Artigo original

PANORAMA DA DENGUE NA REGIÃO SUL DO BRASIL DE 2001 A 2017*

PANORAMA DE LA DENGUE EN LA REGIÓN SUR DE BRASIL DE 2001 A 2017

Andréia Dalla Vecchia
Universidade do Oeste de Santa Catarina, Brasil
Vilma Beltrame
Universidade do Oeste de Santa Catarina, Brasil
Fernanda Maurer D’ Agostini
Universidade do Oeste de Santa Catarina, Brasil

PANORAMA DA DENGUE NA REGIÃO SUL DO BRASIL DE 2001 A 2017*

Cogitare Enfermagem, vol. 23, núm. 3, e53782, 2018

Universidade Federal do Paraná

Recepção: 07 Julho 2017

Aprovação: 15 Janeiro 2018

Objetivo: inventariar casos notificados por dengue clássica e óbitos na região Sul do Brasil entre 2001 e 2017.

Método: estudo descritivo-retrospectivo a partir de dados secundários do DATASUS/SINAN e das Secretarias de Saúde, analisados através de estatística descritiva.

Resultados: observou-se aumento dos casos nos três estados: Paraná (PR) elevou casos autóctones para 94% nos últimos quatro anos, Santa Catarina (SC) para 95%, e Rio Grande do Sul (RS) para 83%, respectivamente, em 2015 e 2016. Observou-se crescente aumento de óbitos por dengue hemorrágica, principalmente no PR; em 2016, o primeiro óbito em SC; e aumento nos últimos dois anos no RS, mais de 90% em adultos.

Conclusão: a região requer atenção dos órgãos de saúde, devido ao aumento de casos e óbitos por dengue, embora apresente a menor incidência da doença do país. Este estudo contribuiu para o conhecimento do cenário atual e da evolução da dengue na região Sul do Brasil.

DESCRITORES: Notificação de doenças+ Mortalidade+ Morbidade+ Epidemias+ Arbovírus.

ABSTRACT

Objetivo: inventariar casos notificados por dengue clásica y óbitos en la región Sur de Brasil entre 2001 y 2017.

Método: estudio descriptivo retrospectivo con base en datos secundarios del DATASUS/SINAN y de las Secretarías de Salud, analizados por medio de estadística descriptiva.

Resultados: se observó crecimiento de los casos en los tres estados: Paraná (PR) tuvo elevación de casos autóctonos para 94% en los últimos cuatro años, Santa Catarina (SC) para 95%, y Rio Grande do Sul (RS) para 83%, respectivamente, en 2015 y 2016. Se observó todavía creciente aumento de óbitos por dengue hemorrágico, principalmente en PR; en 2016; el primero óbito en SC; y crecimiento en los últimos dos años en RS, más de 90% en adultos.

Conclusión: la región necesita atención de los organismos de salud, a causa del crecimiento de casos y óbitos por dengue, a pesar de presentar la menor incidencia de la enfermedad del país. Este estudio contribuyó para el conocimiento del escenario actual y de la evolución de la dengue en la región Sur de Brasil.

DESCRIPTORES: Notificación de enfermedades, Mortalidad, Morbilidad, Epidemias, Arbovirus.

INTRODUÇÃO

A dengue é uma doença viral transmitida por mosquitos da família Culicidae, de grande importância em saúde pública. O vírus da dengue (DENV) é constituído de genoma RNA, cadeia simples, e 4 sorotipos distintos (DENV 1, 2, 3 e 4) pertencentes ao gênero Flavivirus e à família Flaviviridae.(1) A transmissão do vírus ocorre exclusivamente pela picada da fêmea do mosquito Aedes, principalmente da espécie Aedes Aegypti infectada. Pode causar doença febril com sintomas que surgem entre 3 e 14 dias após a picada. A infecção ocasiona doença de amplo espectro clínico, variando desde assintomática, infecções por febre clássica da dengue (FD), até casos graves de febre hemorrágica da dengue (FHD), podendo evoluir para óbito.(1)

Até o momento, não há medicamento específico para tratar a dengue,(2) e esta vem emergindo como uma das doenças mais infecciosas do século XXI,(1,3) cerca de três vezes maior do que o estimado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Sua transmissão é ubíqua ao longo dos trópicos, com as maiores zonas de risco nas Américas e na Ásia.(4)

A crescente ameaça global de surtos de dengue requer atenção na gestão eficaz destes eventos.(2) Segundo a OMS, 50 milhões de pessoas são infectadas pelo vírus a cada ano e cerca de 1/3 da população mundial vive em áreas de risco.(1) Estimativas apontam elevado número de casos no Brasil, contribuindo com maior número nas Américas (39%), aproximando-se de 2,1 milhões de casos, no período de 2000 a 2007.(5)

No Brasil, os primeiros relatos ocorreram no final do século XIX e início do século XX nas cidades de Curitiba (PR) e Niterói (RJ). No início do século XX, o mosquito já era um problema de saúde, mas não decorrente da dengue e sim preocupações com transmissão da febre amarela. Em 1955 o A. aegypti foi erradicado, mas em 1960 ocorreu a reintrodução do vetor no território nacional.(6) A primeira ocorrência de surto de dengue no Brasil ocorreu na década de 1980, em Boa Vista (Roraima), onde os sorotipos DEN-1 e DEN-4 foram isolados.(7) Em 1986 houve epidemias no Rio de Janeiro (RJ) e em algumas capitais do nordeste. Atualmente, o vetor e a dengue são encontrados em todos os estados brasileiros.(6,8)

As condições climáticas, como elevada precipitação, clima quente e úmido em grande parte do território nacional, favorecem a proliferação e distribuição de culicídeos, insetos vetores que são determinantes para a manutenção do complexo ciclo de infecção dos arbovírus e variação da incidência de casos de dengue,(8-9) embora a região sul seja caracterizada pela ocorrência de períodos alternados de clima frio e moderado. Casos de dengue têm sido registrados em populações urbanas, onde a alta densidade demográfica e a curta distância para o voo do vetor são condições favoráveis para a transmissão viral.(10)

Assim, este estudo objetivou identificar número de casos notificados e óbitos por dengue hemorrágica, ocorridos anualmente nos estados do sul do Brasil (PR, SC e RS) no período de janeiro de 2001 a novembro de 2017, tendo em vista que a região sul tem apresentado (estudo de 2002 a 2012) a menor taxa de incidência da doença em comparação com outras regiões do país.(11)

MÉTODO

Estudo descritivo-retrospectivo, a partir de dados secundários obtidos de registros de notificação de casos de dengue clássica e óbitos por dengue hemorrágica, para as três unidades da federação da região sul do Brasil, PR, SC e RS.

As informações foram coletadas no período de dezembro de 2016 a fevereiro de 2017 e atualizadas em novembro de 2017. Obtiveram-se dados para dengue clássica através da pesquisa, usando código internacional de doença (CID A90), e para óbito por dengue hemorrágica devido ao vírus da dengue (CID A91).

No período de 2001 a 2016 a informação do número total de casos de dengue clássica anual foi obtida a partir da situação epidemiológica, planilha descrita “Casos de Dengue. Brasil, Grandes Regiões e Unidades Federadas, 1990 a 2016” disponibilizada no portal de saúde SUS, Ministério da Saúde (SINAN: Sistema de informação de agravos de notificação), o qual informa o número total de casos de dengue em todo país.(12-13)

Para o ano de 2017, o número de notificações para dengue clássica foi extraído de boletins epidemiológicos disponíveis na secretaria de saúde de cada estado,(14-16) devido à falta de dados atualizados no portal de saúde SUS.(12) Dados complementares como gênero (masculino e feminino), faixa etária (agrupadas: < 1 ano; 1 a 4 anos; 5 a 19 anos; 20 a 59 anos; > 60 anos) e número de casos autóctones foram extraídos da base do DATASUS (Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - Informações de Saúde TABNET, epidemiológicas e morbidades), no qual coletou-se a partir da opção “Doenças e Agravos de Notificação SINAN, 2001 a 2006 e 2007 em diante, no qual disponibiliza informação até o ano 2012.(13)

Dados não contemplados na base anteriormente citada foram obtidos em boletins epidemiológicos, bem como em informações do site da Secretaria de Saúde de cada estado.(14-16) Não foi possível estimar o número de casos autóctones para o ano de 2017 devido à insuficiência de informações. Para ambas as situações de casos de dengue clássica e registro de óbitos, pesquisou-se tendo como base o requisito por residência.

O número de casos de óbitos por dengue hemorrágica foi extraído da base DATASUS - Tecnologia da Informação a Serviço do SUS(17), que disponibiliza informações até o ano de 2015. Registros recentes (2016 até novembro de 2017) foram obtidos em site específico da Secretaria de Saúde de cada estado, explorando a opção TABNET ou em boletins epidemiológicos,(14-16) dos quais foram extraídos, armazenados e analisados utilizando planilhas de Excel. Organizou-se e analisaram-se as variáveis: estado (PR, SC e RS), período anual, faixa etária, gênero, casos autóctones, dengue clássica e óbito por dengue. Com base na quantificação para cada conjunto de variáveis obtiveram-se número absoluto e percentuais correspondentes.

Em se tratando de aspectos éticos, o estudo foi realizado a partir de dados secundários, oriundos de sites de domínio público, e não envolveu questões e autorização de comitês de ética.

RESULTADOS

Dengue clássica e óbitos decorrentes do vírus da dengue

Resultados para os casos de dengue clássica estão expressos nas Figuras 1, 2 e 3 e retratam o número de casos notificados de dengue e número de casos autóctones para os três estados do sul do Brasil. Avaliou-se a situação de casos autóctones a partir do ano de 2007, tendo em vista que anterior a isso não há registro na base consultada.

Número total de casos notificados de dengue clássica e registros autóctones no PR entre 2001 e novembro de 2017. Paraná, Brasil, 2017
Figura 1
Número total de casos notificados de dengue clássica e registros autóctones no PR entre 2001 e novembro de 2017. Paraná, Brasil, 2017
Número total de casos notificados de dengue clássica e registros autóctones em SC entre 2001 e novembro de 2017. Santa Catarina, Brasil, 2017
Figura 2
Número total de casos notificados de dengue clássica e registros autóctones em SC entre 2001 e novembro de 2017. Santa Catarina, Brasil, 2017
Número total de casos notificados de dengue clássica e registros autóctones no RS entre janeiro de 2001 e outubro de 2017. Rio Grande do Sul, Brasil, 2017
Figura 3
Número total de casos notificados de dengue clássica e registros autóctones no RS entre janeiro de 2001 e outubro de 2017. Rio Grande do Sul, Brasil, 2017

Tratando-se do estado do PR (Fig. 1), em média 71% dos registros foram considerados autóctones (transmissão dentro do estado de 2007 a 2012). Porém, nos últimos 4 anos (ano de 2017 não incluso) os dados representam 94%.

Para o estado de SC (Fig. 2), no período de 2007 a 2014, os dados revelam baixo número de casos autóctones (média de 4%). No entanto, pode-se verificar um aumento nos últimos dois anos, em que esta média elevou para 95% (não incluso ano de 2017). Observou-se também aumento de casos principalmente em 2015 e 2016, que se aproximou de 5.000 casos anual, enquanto nenhum período anual anterior ultrapassou 300 casos.

No RS (Fig. 3), em média (período 2007 a 2014) a taxa de casos autóctones atingiu 43% e nos últimos dois anos elevou a taxa de autóctone para 83% (exceto 2017). O maior número de casos de dengue foi em 2010 com mais de 3.500, e em 2016 com 3.195 notificações.

A Figura 4 representa o acometimento por dengue clássica nas diferentes faixas etárias ocorridos nos três estados. Em 80% dos casos indivíduos adultos foram afetados, e a faixa etária entre 20 e 59 anos apresentou a maior taxa de adoecimento por dengue clássica (70%). Em contrapartida, a menor faixa atingida são crianças com idade inferior a 1 ano (1%).

Percentual médio (%) de casos de dengue clássica por faixa etária nos três estados (PR, SC e RS) entre 2001 e 2016. Brasil, 2016
Figura 4
Percentual médio (%) de casos de dengue clássica por faixa etária nos três estados (PR, SC e RS) entre 2001 e 2016. Brasil, 2016

A Figura 5 retrata o número de óbitos ocorridos nas diferentes faixas etárias, por febre hemorrágica devido ao vírus da dengue, nos três estados. Para o ano de 2017, até o mês de novembro não há registro de óbitos devido à dengue hemorrágica (CID A91), conforme informações obtidas nos sites das Secretarias de Saúde do PR e de SC (TABNET) e para o RS em boletins epidemiológicos.

Número total de óbitos por dengue hemorrágica (CID A91) nas diferentes faixas etárias para PR, SC, RS, entre 2001 e novembro de 2017. Brasil, 2017
Figura 5
Número total de óbitos por dengue hemorrágica (CID A91) nas diferentes faixas etárias para PR, SC, RS, entre 2001 e novembro de 2017. Brasil, 2017

Em se tratando de óbitos por dengue hemorrágica, 72 casos foram registrados no período de 2001 a novembro de 2017. O estado do PR registrou maior número com 67 óbitos (93%), RS com 4 (5,6%) e SC com 1 (1,4%).

O estado do PR vem registrando casos de óbitos desde 2003, com maior destaque para 2013, em que registrou 14 óbitos, e em 2016, 20 óbitos (ano com maior notificação de dengue clássica). O RS teve 1 caso em 2001 e 3 casos entre 2015 e 2016, enquanto SC registrou o primeiro caso no primeiro semestre de 2016. Estes dados representam uma realidade bastante preocupante em questão de saúde pública, principalmente o estado do PR que liderou no número de óbitos, bem como SC que recentemente registra seu primeiro caso letal, e o RS que registrou aumento nos últimos dois anos. A ausência de registro de óbitos por dengue hemorrágica até novembro de 2017 representa sinais positivos do ponto de vista para a saúde pública.

Conforme figura 5, não houve registro de óbitos em crianças menores de 1 ano para os três estados, porém o PR registrou 7% dos óbitos em indivíduos entre 5 e 19 anos e 1% em crianças na faixa etária entre 1 e 5 anos.

DISCUSSÃO

Na avaliação geral para os três estados e em todo período não houve diferença de acometimento por dengue clássica, sendo igualmente (50%) para ambos os sexos.

Para o estado do PR, 2013 apresentou maior número de casos notificados, registrando aproximadamente 66 mil casos, colaborando com maior surto ocorrido no Brasil com aproximadamente 2 milhões de notificações.(18) Embora tenha ocorrido uma redução a partir de 2014 em relação ao ano anterior, verifica-se um aumento crescente e gradativo nos últimos três anos, e em 2016 com registro aproximado em 65 mil novos casos, semelhante ao ocorrido em 2013.

Em relação aos estados de SC e RS observou-se aumento para 95% e 83%, respectivamente, o registro de casos autóctones nos últimos dois anos. Embora o PR já apresentasse elevado registro autóctone no período 2007 a 2012 (71%), nos últimos 4 anos evoluiu para 94% dos casos de transmissão interna. Isto demonstra que os três estados estão contribuindo com aumento de casos de notificação na região. Estes dados parecem apontar para alterações da taxa de casos de dengue na região sul, que detém a menor taxa de notificação no território nacional (1,2%), sendo as regiões Nordeste e Sudeste predominantes com 85% dos casos.(11,19) Por outro lado, em 2017 houve importante redução do número de notificações por dengue clássica, apresentando, respectivamente, queda de 33%, 41% e 43% para PR, RS e SC em relação ao ano de 2016.

O aumento de casos autóctones observados nos três estados contraria a ideia inicial que o clima da região Sul com estações bem definidas e temperatura menor, média anual inferior a 20ºC, em relação às demais regiões com média superior a 20oC,(20) poderiam ser condições desfavoráveis para a proliferação do vetor,(21) tendo em vista que temperatura inferior a 20ºC interfere no desenvolvimento e na reprodução do mosquito, levando a uma redução dos casos.(6)

Determinantes para o aumento crescente, severidade e frequência das epidemias de dengue estão fortemente relacionada com variáveis meteorológicas. Assim, a variação sazonal da temperatura e da pluviosidade influenciam a dinâmica do vetor e a incidência da doença em todo o país, independente do compartimento climático,(3,9) bem como fatores relacionados ao histórico de imunidade, à introdução de novo sorotipo ou às transições demográficas influenciam a transmissão viral.(1)

Neste sentido, em território brasileiro, de acordo com informação do Ministério da Saúde, a transmissão vem ocorrendo desde meados de 1986, intercalando-se com a ocorrência de epidemias, frequentemente associadas com a introdução de novos sorotipos em áreas anteriormente indenes ou alteração do sorotipo predominante.(18)

Na região sul do país todas as faixas etárias foram acometidas, embora em percentuais diferentes. Enquanto na região sul, no Brasil e também em regiões da América, indivíduos adultos são predominantemente afetados,(21) em outras regiões do mundo como no sudeste asiático a dengue atinge principalmente crianças.(22)

Além disto, no estado do RJ durante epidemia em 2007, foi descrita uma mudança na distribuição etária da dengue, com aumento de casos em crianças.(23) No entanto, neste período avaliado, não se observou aumento de dengue em crianças na região sul.

Com isso, na tentativa de reduzir a disseminação da doença e seus agravantes, recentes notícias de veiculação nacional destacam o estado do PR, pioneiro no país, a realizar desde o segundo semestre de 2016, campanha de vacinação pública contra dengue em alguns municípios do estado. A introdução da vacinação poderá ser um forte aliado no combate à doença, bem como poderá reduzir o impacto na saúde pública em localidades onde a doença é endêmica.(25) Embora, medidas de controle do vetor com a participação dos cidadãos e do poder público devam permanecer constantes como alternativas de redução e disseminação da doença.

A fim de estimar os impactos da vacinação, pesquisadores conduziram um estudo no qual utilizaram diferentes dados de países endêmicos do continente asiático e latino-americano e observaram reduções significativas, após a introdução da vacina, nos casos de dengue na população durante os primeiros 10 anos.(25)

Neste contexto, estudos futuros devem ser realizados a fim de fornecer dados em relação aos impactos pós-vacinação, em diferentes populações e regiões onde a vacinação for introduzida, embora a vacina já tenha demonstrado segurança e imunogenicidade satisfatórias em testes pré-clínicos in vitro e in vivo e em estudos clínicos.(26)

Após longo período de pesquisas, somente a partir do segundo semestre de 2016 a primeira vacina tetravalente foi aprovada e liberada no Brasil e em nível mundial, na qual encontra-se em fase de implantação e, portanto, não há ainda alguma resposta satisfatória quanto aos efetivos impactos na saúde pública.

É importante destacar a ausência de informações (de casos autóctones) na base de dados do DATASUS(13) no período de 2001 a 2006. Sendo assim, a ausência de informação foi um fator limitante no sentido de que o estudo poderia avaliar um período mais extenso e com dados mais representativos. Não foi possível avaliar casos de dengue no período anterior a 2001, pois não há registro, conforme busca realizada na plataforma do DATASUS.(13)

Mesmo assim, podemos verificar um avanço do sistema de informação a partir do ano de 2007, em que se verifica melhor a organização e disponibilidade de dados, embora ainda haja fatores a serem melhorados, principalmente no que tange à alimentação de dados de forma mais rápida e constante.

De modo geral, houve dificuldade em encontrar a mesma informação (quantificação exata) nas diferentes bases pesquisadas, principalmente nas informações que se referem à dengue clássica. Sendo assim, este estudo revela a necessidade de aprimoramento e implantação de sistema de informação único, que possa fornecer informação atualizada e consistente, sem a necessidade de realizar diferentes buscas dentro das bases atualmente disponíveis, as quais demandam tempo e apresentam, muitas vezes, inconsistência de informação.

Além disto, no atual sistema de informação (DATASUS/SINAN) não é possível identificar o sorotipo viral (DENV 1, 2, 3, 4), informação relevante para saúde pública e estudos de pesquisa. A inserção desta informação poderá auxiliar no monitoramento dos tipos virais que estão circulando em determinadas regiões, bem como o surgimento de novos sorotipos, e, consequentemente obter-se um rastreamento da evolução dos diferentes tipos virais da dengue em cada região.

No geral, os casos de óbitos no sul do Brasil ocorreram em indivíduos de ambos os sexos com maior frequência para o sexo feminino (54%), semelhante ao estudo epidemiológico do estado de São Paulo,(27) bem como no RS todos os óbitos ocorridos (100%) pertenceram ao sexo feminino. A faixa etária com maior ocorrência de óbitos foi em adultos entre 20 e 59 anos (50%) e superior a 60 anos (42%), totalizando mais de 90% dos óbitos em adultos, concordando com dados de dengue clássica anteriormente citados. Registros de casos de óbitos desta região assemelham-se com dados nacionais, onde a incidência de Febre hemorrágica (FHD) e com complicações (DCC), que são fatores de risco para óbito, tem sido maior em adultos.(23)

A ausência de registro de óbito em criança menor de 1 ano nos três estados é um sinal positivo do ponto de vista de saúde pública, embora o PR tenha registrado, em 2014, seu primeiro óbito em criança entre 1 e 5 anos, e 5 óbitos entre 5 e 19 anos de idade, a partir de 2007.

A ocorrência de óbitos por dengue no período da infância e adolescência também foi observada no estado de São Paulo,(27) onde até o ano de 2007 não havia registro de óbitos em indivíduos menores que 15 anos. A partir de 2008 teve uma média aproximada de 13%, sendo em 2010 o primeiro óbito em criança menor de 1 ano, no referido estado.

Em 2008, o estado do RJ apresentou situações de gravidade por dengue em faixa etária menor. Apesar da população de 15-49 anos ter apresentado maior número de notificações (54%), foi em indivíduos de 0 a 15 anos que apresentaram maior gravidade da doença, representando 48% das notificações e internações e 42% dos óbitos.(28) Assim, estes dados revelam sinais de alerta para o aumento de casos letais nestas novas faixas etárias, bem como trazem referência do crescente aumento de óbitos por dengue na região sul, especialmente no estado do PR.

A dengue possui uma vasta gama de apresentações clínicas, e não há uma relação clara e evidente que relacione se determinado sorotipo viral possa desencadear a dengue clássica ou febre hemorrágica, ou algum sintoma específico que reporte um determinado sorotipo. Evidências sugerem que os anticorpos neutralizantes e as reações cruzadas regulam as epidemias de dengue e a gravidade da doença.(2,22)

Assim, estudo realizado em países latino-americanos (últimas três décadas) sugere que uma infecção anterior poderá definir o cenário para uma infecção mais grave por um sorotipo diferente em situações posteriores.(29) Deste modo, a mortalidade por dengue, conforme a OMS, pode ser reduzida através da implementação da gestão clínica apropriada, diagnóstico laboratorial e manejo clínico adequado, capacitação de recursos humanos em todos os níveis do sistema de saúde e reorganização hospitalar.(3)

CONCLUSÕES

Este estudo contribuiu com o conhecimento da ocorrência e evolução de dengue clássica e hemorrágica na região sul do Brasil, tendo em vista que há escassez de estudos publicados sobre o tema desta região do país.

Este levantamento mostrou crescente aumento de registro de casos autóctones nos três estados, principalmente nos últimos anos (ano de 2017 não incluso), enfatizando que a região se encontra em situação de alerta e necessita tomar medidas de controle sanitárias e ambientais mais eficazes no combate ao vetor.

Aumento de notificações por dengue clássica, principalmente nos últimos anos, PR a partir de 2013, SC e RS a partir de 2015, reforçam a necessidade de controle rigoroso do vetor e estratégias de redução da doença nesta região.

O crescente aumento de óbitos por dengue hemorrágica, principalmente no estado do PR, o registro do primeiro óbito em SC e o aumento nos últimos anos no RS requer atenção dos órgãos em saúde. Há esforços constantes, porém são insuficientes e estão permitindo o aumento de casos graves e letais também na região sul, embora até novembro de 2017 não tenha havido registros de óbitos desta natureza.

O estudo mostrou que é necessario melhorias no sistema de informação (DATASUS/SINAN), em que se sugere a implantação de uma única plataforma com informações de mortalidade e morbidade por dengue, delimitada por estado. Além disto, faz-se necessario a inclusão de dados dos sorotipos virais (DENV 1, 2, 3, 4) e redução do tempo na alimentação das informações na plataforma de acesso.

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Notas

* Artigo produzido durante realização de estágio pós-doutoral em conjunto com docentes do Programa de Mestrado em Biociências e Saúde da Universidade do Oeste de Santa Catarina(UNOESC). Joaçaba, SC, Brasil.

Autor notes

Autor Correspondente: Andréia Dalla Vecchia. Universidade do Oeste de Santa Catarina(UNOESC). Rua Getúlio Vargas, 2125 - 89600-000. Bairro Flor da Serra, Joaçaba, SC, Brasil. E-mail: andreiavecchia@gmail.com.

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