE CRISIS MANAGEMENT OF A REALITY PARTICIPANT
¡EXPULSIÓN Y CONTROVERSIA! LA GESTIÓN DE CRISIS DE UN PARTICIPANTE DE LA REALIDAD
EXPULSÃO E POLÊMICA! A GESTÃO DE CRISE DE UMA PARTICIPANTE DE REALITY
Revista Alcance, vol. 29, núm. 3, pp. 281-294, 2022
Universidade do Vale do Itajaí
Recepción: 09/10/2020
Aprobación: 20/04/2022
Resumo:
Dilema: O dilema se concentra nas estratégias adotadas para o gerenciamento da crise de uma influenciadora digital participante de um reality show.
Objetivo educacional: O caso foi elaborado para discutir a importância de como ações rápidas e efetivas, na comunicação e análise de dados das redes sociais, têm impacto para contornar o problema de imagem e estimular o faturamento e engajamento após o reality.
Contextualização: Este caso de ensino se concentra na história de uma participante de reality show, transmitido pela televisão brasileira que passou por uma grave crise de imagem no último dia do programa.
Tema principal: Gerenciamento de crise nas redes sociais.
Público: A utilização do caso é indicada para cursos de graduação em Administração e Marketing, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas, e ainda, cursos de especialização nas diferentes temáticas de gestão de marketing e gestão de crise.
Originalidade/valor: Ao final da discussão, se espera alcançar os seguintes objetivos de aprendizagem: (1) a relevância do uso das redes sociais para criar narrativas reativas em caso de crises; (2) como a rápida reação durante a crise impactou no engajamento; (3) como as ações tomadas durante o decorrer do programa impactaram no faturamento após o reality.
Palavras-chave: Big Brother Brasil, gestão de crise, gestão de imagem, engajamento, influenciadores digitais.
Abstract:
Dilemma: The dilemma focuses on the strategies adopted to manage the crisis of a digital influencer participating in a reality show.
Educational objective: The case was designed to discuss the importance of how fast and effective actions, in the communication and analysis of data from social media, have an impact on detouring the image problem and stimulating billing and engagement after the reality show.
Context: This teaching case focuses on the story of a reality show participant, broadcast on Brazilian television, who went through a serious image crisis on the last day of the program.
Main topic: Crisis management in social media.
Audience: The use of the case is indicated for undergraduate courses in Administration and Marketing, Advertising and Public Relations, as well as specialization courses in different themes of marketing management and crisis management.
Originality/value: At the end of the discussion, the following learning objectives are expected to be achieved: (1) the relevance of using social networks to create reactive narratives in case of crises; (2) how quick reaction during the crisis impacted engagement; (3) how the actions taken during the program impacted the billing after the reality.
Keywords: Big Brother Brazil, crisis management, image management, engagement, digital influencers.
Resumen:
Dilema: El dilema se centra en las estrategias adoptadas para gestionar la crisis de un influyente digital que participa en un programa de telerrealidad.
Objetivo educativo: El caso fue diseñado para discutir la importancia de cómo las acciones rápidas y efectivas, en la comunicación y el análisis de datos de las redes sociales, inciden en sortear el problema de la imagen y estimular la facturación y el compromiso después del programa de telerrealidad.
Contexto: Este caso didáctico se centra en la historia de un participante de un programa de telerrealidad, transmitido por la televisión brasileña, que pasó por una grave crisis de imagen en el último día del programa.
Tema principal: Gestión de crisis en redes sociales.
Público: El uso del estuche está indicado para cursos de pregrado en Administración y Mercadeo, Publicidad y Relaciones Públicas, así como cursos de especialización en diferentes temas de gerencia de mercadeo y manejo de crisis. Originalidad/valor: Al final de la discusión, se espera lograr los siguientes objetivos de aprendizaje: (1) la relevancia del uso de las redes sociales para crear narrativas reactivas en caso de crisis; (2) cómo la reacción rápida durante la crisis impactó el compromiso; (3) cómo las acciones tomadas durante el curso del programa impactaron la facturación después de la realidad.
Palabras clave: Big Brother Brasil, gestión de crisis, gestión de imágenes, compromiso, influentes digitales.
O INGRESSO NO REALITY
A entrada no reality show Big Brother Brasil (BBB) sempre teve um papel importante em lançar ao mercado novas subcelebridades e atrair milhares de jovens com o sonho de se tornarem influenciadores digitais, e claro, construírem uma carreira no meio do entretenimento de forma acelerada. Com isso em mente, uma jovem de 21 anos, residente em Senador Canedo, no Estado de Goiás, realizou sua inscrição para participar do maior reality show da TV brasileira e foi uma das selecionadas para participar do programa.
No dia 12 de junho de 2018, houve a seletiva regional do BBB na cidade de Goiânia. A estreia ocorreria no dia 15 de janeiro de 2019 e acabou se tornando a segunda edição mais longa da história, foram 88 dias de confinamento. Habitualmente, os participantes possuem um clipe de apresentação que os anunciam na televisão e para diferentes veículos de imprensa. Fernanda foi selecionada. Realizaria seu sonho. Foi anunciada no dia 11 de janeiro de 2019 e tinha, naquele momento, cerca de 105 mil seguidores no Instagram.
A trajetória de Fernanda foi extremamente tumultuada e foi dada como uma participante sem conteúdo e extremamente introspectiva. A expectativa era que a eliminação ocorresse nas primeiras semanas, entretanto, a participante foi envolvida logo na segunda semana em uma narrativa em que os demais participantes precisavam escolher três colegas de confinamento para eliminarem da casa, de forma hipotética. Fernanda foi escolhida e isso a levou para uma dinâmica, apelidada pela produção do programa como o Quarto dos 7 Desafios.
A dinâmica do Quarto dos 7 Desafios consistia em resolver sete enigmas para destravar itens de necessidades básicas para as três participantes, tais como: água, alimentação, uso do banheiro para as necessidades básicas e banho. As participantes deveriam desvendar cada enigma e, caso não ocorresse, seriam penalizadas e não poderiam disputar a prova do líder, uma prova que garante ao vencedor imunidade e a permanência no programa por mais sete dias. O quarto trouxe visibilidade para as três participantes, pois era o tema principal dos VT’s de edição exibidos durante o programa, na TV aberta. Além disso, era o foco principal, dos assinantes pay per view, por ter deixado o público intrigado com os enigmas. A dinâmica deu visibilidade, perante o público geral do BBB e o público nichado, composto por fã-clubes que geram a maioria dos votos para a permanência dos participantes dentro da casa. Traçaria, ainda, a trajetória da participante, e até mesmo, a levaria a fatídica data de sua expulsão, um dia antes da grande final do programa, para o qual já estava classificada.
O número de seguidores da participante Fernanda crescia constantemente no Instagram. Observava-se um crescimento mais acentuado quando participava da dinâmica de eliminação, situação em que três participantes eram votados para serem eliminados, por meio do voto popular. Durante esta dinâmica, a exposição dos personagens envolvidos aumentava, pois, os VT’s do programa exploravam situações como forma de resumir e criar narrativas para que o público escolhesse entre os personagens e pudesse estabelecer vínculos afetivos. A dinâmica de eliminação, caso não resulte na saída do participante, é quase sempre benéfica, afinal, o coloca em posição de destaque para a audiência principal do programa.
ESTUDANDO A AUDIÊNCIA
Saber potencializar a exposição em uma emissora de TV foi fundamental para Fernanda planejar a potencialização de seus números no Instagram. Para aproveitar ao máximo a situação, foi montada uma equipe, composta por quatro profissionais com especializações em desginer UX, designer gráfico, analista de redes sociais e analista de marketing. Esses profissionais foram responsáveis pelo direcionamento tomado, externamente ao programa, para potencializar os números de seguidores no Instagram e aproveitar, de forma pragmática, a exposição de imagem que recebia. Afinal, Fernanda foi para a dinâmica de eliminação cinco vezes durante o programa e a equipe multidisciplinar adotou a estratégia de criar uma narrativa complementar à exibida pela televisão. Tais profissionais desenvolveram uma persona, baseada na maioria do público espectador do programa. Desta forma, foi possível criar uma narrativa para as redes sociais que tinha como objetivo gerar empatia com o grande público, angariando novos seguidores ativos e que se identificavam com a personalidade da participante. A persona foi criada utilizando como recurso um perfil baseado nos espectadores de realities no Brasil.
Em uma pesquisa conduzida no ano de 2020, pela empresa britânica Betway, especializada em apostas esportivas on-line, foi identificado o seguinte público para os realities brasileiros:
“61% do público desse tipo de atração é feminino. 52% são pessoas da classe C, sendo que só 5% são da classe A. Já 22% têm entre 10 e 17 anos; 18% têm entre 18 e 24 anos; 24% têm entre 25 e 34 anos; 21% entre 35 e 49 anos; 15% têm mais de 50”.
A persona, inicial, elaborada para a criação da estratégia de comunicação foi:
Estudante de publicidade, assiste ao programa por meio do pay per view e vê diversas cenas, a partir de páginas especializadas, no Instagram. Participa ativamente de discussões sobre o programa em redes sociais, como o Twitter. Gosta de falar sobre feminismo, mas entende somente de forma rasa, assiste à TV para se divertir e comentar com suas amigas sobre a programação no Instagram. Está sempre ligada nos novos memes que aparecem. Gosta de se vestir com artigos de moda atuais, mas não dispõe de recursos financeiros para consumir marcas de luxo. É assalariada, recebe até R$ 2000 mensais e sonha em ter seu próprio negócio. Lê pouquíssimo e encontra, na internet, um refúgio para falar sobre assuntos polêmicos, que não pode discutir em casa, pois sua família é tradicional, ou não abre espaço para o diálogo.
Ao decorrer do BBB, a equipe de Fernanda sentiu a necessidade de criar outras personas para envolver os demais espectadores que a seguiam em suas redes sociais e adaptar a narrativa complementar dada pelo programa. Foram criadas duas personas adicionais, que tinham em comum o gênero feminino, integrantes da classe C, renda mensal de até dois salários-mínimos e idade até 34 anos. Ambas criadas por meio de análises de perfil dos comentários e respostas de mensagens recebidas pela participante, no perfil do Instagram. Ainda eram analisados perfis de fotos postadas pelos novos seguidores, erros de português, fotos dos perfis, resposta aos tons de postagens, entre outros assuntos.
Com as personas concretizadas, foi determinado que a estratégia de comunicação deveria ser pautada no humor fácil e visualmente expressivo, típico de personagens como Mazaroppi, o que criaria, naturalmente, uma relação com o estilo sertanejo típico, do sotaque e trejeitos da goiana. Sua timidez, modo simples de se expressar, sorriso fácil, forma matuta de se comportar, falta de tato com as palavras e modo arredio de lidar com as relações pessoais que fossem superficiais, lhe deram o ar de uma caipira adorável. A simplicidade da narrativa criada nas redes sociais vinha ao encontro com a personalidade que a goiana apresentava no programa, devido às suas origens e vivências. Esta personagem foi ainda mais evidenciada, por conta de sua associação com outra participante, que também era uma garota do interior, e sua companheira inseparável no programa com características de interiorana, assim como ela, criando uma relação de afeto e irmandade feminina. Esta estratégia garantiu que a goiana sobrevivesse às dinâmicas de eliminação pelo voto popular e contribuísse para que Fernanda se tornasse finalista, entretanto foi expulsa um dia antes da grande final.
CRISE DE IMAGEM E INÍCIO DOS CONFLITOS EMOCIONAIS
Fernanda foi envolvida em polêmicas durante a exibição do reality show na TV. Sua parceira inseparável de confinamento proferiu diversas vezes frases racistas e foi alvo de uma intensa cobertura midiática sobre o tema. A situação se agravou profundamente para Fernanda quando demonstrou desconhecimento sobre a matriz de religiões africanas e fez comentários sobre “sentir medo de macumba”. Estes fatores eram intensamente abordados fora do confinamento. Em especial, num ano após a eleição do então presidente da república, Jair Messias Bolsonaro questões como racismo, misoginia, preconceito religioso e homofobia eram temas constantes nas redes sociais, o que despertou a fúria de milhares de pessoas e, supostamente, geraria rejeição sobre a participante.
As estratégias de ação foram determinadas pela equipe logo após o comentário de Fernanda. A equipe de marketing, prevendo à proporção que os comentários poderiam gerar, tomou algumas medidas que, diante das crises de imagem, deveriam ocorrer de forma preventiva. No caso de Fernanda, esse caminho foi adotado visando à preservação de sua imagem para a construção de possíveis parcerias comerciais após o reality, o que sempre foi o objetivo principal dela. Para remediar a crise de imagem que se instalava, a equipe adotou as seguintes medidas:
Uma nota de esclarecimento foi divulgada para a imprensa, com pedido de desculpas, esclarecendo o desconhecimento de Fernanda sobre o tema religioso. A família assumiu a postura de ignorância sobre o tema e se incumbia de aprender e ensiná-la;
O tema foi tratado nas redes sociais com leveza, evidenciando que a participante também era ignorante em outros assuntos, o que enfatizava a narrativa do matuto do interior. Foram coletados vídeos, em seu arquivo no Instagram, que salientavam o ponto em discussão, para promover um diálogo com sua audiência;
Foi adotada uma postura de apoio aos participantes rivais que estavam sofrendo com a suposta intolerância e militando sobre o tema. Foram emitidas cartas pessoais às equipes e famílias destes participantes, pedindo desculpas e afirmando o compromisso de ensinar sobre o tema. As cartas foram bem aceitas e evitaram que o nome de Fernanda fosse usado durante as acusações;
As manifestações negativas nas postagens de Fernanda nas redes sociais foram respondidas em uma força-tarefa da equipe, sempre admitindo a ignorância sobre o tema e o compromisso em melhorar.
Após as atitudes para lidar com a crise de imagem, as declarações foram ganhando força fora do programa e a rejeição da amiga de Fernanda só aumentava. Isso tornou o apelo popular do caso ainda mais forte e poderia lhe render o título de campeã da temporada. A participante com chance de ganhar o programa passaria, na primeira semana, de candidata à eliminada.
As medidas tomadas pela equipe mantiveram o crescimento constante dos números da participante, evitando uma perda de seguidores no Instagram. A média de crescimento diário era de 15.340 novos seguidores.
EXPULSÃO E CONFUSÃO À VISTA
No dia 11 de abril, durante a madrugada, em uma festa que comemorava a conquista de sua vaga para a final do programa televisivo, um incidente ocorreu com a participante. Durante uma discussão, Fernanda empurrou sua amiga. Nas laudas contratuais do programa, era claro que qualquer tipo de agressão física seria penalizado com a eliminação do participante. Por se tratar de um reality de amplo alcance, durante o dia, diversos meios de comunicação trataram a polêmica como a principal manchete do dia.
A motivação para a agressão foi iniciada cerca de dez dias antes, quando as amigas discutiram sobre assuntos rotineiros da casa e Fernanda discordou de algumas frases proferidas pela amiga. Frases com tons racistas e com o intuito de debochar das situações e dos adversários na casa. Em momentos de discordância, Fernanda optou pelo silêncio, ou pedia que a amiga se calasse, para que não se prejudicasse. Durante a discussão, na madrugada anterior à agressão, foi essencial a postura de Fernanda para que a equipe externa fosse pontual e certeira, com a finalidade de remediar a situação e não prejudicar seu faturamento futuro. Enquanto discutiam, a participante deixou claro que, apesar de amar a amiga, havia coisas que gostaria de falar de maneira privada, por não concordar, que poderiam rejudica-la no futuro e impactar na sua reputação. Durante a discussão, o usual tom de deboche foi retomado pela amiga da participante que proferia aos gritos: “eu gosto dela, mas não sei se quero uma pessoa assim na minha vida”.
A cena da agressão foi veiculada no horário nobre, e ainda, durante três plantões ao decorrer do dia, até o momento do anúncio da eliminação. Todas as vezes que a agressão foi exibida, a cena da conversa estava presente. Ao longo do dia, era possível acompanhar notícias, em diversos portais, destacando que “Expulsão de Fernanda dá ar melancólico ao fim do BBB”.
Por meio do monitoramento de opiniões, no Instagram, a equipe externa constatou que a opinião pública acreditava que essa frase significava que Fernanda não concordava com as frases de cunho racista que foram ditas durante o programa por sua amiga, e que a bebida e as discordâncias sobre o tema foram o estopim para a briga. Percebeu-se que a narrativa, ao se acentuar, fez com que a participante ganhasse simpatia por aqueles que a criticavam, pois teve coragem de expor o erro da amiga, e claro, se posicionar contra a situação. Foi divulgada pela equipe de marketing uma nota que admitia o erro, pedindo perdão à família da agredida, apoio para que a participante pudesse aprender e compreender melhor as questões que motivaram a agressão, e foi feito silêncio em todas as redes sociais para criar expectativa e curiosidade para a primeira manifestação da própria participante. Esta estratégia gerou extrema curiosidade do público, elevando seus números de forma avassaladora, afinal, todos queriam saber o que ela tinha para falar, se apoiaria a amiga na final, movimentando seus fãs para votar a favor dela, ou se adotaria uma postura mais rancorosa. Algumas notícias veiculadas na imprensa tiveram como manchete:
“Fora do BBB19, Fernanda surta ao descobrir o número de seguidores no Instagram”
“BBB 19: Fernanda fala pela primeira vez após expulsão”
“Após expulsão conturbada, Fernanda conquista marca inconcebível fora do BBB19”
Alguns números demonstram como foi o dia, em relação à expectativa que Fernanda se pronunciasse:
Fernanda iniciou o programa com 105.000 seguidores e, durante toda a exibição, foi uma das protagonistas, adicionando à sua base mais 1.727.191 milhão de novos seguidores, e que totalizariam, até o momento da agressão, 1.832.191 seguidores em seu Instagram. O crescimento, que era, em média, de 15.340 novos seguidores diários, em um único dia, aumentou para 558.039, gerando um crescimento de 32% sobre o total de novos seguidores, desde o início do programa. Assim, Fernanda encerrou o dia 11 de abril, dia da agressão, com 2.360.268 seguidores em seu Instagram.
No dia 11 de abril, às 21h42, foi feita a primeira postagem após a expulsão. O horário foi selecionado por ser o pico de audiência de Fernanda e precedia a edição do programa, que era exibido por volta das 22h30. Tudo calculado para aumentar a disseminação da informação e o buzz sobre o momento. O conteúdo publicado foi um vídeo, feito de forma caseira, sem produção, acentuando o abatimento da participante e admitindo que havia cometido um erro e que não culpava ninguém pelos seus atos, que a emissora havia tomado a decisão certa e que deveria sofrer a consequência de seus erros. Fernanda esclareceu que não queria que seus fiéis seguidores votassem para prejudicar sua amiga, e enfatizou que deveria ganhar o merecedor, que no caso não havia sido ela. O vídeo finalizou com uma declaração dela, afirmando que ficaria bem e que a vida já lhe tinha apresentado muitas oportunidades, lhe restando, então, trabalhar muito para dar orgulho à família e a quem estava lhe acompanhando. O vídeo alcançou 3.136.565 milhões de impressões e foi disseminado em veículos de imprensa com grande expressão nacional, como Folha de São Paulo, Estadão e Globo.com. Além disso, a família foi orientada a não dar qualquer declaração, para evitar distorção da mensagem que deveria ser passada à audiência. O silêncio foi um eficiente catalisador para que curiosos se encaminhassem para o Instagram de Fernanda, a fim de acompanhar o fim da saga e impulsionar os números.
Outra medida adotada foi o lançamento emergencial de uma campanha de comoção que solicitou aos fãs, amigos e pessoas que se identificaram com Fernanda o envio de vídeos que abordaram os motivos que os faziam torcer pela participante. Foram centenas de vídeos recebidos e os que tinham a maior quantidade de influenciadores foram selecionados para potencializar a campanha, pois acreditava-se que repostariam os vídeos em suas redes sociais. Os vídeos dos anônimos selecionados focaram em aspectos como a jovialidade matuta da participante, fãs emocionados e vídeos em que os seguidores relembraram os melhores e mais divertidos momentos de Fernanda na casa, enfatizando a narrativa criada ao se desenhar a persona na primeira semana de exibição do programa. Toda a estratégia tinha a intenção de emocionar, permear a mente das pessoas com respostas imagéticas positivas e diminuir o peso das imagens da agressão.
Forma de comunicar, material produzido, orientação à família, campanha com os vídeos, monitoramento e resposta para os comentários, tudo foi planejado e executado durante dois dias, quando a participante reassumiu seu Instagram com suas primeiras postagens. O conteúdo inicial abordou cenas da final, em que Fernanda participou, na plateia, do lado de fora do reality, muito emocionada e interagindo com dezenas de fãs ao seu redor.
AFINAL, A IMAGEM FICOU ARRANHADA? FOI TUDO UM SONHO DE VERÃO?
O objetivo da participante, ao entrar no reality show, era catapultar sua imagem para colher frutos positivos em seu faturamento. Programas deste segmento têm a capacidade de criar celebridades, ou denegrir a imagem dos participantes, a ponto de transformar seu faturamento em um desafio diário. Fernanda relatou que faturava até R$ 7.000,00 mensais, como influenciadora digital antes da experiência do BBB. A partir da exposição do programa e gestão da crise, seu faturamento, em 40 dias, teve um aumento de 3131%. O faturamento se estabilizou em aproximadamente 1428% do valor inicial em sua média geral. O valor máximo alcançado, no ano de 2019, foi 3848% superior ao faturamento anterior ao reality.
A eficaz gestão da imagem rendeu, ainda, novas parcerias e as notícias veiculadas com seu nome, após a crise, não mencionaram a agressão, racismo ou intolerância religiosa. O assunto foi rapidamente esquecido e sua equipe de marketing fez um planejamento de conteúdo pós-reality, focado em editoriais de moda, bem-estar e beleza, segmentos que foram detectados como potenciais para vendas e engajamento entre seu novo público. Estas escolhas de temas ocorreram por meio da realização de uma pesquisa em seu perfil do Instagram e foram apontadas como mais aderentes entre o público e Fernanda. Esta sintonia entre segmento e público-alvo reverteu no aumento do faturamento e engajamento no perfil.
Durante o reality, ocorrido entre os dias 15 de janeiro e 12 de abril, Fernanda atingiu os seguintes números no Instagram:
896.6 milhões de impressões na conta;
86.2 milhões de usuários alcançados;
1.4 milhão de impressões por postagem;
883.3 mil pessoas alcançadas por postagem.
Com o fim do reality e das polêmicas envolvendo a participante, a expectativa era de que os números diminuíssem, entretanto, observados os 30 dias posteriores, foram os seguintes alcances:
1.2 bilhão de impressões na conta;
88.2 milhões de usuários alcançados;
5.3 milhões de impressões por postagem;
3.1 milhões de pessoas alcançadas por postagem.
Toda a gestão de crise efetuada durante o reality e as crises de imagem mais graves, resultaram em um aumento dos números, que ampararam as ações comerciais e, consequentemente, impulsionaram o faturamento de Fernanda. Mas afinal, será que a experiência permitiu criar uma estratégia certeira para conduzir crises durante realities? Tinham aprendido o que fazer e conseguiriam repetir os resultados?
PRÓXIMOS PASSOS
Um dos desafios dos profissionais de marketing que lidam com gestões de crise é identificar a origem da crise, seu tipo, determinar os responsáveis e as respostas cabíveis, buscar saber quais emoções os espectadores têm sobre determinado assunto e, então, traçar ações que preservem a imagem da empresa. Outro grande desafio é mensurar os resultados financeiros em ações e campanhas. Neste caso, é possível perceber que os eventos ocorridos durante o referido reality show, com a crise relacionada ao racismo e à intolerância religiosa, adicionados à expulsão por uma agressão poderiam ter um reflexo irremediável na carreira da participante e em seu faturamento e sua imagem. As ações tomadas transformaram uma grave crise de imagem em um momento de altos ganhos e reverberação positiva de sua imagem. Os números apresentados ao longo do caso de estudo comprovam que ações de planejamento, criação de personas, storytelling aplicadas às mídias digitais, com monitoramento das respostas a cada postagem e mensuração de resultados, transpuseram uma crise de imagem a uma ação positiva.
A gestão da crise adotada por Fernanda encaminha questionamentos, a saber: Existe fórmula para chegar à final de um reality show? As estratégias de gestão de crise funcionam em contextos diferentes? Existem formas de adaptar o storytelling planejado às polêmicas que surgem no decorrer dos programas? O faturamento comercial pode ser preservado em meio a crises de imagem? Qual o peso de uma crise de imagem para a captação comercial? As novas narrativas vividas por Fernanda impactariam na imagem de forma positiva ou negativa? Seu público-alvo, conquistado no reality, seria modificado em um novo programa? Os contratantes estariam dispostos a lidar com estas mudanças de público e imagem? Fernanda ainda se encaixaria no nicho on-line de moda e beleza em que atuava? A estratégia adotada no primeiro reality funcionaria em um segundo?
NOTAS DE ENSINO
Objetivos Educacionais e Recomendações de Aplicação
O caso tem como objetivo discutir sobre a importância de como ações rápidas e efetivas, na comunicação, aliadas à análise de dados das redes sociais, têm impacto para contornar o problema de imagem e estimular o faturamento e engajamento após a participação em um reality show. Os objetivos de aprendizagem são: (1) a relevância do uso das redes sociais para criar narrativas reativas, em caso de crises; (2) como a rápida reação, durante a crise, impactou no engajamento; (3) como as ações tomadas durante o decorrer do programa impactaram no faturamento após um programa televisivo baseado na vida real. É apropriado para ser utilizado nos cursos de graduação em Administração e Marketing, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas, e ainda, cursos de especialização nas diferentes temáticas de gestão de marketing e gestão de crise. É recomendada sua utilização em disciplinas de Comunicação e Marketing, afinal, o caso instiga a discussão sobre a gestão de crise de imagem, engajamento e estratégias digitais, e o influenciador digital como uma marca.
É sugerida a aplicação do caso da seguinte forma: (a) leitura prévia e análise individual pelo aluno; (b) discussão, em pequenos grupos (entre 3 e 5 alunos), para debate do tema e posicionamento de opiniões; (c) apresentação de outros exemplos de influenciadores digitais, nacionais e internacionais, envolvidos em polêmicas e a repercussão gerada; e (d) avaliação das estratégias adotadas pela equipe de Fernanda.
Por fim, a expectativa com o caso de ensino é que o docente discuta aspectos como:
Estratégias de gestão de crise em marcas e influenciadores digitais;
Mensuração e acompanhamento das estratégias comerciais em diferentes ambientes, como a televisão e as redes sociais;
Mapeamento e análise de crises de imagem;
Proposta de métricas de retorno das ações comerciais dos influenciadores digitais;
Processo de construção da marca do influenciador digital oriundo de um reality show.
Questões para discussão do caso
Para a preparação da aula, o docente pode utilizar as questões abaixo, para interação
com os alunos e discussão de pontos-chave do caso:
PLANO DE ENSINO SUGERIDO
Para o melhor aproveitamento da temática em gestão de marketing e gerenciamento de crise de imagem em influenciadores digitais é recomendado que o professor organize a discussão em quatro partes. A primeira parte da aula, com duração de 40 minutos, deverá estar concentrada na explicação sobre o que é uma crise de imagem e os passos básicos para encontrá-la. É recomendável que o professor aborde:
1. O que é uma crise?
2. Discutir o que é uma crise de imagem e como encontrá-la. Para uma discussão mais clara, recomenda-se a leitura dos artigos de Falkheimer e Heide (2006); Gruber, Smerek, Thomas-Hunt e James (2015); Ji, Liu e Austin (2014); Zhu, Anagondahalli e Zhang (2017). Os estudos irão ajudar o professor na preparação e no relato de outras experiências de gestão de crise em redes sociais;
3. É recomendada a leitura do caso de ensino pelos alunos e sua discussão, em grupos de 3 a 5 pessoas, sobre as estratégias iniciais para a construção da imagem de Fernanda, e ainda, como a gestão de crise ajudou nos conflitos relacionados à “intolerância religiosa” e sua expulsão do primeiro reality;
5. Discutir sobre monitoramento, como forma de prevenção, e como é determinante identificar o perfil dos seguidores, em que rede social se encontram, e o que consomem de conteúdo on-line. Desta forma, perceber os movimentos e as redes sociais que devem ser monitoradas, de acordo com o perfil dos seguidores do(a) influenciador(a). Explorar o uso de ferramentas de controle, citar exemplos práticos de monitoramento, tais como as aplicações Keyhole, Sprout Social e Social Bakers;
6. Expor como o reconhecimento ágil dos problemas de imagem, a falta de empatia entre personas e público-alvo, e a manutenção do canal de comunicação aberto com seu cliente/espectador, pode transformar crises em oportunidades. É fundamental citar algum exemplo atualizado que situe os alunos;
7. Por fim, questionar se as estratégias adotadas no primeiro reality de Fernanda poderiam funcionar caso houvesse uma nova participação. Pedir para que os alunos se questionem, de forma individual, como isso poderia ocorrer, na possibilidade de usar estratégias similares.
Na segunda parte da aula, com duração de 20 minutos, os discentes deverão discutir, dentro do grupo, sobre as estratégias adotadas na gestão de crise, no caso de Fernanda. É recomendável usar o diagrama de definição de estratégia de resposta para desenhar o problema e identificar o tipo de crise, a natureza e a reação do público. É esperado que, com esta discussão, os grupos estejam preparados para a terceira etapa da aula, momento em que os alunos montarão alternativas àquelas propostas pela equipe da Fernanda.
Na terceira etapa da aula, ao terminarem a leitura e discutirem o caso de ensino, os alunos já estarão cientes dos fatores que motivaram a crise de imagem de Fernanda e como sua equipe de marketing resolveu a situação e impulsionou seu faturamento, utilizando a crise para reconstruir sua imagem perante seu público-alvo. Os alunos serão orientados a utilizar a ferramenta Social Media Canvas para criarem alternativas para resolver a crise de imagem de Fernanda. Será entregue um Canvas de exemplo preenchido (Figura 4) com o contexto apresentado no caso de Fernanda. Desta forma, os alunos poderão visualizar, de forma prática, como deverão preencher os campos e criar soluções alternativas para a crise. O Social Media Canvas será o norteador para docente e alunos, na discussão de aspectos principais do caso, e claro, contribuição com a discussão para que os alunos possam ter ideias de estratégias que poderiam ser seguidas. A Figura 5 apresenta uma versão em branco do Social Media Canvas.
Esta etapa terá duração de 50 minutos, para que os alunos possam desenhar o Social Media Canvas e discutir com seu grupo novas possibilidades para resolver a crise de imagem de Fernanda, a partir do seguinte foco:
▪ Direcionar a narrativa da agressão para torná-la mais palpável para o público de Fernanda;
▪ Desvincular a imagem de Fernanda com a agressão;
▪ Preparar sua imagem como influenciadora para atuar no mercado de moda e beleza;
▪ Desenvolver estratégias de conteúdo pautadas pelo objetivo de marketing, para elevar e potencializar o faturamento de Fernanda.
O Social Media Canvas será rascunhado durante a aula, com orientação do professor, que proverá exemplos práticos do caso da celebridade ou influenciador narrado na sala, traçando paralelos com a situação de Fernanda. Os grupos poderão trocar informações e hipóteses para incrementar a discussão e tornar a elaboração do Canvas mais dinâmica.
A quarta e última etapa consistirá no preenchimento do Canvas que deverá acontecer fora do ambiente escolar para os alunos aprofundarem as sugestões que resolveriam a crise de imagem de Fernanda. Os grupos deverão apresentar o Social Media Canvas e suas sugestões para resolver as questões propostas à condição de Fernanda na aula seguinte. Cada grupo terá cerca de 25 minutos para apresentar o proposto em grupo, porém, é recomendável que este tempo seja ajustado, de acordo com a quantidade de grupos que apresentarão o trabalho. Ao final das apresentações, os alunos deverão ser questionados pelo professor sobre as principais dificuldades enfrentadas ao suporem um possível resultado para as ações propostas e como impactam de forma direta no faturamento.
3. É recomendada a leitura do caso de ensino pelos alunos e sua discussão, em grupos de 3 a 5 pessoas, sobre as estratégias iniciais para a construção da imagem de Fernanda, e ainda, como a gestão de crise ajudou nos conflitos relacionados à “intolerância religiosa” e sua expulsão do primeiro reality;
Alternativas para Análise do Caso/Análise teórica
Obtenção dos dados do Caso de Ensino
As coletas de dados no perfil de Fernanda ocorreram desde a entrada no referido programa televisivo baseado na vida real, até meados do ano de 2020. Além dos dados coletados no Instagram, foram realizadas pesquisas com amostras de seus seguidores, para ajudar na construção das estratégias.
As estratégias iniciais foram montadas pela agência, em conjunto com um membro da família, buscando levantar informações sobre o comportamento e a personalidade de Fernanda para criar a persona que seria explorada nas redes sociais. Com o decorrer do programa, novas ações foram tomadas para adaptar as estratégias iniciais às narrativas que foram se desenvolvendo. A última etapa foi uma entrevista e posterior alinhamento das estratégias para o pós-reality de Fernanda.
Desfecho do Caso
Após a expulsão, a equipe continuou buscando indicadores para manter o crescimento de Fernanda e a aderência de seu público. Dessa forma, os contratos negociados, com foco em vendas, por meio das publicidades em seu Instagram, tendem a gerar mais resultados para os contratantes, o que gera uma repercussão positiva sobre a conversão em vendas no perfil de Fernanda. Ao optar por otimizar as vendas dos contratantes, a equipe de marketing limitou a equipe comercial e os possíveis contratantes a terem um perfil analisado antes do fechamento de parcerias, pois, com esse critério, o match (cruzamento de informações) entre o público de Fernanda e o das empresas que a contrata tende a ser mais assertivo.
Fernanda, após sua expulsão, investigou, com sua equipe, possíveis nichos nos quais seu perfil de conteúdo mais se encaixava e, dentre os listados, optou por seguir dentro do nicho de beleza e moda, produzindo conteúdos afins. A opção por tais segmentos visava ao maior lucro, pois se percebeu uma maior procura de parcerias por empresas desses ramos. Outro fator foi a identificação com os temas e a aderência do público.
Atualmente, são feitas pesquisas periódicas em seu perfil para que o material produzido se adeque às características de sua audiência e são coletadas informações de vendas de seus contratantes, constantemente, para comprovar a eficácia de seu conteúdo, além das visualizações e curtidas em sua página no Instagram.
REFERÊNCIAS
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