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Estampa tátil: etiquetas de identificação das estampas e cores de peças de vestuário para deficientes visuais
Tactile print: identification labels for prints and colors of clothing for the visually impaired
Estampa táctil: etiquetas de identificación para estampados y colores de ropa para personas con deficiencia visual
ModaPalavra e-periódico, vol. 14, núm. 32, pp. 181-205, 2021
Universidade do Estado de Santa Catarina



DOI: https://doi.org/10.5965/1982615x14322021179

Resumo: A escolha pelas peças de vestuário faz parte do cotidiano da maioria dos usuários. Os elementos gráficos e as cores são aspectos visuais que personalizam os itens e identificam estilos. Para os deficientes visuais as escolhas e a identificação do vestuário não são realizadas de maneira autônoma. Assim, como interface de auxílio a identificação das estampas e cores do vestuário, este estudo propõe desenvolver etiquetas táteis com elementos do design de superfície para deficientes visuais, atendendo suas necessidades durante a compra e no uso diário. Através de um estudo exploratório, de caráter descritivo e qualitativo, foram realizadas entrevistas com o público alvo na Associação Catarinense de Integração ao Cego – ACIC, como análise da interação dos deficientes visuais com o vestuário. A concepção dos protótipos foi realizada em parceria com a empresa catarinense de artigos de personalização do vestuário Tecnoblu, utilizando como metodologia o Guia de Orientação para o Desenvolvimento de Projetos - GODP.

Palavras-chave: etiqueta do vestuário, Deficientes visuais, Design de superfície.

Abstract: The choice of clothes is part of the daily lives of most users. Graphic elements and colors are visual aspects that personalize items and identify styles. For the visually impaired, clothing choices and identification are not made independent. So, as an interface to help identify the patterns and colors of clothing, this study proposes to develop tactile labels with elements of surface design for the visually impaired, meeting their needs during shopping and daily use. Through an exploratory, descriptive and qualitative study, interviews were conducted with the target audience at the Associação Catarinense de Integração ao Cego - ACIC, as an analysis of the interaction of the visually impaired with clothing. The design of the prototypes was carried out in partnership with Tecnoblu, company of clothing customization products of Santa Catarina, using as a methodology the Guidance of Development Projects - GDP.

Keywords: tactile labels, Visually impaired, Surface Design.

Resumen: La elección de las prendas de ropa es parte de la vida diaria de la mayoría de los usuarios. Los elementos gráficos y los colores son aspectos visuales que personalizan elementos y identifican estilos. Para los deficientes visuales, las elecciones de ropa y la identificación no se realizan de forma autónoma. Por lo tanto, como una interfaz para ayudar a identificar los patrones y colores de la ropa, este estudio propone desarrollar etiquetas táctiles con elementos de diseño de superficie para personas con discapacidad visual, que satisfagan sus necesidades durante las compras y el uso diario. A través de un estudio exploratorio, descriptivo y cualitativo, se realizaron entrevistas con el público-objetivo de la Associação Catarinense de Integração ao Cego - ACIC, como un análisis de la interacción de los discapacitados visuales con la ropa. El diseño de los prototipos se llevó a cabo en colaboración con la empresa de productos de personalización de ropa, de Santa Catarina, Tecnoblu, utilizando como metodología la Guía de Orientación para el Desarrollo de Proyectos - GODP.

Palabras clave: etiqueta de ropa, Deficientes visuales, Diseño de superficie.

1. INTRODUÇÃO

Para os deficientes visuais, as características visuais que nos cercam são interpretadas pelo tato, olfato, audição e sistema gustativo como sentidos que captam as informações. A compreensão dos aspectos visuais, portanto, não se dá de maneira instantânea, mas sim de modo sequencial, quando as superfícies ou objetos são tateados ou descritos, por exemplo. A visão não é o único instrumento capaz de proporcionar experiências visuais (FREITAS, 2011).

As escolhas pelas peças do vestuário não são realizadas de forma autônoma, livres para a identificação e interpretação desses usuários; a tarefa está condicionada ao olhar de um intermediário que capta as informações e as transmite.

São considerados deficientes visuais todas as pessoas que possuem algum tipo de dificuldade de apreensão visual: cegos; com baixa visão ou visão subnormal; daltônicos; amblíopes; com catarata ou glaucoma. A cegueira consiste na perda total da visão ou insignificante capacidade de enxergar e a baixa visão apresenta-se quando o funcionamento visual dos olhos é comprometido, mesmo após correções ou tratamentos (NOWILL, 2016). Esse grupo pode ser dividido, também, por pessoas com deficiência visual congênita e deficiência visual adquirida. As experiências visuais diferem entre os dois casos, pois o primeiro não possui memórias obtidas pelo aparelho óptico, e o segundo possui recordações do ambiente, das superfícies e objetos através dos olhos.

No Brasil, segundo o último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,2010), 6,5 milhões de pessoas são deficientes visuais. Desse número, mais de 500 mil pessoas são cegas e mais de 6 milhões possuem baixa visão ou visão subnormal, com permanente dificuldade de apreensão visual (NOWILL, 2016).

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2013), em 2010, cerca de 285 milhões de pessoas possuíam alguma deficiência visual, das quais 39 milhões eram cegas.

Desta forma, por todo o mundo milhões de usuários possuem dificuldades significativas para realizar tarefas cotidianas, como escolher uma peça de vestuário.

Este estudo pretende desenvolver interfaces têxteis para a identificação das estampas e cores de peças do vestuário para deficientes visuais, com o intuito de promover a autonomia e independência destes, durante a compra dos itens e em sua escolha diária.

Sendo o objetivo principal deste ensaio propor etiquetas táteis para deficientes visuais com elementos do design de superfície que atenda suas necessidades de reconhecimento do vestuário.

As características metodológicas da pesquisa conduzem a um estudo exploratório, descritivo do ponto de vista dos objetivos e de análise qualitativa. A pesquisa de campo foi realizada junto a Associação Catarinense de Integração ao Cego (ACIC), pelo qual foram realizadas entrevistas com o público alvo com foco na interação dos usuários com o vestuário. Além da coleta de informações técnicas e a parceria com a empresa Tecnoblu Your ID (TECNOBLU), especializada na criação de artigos personalizados para o vestuário1.

A imersão realizada neste estudo se propõe a facilitar as escolhas do vestuário para os deficientes visuais, público crescente no Brasil e no mundo, que deseja demostrar sua personalidade através das peças que vestem.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Os elementos fundadores para a concepção deste estudo foram concentrados em três tópicos: moda inclusiva e tecnologia assistiva – aspectos formadores; materiais e métodos – o percurso da investigação; e o processo criativo das etiquetas táteis – características que proporcionaram a inovação.

2.1 Moda inclusiva e tecnologia assistiva

A Tecnologia Assistiva (TA), segundo Bersch (2017, p. 2)

engloba recursos e serviços com o objetivo de proporcionar ou ampliar habilidades funcionais de uma pessoa com deficiência ou com incapacidades advindas do envelhecimento. O objetivo da TA é o de promover a vida e a inclusão social de seus usuários.

Além de área do conhecimento, a TA é considerada estratégia, metodologia, recurso e prática na promoção da funcionalidade e prestação de serviços para pessoas com incapacidades, mobilidade reduzida ou deficiência. Tornando-a, conforme Oliveira (2018, p. 31) “um conceito abrangente que busca promover a autonomia e independência funcional do seu usuário”.

Nesse sentido, a TA - assim como o design centrado no usuário e o design de interação, respectivamente – tem como objetivo desenvolver alternativas e produtos que atendam às necessidades do usuário e que reduzam os aspectos negativos da experiência do usuário, melhorando os aspectos positivos da interação usuário-produto ou usuário-serviço.

A qualidade de vida também se relaciona à TA diante das facilidades propostas as atividades cotidianas, instrumentais da vida diária, trabalho, lazer e educação implicando diferentes relações de interação, promovendo independência e autonomia aos usuários e consumidores. Para as pessoas com deficiência visual, o uso da TA está relacionado à locomoção e ao acesso à informação (SANTOS et al., 2017).

Em relação a moda, suas contribuições se relacionam, principalmente, ao acesso às informações do vestuário.

Para o auxílio à interação dos deficientes visuais ao vestuário, algumas tecnologias assistivas se destacam, como as apresentadas por Scheneider (2017, p. 69):

[...] tecnologias de auxílio de compra de novos produtos de moda/vestuário, por meio de aplicativo mobile que permite que os deficientes visuais acessem as informações de localização em shoppings centers; as tecnologias de auxílio no reconhecimento de cores de produtos de moda/vestuário, representadas por dispositivos e aplicativos mobile que detectam e reconhecem as cores; e as tecnologias de auxílio no reconhecimento de informações gerais de produtos de moda/vestuário, pelo instrumento das etiquetas têxteis em braille.

Os produtos de moda caracterizam-se por valorizar a autoimagem dos usuários e consumidores, estabelecendo comportamentos positivos ou negativos por parte do grupo social, sendo também, elementos estéticos simbólicos influentes, atuando, segundo Cunha et al. (2019, p. 91), “[...] como mediadores das percepções e dos comportamentos da pessoa usuária e das pessoas que participam de seus grupos sociais”.

O vestuário proporciona o exercício da moda, as roupas trazem consigo signos que atrelados aos seus significados demostram a persona que os veste, assim vestir-se ganha a condição de texto. O consumo, neste caso de produtos de moda, é a integração ao sistema de interpretação do mundo (SANT’ANNA, 2009), capaz de integrar todos os usuários mais ou menos encaixados em suas individualidades.

Assim, a associação entre os dispositivos da TA e os produtos estético-simbólicos atrelados à moda podem compreender diferentes aspectos da interação entre os consumidores deficientes visuais e os produtos de vestuário.

Aprofundar-se nas experiências e necessidades dos usuários e desenvolver produtos e serviços destinados a TA conduz a equiparação de oportunidades, igualdades nas dimensões físicas, psicológicas e sociais e promove a autonomia do deficiente como consumidor, seja de maneira total ou assistida.

2.2 Materiais e métodos

Para conduzir o percurso metodológico este ensaio tem como fundamento a pesquisa bibliográfica, que dá suporte e coloca-se como estado da arte do estudo através da imersão de temas como o design de superfície, as interfaces têxteis para o vestuário e aspectos circundantes aos deficientes visuais – não exploradas no recorte deste artigo.

Como parte do levantamento de dados, a pesquisa de campo – onde foram apontados os aspectos de interação dos deficientes visuais com o vestuário, suas experiências de compra, a realização de atividades de conservação e manutenção das peças e suas predileções de informações a serem integradas as etiquetas táteis – foi realizada por meio de entrevistas com integrantes da ACIC.

O Guia de Orientação para o Desenvolvimento de Projetos – GODP (MERINO, 2016), metodologia aplicada neste estudo, conduziu o processo de criação das etiquetas táteis, mapeando as oportunidades de prospecção e traçando requisitos de projeto.

Para a realização dos protótipos, a pesquisa contou com a participação da empresa catarinense TECNOBLU oferecendo recursos materiais e imateriais para o desenvolvimento das interfaces táteis para o vestuário.

Assim, este estudo estrutura-se a partir da revisão teórica de elementos formadores do tema e da pesquisa de campo com o público alvo e a empresa parceira, caracterizando-se como pesquisa qualitativa e descritiva. O quadro 1 exemplifica as etapas percorridas ao longo do estudo.


Quadro 1.
Procedimentos metodológicos
Elaborado pela autora, 2019.

2.3 Processo criativo das etiquetas táteis

Para dar suporte e direcionamento ao processo criativo das interfaces táteis para o vestuário, foram realizadas entrevistas com integrantes da ACIC2, buscando-se compreender os aspectos de interação dos usuários com a moda e o vestuário e as expectativas relacionadas as etiquetas têxteis voltadas para deficientes visuais.

Os principais apontamentos do público alvo, oriundos das entrevistas, destacam a falta de autonomia em toda a dinâmica de consumo e identificação com o vestuário; e o reconhecimento das cores, desenhos e estampas das peças, bem como a identidade das marcas e o tamanho dos artigos, como as características mais importantes para determinar suas escolhas.

Para todos os entrevistados, o tato é mencionado como sentido de apreensão das informações do vestuário, presente em todas as experiências de manipulação e identificação das roupas.

Assim, o relato do público alvo serviu como guia para o desenvolvimento das etiquetas táteis, comprometendo-se com as necessidades apontadas pelos deficientes visuais – usuários e consumidores – e as características projetuais da pesquisa.

A aplicação GODP ocorre em etapas através de um mapa visual das atividades que conectam uma unidade a outra. Cada fase se concentra na realização de aspectos relevantes e influentes para a resolução do problema. Segundo Teixeira (2018, p. 23), “ao tornar os processos mais visuais, facilitamos a compreensão e a tomada de decisão; isso tende a tornar os projetos mais enxutos, abrindo mais espaço para a inovação”. A proposta, portanto, é promover maior visualização dos processos durante o desenvolvimento da ideia, pesquisa ou projeto.

As primeiras etapas percorridas pelo GODP, mapeiam as oportunidades relacionadas ao objeto de estudo, prospectam as alternativas que impulsionam a inovação, realizam o levantamento dos dados sobre o público alvo, e onde também se concentram as ideias sobre a imagem do produto a ser desenvolvido.

As etapas seguintes apresentam os requisitos de projeto – aspectos que direcionam a proposta da pesquisa –, onde são refinadas as alternativas prospectadas nos blocos anteriores. Por fim, as últimas etapas conduzem a prototipagem e a verificação final do projeto, estágios não alcançados neste estudo diante da impossibilidade temporal e de aprofundamento da pesquisa, já que, segundo o autor, “processos estão suscetíveis a mudanças” (TEIXEIRA, 2018, p. 22).

A imagem das etapas exploradas pelo GODP estão na Figura 1. Uma síntese dos principais pontos percorridos nesse percurso.


Figura 1.
Etapas percorridas pelo GODP
Elaborado pela autora, 2019

Dentro do mapeamento de oportunidades (bloco 1) foram prospectados diferentes projetos que auxiliam os deficientes visuais em suas atividades cotidianas, como o Feelipa Color Code, código de cores que se apropria das formas geométricas para ilustrar as cores primárias, secundárias e terciárias no ensino aos deficientes visuais3. A utilização das formas geométricas, símbolos reconhecidos universalmente, tem o objetivo de atingir o maior número de pessoas, com as mais diversas dificuldades de apreensão visual.

O quadrado, o retângulo e o círculo, formas geométricas básicas, representam as cores primárias e as cores secundárias e terciárias são representadas pela aglutinação das formas (Figura 2).


Figura 2.
Código de cores Feelipa Color Code
FEELIPA COLOR CODE, 2018

O preto, cinza e branco são representados pelas barras, sendo acrescidas conforme sua saturação. Ao todo o código apresenta 24 tonalidades, sendo os tons escuros representados por meio do acréscimo das três barras (preto) e os tons claros pela implantação de uma barra (branco) no sentido inferior das figuras.

Porque não oferecer mais possibilidades de tonalidades, já que o universo cromático é tão vasto e o vestuário se apropria de todas essas escalas?

Assim, foi desenvolvida uma adaptação do Feelipa Color Code, possibilitando acrescentar infinitas combinações e níveis de saturação. Para isso, foram mantidas as bases geométricas criadas pelo código, porém foram acrescidas sobre as bases a forma correspondente, sendo os níveis de saturação aumentados conforme a quantidade sobreposta (Figura 3).


Figura 3.
Adaptação do código Feelipa Color Code – Níveis de saturação
Criado pela autora, 2018

No entanto, os usuários do código ainda não o conhecem a ponto de reconhecer seu método de aprendizagem em produtos ou objetos. Para isso, foram desenvolvidos painéis de aprendizagem, com o objetivo de facilitar o ensino pelos deficientes visuais. O primeiro demostrando como as cores primárias derivam as secundárias e terciárias (por meio da aglutinação das formas), e o segundo com os relevos que se sobrepõem as formas ilustrando os níveis crescentes de saturação.

Com a oportunidade de aprendizagem do código de cores adaptado para os deficientes visuais sanada, as próximas etapas do desenvolvimento do projeto foram destinadas a criação das interfaces com identificação das cores e estampas de peças do vestuário.

O intuito da proposta é garantir a autonomia nas escolhas do público alvo em todas as atividades que envolvem o vestuário. Assim, a combinação etiqueta interna4 e tag foi a solução encontrada para que o projeto alcançasse todos os estágios de identificação das peças de vestuário.

Questões de usabilidade e conforto também resultaram na combinação de etiqueta interna e tag, já que todas as informações que deviam ser transmitidas não comportavam as dimensões das etiquetas internas conhecidas no mercado.

Desta forma, as etiquetas internas para peças lisas – sem a presença de estampas ou design de superfície –, trazem a sua cor correspondente por meio das formas geométricas e as adaptações feitas sobre o código de cores para a saturação.

Já a tag propõe identificar a cor da peça de vestuário, elemento central da interface, e três opções de cores para possíveis combinações de composição (Figura 4).


Figura 4.
Tag para peças lisas
Criado pela autora, 2018

Com isso, além de reconhecer a cor da peça de vestuário o usuário terá a possibilidade de identificar cores para combinações de looks, tornando a tarefa do vestir ainda mais independente.

Seguindo a mesma proposta de layout das etiquetas para peças lisas, foram desenvolvidas as interfaces para peças estampadas, cerne deste estudo. O elemento de identificação dos padrões é o rapport5 disposto no centro da tag. Abaixo são indicadas as cores presentas na estampa, em ordem de predominância. Na etiqueta interna são identificados os elementos predominantes da estampa, já que seu tamanho reduzido não permite apresentar o rapport por inteiro (Figura 5).


Figura 5.
Tag e etiqueta interna para peças estampadas
Criado pela autora, 2018

Assim, a tag auxilia os deficientes visuais no momento da compra das peças – sendo um artigo destacado das roupas, e a etiqueta interna na escolha diária pelo vestuário.

Definidos os layouts das interfaces, foram criadas as estampas que dariam origem aos produtos finais do projeto. No total foram desenvolvidas três composições – número limitado para comportar futuro teste de usabilidade com os usuários – em escala crescente de complexidade, para compreender até que ponto os desenhos mais complexos podem ser interpretados. A primeira, um poá – desenvolvida no programa de edição Adobe Illustrator, de contornos simples; a segunda com um pássaro – realizada manualmente, com contornos e linhas sinuosas; e a terceira com dois elementos, flores e folhas – realizada manualmente, com sobreposições e detalhes minuciosos (Figuras 6, 7 e 8).


Figura 6.
Etiqueta para peças estampadas – Poá
Criado pela autora, 2019


Figura 7.
Etiqueta para peças estampadas – Pássaro
Criado pela autora, 2019


Figura 8.
Etiqueta para peças estampadas – Folhas e flores
Criado pela autora, 2019

No verso das tags apresenta-se um breve texto a respeito da origem da proposta, assim como a inscrição em braille do título do projeto: Estampa tátil. A inserção de um texto explicativo tem o objetivo de expor aos demais consumidores, que não possuem nenhum tipo de dificuldade de apreensão visual, a iniciativa.

2.4 Resultados: proposta de etiquetas táteis com elementos do design de superfície para deficientes visuais

O início do processo de desenvolvimento das interfaces contou com as diretrizes do GODP, ferramenta que oportunizou enxergar novos caminhos para o projeto – como a criação e adaptação do código de cores e o surgimento das etiquetas para peças lisas.

Como parte da pesquisa de campo foi realizada entrevista junto ao Diretor Criativo da empresa parceira, com o objetivo de compreender sua estrutura e possibilidades para o desenvolvimento das etiquetas táteis; bem como a sua trajetória e atuação no mercado. O conhecimento desses aspectos mostrou-se efetivo para o processo criativo das interfaces.

Para iniciar a confecção dos protótipos das etiquetas foram definidos os tipos de materiais utilizados e os métodos de aplicação dos elementos tridimensionais – juntamente com a empresa parceira TECNOBLU.

Em busca de materiais mais acessíveis e a possibilidade de lavagem das etiquetas internas, foram definidos e utilizados: papel ou papelão para a base das tags; lona como base para a criação das etiquetas internas; PU (tecido sintético) para a maioria dos elementos tridimensionais; e corino na realização dos demais elementos em 3D, de maior complexidade. Todos os elementos tridimensionais foram cortados a laser.

A transformação do PU em artigo tridimensional é obtida através do processo chamado flexografia, pela criação de clichês, matrizes onde são gravadas as imagens ou formas desejadas.

Na Figura 9 são ilustrados os protótipos de etiquetas para peças lisas e para peças estampadas.


Figura 9.
Protótipos das etiquetas para peças lisas e estampadas
Criado pela autora, 2019

Todos os elementos geométricos tridimensionais presentes nas interfaces foram desenvolvidos com PU, e os elementos tridimensionais orgânicos (pássaro, folhas e flores) foram criados com corino.

Algumas dificuldades técnicas – como o tempo reduzido para a confecção dos protótipos, fez com que parte dos elementos tridimensionais fossem realizados a parte (recortes em corino), por isso o uso de dois materiais nas peças tridimensionais.

Assim, a geração de oportunidades proporcionada pela realização dos protótipos contribuiu para a visualização dos pontos positivos e aqueles que ainda precisam ser aprofundados e testados com o público alvo. Além da aproximação entre pesquisa científica e mercado, empresa e universidade, rica para o desenvolvimento de projetos alinhados as necessidades dos usuários e as perspectivas de inovação dos negócios do setor do vestuário.

2.5 Discussões

Parte das discussões a respeito do projeto Estampa Tátil correspondem às questões de viabilidade da proposta, do ponto de vista econômico-social.

A proposta apresenta relevância social, interfere na autonomia e independência de pessoas com deficiência visual proporcionando o exercício de suas personalidades através da moda e suas percepções de identidade. Beneficia, também, os familiares e as pessoas que convivem com esses usuários e precisam “ser” seus olhos em diferentes atividades cotidianas.

Do ponto de vista econômico, o projeto possui vantagens competitivas gerando valor para as empresas através de sua atuação socialmente responsável (PESSOA et al. 2009). Assim, não somente o público com deficiência visual será beneficiado e atraído pela proposta, mas também aqueles consumidores que veem na inclusão um ativo de valor. Sinônimo de engajamento entre consumidores e marcas.

As interfaces sugeridas neste estudo já fazem parte dos artigos de identificação e personalização utilizados nas peças de vestuário, por isso podem ser adaptadas pelas empresas. O objetivo do projeto não é criar produtos especializados, mas possibilitar o uso irrestrito por qualquer marca do vestuário, ou que se utilize do design de superfície, para tornar as cores e estampas acessíveis a todos.

O aperfeiçoamento da proposta deve ser tema de um novo estudo, com uma análise específica das características presentes nas etiquetas táteis para deficientes visuais, para compreender a efetividade do projeto em termos de usabilidade junto ao público alvo.

3. CONCLUSÃO

O processo de desenvolvimento das etiquetas táteis começou com as etapas propostas do GODP, onde parte importante da constituição do projeto foi prospectada e as primeiras alternativas de criação foram realizadas.

O código de cores Feelipa Color Code, característica de influência para o desenvolvimento da proposta, presente nesta etapa da criação, foi adaptado em busca da expansão do espectro cromático vislumbrado pelos deficientes visuais.

A escolha pelo código foi caracterizada por alguns pontos chave: a identificação das cores através das formas geométricas, símbolos reconhecidos pelo mundo; a associação das cores com as formas, explicações relacionais da geometria diante das linhas e ângulos desses elementos (KANDINSKY, 2012); e a não utilização do braille como método de interpretação6. Assim, o código que utiliza das formas geométricas e suas aglutinações se adequou as inclinações do projeto.

Diante do objetivo da proposta deste estudo, a combinação de etiqueta interna e tag buscou estar presente em todas as etapas de identificação do vestuário, desde o momento da compra até a escolha diária pelas peças, proporcionando autonomia e identidade aos usuários e consumidores.

A aproximação com o público alvo durante visitas à ACIC se mostrou fundamental para compreender a perspectiva dos deficientes visuais e suas relações de interação com o vestuário e a busca por identidade através da moda.

A oportunidade da parceria com a empresa catarinense TECNOBLU, possibilitou identificar e conhecer aplicações, métodos, materiais e a estrutura de confecção de interfaces como as etiquetas têxteis.

As experiências vivenciadas no percurso desta pesquisa sugerem a aproximação prolongada com os usuários, para compreender mais profundamente suas relações de interação com o vestuário, e a apresentação dos testes de usabilidade dos artigos propostos a eles para elucidar a eficiência e as dificuldades encontradas na sua utilização.

Após a validação do público diante das interfaces propostas neste estudo, sugere-se, também, a realização de um guia, um modelo de orientação para as marcas de moda e do vestuário com as especificações oriundas dos melhoramentos apontados pelos testes, facilitando o sucesso da implementação no mercado.

Notas de fim de texto

¹ As entrevistas com o público alvo, realizadas na ACIC, esclareceram as principais necessidades dos usuários na identificação das peças de vestuário, os elementos preferidos em uma etiqueta do vestuário destinada aos deficientes visuais, e a importância da percepção da sua personalidade por meio das roupas. A empresa parceira, TECNOBLU, também foi entrevistada, com o objetivo de compreender sua estrutura e possibilidades para o desenvolvimento das etiquetas táteis; bem como a sua trajetória e atuação no mercado.

² O aprofundamento da pesquisa de campo – entrevistas com o público alvo junto a ACIC – é relatado em detalhes em outro estudo, devido a extensão dos relatos e a relevância do tema para pesquisas científicas e projetos de TA.

3 O código foi desenvolvido pela portuguesa Filipa Nogueira Pires, em 2009, durante sua dissertação de Mestrado, em Design de Produto pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, em parceria com o Centro Helen Keller – instituição dedicada a integração de crianças com deficiência visual e outras limitações –, onde a autora validou o estudo diante da aproximação dos alunos com o código, por meio de um jogo com as bandeiras nacionais mundiais.

4 As etiquetas do vestuário podem ser classificadas em: etiquetas técnicas ou internas – etiquetas de manutenção e conservação; etiquetas promocionais ou tags; etiquetas institucionais e etiquetas comerciais (SCHENEIDER, 2016).

5 O rapport é uma estrutura preestabelecida de repetição, da qual os módulos são compostos. Com o encaixe dos módulos forma-se a superfície estampada (RÜTHSCHILLING, 2008, p. 64).

6 Segundo a Diretora Técnica da ACIC – em um relato durante uma das visitas a instituição, apenas cerca de 10% do público com deficiência visual compreende e usa o braille em seu dia a dia.

REFERÊNCIAS

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