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INOVANDO PRÁTICAS - TRANSFORMANDO VIDAS: FORMAÇÃO DE AGENTES DE DESENVOLVIMENTO AMBIENTAL
Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira; Luciana Souza Oliveira; Anderson Vieira Santos;
Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira; Luciana Souza Oliveira; Anderson Vieira Santos; Vanderlei Souza Carvalho; Daniel Mariano Leite
INOVANDO PRÁTICAS - TRANSFORMANDO VIDAS: FORMAÇÃO DE AGENTES DE DESENVOLVIMENTO AMBIENTAL
Revista Conexão UEPG, vol. 16, núm. 1, 2020
Universidade Estadual de Ponta Grossa
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Resumo: Este projeto de extensão objetivou formar populações tradicionais dos territórios Sertão do São Francisco, na Bahia, e Sertão do São Francisco, em Pernambuco, para a Educação Ambiental com vistas à convivência com o semiárido, na perspectiva de aprofundar as reflexões teóricas e práticas sobre problemas contemporâneos da sociedade, exercitando metodologias participativas que as capacitassem para a gestão dos seus negócios agrícolas, agrários e de outras naturezas. O currículo teve como referência principal a formação critica para o desenvolvimento socioambiental e o modo de produção da vida, as relações sócio-históricas, políticas e culturais dos atores envolvidos, possibilitando a construção de espaços pedagógicos de aprendizagem para além da sala de aula, por meio da metodologia de alternância: tempo escola, tempo do exercício profissional e tempo comunidade. Os resultados foram 200 agentes de desenvolvimento ambiental formados e atuando nas suas comunidades, de forma sustentável, nas dimensões humana, técnica, ética, moral, politica e estética.

Palavras-chave:Desenvolvimento sustentávelDesenvolvimento sustentável,Meio ambienteMeio ambiente,Agricultura familiarAgricultura familiar,Convivência com o semiáridoConvivência com o semiárido,Tecnologias sociaisTecnologias sociais.

Abstract: This project provided Environmental Education to traditional populations from the Sertão do Sao Francisco (Bahia) and Sertão do São Francisco (Pernambuco) aiming at living with the difficulties of semi-arid regions. In addition, the project expanded theoretical and practical reflections on current society problems through participatory methodologies that would enable the aforementioned populations to manage their agricultural, agrarian and other affairs. The curriculum was supported by critical education for socio-environmental development and the mode of production of life, socio-historical, political and cultural relations of the actors. This promoted the construction of pedagogical learning spaces beyond the classroom using the methodology of alternation: school time, time m the profession and community time. The results include the education of 200 environmental development agents acting in their communities in a sustainable manner to develop the human, technical, ethical, moral, political and aesthetic dimensions.

Keywords: Sustainable development, Environment, Family farming, Living in semi-Arid Regions, Social technologies.

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Artigos

INOVANDO PRÁTICAS - TRANSFORMANDO VIDAS: FORMAÇÃO DE AGENTES DE DESENVOLVIMENTO AMBIENTAL

Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira
Universidade Federal do Vale do São Francisco, Brasil
Luciana Souza Oliveira
Instituto Federal Sertão Pernambucano (IFSertão-PE), Brasil
Anderson Vieira Santos
Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Brasil
Vanderlei Souza Carvalho
Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Brasil
Daniel Mariano Leite
Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Brasil
Revista Conexão UEPG, vol. 16, núm. 1, 2020
Universidade Estadual de Ponta Grossa

Recepção: 03 Junho 2019

Aprovação: 20 Setembro 2019

Introdução

Este projeto de extensão resultou da chamada pública 05/2015 do FNMA- Fundo Nacional de Meio Ambiente - e teve como propósito formar Agentes de Desenvolvimento Ambiental, doravante denominados ADS, para atuarem nos territórios da cidadania Sertão do São Francisco, na Bahia, e Sertão do São Francisco, em Pernambuco, num total de dezessete municípios, todos localizados na região semiárida, no bioma caatinga, rico em diversidade de plantas e animais, mas extremamente frágil às externalidades, o que demanda dos seus habitantes um manejo cuidadoso que respeite as suas especificidades.

A escolha do tema decorreu da compreensão de que, como afirma Lacki (2002), "entre os agricultores familiares, a ineficiência do fator de produção mais abundante, que é a mão de obra, incide negativamente na produtividade dos demais fatores que geralmente são escassos, como a terra, os animais, os insumos, as máquinas", apresentando-se a educação como a ferramenta com maior potencial para empoderar as suas famílias. Para o educador Saviani (2013), a educação significa tomar o homem cada vez mais capaz de conhecer os elementos da sua situação para melhor intervir nela, transformando­ a no sentido de uma ampliação da liberdade, da comunicação e colaboração entre os homens. Com a mesma compreensão, Rodrigues (2003) explica que hoje, preparar culturalmente os indivíduos significa possibilitar-lhes a visão de mundo presente na sociedade, para que possam "agir aderindo, transformando e participando da mudança dessa vida". Kliksberg (2002) afirma que o desenvolvimento dos países mais bem­ sucedidos do mundo baseou-se no capital educativo que souberam produzir, demonstrando que o investimento social gera capital humano, que se transforma em produtividade, progresso tecnológico e é decisivo para a competitividade.

O atual cenário mundial privilegia o conhecimento, exigindo do trabalhador que ele saiba tomar decisões e atue coletivamente. Na região semiárida do nordeste, a agricultura, segundo estudos da FAO-UNESCO (2003) e do Banco Mundial (2000), por muito tempo ainda será a principal fonte de ocupação e renda, embora novas formas de utilização do espaço rural estejam acontecendo, porque o rural ultrapassa o agrário. Nessa perspectiva, os agentes de desenvolvimento ambiental assumem grande importância nas comunidades, porque são eles que ajudam os agricultores a identificar os recursos e as oportunidades de desenvolvimento existentes no seu meio, orientando-os a transformar as potencialidades em oportunidades de trabalho e renda. Um outro motivo foi a fragilidade da extensão rural na região, onde a presença do técnico especialista é rara, ficando os sujeitos que vivem no e do campo sem o aporte teórico-prático necessário para o melhor desempenho das suas atividades.

Como bem afirma Leff (2009), a crise ambiental é crise da razão e a educação ambiental emerge como um novo saber que ultrapassa o conhecimento e põe à prova essa realidade vivida, a ética e o próprio sentido da existência, construindo novas realidades para um futuro sustentável.

Impulsiona uma utopia como reconstrução da realidade a partir de uma multiplicidade de sentidos individuais e coletivos, para além de uma articulação científica, de intersubjetividades e de saberes individuais. [...] busca conhecer o que as ciências ignoram, porque seus campos de conhecimento projetam sobras sobre o real e avançam, disciplinando paradigmas e subjugando saberes (LEFF, 2009).

Meio ambiente é um espaço socialmente construído nas relações cotidianas, permeadas por atividades econômicas, sociais e políticas que acarretam processos de criação cultural e tecnológica, e processos históricos e políticos de transformação da natureza e da sociedade. Em 1973, o canadense Maurice Strong lançou o conceito de ecodesenvolvimento, baseado em seis princípios: 1) Satisfação das necessidades básicas; 2) Solidariedade com as gerações futuras; 3) Participação da população envolvida; 4) Preservação dos recursos naturais e do meio ambiente; 5) Elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social e respeito a outras culturas; 6) Programas de educação.

A importância desse trabalho é que, a partir dele, abriu-se espaços para a formulação dos conceitos de desenvolvimento sustentável, quando em 1987, a Comissão Mundial da ONU para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida por Gro Harlem Brundtland e Mansour Khalid, apresentou o documento "Nosso Futuro Comum" (1991), que dizia: "Desenvolvimento Sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades". Nessa perspectiva, passa-se a perceber o desenvolvimento sustentável de um outro modo, em que as próprias comunidades encontram formas de suprir as suas necessidades, investindo na sua vocação, buscando o intercâmbio externo por meio da cooperação e integração das cadeias produtivas e das redes econômicas e sociais, o que implica a existência de capital social, capital humano e capital financeiro. Mas são estudos recentes, que carecem de melhor compreensão por parte da população.

O que se observa, na prática, é que o impacto da privatização de serviços básicos, como a educação, sobre as formas organizativas da sociedade civil tem reforçado no Brasil a exclusão social e, com ela, a diferenciação entre os grupos quanto à capacidade de se inserirem organizadamente no sistema social. Diante dessa constatação, a educação ambiental surge como resposta à crise estabelecida, no sentido de preparar o individuo para enfrentar os problemas ambientais do mundo contemporâneo, tendo como princípios: 1) desenvolvimento de consciência e sensibilidade entre indivíduos e grupos sobre problemas locais e globais; 2) aumento de conhecimentos que possibilitem maior compreensão sobre o ambiente e seus problemas associados; 3) mudanças de atitudes e valores que encorajem sentimentos de preocupação com o ambiente e motivem ações que o melhorem e o protejam; 4) desenvolvimento de capacidades que possam ajudar indivíduos e grupos a identificar e resolver problemas ambientais; 5) promoção de participação, que essencialmente significa envolvimento ativo em todos os níveis da proteção ambiental. Esses princípios têm sido a base para as discussões sobre o tema no Brasil e no mundo, porém o desafio tem sido desenvolver programas que os contemplem e demonstrem mudanças comportamentais que reflitam posturas mais éticas, solidárias e participativas (PADUA; TABANEZ, 2001).

Nesse contexto, Leff (2014) defende que "os conflitos socioambientais emergem de princípios éticos, direitos culturais e lutas pela apropriação da natureza que vão além da internalização dos custos ecológicos para assegurar um crescimento sustentado". Faz­-se necessário então, desenvolver novos valores culturais e éticos, transformar estruturas econômicas e reorientar os estilos de vida.

A complexidade ambiental exige o aprendizado de fatos novos, de uma outra pedagogia que incorpore a cada indivíduo uma identidade colaborativa que aproxime os seres nos seus valores, utopias e interesses. Essa concepção foi parcialmente apropriada pela Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA-Lei 9.795/99) que, em seu artigo primeiro, define a educação ambiental como processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos e habilidades, atitudes e competências voltadas para conservação do meio ambiente, de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. Enfatiza, ainda, a questão da interdisciplinaridade metodológica e epistemológica da educação ambiental como "componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal" (art. 2°).

Vale ressaltar acerca do desenvolvimento sustentável, que a formalização de sua dimensão política emergiu a partir da consideração de quatro dilemas fundamentais: a) o da conservação da natureza versus crescimento econômico, cujo foco vem sendo a biodiversidade; b) o da liberdade versus controle, centrado na questão das decisões centralizadas ou das escolhas democráticas quanto aos rumos de ação; c) o da centralização versus descentralização, relacionado à escala espacial adequada à decisão e à ação na área do desenvolvimento sustentável e d) o do reformismo versus revolução, ligado à questão da natureza e intensidade das mudanças requeridas em nível político e institucional para viabilizar a sustentabilidade (SORRENTINO; TRAJBER, 2007).

No caso do semiárido, a educação para a convivência com o bioma caatinga implica na desdogmatização de conceitos e na valorização da sua biodiversidade. Nessa perspectiva, a proposta do projeto de extensão foi orientar práticas que transformassem a visão enviesada de uma região fadada à miséria para outra que vislumbrasse a possibilidade de vida digna.

Dessa forma, objetivou-se formar 200 Agentes Populares em Educação Ambiental, potencializando a inclusão social e o fortalecimento da cidadania por meio de processos de educação, tendo como eixo orientador os princípios da agroecologia. Para tanto, trabalhou-se:

  1. 1. Valorização do conhecimento e do saber local como ponto de partida para ações transformadoras da realidade.

    2. Fortalecimento e melhoria do ambiente de vida de ação e de pensamento das populações locais, por meio da crítica na sua forma de representar e analisar o seu contexto social, político, econômico e cultural.

    3. Criação de redes solidárias de cooperação que pudessem ampliar o capital social necessário para iniciar processos de desenvolvimento territorial.

    4. Estimulo à democratização nas tomadas de decisões, assim como a participação de todos os membros da família na gestão da unidade familiar e nas estratégias de desenvolvimento das comunidades e territórios.

    5. Incentivo a formas associativas que além de criar melhores ambientes de competitividade e produção, fossem geradoras de solidariedade e fortalecessem a capacidade de intervenção coletiva dos atores sociais como protagonistas dos processos do desenvolvimento territorial.

    6. Promoção de abordagens metodológicas participativas.

    7. Contribuição para um melhor aproveitamento dos seus recursos naturais por meio de sistemas produtivos que privilegiassem a utilização de tecnologias de baixo custo destinadas à convivência com o semiárido.

    8. Estimulo à diversificação de culturas, visando à busca de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável da população.

    9. Implantação na UNIVASF de uma unidade demonstrativa de Tecnologias Sociais para a convivência com o semiárido, privilegiando aquelas que aproveitam a água de chuva para os cultivos e as construções que valorizam os recursos naturais, tais como: o sol e o vento.

Material e métodos

As ações vivenciadas nesse projeto foram baseadas em situações testadas anteriormente. A experiência brasileira no nordeste com a Formação de Agentes de Desenvolvimento Sustentável ocorreu no Território do Alto Sertão Piauí- Pernambuco, como resultado do esforço coletivo de transformação da realidade social dos municípios nele envolvidos e remonta ao projeto piloto "Fome Zero", desenvolvido nos anos 2003/2004 no município de Acauã - Piauí, pela EMBRAPA Semiárido de Petrolina - Pernambuco, com o apoio do CmAD - Centre de Coopération lnternationale em Recherche Agronomique pour le Développement de Montpellier França e da FAO- Food and Agriculture Organization of the United Nations. O seu objetivo foi desencadear ações emergenciais e estruturantes capazes de elevar o IDH - índice de Desenvolvimento Humano - daquela população, apontada pelo IBGE naquele momento como um dos piores do Brasil.

Um zoneamento agroecológico do município foi feito de forma participativa, possibilitando a tipificação dos produtores e definindo as ações a serem executadas, sempre buscando o fortalecimento do sistema de produção, do melhor aproveitamento da água de chuva, do processamento de produtos animal e vegetal, mas principalmente capacitando os atores locais por intermédio do CAT - Campo de Aprendizagem Tecnológica onde, pela demonstração prática, foi possível se comprovar a viabilidade das inovações propostas. O trabalho avançou e novos saberes foram incorporados à capacitação, como o sentimento de pertencimento ao meio rural, a valorização da identidade cultural e o fortalecimento dos capitais social e humano, além da utilização da informática na perspectiva de um novo olhar sobre o campo. Para tanto, cinquenta e cinco jovens foram preparados para serem Agentes de Desenvolvimento Sustentável das suas comunidades, atuando voluntariamente como multiplicadores das ideias inovadoras de convivência com o semiárido.

De tão bem-sucedida, a experiência buscou novos parceiros e alargou o seu campo de atuação para os municípios de Afrânio, Dormentes e Santa Filomena, em Pernambuco, e Paulistana e Jacobina, no Piaui. Uma segunda formação de ADS capacitou sessenta e cinco sujeitos aprendizes das várias comunidades que integram o Território do Alto Sertão, dessa vez por docentes da UNIVASF - Universidade Federal do Vale do São Francisco - e pesquisadores da EMBRAPA Semiárido, respeitando-se a cultura local.

Resultados

A pesquisa que avaliou o impacto dos ADS nas transformações sociais, politicas e culturais dos municípios que integram o Território do Alto Sertão Piauí Pernambuco, realizada por dois bolsistas do CNPq integrantes do Programa de Iniciação Científica da UNIVASF, os identificou como partícipes na melhoria da qualidade de vida dos agricultores familiares, tanto por levarem até eles conhecimentos novos relacionados aos plantios e à criação de animais, quanto por conseguirem financiamentos para projetos agropecuários nas suas propriedades.

Destacam como tecnologias inovadoras aprendidas: construção de barragens subterrâneas, silagem, fenação, forragem, sal proteinado, amoniação, plantio em curva de nível, plantio consorciado, além de melhor manejo do solo e dos animais, com reflexos positivos na redução do tempo para a execução das tarefas. Ressaltam ainda a compreensão que passaram a ter sobre a caatinga, isto é, sua riqueza, diversidade e a importância de preservar os seus recursos naturais, evitando a queimada, o desmatamento e a caça predatória, num ecossistema já bastante comprometido.

A subordinação dos países ao processo de acumulação financeira que caracteriza a atual globalização, talvez seja o principal mecanismo de produção da desigualdade. Nesse cenário, é importante ampliar as possibilidades de educação para que não fique restrita apenas às escolas formais, mas possa ser transposta para outros espaços, uma vez que a participação da comunidade na gestão dos assuntos públicos faz-se cada vez mais necessária. Como destaca Abromovay (2002):

A ideia de desenvolvimento local procura colocar ênfase em mecanismos institucionais específicos, capazes de mobilizar energias produtivas que o funcionamento dos mercados cabe inibir e que a simples presença de certas infraestruturas mostra-se incapaz de despertar [...]. A abordagem territorial e não setorial do desenvolvimento, supõe a ampliação das oportunidades de escolha por parte dos indivíduos, isto é, o alargamento das possibilidades de geração de renda para além da atividade agrícolas (ABROMOVAY, 2002).

Posteriormente, a UNIVASF com o apoio do CNPq e do MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário, desenvolveu projeto similar, envolvendo dez municípios de Juazeiro - Bahia, e Petrolina - Pernambuco, em parceria com o Instituto Federal do Sertão Pernambucano e a Universidade do Estado da Bahia, com resultados positivos.

Para essa experiência, a metodologia de ação teve caráter educativo, baseado nas competências da alfabetização científica e com ênfase na pedagogia da prática, promovendo a geração e a apropriação coletiva de conhecimentos, a construção de processos de desenvolvimento sustentável e a adaptação e adoção de tecnologias voltadas para a formação de agricultores familiares sustentáveis, onde o ponto de partida sempre foi a realidade e os saberes locais.

Para a execução das ações formativas, a metodologia foi a da Alternância, permitindo ao participante sedimentar a sua experiência em dois tempos: tempo escola e tempo comunidade. No tempo escola, foram exercitadas as teorias e as práticas relacionadas às temáticas da formação. No tempo comunidade, foram priorizadas ações que construíssem um modelo de desenvolvimento local sustentável, na perspectiva do fortalecimento da cidadania dos sujeitos envolvidos. A formação dos ADS contemplou conhecimentos básicos em humanidades, como estratégia para a construção de uma visão clara da realidade, e um instrumental de pesquisa social aplicada, para estimular o potencial reflexivo, criativo, técnico e organizativo, a fim de que as comunidades envolvidas pudessem responder ativamente às demandas e, mais do que isso, subsidiar o poder público na definição de políticas sociais que melhorassem a qualidade de vida da população rural.

A cidadania só pode ser exercitada plenamente se o cidadão e cidadã, além de ter acesso ao conhecimento, puder produzi-lo e exercê-lo. Os ADS precisavam contribuir para que isso ocorresse, daí que as discussões e as atividades em tomo de temas como solidariedade, bem-estar individual e coletivo, identidade, cultura, sociabilidade, coletividade, capital social, capital humano, economia solidária num contexto globalizado, juntamente com temas vividos e propostos pelas populações locais, foram fundamentais para o fomento de uma postura crítica e aberta à diversidade que o mundo e a vida comportam. Como diz Sachs et al. (2007):

[...] é necessário discutir a cidadania não como uma soma de identidades, mas sim como um principio de articulação que afeta as diferentes posições subjetivas dos agentes sociais, ao mesmo tempo em que permite uma pluralidade de lealdades especificas e o respeito à liberdade individual (SACHS et al., 2007).

Ao tecer comentários sobre o assunto, Scotto et al. (2009) refere-se ao analfabetismo cientifico como responsável pela "falta de acesso a oportunidades de trabalho e crescimento profissional e pelo escasso aproveitamento que os governos fazem do conhecimento cientifico para a resolução de problemas produtivos e sociais com vistas ao desenvolvimento sustentável".

A formação teórica teve duração de 120 horas, abrangendo os seguintes temas e conteúdos:

I. SOCIEDADE, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

  1. 1.1. Concepções histórico-filosóficas-sociológicas do Desenvolvimento Socioambiental;

    1.2. Meio Ambiente, Gestão Ambiental e Qualidade de Vida;

    1.3. Desenvolvimento Sustentável: um conceito em construção;

    1.4. Administração e Gestão Ambiental Urbana/Rural e sua relação com o Desenvolvimento Sustentável;

    1.5. Ética, Cidadania e Meio Ambiente;

    1.6. Responsabilidade Social;

    1.7. Direito Ambiental e Legislação;

    1.8. A educação ambiental como ferramenta para as transformações atitudinais.

2. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O CAMPO

  1. 2.1. Centralização e descentralização no Brasil em perspectiva histórica;

    2.2. República;

    2.3. A organização da burocracia estatal;

    2.4. Descentralização e Reforma do Estado;

    2.5. A constituição de 1988 e o novo pacto federativo;

    2.6. Autonomia municipal;

    2.7. Competências e atribuições dos municípios;

    2.8. Descentralização das políticas públicas;

    2.9. A intersetorialidade e a transversalidade das politicas para o campo;

    2.10. O papel da sociedade civil e do Estado;

    2.11. Atuação dos Conselhos no processo democrático;

    2.13. Programas e Projetos voltados para o campo.

3. BIOMA CAATINGA

  1. 3.1. Definição, classificação e característica da vegetação da Caatinga;

    3.2. Espécies vegetais da Caatinga e seus usos;

    3.3. Unidades de conservação da Caatinga;

    3.4. Aspectos fitogeográficos;

    3.5. Ciclos da seca;

    3.6. O semiárido e o contexto do desenvolvimento sustentável.

4. TECNOLOGIAS DE CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO

  1. 4.1. Paradigmas de convivência com o semiárido;

    4.2. Concepções de Paulo Freire sobre Educação Contextualizada;

    4.3. Captação de água de chuva;

    4.4. Dimensionamento e construção de cisternas;

    4.5. Dimensionamento e construção de barragem subterrânea;

    4.6. Irrigação de salvação;

    4.7. Plantas adequadas ao semiárido;

    4.8. Caprinovinocultura e criação de pequenos animais;

    4.9. Produção de feno e outros alimentos suplementares.

5. ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE INTERVENÇÃO SOCIAL

  1. 5. ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE INTERVENÇÃO SOCIAL

    5.1. Definição de Projeto Sociais;

    5.2. Características do Projeto Social;

    5.3. Tipos de Projetos Sociais;

    5.4. Projetos institucionais e suas características;

    5.5. Projetos para captação de recursos e suas características;

    5.6. Etapas da elaboração;

    5.7. Impactos dos projetos sociais;

    5.8. Monitoramento e avaliação de projetos sociais.

6. METODOLOGIAS PARTICIPATIVAS

  1. 6.1. Conceituação de Sociedade e de Comunidade;

    6.2. Comunidades locais e globais;

    6.3. Lideranças comunitárias;

    6.4. Educação, participação e poder;

    6.5. Metodologias participativas-fundamentos e operacionalização.

7. ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO DE PROJETOS

  1. 7.1. Conceituação de avaliação;

    7.2. Avaliação diagnóstica, formativa e somativa;

    7.3. Elaboração de instrumentos de avaliação a partir dos objetivos;

    7.4. Elaboração de instrumentos de acompanhamento;

    7.5. Construção de indicadores de avaliação;

    7.6. Elaboração de relatórios.

Após a fundamentação teórica sobre a educação ambiental como processo educativo, embasada nos conteúdos de politica, estado, gestão participativa, associativismo/cooperativismo, empreendedorismo, comunidade, organização, ética, cultura popular e outros, conforme descritos acima, foram exercitadas com os ADS as seguintes práticas, a partir da implantação da unidade demonstrativa na UNIVASF de tecnologias sociais para a convivência com o semiárido:

  1. • Técnicas de Inclusão Digital como ferramenta de sustentabilidade quanto às metodologias do trabalho de campo e as tecnologias de convivência com as terras secas, especialmente as relacionadas com o aproveitamento da água de chuva para os consumos humano e animal;

    • Técnicas de captação de água de chuva "In Situ'\ para cultivos agrícolas;

    • Método sulcos barrados, técnicas de captação de chuva para consumo humano e animal;

    • Cisternas rurais;

    • Amoniação;

    • Ensilagem;

    • Fenação;

    • Silo Cincho;

    • Silo de Vara;

    • Produção e utilização de plantas forrageiras para alimentação animal.

A escolha dessas práticas sociais e a metodologia fundamentaram-se nas experiências acumuladas pela UNIVASF nos seus trabalhos de pesquisa e de extensão que comprovam a baixa familiaridade dos agricultores familiares das tecnologias já disponíveis para a convivência com o semiárido, que podem reduzir os riscos de perdas, tanto nos plantios quanto com a criação de pequenos animais, melhorando assim a sua renda e a sua qualidade de vida.

As discussões e as atividades em tomo de temas como solidariedade, bem-estar individual e coletivo, identidade, cultura, sociabilidade, coletividade, capital social, capital humano, economia solidária num contexto globalizado, juntamente com temas vividos e propostos pelas populações locais, foram fundamentais para o fomento de uma postura crítica e aberta à diversidade que o mundo e a vida comportam. Cinco intervenções comunitárias selecionadas pelo projeto foram apoiadas com recursos de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) cada, a fim de estimular o sentimento coletivo e de pertencimento ao local (Quadro 1).



Quadro 1- Projetos, temáticas e comunidades assistidas.
Fonte: Autores.

Conclusões

• Embora o árduo trabalho, no momento em que o participante se apropriava de conhecimentos que realmente serviram de base para a compreensão da realidade, quase sempre passava a agir sobre o seu meio, na tentativa de conciliar os imperativos do desenvolvimento econômico com os de preservação ambiental, minimizando a violência coletiva e fortalecendo a ação comunitária.

• O papel da UNIVASF foi o de promover uma relação dialética e dialógica com os ADS durante a sua formação, a partir da problematização de fatos concretos das realidades locais. Dessa forma, adotou-se um enfoque metodológico que gerasse relações de co-responsabilidade entre os participantes, suas organizações, tanto na fase de planejamento, como na execução, monitoramento e avaliação das ações.

• Nessas intervenções, toda a comunidade se envolveu, gerando coesão comunitária e possibilitando àqueles que não participaram da formação, um aprendizado sobre as temáticas relacionadas, ampliando sobremaneira o capial humano das populações, além do cuidado com o meio ambiente.

• A geração de trabalho e renda também foi estimulada através das ações implementadas.

Material suplementar
Referências
ABROMOVAY, R. Paradigmas do capitalismo agrário em questão. Campinas, Hucitec, 2002.
BANCO MUNDIAL. Le développement auseuildu XX emesiecle. Paris. ESKA, 2000. BRASIL Lei n. 9.795, de 27 de abril de 1999. Institui a Politica Nacional de Educação Ambiental. Diário Oficial da União, Brasília, seção 1, p. 1-4, abr. 1999.
BRUNDTLAND, G. H. Comissão mundial sobre meio ambiente e desenvolvimento - 1988. Nosso Futuro Comum (Relatório Brundtland). Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1988.
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO (CMMAD). Nosso futuro comum. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1991.
FAO-UNESCO. Educación para eldesarrollo rural: hacia nuevas respuestas normativas. Um estudo conjunto de La FAO y La UNESCO. Roma, Paris, 2003.
KLIKSBERG, B. Falácias e mitos do desenvolvimento social. Brasília: UNESCO, Cortez Editora, 2002.
LACKI, P. Como enfrentar a crise da agricultura: lamentando os problemas insolúveis ou resolvendo os problemas solucionáveis? Roma: Papers da FAO, 2002.
LEFF, E. Ecologia, capital e cultura: a territorialização da racionalidade ambiental. São Paulo: Cortez Editora, 2009.
LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
Ministério da Educação, Coordenação Geral de Educação Ambiental: Ministério do Meio Ambiente, Departamento de Educação Ambiental: UNESCO, 2007.
PÁDUA, S.; TABANEZ, M. Educação ambiental: caminhos trilhados no Brasil. São Paulo: Ipê, 2001.
RODRIGUES, N. Por uma nova escola: o transitório e o permanente na educação. São Paulo: Cortez Editora, 2003.
SACHS, I. In: NASCIMENTO, Elimar P.; VIANNA, J. N. (org). Dilemas e desafios do desenvolvimento sustentável no Brasil. Rio de Janeiro: Garamond, 2007.
SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica. 11. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2013.
SCOTTO, G.; CARVALHO, I. C. M.; GUIMARÃES, L. B.. Desenvolvimento sustentável. 4 ed. Petrópolis: Vozes, 2009.
SORRENTINO, M.; TRAJBER, R. Políticas de educação ambiental do órgão gestor. Vamos cuidar do Brasil: conceitos e práticas em educação ambiental na escola/coordenação: Soraia Silva de Mello, Rachei Trajber. P.13-22. Brasília: Ministério da Educação, Coordenação Geral de Educação Ambiental: Ministério do Meio Ambiente, Departamento de Educação Ambiental: UNESCO, 2007.
Notas


Quadro 1- Projetos, temáticas e comunidades assistidas.
Fonte: Autores.
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