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TALENTOS DO INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ: APRENDER A FAZER E A SER EM ESPANHOL E INGLÊS
Jefferson Adriano de Souza; Kelly Cristinna Frigo
Jefferson Adriano de Souza; Kelly Cristinna Frigo
TALENTOS DO INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ: APRENDER A FAZER E A SER EM ESPANHOL E INGLÊS
Revista Conexão UEPG, vol. 14, núm. 1, pp. 92-98, 2018
Universidade Estadual de Ponta Grossa
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Resumo: O projeto de extensão Talentos do Instituto Federal do Paraná (IFPR), conectado ao projeto Vamos Cantar uma canção?, do Programa de Bolsas Acadêmicas de Inclusão Social, estimula a interação com as línguas Espanhola e Inglesa através de músicas. O objetivo é ampliar o contato, participação, aprendizagem e possibilidades de identidade. Na execução, os estudantes são selecionados em apresentações de música em sala e preparados para cantar na Mostra de Cursos, quando o Instituto abre suas portas para a comunidade externa. Neste relato, além das impressões dos coordenadores, são apresentados depoimentos dos participantes , coletados por meio de questionário . Para os estudantes, essa experiência foi uma superação que os projetou como sujeitos capazes de fazer e de ser em Espanhol e Inglês. Cantar movimentou suas identidades da descrença à crença, ampliou possibilidades de inclusão para que eles se posicionassem como parte e não à parte dessas línguas.

Palavras-chave:Línguas adicionaisLínguas adicionais, música música, inclusão social inclusão social.

Abstract: The outreach project Talents of Federal Institute of Parana (IFPR), connected to the project Let’s sing a song? From the Academic Fellowship Program for Social Inclusion, motivates the interaction with Spanish and English Language through music. It aims to expand the contact, participation, learning and possibilities of identities. In its execution, students are selected during music presentations in classroom and they are prepared to sing in the Course Showcase, when the Federal Institute opens its doors for the community. In this study, besides the coordinators’ impressions, the participants’ voices are presented, collected by questionnaire. For students, it was an overcoming experience and it projected them as subjects able to do and to be in Spanish and English. Singing a song moved their identities from disbelief to belief, expanding possibilities of inclusion so that they could position themselves as part of and not apart from those languages.

Keywords: Additional languages, music, social inclusion.

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Artigos

TALENTOS DO INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ: APRENDER A FAZER E A SER EM ESPANHOL E INGLÊS

Jefferson Adriano de Souza
Instituto Federal do Paraná (IFPR), Brasil
Kelly Cristinna Frigo
Instituto Federal do Paraná (IFPR), Brasil
Revista Conexão UEPG, vol. 14, núm. 1, pp. 92-98, 2018
Universidade Estadual de Ponta Grossa

Recepção: 19 Maio 2017

Aprovação: 17 Outubro 2017

Introdução

Segundo Lima (2011), o ensino de outros idiomas representa para alguns alunos impossibilidade. Pavlenko (2004) acrescenta que, no espaço escolar, os silenciados usualmente pertencem a grupos menos favorecidos. Não são poucos os que querem se comunicar, conectar-se com outros lugares e pessoas em Espanhol e Inglês. Contudo, em contextos marcados por relações desiguais de poder, esse desejo muitas vezes é sufocado pelo medo de exposição (NORTON, 2010).

Para além da ciência, tecnologia, economia e política, as línguas estrangeiras devem grande parte de seu poder ao entretenimento, sobretudo, à música. A vontade de compreender, pronunciar e cantar as letras que circulam globalmente revela o irresistível desejo de ser e fazer parte de comunidades imaginadas de artistas internacionais, de pessoas que falam e cantam nessas línguas. Norton (2001) defende que esses mundos imaginários, não tangíveis, têm forte impacto na vida desses aprendizes.

Pautados nessas reflexões, acreditamos que o contato com músicas permite aos sujeitos vivenciarem essas línguas, sentirem-se parte, ocuparem espaços, fazerem coisas em Espanhol e Inglês com significado para eles. A música é um convite lúdico para que alunos com histórico de resistência, por vezes silenciados, mergulhem nessas línguas e se descubram capazes de aprendê-las e de usá-las para fins específicos, como cantar. Desse modo, a descrença cede lugar à crença, o impossível se torna possível e a aprendizagem acontece.

No Instituto Federal do Paraná (IFPR), as disciplinas de línguas estrangeiras têm motivado estudantes a cantarem na e para além da escola. O projeto de extensão Talentos do IFPR, conectado ao projeto Vamos cantar uma canção?, do Programa de Bolsas Acadêmicas de Inclusão Social (PBIS), estimula esses sujeitos a interagirem e praticarem essas línguas através do contato com músicas. Para sua concretização, os interessados em aprender a cantar são identificados em sala, convidados a participar e preparados pelos coordenadores.

Assim, é possível promover o ensino desses idiomas de forma lúdica e memorável, motivando contatos, uso, participação, desenvolvimento intelectual, emocional e cultural. Outra contribuição está na propaganda, no apelo e no desejo de pertencimento que esse canto desperta na comunidade externa que visita a Mostra de Cursos. Para além disso, a música permite incluir os excluídos, amenizar desigualdades, despertar vozes e talentos.

Neste artigo, compartilhamos as vivências do projeto Talentos do IFPR, na V Mostra de Curso, realizada em um campus do IFPR, em 2016, destacando a atuação de bolsistas do PBIS e de outros estudantes que participaram do evento.

Métodos

As atividades desenvolvidas no projeto foram divididas em quatro momentos: 1) trabalho com músicas em sala; 2) identificação dos estudantes com potencial para cantar; 3) convite e preparação desses sujeitos; e 4) apresentações na V Mostra de cursos do IFPR em 6 de outubro de 2016.

Nesse campus do IFPR, a língua espanhola é ministrada nos 1° e 2° anos dos cursos técnicos integrados e a língua inglesa, nos 3° e 4°. Nas disciplinas, são realizadas atividades frequentes com música, a fim de conectar os estudantes com esses idiomas. Para isso, são selecionadas canções atuais, com grande visibilidade e com grau de dificuldade moderado. Além de ouvirem, eles copiam as letras, leem os textos em voz alta, aprendem a observar recorrências, trabalham com sons específicos das línguas, melhoram a pronúncia, vocabulário, estruturas e cantam repetidas vezes, primeiro à capela e depois com o karaokê.

Durantes as atividades, muitos participam coletivamente e se conectam à língua alvo. Em sala, quando cantamos juntos, é possível perceber vozes que se projetam com entusiasmo ou timidez, sinalizando possíveis candidatos para este projeto. Além disso, eles têm a oportunidade de preparar uma canção e apresentá-la no final dos bimestres. Nessas ações, eles escolhem cantar em grupo ou individualmente. Apesar do desejo, alguns temem o julgamento e optam por não se expor. Isso não afeta negativamente a avaliação porque trata-se de uma atividade opcional.

No segundo bimestre de 2016, após as apresentações em sala, convidamos alguns estudantes para participar deste projeto. No curso técnico em Automação, cinco aceitaram o convite, sendo duas meninas e três meninos; em Informática, foram quatro meninas e dois meninos; em Mecânica, duas meninas e três meninos, todos dos 3° anos do ensino médio integrado. Além desses, participaram outros três bolsistas do PBIS e uma voluntária, somando vinte atuações em inglês. Na língua espanhola, foram cinco aceites, sendo um menino e quatro meninas. No total, participaram vinte e cinco estudantes, sendo quinze meninas e dez meninos.

Nessa seleção, não foram priorizados sujeitos que já sabiam cantar, mas aqueles que manifestaram um desejo de participar do evento capaz de superar o medo de exposição. Convidamos um número semelhante de meninos e meninas, a fim de contemplar igualmente os gêneros. Entre os requisitos, destacamos: 1) ter cantado em sala; 2) ter demonstrado envolvimento nessa atividade; e 3) ter interesse e disponibilidade em participar do projeto.

Os ensaios visavam a prepará-los, trabalhando potencialidades e dificuldades. Nessas práticas, eles precisavam: desenvolver confiança na pronúncia, saber o que estavam cantando para interpretar a letra, aprender a controlar a respiração, projetar a voz e adequar a sua expressão corporal. No terceiro encontro, iniciávamos os ensaios com acompanhamento musical ou com karaokês extraídos da internet. Ao longo do processo, ajudávamos a decidir sobre as partes da letra mais adequadas a cada voz. Definidos esses detalhes, eles eram orientados a praticar.

Esse trabalho exigiu muito investimento de tempo e de estudo. As apresentações para a comunidade externa envolviam riscos para as identidades dos estudantes, visto que não tínhamos controle sobre as reações do público. As ações foram conduzidas para fortalecer a confiança e gerar impactos positivos na autoestima dos participantes. Por isso, eles foram preparados durante três meses e praticaram bastante. No dia do evento, diante do público, o fator emocional influenciou um pouco, mas as canções foram executadas e os objetivos alcançados.

As apresentações foram realizadas na sala 20-02, em um campus do IFPR em 6 de outubro de 2016, na parte da manhã e da tarde. As escolas visitantes eram conduzidas até esse espaço, onde os coordenadores do projeto faziam breve exposição, destacando o objetivo da proposta: aproximar os estudantes das línguas alvos, por meio da música.

Como havia muitos cantores, a cada escola, três apresentações eram executadas, sendo uma em Espanhol e duas em Inglês. As performances tinham, no máximo, 10 minutos, para que os visitantes pudessem conhecer outros projetos desenvolvidos na instituição.

Todos foram orientados com base na mesma metodologia. Os estudantes decidiram se cantariam individualmente, em dupla ou em grupo e selecionaram a(s) música(s) para apresentar na Mostra. Após a seleção, eles copiaram a letra da canção para estudá-la. Nas orientações, fazíamos a leitura em voz alta das letras para identificarmos as dificuldades de pronúncia, ouvíamos a música e praticávamos verso a verso, à capela.

Optamos por não usar microfone, apenas uma caixa de som para os karaokês. Anteriormente, o uso daquele recurso causava distorções e transtornos. Os estudantes cantaram próximos ao público, possibilitando maior interação. Os visitantes escutavam essas vozes, sem interferência, o que melhorou a qualidade das atuações e facilitou o processo.

Uma semana depois do evento, reunimos os participantes em uma sala, projetamos fotos das apresentações e aplicamos um questionário com seis questões sobre: 1) o significado dessa experiência; 2), sentimentos ao cantar; 3) comentários que eles ouviram sobre as apresentações; 4) lição desse momento; 5) a apresentação que mais os impactou; e 6) se tal apresentação os motivou ou desmotivou a cantar.

Durante a aplicação do questionário, os estudantes do projeto Talentos do IFPR assinaram o termo de livre consentimento esclarecido, autorizando o uso dos dados coletados. Os bolsistas do PBIS preencheram o documento no início do programa. Os dados apresentados neste relato foram compartilhados com os participantes, a fim de fomentar novas reflexões e ampliar horizontes.

Na sequência, descrevemos as impressões sobre o evento e recortes das vozes dos estudantes.

Resultados

Em 6 de outubro de 2016, na V Mostra de Cursos do IFPR, sala 20-02, os coordenadores do projeto "Talentos do IFPR", juntamente com os estudantes, se reuniram para compartilhar com a comunidade externa os resultados desse trabalho. O evento envolveu 25 estudantes, dos 1°, 2° e 3° anos dos cursos técnicos integrados, e 18 músicas foram executadas em Espanhol e Inglês, na parte da manhã e da tarde, conforme Tabela 1.

Aproximadamente 15 escolas visitaram o evento, totalizando mais de 40 performances. Os integrantes do PBIS realizaram 10 apresentações nesse período. As escolas visitantes, divididas em grupos de 20 alunos, entravam na sala ouviam a explicação dos coordenadores e assistiam a três músicas, sendo a primeira em Espanhol, a segunda em Inglês e a terceira executada pelos bolsistas do PBIS, em Inglês. Todo o processo durava cerca de 10 minutos.

Esse formato valorizou o trabalho de todos os envolvidos, principalmente dos bolsistas que cantaram várias vezes. Entendemos que inclusão social se faz com participação, uma vez que o uso da língua alvo é condição necessária ao desenvolvimento da aprendizagem. Ao cantar, os estudantes puderam participar, usar e aprender essas línguas.



Tabela 1. Detalhes das apresentações1
Fonte: Os próprios autores.

O grupo do PBIS era formado por Giovani, Carolaine, Andreisy e Hellen (voluntária). Eles cantaram a canção Hymn for the weekend (Figura 1). Dividimos a música em três partes. Giovani começou cantando a primeira estrofe, a segunda era das vozes femininas e todas as vozes se encontravam no refrão. A apresentação tinha 2 minutos, mas, para eles, representou um grande desafio. Pela primeira vez, estavam cantando em inglês diante de muitas pessoas, ocupando papel de destaque. Naquele momento, eles eram os cantores do IFPR. O fato de ser um grupo fortaleceu a confiança dos envolvidos.



Figura 1. Apresentação do grupo do PBIS2

Por ser a primeira experiência, eles estavam ansiosos, mas cantaram, e a cada performance, demonstravam mais confiança. Nas palavras de Carolaine, "esse momento significou muito para mim. Eu amei cantar, apesar da vergonha". Hellen declarou: "foi gratificante porque eu gosto de cantar e foi bem incrível porque eu não tenho tanta confiança". Giovani descreveu o evento como "um desafio gigante, eu estava com muita vergonha, mas superei".

De forma geral, no questionário, eles representaram as atuações como algo positivo para o seu desenvolvimento intelectual e emocional. No início do projeto, eles não acreditavam que cantariam em inglês para uma plateia, mas foram muito além disso e aprenderam a confiar mais em si mesmos e a superar os desafios propostos. Acreditamos que esse momento contribuiu para empoderá-los e fazê-los se perceberem como sujeitos capazes de aprender e de usar essas línguas para concretizar projetos, como cantar uma canção.

A bolsista Andreisy interpretou duas músicas, uma individualmente e outra com o grupo do PBIS. Na primeira apresentação solo, ela cantou Home, gaguejou e deixou transparecer seu nervosismo. Quando terminou, ela se dirigiu aos coordenadores e disse: "quero cantar novamente". Na segunda vez, foi melhor. Tal postura revelou o seu envolvimento com a atividade e empoderamento. Em suas palavras: "Apesar do medo, eu tentei fazer o que eu aprendi e consegui fazer as apresentações". A superação é algo recorrente nos depoimentos, o que sugere a movimentação desses sujeitos da descrença à crença.

É importante registrar que, no início de cada apresentação do PBIS, explicávamos que essa era a primeira interação do grupo em público e que eles estavam estudando inglês havia apenas dois meses. Tal esclarecimento ajudou os ouvintes a visualizarem estudantes no início do processo, aprendendo a cantar em inglês. Eles puderam reconhecer o esforço e avaliá-los como alunos que cantam e não como cantores profissionais. Tal declaração objetivou amenizar tensões e criar um ambiente acolhedor. Conforme Norton (2010), ao usar a língua, o aprendiz pode ser e/ou sentir-se posicionado por falantes mais proficientes de forma desigual, situação que pode gerar resistência, fuga e silêncio.

É papel do educador investir em contextos menos excludentes e mais favoráveis à participação e à aprendizagem. Afinal, como nos ensinou Freire (1997), educar é um ato de amor e transformação que envolve responsabilidade, ética e comprometimento com os sujeitos e suas realidades. O conhecimento compartilhado na escola afeta a vida dessas pessoas, constituindo suas identidades. Neste projeto, procuramos fazer dos momentos compartilhados uma experiência positiva e transformadora. As interações mediadas por músicas nos possibilitou criar espaços para que eles se percebessem como parte e não à parte dessas línguas.

Até 2015, este projeto se chamava IFPR Got Talents. Em 2016, mudamos para Talentos do IFPR e incorporamos apresentações em Espanhol para divulgar o trabalho com este idioma no IFPR e envolver os estudantes dos segundos anos. Além das atividades em sala, identificamos os interessados, pautados nas performances realizadas no projeto Festa Hispânica. Por ser o primeiro ano, houve pouca participação, mas esperamos aumentar a presença desses cantantes nas próximas edições. Aceitaram o convite do projeto Natália e Nicolas (2° ano de Informática), Vitória N. (2° ano de Mecânica), Flávia (3° ano de Mecânica) e Vitória S. (3° ano de Automação).

As performances em Espanhol despertaram a atenção dos visitantes. O dueto de Natália e Nicolas encantou pelo romantismo, simplicidade e pelos sorrisos trocados. Os dois estavam conectados e felizes na melodia. Cantaram com naturalidade e transmitiram a imagem de alunos que cantam como alunos e, ao mesmo tempo, fluem seguros como cantores. Nas palavras de Natália, "foi muito gratificante cantar [...] mostrar parte do que o instituto oferece [...] tentei dar o meu melhor e me senti muito bem [...] e feliz porque gostei da nossa apresentação".



Figura 2. Apresentação de Natália e Nicolas

As apresentações que mais impactaram os visitantes da Mostra, considerando-se o entusiasmo das palmas, reações e comentários, foram: Camila e Emilli (Cheap thrills); Guilherme e Loryane (Price tag); e Larissa e Rodrigo (Give me love). Os fatores que, provavelmente, contribuíram para isso foram: a voz, a confiança e a dificuldade das canções. No questionário aplicado, os participantes destacaram essas performances e acrescentaram: Natália e Nicolas (l,Con quién se queda el perro?); Loryane (Pretty hurts); e Rodrigo (Lisztomania), usando os critérios voz e segurança. A maioria representou as atuações como motivadoras, possivelmente porque se projetaram como parte de todo esse processo.



Figura 3. Apresentação de Larissa e Rodrigo

No entanto, o domínio dessas atuações abalou a confiança dos bolsistas do PBIS. Andreisy e Giovani se sentiram intimidados pelo show dos colegas e pelos elogios que ouviram dos visitantes sobre essas performances. Paiva (2012) defende que o Outro, na língua estrangeira, sujeito mais proficiente, nem sempre motiva interações, por vezes, provoca medo, insegurança, sentimento de inferioridade. Mas, apesar de temerem comparações, eles participaram e apresentaram suas canções. Fazia parte do processo se reconhecerem e serem reconhecidos como iniciantes em inglês e como alunos que cantam.

As performances dos meninos superaram expectativas e transpuseram barreiras. João Pedro, Yuri, Cristian, Daniel e Kleber venceram a timidez e surpreenderam professores e colegas, pois não costumam se expor. Rodrigo se apresentou como um profissional e arrebatou a todos com seu show, inspirando outros meninos. Nas palavras de Kleber, "gostei muito da música e da forma como o Rodrigo cantou. Vê-lo me motivou mais, porque normalmente as garotas têm mais facilidade para cantar".

Observamos que a questão de gênero tem relevância nessas exposições. Normalmente, as meninas são as que mais participam e se sentem à vontade em interações que exploram aspectos artísticos e emocionais. Para Pavlenko (2004), etnia, gênero e classe são construções sociais importantes que influenciam as identidades, porque podem favorecer ou constranger oportunidades de uso e participação nas línguas. Isso ressalta a importância de oferecermos oportunidades para todos, sobretudo para os que estão excluídos, a fim de promover mais inclusão e empoderar sujeitos silenciados, como os bolsistas do PBIS.

Conforme Norton e McKinney (2011), identidade e aprendizagem estão conectadas porque as línguas fornecem um complexo de práticas em que relações são definidas e negociadas. A aprendizagem amplia as possibilidades do sujeito em comunidades, tomando-se inseparável da construção de identidade. Os que não aprendem também constroem identidades, por vezes, associadas ao fracasso, exclusão, inferioridade e resistência. Logo, aprender ou não produz identidades. A diferença é que aprender amplia possibilidades, não aprender limita.

As performances de Camila, Emilli e Loryane impressionaram os visitantes, o que ficou registrado na vibração das palmas, no brilho dos olhos e nos comentários. Naquele momento, os estudantes representavam comunidades imaginadas de artistas e pessoas que falam essas línguas tão desejadas e, por vezes, temidas. Se por um lado, isso favorece a autoestima de alguns, também pode ameaçar a confiança de outros.



Figura 4. Apresentação de Camila e Emilli

Tal fato ocorre porque alguns se sentem impossibilitados de ocuparem esses lugares, identidades. Na comparação, eles não conseguem se projetar nessa posição, sendo aplaudidos, reconhecidos, legitimados como parte dessas línguas. Portanto, é importante equilibrar as relações desiguais de poder, valorizando a diversidade. Ou seja, além de ouvir estudantes que cantam como cantores, é necessário ouvir alunos que cantam como alunos, possibilitando diferentes identificações. Isso transpareceu no depoimento de Emilli:

A lição que levo dessa experiência é que consigo vencer minha timidez, medo de errar e isso foi muito importante. A apresentação do PBIS foi a que mais me chamou a atenção, por ser um grupo iniciante no inglês e bastante diverso. Eles estavam nervosos, mas cumpriram o que foi trabalhado e a do Cristian porque me surpreendeu, eu nem sabia que ele cantava. Isso me motivou porque eu percebi que todos ficam nervosos também, mas superam (EMILLI, estudante do 3° ano do Curso Técnico em Mecânica, 2016).

Em seu depoimento, ela falou sobre sua superação para cantar em público e demonstrou identificar-se com o nervosismo dos colegas. Durante o questionário, ela explicou que não escolheu os melhores, mas os que mais a surpreenderam. Na visão de Hellen, voluntária do PBIS, Emilli foi uma inspiração, porque transmitiu confiança ao cantar, enquanto ela ainda se sente muito nervosa e insegura. Nessa comparação, observamos a construção das identidades no jogo das diferenças. De acordo com Silva (2012), identidade e diferença são produtos de relações sociais e de poder, não apenas definidas, mas impostas e disputadas.

Para alguns, ver um colega que canta muito bem não é motivador, mas para outros, sim. Hellen viu em Emilli, Camila e Larissa um ideal para construir sua identidade como aluna cantora. Normalmente, a idealização das línguas, seus usos e usuários não é positiva, porque pode prejudicar a aprendizagem, ao projetá-la em identidades difíceis de serem alcançadas. No caso de Hellen, não foi assim. Em maio de 2017, sete meses após a Mostra de Cursos, ela cantou no I Festival de Arte e Cultura do IFPR para mais de 500 pessoas. Não foi em uma sala, mas em um palco; não foi uma, mas duas músicas em inglês, incluindo Give me love, a música que ela ouviu a estudante Larissa cantar em outubro de 2016.

Neste projeto, defendemos que é preciso reafirmar práticas de inclusão e valorização do que o sujeito é capaz de fazer nas línguas estrangeiras, ampliando acesso às interações, respeito às diversidades e usos criativos das línguas que promovam comunicação e transformação social. As identidades são muito complexas; ações que motivam um grupo podem desmotivar outros. A alternativa é oferecer oportunidades, flexibilizar e respeitar as escolhas.

Após a Mostra, questionamos os estudantes sobre o significado das apresentações e a palavra mais mencionada foi: superação. À primeira vista, parece que cantar uma canção em Espanhol ou Inglês é algo banal, sem impacto nas identidades. No entanto, muitos representaram essa experiência como algo marcante que os transformou. Eles fizeram algo que não imaginavam e se sentiram mais fortes; transpuseram barreiras, medos, vergonha, ansiedade, nervosismo e venceram. Hoje, eles estão mais motivados a enfrentarem novos desafios e a superarem limites. Sobre a lição que esse momento deixou, disseram:

Carolaine: não preciso ter vergonha e posso alcançar meus objetivos. Cristian: aprendi a ligar menos para a pressão. Daniel: eu sou capaz de superar minhas expectativas. Flávia: devemos enfrentar nossos medos, quebrando barreiras que nos impedem de fazer algo novo. Erica: somos capazes de tudo se nos dedicarmos ao que queremos. Hadelly: medo que eu sinto ao falar pode ser destruído e eu posso cantar para muitas pessoas. Hellen: se você quer, você tem que buscar, cantar, tentar e melhorar. Kleber: ter conseguido me apresentar, romper essa barreira. Maelly: aprendi a me soltar mais a não ter vergonha de cantar. Nicolas: eu posso fazer qualquer coisa se eu batalhar para isso (DEPOIMENTOS escritos, em 13-10-2016).

Todas essas vozes resumem a maior conquista do projeto: "somos capazes". O objetivo foi aproximá­-los das línguas espanhola e inglesa, por meio da música, de forma que eles pudessem investir, conectar­-se, participar, usar, aprender a fazer e a ser nessas línguas, posicionando-se como sujeitos capazes. Ler os depoimentos nos faz acreditar que alcançamos nosso propósito.

A canção desatou o nó, tomando próximo o distante, crente o descrente. A canção incluiu os excluídos, deu voz aos silenciados, restaurou a confiança e a autoestima; fortaleceu os que se consideravam fracos e trouxe o "estrangeiro" para dentro de nós, transformando a percepção de nós mesmos. As canções nos fizeram compreender que o ensino-aprendizagem dessas línguas é, como assinalou Rajagopalan (2003), um amplo processo de renegociação e redefinição das identidades em construção.

Aprender a se comunicar com o mundo em Espanhol e/ou Inglês é um direito que não pode ser silenciado por relações desiguais de poder, sentimentos de inferioridade, medos, resistência, exclusão, preconceitos e intolerância. Precisamos educar para o respeito à diversidade, para o conhecimento que amplia os horizontes e ilumina a humanidade. Concordamos com Norton e Toohey (2011), quando afirmam que, pela linguagem, pessoas negociam sentidos de si, acessam comunidades poderosas que permitem oportunidades de fala ou são marginalizadas no/pelo silêncio; identificam a si e aos outros, atuando na (trans)formação da linguagem e identidade.

Conclusão

O principal evento do projeto Talentos do IFPR, a V Mostra de Cursos do IFPR 2016, atingiu os objetivos propostos. Conseguimos: projetar o trabalho realizado nas disciplinas de Espanhol e Inglês; valorizar a autoestima dos estudantes; oferecer oportunidades reais de uso dessas línguas; promover positivamente as ações culturais realizadas no campus e despertar o interesse das escolas visitantes. Os professores que acompanhavam os grupos elogiaram o trabalho. De acordo com o depoimento dos participantes, foi uma experiência impactante, que ficará registrada na mente como uma superação e repercutirá positivamente nas possibilidades de identidade e no futuro desses jovens.

Material suplementar
Referências
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1997.
LIMA, Diógenes C. de Lima (Org.). Inglês em escolas públicas não funciona: uma questão, múltiplos olhares. São Paulo: Parábola Editorial, 2011.
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NORTON, Bonny. Language and identity. In: HORNBERGER, Nancy H.; MCKAY, Sandra Lee. (Ed.). Sociolinguistics and language education. Bristol, UK: Multilingual Matters, 2010, p. 349-369.
NORTON, Bonny; MCKINNEY, Carolyn. Identity and second language acquisition. In: ATKINSON, Dwight. (Ed.). Alternative approaches to Second Language Acquisition. New York: Routledge, 2011, p. 73-94.
NORTON, Bonny; TOOHEY, Kelleen. Identity, language learning, and social change. Language Teaching, v. 44, n. 4, p. 412-446, 2011.
PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira. O outro na aprendizagem de línguas. Disponível em: http://www.veramenezes.com/ outro.pdf. Acesso em: 03 mar. 2012.
PAVLENKO, Aneta. Gender and sexuality in foreign and second language education: critical and feminist approaches. In: NORTON, Bonny; TOOHEY, Kelleen. (Ed.). Critical pedagogies and language learning. Cambridge: Cambridge University Press, 2004. p. 53-71.
SILVA, Tomaz T. da. A produção social da identidade e da diferença. In: ______. (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2012. p. 73-10
Notas
Notas
1 Por questões éticas, esclarecemos que, no ato da matrícula, os estudantes e responsáveis legais assinam uma Autorização de Cessão de Imagem, arquivada na Secretaria do Campus, para subsidiar as atividades de ensino, pesquisa e extensão desenvolvidas.
2 As imagens e os nomes dos estudantes foram divulgados com base na assinatura do Termo de Livre Consentimento Esclarecido e na Autorização de Cessão de Imagem. O crédito das fotografias é do estudante Willian Rangel.


Tabela 1. Detalhes das apresentações1
Fonte: Os próprios autores.


Figura 1. Apresentação do grupo do PBIS2


Figura 2. Apresentação de Natália e Nicolas


Figura 3. Apresentação de Larissa e Rodrigo


Figura 4. Apresentação de Camila e Emilli
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