Artigo original

AVALIAÇÃO DA INFRAESTRUTURA DAS UNIDADES DE SAÚDE DA FAMÍLIA E EQUIPAMENTOS PARA AÇÕES NA ATENÇÃO BÁSICA

EVALUACIÓN DE LA INFRAESTRUCTURA DE LAS UNIDADES DE SALUD DE LA FAMILIA Y DE LOS EQUIPOS PARA ACCIONES EN LA ATENCIÓN BÁSICA

Kênia Souto Moreira
Faculdades Integradas Pitágoras, Brasil
Cássio de Almeida Lima
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Brasil
Maria Aparecida Vieira
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil
Simone de Melo Costa
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil

AVALIAÇÃO DA INFRAESTRUTURA DAS UNIDADES DE SAÚDE DA FAMÍLIA E EQUIPAMENTOS PARA AÇÕES NA ATENÇÃO BÁSICA

Cogitare Enfermagem, vol. 22, núm. 2, e51283, 2017

Universidade Federal do Paraná

Recepção: 17 Março 2017

Aprovação: 22 Maio 2017

RESUMO: Objetivou-se avaliar a infraestrutura das unidades de saúde da família e os equipamentos para ações na Atenção Básica. Pesquisa quantitativa, transversal analítica, realizada em 2014 em cidade polo de Minas Gerais, com avaliação de subdimensão da Autoavaliação para Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica, de 75 equipes. A classificação da subdimensão situou-se no padrão insatisfatório para 48% das unidades. São poucas as unidades com total adequação para: ações em saúde (5,3%), atendimento com privacidade (9,3%), disposição de telefone e internet (1,3%), recursos para atender urgência e emergência (1,3%), veículo oficial para ações externas (4%), identificação visual das dependências e dos profissionais (4%). A disposição de telefone e internet apresentou maior média para zona urbana e disposição de veículo oficial foi maior para zona rural (p<0,05). A qualidade da infraestrutura e dos equipamentos obteve avaliação predominantemente negativa pelas equipes, limitando a consolidação da Atenção Básica.

Palavras chave: Serviços de saúde, Avaliação de serviços de saúde, Qualidade da assistência à saúde, Estratégia saúde da família, Atenção primária à saúde.

RESUMEN: Estudio cuyo objetivo fue evaluar la infraestructura de las unidades de salud de la família, así como los equipos para acciones en la Atención Básica. Investigación cuantitativa, transversal analítica, realizada en 2014 en ciudad polo de Minas Gerais, por medio de evaluación de subdimensión de la Autoevaluación para Mejorar el Acceso y la Cualidad de la Atención Básica de 75 equipos. Se evaluó la clasificación de la subdimensión como insatisfactoria para 48% de las unidades. Fueron pocas unidades con total adecuación para: acciones en salud (5,3%), atendimiento con privacidad (9,3%), disposición de teléfono e internet (1,3%), recursos para atender urgencias y emergencias (1,3%), vehículo oficial para acciones externas (4%), identificación visual de las dependencias y de los profesionales (4%). La disposición de teléfono e internet presentó media mayor para zona urbana y hubo más disposición de vehículo oficial en el ámbito rural (p<0,05). La evaluación de la cualidad de la infraestructura y de los equipos por los profesionales fue predominantemente negativa, limitándose la consolidación de la Atención Básica.

Palabras clave: Servicios de salud, Evaluación de servicios de salud, Cualidad de la asistencia a la salud, Estrategia Salud de la familia, Atención primaria a la salud.

INTRODUÇÃO

A expansão da Estratégia Saúde da Família (ESF) coloca em discussão questões sobre qualificação das equipes de saúde, resolubilidade dos serviços e necessidade de monitorar e avaliar a Atenção Básica (AB). Para isso, o Ministério da Saúde brasileiro passa a defender o aprimoramento contínuo de processos avaliativos na rotina da gestão e dos serviços de saúde pública. A Política de Monitoramento e Avaliação da AB instituiu a Autoavaliação para Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (AMAQ), em conjunto com estados e municípios, estabelecendo a avaliação como instrumento permanente para a tomada de decisões e a qualidade como um atributo fundamental a ser alcançado no Sistema Único de Saúde (SUS)(1-4).

Nesse contexto, a AMAQ analisa, entre outras dimensões, a infraestrutura e os equipamentos indispensáveis para o desenvolvimento das ações na AB. Ressalta-se que a estrutura física adequada e a disponibilidade de equipamentos e materiais, com os recursos necessários para a execução de ações em saúde e em correspondência quantitativa ao contingente populacional adscrito e suas especificidades, é de fundamental importância para organização dos processos de trabalho e atenção à saúde dos usuários, a fim de se oferecer uma assistência de melhor qualidade(1).

No entanto, na prática em saúde da família evidencia-se uma necessidade de aprimoramento das características físico-estruturais e de obtenção de equipamentos e materiais requeridos para a realização das práticas em saúde. As deficiências estruturais das unidades repercutem em insatisfação dos profissionais das equipes de saúde da família. Isso porque o modelo de assistência proposto na ESF se coloca a favor de uma assistência integral ao indivíduo, à família e à comunidade, o que requer condições estruturais mínimas necessárias para a execução das ações que ultrapassam o modelo biomédico(5-6).

Sendo assim, a estrutura deve ser valorizada na avaliação dos serviços de Atenção Primária à Saúde. A avaliação da infraestrutura e dos equipamentos constitui instrumento importante na prática gerencial(7). Deve ser estimulada e seus conhecimentos aplicados e discutidos no sentido de aumentar o desempenho e o impacto das ações na AB junto à saúde da população(4,8-9). Desse modo, os estudos poderão subsidiar o aprofundamento do conhecimento da realidade específica das unidades de saúde para o planejamento de intervenções que possam melho¬rar as condições de atendimento(5,10). Torna-se importante aferir a autoavaliação das equipes sobre suas unidades de saúde por meio do instrumento da AMAQ, o qual permite identificar as subdimensões que exigem maior atenção e intervenção da gestão(2-4).

Este estudo teve como objetivo avaliar a infraestrutura das unidades de saúde da família e os equipamentos para ações na Atenção Básica.

MÉTODO

Trata-se de estudo com abordagem quantitativa, desenho transversal e analítico. Teve como cenário a cidade polo do Norte do estado de Minas Gerais, Montes Claros. Conforme censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o contingente populacional do município foi estimado em 394.350 mil habitantes(11).

O estudo foi conduzido com dados de todas as 75 equipes de saúde da família, da zona urbana e rural, cadastradas no município. Os dados foram coletados em 2014, a partir do instrumento AMAQ, em site do Ministério da Saúde, sendo os arquivos impressos e disponibilizados por técnicos da secretaria municipal de saúde.

AMAQ é um instrumento referente à segunda fase de desenvolvimento do Programa de Monitoramento e Avaliação de Qualidade (PMAQ). É uma ferramenta de avaliação de serviços de saúde gerada a partir de instrumentos validados, nacionalmente e internacionalmente, e foi utilizada pelo Ministério da Saúde brasileiro. O instrumento é composto por duas dimensões e subdimensões relacionadas à equipe de atenção básica, com análise independente. Neste estudo, analisou-se a subdimensão Infraestrutura e Equipamentos, integrante da dimensão Unidade Básica de Saúde (UBS)(1).

A subdimensão avaliada considerou oito padrões de qualidade da UBS:

Cada item permite avaliar o grau de adequação da infraestrutura das unidades de saúde e os equipamentos indispensáveis para as ações na AB ao padrão de qualidade apresentado, em escala que varia de zero a 10 pontos, sendo zero o não cumprimento ao padrão e 10 a total adequação. Os pontos são somados para classificar a equipe em resultados muito insatisfatório, insatisfatório, regular, satisfatório e muito satisfatório, conforme zero-15 pontos, 16-31, 32-47, 48-63 e 64-80, respectivamente. Quanto maior a pontuação, melhor a classificação da equipe(1). Além das oito questões do AMAQ, coletou-se informação acerca das equipes de saúde da família quanto à localização: urbana ou rural.

A análise estatística foi realizada por meio do software IBM Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) Statistics, versão 22.0. A descrição dos resultados foi apresentada em valores percentuais, médias, desvio padrão, moda e percentis. Realizaram-se análises bivariadas para comparar as proporções de equipes em cada padrão de qualidade (muito insatisfatório a muito satisfatório) conforme localização (urbana, rural) pelo teste Likelihood ratio, alternativo do qui-quadrado de Pearson. Verificou-se a normalidade da distribuição dos dados pelo teste Kolmogorov Smirnov. Todas as oito questões de avaliação de qualidade apresentaram p<0,05, ou seja, dados não paramétricos. E, para a questão do somatório dos pontos na subdimensão obteve-se o valor p=0,464. Sendo assim, utilizou-se o teste Mannn Whitney para comparar as médias das questões e o teste t student para comparar as médias do somatório de pontos conforme localização rural ou urbana. Todos os testes consideraram o nível de significância p<0,05.

A pesquisa foi conduzida em conformidade com as normas regulamentadoras das pesquisas envolvendo seres humanos. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Montes Claros, Parecer Consubstanciado nº 704.718/2014. O projeto também obteve concordância institucional da Secretaria Municipal de Saúde.

RESULTADOS

Para as oito questões integrantes da subdimensão avaliada pelas equipes, observou-se que apenas quatro (5,3%) equipes avaliaram a adequação das UBS com a pontuação 10; a falta de qualquer manutenção regular e sistemática foi destacada por 22 (29,3%); assim como de telefone e internet, 14 (18,7%); e a falta total de adequação da UBS para atender deficientes, analfabetos e idosos foi constatada para 15 (20%) das equipes (Tabela 1).

Tabela 1
Descrição dos pontos aos oito padrões de qualidade da subdimensão Infraestrutura e Equipamentos da Unidade Básica de Saúde. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Descrição dos pontos aos oito padrões de qualidade da subdimensão Infraestrutura e Equipamentos da Unidade Básica de Saúde. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Fonte: Dados da autoavaliação para melhoria do acesso e da qualidade da atenção básica, 2014.

No somatório da pontuação na subdimensão, por equipe, observou-se neste estudo uma variação de quatro a 55 pontos, com média igual a 30,84 (±11,784) pontos por equipe. Entre as oito questões, a menor média entre as equipes foi para a questão deslocamento dos profissionais para realização de atividades externas programadas por meio de veículo oficial, 1,33 (±2,974); enquanto a maior média foi para unidade dispõe de identificação externa e interna nas suas dependências, 6,27 (±2,632) (Tabela 2).

Tabela 2
Valores médios e separatrizes dos pontos obtidos nas oito questões de avaliação de Infraestrutura e Equipamentos na Unidade Básica de Saúde. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Valores médios e separatrizes dos pontos obtidos nas oito questões de avaliação de Infraestrutura e Equipamentos na Unidade Básica de Saúde. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Fonte: Dados da autoavaliação para melhoria do acesso e da qualidade da atenção básica, 2014.

A classificação da subdimensão em padrões de qualidade foi insatisfatória para 36 (48%) das UBS (Tabela 3).

Tabela 3
Classificação da subdimensão Infraestrutura e Equipamentos da Unidade Básica de Saúde. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Classificação da subdimensão Infraestrutura e Equipamentos da Unidade Básica de Saúde. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Fonte: Dados da autoavaliação para melhoria do acesso e da qualidade da atenção básica, 2014.

Não houve diferença significativa entre as médias de pontos obtidos na subdimensão avaliada conforme a localização das equipes, na zona rural a média foi 31,09 (±10,949) pontos e na zona urbana 30,80 (±12,003) pontos, p=0,940. Com relação às diferentes questões da subdimensão, conforme localização da UBS, constatou-se que a disposição de telefone e internet apresentou maior média para zona urbana, enquanto a disposição de veículo oficial para deslocamento dos profissionais para ações externas programadas foi maior para zona rural (p<0,05), conforme descrito na Tabela 4.

Tabela 4
Comparação das médias de pontos nas questões de avaliação de Infraestrutura e Equipamentos na Unidade Básica de Saúde conforme localização urbana ou rural. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Comparação das médias de pontos nas questões de avaliação de Infraestrutura e Equipamentos na Unidade Básica de Saúde conforme localização urbana ou rural. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Fonte: Dados da autoavaliação para melhoria do acesso e da qualidade da atenção básica, 2014.

Não houve associação entre classificação na subdimensão Infraestrutura e Equipamentos das Unidades Básicas de Saúde e localização urbana ou rural (p=0,478). Tanto na zona urbana como na rural o maior percentual foi para UBS com padrão de qualidade insatisfatório, 29 (45,3%) e sete (63,6%), respectivamente (Tabela 5).

Tabela 5
Classificação da subdimensão Infraestrutura e Equipamentos da Unidade Básica de Saúde conforme localização urbana ou rural. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Classificação da subdimensão Infraestrutura e Equipamentos da Unidade Básica de Saúde conforme localização urbana ou rural. Equipes de saúde da família. Montes Claros, MG, Brasil, 2014
Fonte: Dados da autoavaliação para melhoria do acesso e da qualidade da atenção básica, 2014.

DISCUSSÃO

O presente estudo evidenciou uma avaliação majoritariamente negativa quanto aos equipamentos e à infraestrutura das unidades de saúde da família, por parte das equipes de saúde da família. Na literatura recente sobre a temática, as pesquisas apontam resultados similares aos observados neste trabalho(2-6,8,10,12-14).

A infraestrutura frágil e a insuficiência de recursos materiais, além de com¬prometer o desenvolvimento e a qualidade das ações da AB, geram insatisfação nos profissionais e limitam as potencialidades de ampliação do elenco de ações na perspectiva da reorganização das práticas e do modelo de atenção à saúde(10). Demonstrou-se na atual pesquisa que apenas 9,3% das equipes consideraram que a UBS está em total adequação para permitir o atendimento individual com privacidade. Em uma revisão sistemática, identificou-se que a falta de espaço físico adequado nas unidades tem levado à ausência de privacidade no diálogo com os usuários. Ademais, a carência de equipamentos e recursos materiais interfere na continuidade do atendimento e ocasiona condições de trabalho desfavoráveis(15).

Em investigação de abrangência nacional, conduzida em 38.812 unidades básicas de saúde e 17.202 equipes de saúde participantes do PMAQ, com foco na adequação da estrutura na prevenção do câncer de colo de útero, a prevalência de adequação da estrutura foi 49%. Tal prevalência foi maior entre as unidades cujo modelo assistencial era a ESF e entre aquelas que haviam aderido ao PMAQ (61%)(16). Outra pesquisa, realizada em 55 unidades da ESF de Cuiabá-MT, mostrou que a maioria das unidades contemplava quesitos de infraestrutura física e de oferta de ações no pós-parto(17).

As falhas na infraestrutura e disponibilidade de insumos revelam ser necessário investir na melhoria da estrutura organizacional para que se agregue mais qualidade ao cuidado em saúde. Ressaltou-se em outro estudo que a disponibilidade de insumos e equipamentos na unidade de saúde foi o fator mais fortemente associado à melhor performance e ao desempenho mais adequado da AB, em Belo Horizonte-MG(18).

Muitos serviços de saúde são instalados em prédios improvisados, que estão disponíveis nas comunidades e não possuem uma construção específica para atender aos usuários e aos profissionais de saúde, que esteja em conformidade com a legislação específica(14). Grande parte das unidades básicas de saúde funciona em locais alugados, de modo que não se podem promover reformas(12,17).

Ainda, foi preocupante a avaliação que os profissionais de saúde da família atribuíram à disponibilidade de linha telefônica e equipamentos de informática com acesso à internet, aos quais devem ter livre acesso. Achado ainda mais alarmante foi observado quanto à presença de veículo oficial para deslocamento para ações externas, sendo que 78,7% dos profissionais indicaram pontuação zero para esse item. Similarmente, na avaliação da ESF em Campina Grande-PB, o trabalho burocrático não estava informati¬zado em nenhuma das unidades de saúde(8). Essa deficiência anula as possibilidades de ganho advindo do uso das ferramentas eletrônicas destinadas ao armazenamento, organização, acesso e disponibilização da informação. E parte considerável do tempo dos profissionais acaba sendo ocupado, em detrimento de outras atividades, o que compromete a disponibilidade para a assistência ao usuário, impactando negativamente na qualidade do cuidado(8).

O atual estudo constatou maior média de pontuação para disposição de linha telefônica e internet na zona urbana, e maior média de pontos para disposição de veículo oficial para deslocamento dos profissionais para ações externas programadas na zona rural. Esses resultados podem ser claramente elucidados pelo fato de que na área urbana há uma maior disponibilidade e acesso aos meios de comunicação e internet. Já, na zona rural, onde a organização territorial assume características específicas que demarcam maior distância entre as unidades de saúde e os domicílios, é uma condição mínima a presença de um automóvel para que as equipes possam realizar suas atividades.

Outro importante item avaliado na subdimensão infraestrutura e equipamentos é se a unidade de saúde dispõe de materiais e equipamentos necessários ao primeiro atendimento, nos casos de urgência e emergência. Nesse item, também predominou a avaliação negativa. Tem-se como hipóteses desse achado o baixo investimento destinado à aquisição de equipamentos para a AB, como também o caráter histórico dos atendimentos de urgência e emergência, comumente realizados apenas em hospitais e ambulatórios especializados. Em outro estudo conduzido na macrorregião Nordeste do estado de Minas Gerais(4) apresentaram-se essas deficiências estruturais nas unidades básicas de saúde.

Sendo assim, é necessário intervir nesse aspecto, a fim de viabilizar o atendimento das equipes e, consequentemente, o aumento da resolubilidade da ESF(4). É válido ressaltar que, como a ESF constitui a porta de entrada do sistema de saúde, suas unidades devem estar equipadas para uma primeira abordagem nas situações de urgência e emergência. Ainda mais que, atualmente, o número de usuários portadores de doenças crônicas não transmissíveis tem aumentado consideravelmente, e esses pacientes poderão apresentar complicações, quadros de urgência e emergência, que irão requerer intervenções e ações iniciais no serviço da AB.

Neste estudo, verificou-se falta total de adequação das unidades de saúde para atender usuários portadores de deficiência, analfabetos e idosos para 20% das equipes. Resultado que merece atenção, pois os serviços de saúde da família devem garantir o amplo acesso e a acessibilidade da comunidade. Em Campina Grande(8) e João Pessoa(14), também constatou-se essa fragilidade. Como qualquer outro grupo populacional, as pessoas com deficiência necessitam de acesso à saúde. De acordo com a Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência, tanto a AB quanto os serviços de média e alta complexidade devem promover uma ampla cobertura no atendimento a esses usuários(14).

Pesquisas internacionais também enfatizam a necessidade de melhorias na acessibilidade, pois a dificuldade ou impossibilidade de entrar em um estabelecimento é uma razão de pacientes com deficiência não procurarem os serviços de saúde(19-21). Estudo realizado na Índia, com 839 pessoas com deficiência e 1153 sem deficiência, mostrou que aquelas com deficiência apresentaram uma necessidade de busca por serviços de saúde maior em comparação com as sem deficiência(20).

Desse modo, em detrimento à impossibilidade do acesso ao serviço de saúde, esses usuários podem se tornar mais suscetíveis a doenças, como também retardar o tratamento quando já estão instaladas. Então, para se promover o acesso universal, é fundamental que as unidades de saúde disponham de adaptações ambientais adequadas(14). Também devem dispor de materiais, equipamentos e instrumentos adequados para a promoção do acolhimento e da atenção humanizada e integral a pessoas com deficiência e/ou com mobilidade reduzida, analfabetos e idosos. Isso corresponde à ampliação do acesso, equidade e maior qualificação da atenção prestada(1).

Face à avaliação das unidades de saúde da família apresentada neste estudo, observa-se que se trata de ter em mãos um sistema de saúde ideal, mas que necessita da operacionalização de suas formulações no cotidiano de suas ações(3). Tal realidade suscita preocupações quanto à qualidade da expansão da ESF induzida nacionalmente. Uma provável explicação é que municípios de pequeno e médio porte encontram dificuldades no financiamento e na gestão local de seus sistemas de saúde, sendo necessária a consideração dos contextos específicos em que as políticas são implementadas(6).

Todavia, mesmo que infraestrutura, equipamentos e insumos da ESF tenham sido foco de atenção, recentemente, por parte de governantes e gestores, as deficiências encontradas devem ser efetivamente gerenciadas por estes(12,22).

Nesse contexto, espera-se que este trabalho forneça aos gestores uma avaliação que subsidie o planejamento de ações que retifiquem as inadequações encontradas nas unidades de saúde e permita uma visão da operacionalidade da AB, das facilidades e dos nós críticos que afetam a boa qualidade da atenção. Entretanto, este estudo possui limitações. Trata-se de uma pesquisa com delineamento transversal circunscrita ao cenário das unidades da ESF de um município. Não foram utilizadas técnicas de observação direta, mas, sim, analisados dados oriundos da autoavaliação das equipes de saúde da família.

CONCLUSÃO

A qualidade da infraestrutura das unidades de saúde e dos equipamentos para ações na AB obteve uma avaliação predominantemente negativa pelas equipes de saúde da família. Evidenciaram-se fragilidades que requerem maior atenção: disponibilidade de linha telefônica e equipamentos de informática com acesso à internet, veículo oficial para deslocamento; materiais e equipamentos para a assistência inicial nas situações de urgência e emergência; e inadequação das unidades para atender portadores de deficiência, analfabetos e idosos.

A infraestrutura frágil e a insuficiência de recursos materiais foram uma realidade constatada no cenário avaliado, também verificada nos cuidados primários de saúde no Brasil. As inadequações das unidades de saúde prejudicam o desenvolvimento das ações na AB, a qualidade do cuidado e geram insatisfação nos profissionais e nos usuários. E limitam o potencial dos serviços para a consolidação da ESF, na perspectiva da reorganização de práticas centradas na tríade indivíduo-família-comunidade e na qualidade da atenção à saúde.

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Autor notes

Autor Correspondente: Cássio de Almeida Lima. Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Rodovia MGT 367 - Km 583, 5000 - 39100-000 - Diamantina, MG, Brasil. E-mail: cassioenf2014@gmail.com

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