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“APRENDER FAZENDO” CARTOGRAFIAS: RELATOS DE EXPERIÊNCIA ATRAVÉS DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

Alex Mota dos Santos
Universidade Federal de Goiás (UFG), Brasil
Thalyta Ferreira Franco
Universidade Federal de Goiás (UFG), Brasil
Thiago de Souza Santana Farias
Universidade Federal de Goiás (UFG), Brasil
Deise Luiza Lúcio de Souza
Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves, Brasil

“APRENDER FAZENDO” CARTOGRAFIAS: RELATOS DE EXPERIÊNCIA ATRAVÉS DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

Revista Conexão UEPG, vol. 16, núm. 1, 2020

Universidade Estadual de Ponta Grossa

Recepção: 05 Agosto 2019

Aprovação: 18 Dezembro 2019

Resumo: Aprender fazendo explora atividades práticas para aprendizagem de cartografias por estudantes do ensino fundamental através do projeto de extensão “A universidade vai à escola”: trocas de experiências pedagógicas a partir do uso de geotecnologias. A metodologia contemplou o uso de ferramentas tecnológicas para elaboração de mapas em ambiente computacional e técnicas analógicas, para elaboração de mapas híbridos e mentais, através da abordagem Hands-on. Os resultados revelaram que crianças se motivam para novas aprendizagens, adaptaram-se de forma satisfatória às ferramentas tecnológicas e avaliaram essa perspectiva de construção cartográfica como a mais relevante.

Palavras-chave: Ensino de cartografia, Ensino fundamental, Transferência de tecnologia.

Abstract: This paper explores practices for learning cartographies by elementary school students through the outreach project ''University goes to school: pedagogical exchange experiences based on the use of geotechnologies". The methodology includes the use of technological tools for the elaboration of maps m computational environments and analog techniques for the elaboration of hybrid and mental maps, through Hands-on approach. The results revealed that the children were motivated for new learning, in addition to adapting satisfactorily to the technological tools and evaluated this perspective of cartographic construction as the most relevant.

Keywords: Cartography teaching, Elementary School, Technology transfer.

Introdução

As atividades práticas favorecem o aprendizado nos diversos níveis do ensino formal. Nesse sentido, segundo Costa e Batista (2017, p. 6), essas atividades estimulam "a criatividade, a crítica e a reflexão no processo de ensino e aprendizagem, proporcionando aprendizado mais significativo aos discentes''. Assim, a aplicação das cartografias e atividades práticas de elaboração de mapas favorecem os estudos de temas atuais, transversais e são recorrentes nas análises geográficas. Segundo Moço (2011, s/p.), conhecer a cartografia é essencial para a compreensão das relações entre espaço e tempo. Além disso, ao potencializar o processo de alfabetização cartográfica no nível básico, "as crianças passam a ler algumas representações e a estabelecer interpretações, sobretudo, com visão crítica" (PAULO et al., 2017, p. 121).

A partir de tais constatações, este artigo apresenta uma experiência de produção cartográfica por estudantes do ensino fundamental por meio da extensão universitária. Nesse sentido, concordamos com Brêtas e Pereira (2007, p. 6) quando afirmam que "a extensão, como prática acadêmica, visa interligar a universidade em suas atividades de ensino e pesquisa com as demandas da sociedade, buscando respeitar o compromisso social da universidade".

As atividades de extensão alcançam as escolas em diversas áreas do conhecimento, das quais destacam-se as ações de orientações profissionais ao nível do ensino médio (PIMENTEL, et al., 2018; FALCAO; CALDAS, 2018), em ensino de cartografia (PAULO et al., 2017; SANTOS et al., 2018; SANTOS, 2018), de reforço escolar em matemática (PELISSARI; ANDREIS, 2019), educação ambiental (FRANÇA et al., 2019), ensino de ciências (SILVA et al., 2019), dentre outros.

No caso específico da cartografia, Santos et al. (2018, p. 92) afirmam que "o estudo da cartografia é prática recorrente no ensino formal e, na universidade foi, desde sempre, um instrumento de ensino, de pesquisa e de extensão". Para os autores, atividades de extensão universitária podem proporcionar a autonomia ao estudante, já que é ele "o produtor" do seu conhecimento a partir das leituras de mundo que todos fazem (SANTOS et al., 2018).

Desse modo, estudar 'cartografias' abre possibilidades do contato com o mundo das representações em ambientes digitais, híbridos e analógicos. Em ambientes digitais, via web, estudantes interagem com ferramentas tecnológicas, tão significativas para o processo de ensino-aprendizagem. Na perspectiva da cartografia híbrida, o estudante recebe mapas impressos e faz a inserção do conhecimento mediado na escola. Por fim, como material analógico, destacamos os mapas mentais, através de uma cartografia dos sentidos, em que "valoriza-se a participação de grupos sociais e dos processos socioambientais econômicos, considerando sua dimensão cultural" (SANTOS, 2017, p. 107).

Os mapas mentais revelam a auto-cartografia, pois valoriza o conhecimento dos estudantes, sem o compromisso com as regras de cartografia convencional. Segundo as pesquisas de Santos et al. (2018), de modo geral, os resultados da auto cartografia revelaram espaços geométricos, em que as crianças trouxeram marcadores espaciais fixos e importantes no espaço. Essas representações são importantes para o estudo de conceitos geográficos, entre os quais lugar, espaço e território.

Desse modo, para a realização das cartografias, adotou-se uma metodologia a partir da perspectiva Hands-on para atividades totalmente práticas, dando oportunidade aos estudantes de participarem efetivamente da construção dos mapas, de forma colaborativa. Em geral, Hands-on (HEILBRONNER; REZULLI, 2016) refere-se ao desenvolvimento de uma atividade ou tarefa de forma totalmente interativa, colocando a "mão na massa", ou aprender pela prática, fazendo.

Nesse sentido, a importância da divulgação dessa experiência advém do fato de que a extensão universitária constitui espaço privilegiado de produção do conhecimento significativo para a superação das desigualdades sociais existentes (SCHEIDEMANTEL et al., 2004), contribui de forma substancial para o desenvolvimento de atividades pedagógicas formativas (LEANDRO; SOUZA, 2018) e o estabelecimento da relação da universidade com a sociedade. Portanto, entendemos que ações de extensão merecem ampla divulgação.

Materiais e Métodos

A Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves está localizada na Rua Celeste Baiochi (Figura 1), no Residencial Barravento, p feria da cidade de Goiânia. A escola funciona em regime integral, e seu Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi de 7,9. A escola recebe outras ações oferecidas por professores da Universidade Federal de Goiás nas áreas da dança, matemática e física. Essa foi uma observação importante quando do desenvolvimento das atividades desse projeto de extensão, pois a escola encontrava-se aberta às ações oferecidas pela universidade, que acompanha de perto e oferece apoio pedagógico. Além disso, a escola dispõe de um laboratório de informática equipado com Sistema Operacional Linux e com acesso à internet, requisito mínimo para a realização de parte das ações de extensão desse projeto, especialmente a cartografia digital.

Figura 1 - Localização da Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves.
Figura 1 - Localização da Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves.
Fonte: Organizado e elaborado pelos autores.

Procedimentos metodológicos

A escola oferece ensino básico em nível de primeiro e segundo ciclo. Desse modo, por se tratar de menores de idade, todo o processo de seleção dos participantes foi conduzido pela sua coordenação pedagógica. A instituição selecionou 30 estudantes com idades entre 10 e 12 anos, todos matriculadas no sexto ano. A escola também se responsabilizou pela comunicação com os pais e responsáveis e definição do horário de realização das atividades. Assim, as atividades foram realizadas às quintas-feiras, das 15 às 17 horas, entre os meses de outubro de 2018 e junho de 2019.

O início das atividades na Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves ocorreu a partir da apresentação, por parte dos pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), de suas atividades de extensão, de ensino, pesquisa e importância para a sociedade, numa linguagem acessível às crianças. Para essa apresentação, utilizaram-se os vídeos elaborados pela Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) da Universidade Federal de Goiás, para cada curso oferecido pela instituição, e que estão disponíveis do site da instituição.

No segundo momento, as oficinas de mapas mentais foram elaboradas de forma livre. Nessa fase, as crianças recebiam materiais básicos, como lápis para escrever e desenhar e papel. A elaboração dos mapas foi mediada por discussões sustentadas em temas geradores: o conhecimento do mundo vivido, a dinâmica intraurbana a partir dos bairros da cidade de Goiânia e a escola. Ou seja, eram apresentados os temas, realizadas as discussões e os estudantes eram encorajados e convidados a mapear o que conheciam e o que reconheciam ao longo do trajeto que percorriam até a escola.

Essa metodologia foi explorada por Kozel (2007) e por Santos (2017). Para Kozel (2007), os mapas mentais refletem o vivido pelos sujeitos como linguagem repleta de signos construídos socialmente. Além disso, segundo Kozel e Nogueira (1999, p. 244):

Através da valorização dos mapas mentais desenhados pelos alunos podemos desmistificar a superioridade técnica das construções dos mapas oficiais. Mostrando que as representações que estes constroem podem vir a ser um "verdadeiro mapa" se trabalhados com recurso técnicos, pois como vimos os mapas mentais são como os "oficiais" representação do espaço real, do mundo real, diferindo apenas em precisão.

As oficinas de cartografia híbrida foram realizadas de forma semelhante às oficinas de mapas mentais. Contudo, nessa fase os estudantes receberam mapas impressos, dos quais destaca-se os mapas de Goiás e do Brasil. Nesse sentido, segundo Schlemmer (2018), a cartografia pode ser dita híbrida em diversas perspectivas, quanto à natureza dos espaços (geográfico e digital), quanto à presença (física e digital), quanto às tecnologias (analógicas e digitais) e quanto à cultura (pré-digital e digital). Nesse sentido, nessa análise o termo híbrido foi entendido sob a perspectiva das tecnologias utilizadas, analógicas e digitais. Ou seja, os estudantes recebiam o mapa de base, elaborado digitalmente, impressos e inseriam os conhecimentos e conteúdos já explorados pela escola. Os mapas digitais para essa etapa foram obtidos do site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

As oficinas de cartografia digital foram mediadas também por temas geradores, normalmente, atuais e transversais ao currículo. Essa mediação ocorria através de debates sobre os conteúdos, pois o foco não era apenas a oficina em si, mas a discussão dos conhecimentos a serem representados.

Desse modo, sustentada pela interatividade alcançada pelo uso da tecnologia, o projeto se valeu de aplicativos disponíveis na web para confecção de mapeamentos temáticos.

  1. • WebCart Beta, que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é um ferramenta simplificada para criação de cartogramas a partir dos dados contidos no canal Cidades@. Seu uso é muito simples, basta escolher o tema de interesse, calcular seu indicador usando mais de uma variável e criar o cartograma que desejar;

    • SIEG Mapas, ferramenta de mapa interativo do Sistema Estadual de Geoinformação de Goiás (SIEG), que é uma ferramenta de análise de dados socioeconômicos e ambientais do Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (IMB), coordenado pela Secretaria de Estado de Gestão e Planejamento (SEGPLAN);

    • IPEAdata, que é uma base de dados macroeconômicos, financeiros e regionais do Brasil mantida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada;

    • IBGE Mapas, que permite a visualização de diversos mapas produzidos pelo IBGE, acompanhados de uma explicação sucinta sobre o assunto mapeado, principalmente os elementos físicos e ambientais.

De forma geral, como adiantado, os temas foram discutidos exaustivamente, nas três perspectivas e na sequência das ações, realizadas as oficinas de cartografias. A discussão exaustiva se relaciona ao fato de que a equipe de execução das ações se preocupou em captar o conhecimento dos estudantes, da provocação da reflexão, para em seguida aplicar as oficinas de cartografia. Assim, merece destaque o fato de que o mapa foi o meio, não o principal produto, considerando que o mais relevante foram as discussões apresentadas e mediadas pelos estudantes. Houve esforço pelo ouvir as experiências e os conhecimentos trazidos pelos estudantes. Essa interação é recomendada pela Política Nacional de Extensão Universitária, que orienta para a Interação Dialógica marcada pelo diálogo e troca de saberes entre os envolvidos nas atividades de extensão.

Os assuntos tratados pelas ferramentas são variados, portanto, foi necessário também realizar recorte temático. Nesse sentido, foram eleitos os temas ambiente: fauna ameaçada, regiões hidrológicas, unidades de conservação e tipos de vegetação; aspectos sociais: educação, transporte, desenvolvimento humano e demografia, dentre outros.

Além das discussões realizadas "para e com as crianças", é importante referir a oficina realizada para os professores da escola e a exposição realizada ao final dessa edição do projeto de extensão '"A Universidade vai à escola": trocas de experiências pedagógicas a partir do uso de geotecnologias'. A oficina para os professores foi uma reivindicação da direção da escola. A escola defendeu que todos os professores conhecessem a metodologia da ação de extensão e que, caso julguem pertinente, apliquem às suas atividades de ensino. A partir da oficina, foi elaborado um vídeo para que os professores possam consultar. Esse vídeo está disponibilizado no canal no Youtube® Geotecnologias na Rede (Metodologias ativas para ensino de cartografia e os temas transversais).

A exposição já constava do cronograma das atividades do projeto de extensão e sua realização ocorreu para que toda a comunidade escolar, pais, servidores e demais estudantes conhecessem os produtos do projeto. Além disso, foi uma forma de valorizar a produção cartográfica de todos os envolvidos.

Dessa maneira, a exposição ocorreu no dia 27 de junho de 2019 e foi amplamente divulgada pela escola. Na oportunidade, todos os estudantes da escola participaram dessa etapa de divulgação dos resultados, descrita mais à frente neste artigo.

Por fim, foram aplicados dois questionários, conforme proposta metodológica de Chaer et al. (2011), para sondagem da satisfação e preferências com o projeto por parte dos estudantes do ensino fundamental, com sete perguntas, sendo quatro questões fechadas e três abertas e por parte da escola, com cinco questões, sendo quatro fechadas e uma aberta.

A avaliação é uma etapa importante, deve ser contínua, processada no decorrer das atividades; ser qualitativa e quantitativa, realizada pela universidade e pelo grupo atingido pelas ações, dentre outros. As respostas foram tabuladas em planilha eletrônica e avaliadas de forma quali-quantitativa. Assim, questões objetivas foram analisadas a partir da estatística básica descritiva, as questões subjetivas avaliadas qualitativamente, e as impressões apresentadas nos resultados.

Resultados e Discussões

O relato dos resultados de um projeto de extensão é uma tarefa complexa. Exprime sempre um recorte de uma realidade ampla, pois atinge diversos públicos, incluindo pais, professores e outros servidores da escola. No caso em tela, o projeto de extensão ''movimentou a escola", alterando os horários dos estudantes.

A apresentação da UFG, através dos vídeos da PROGRAD/UFG, referido na metodologia, foi um momento ímpar, que aguçou curiosidades. Discutimos as abordagens dos diversos cursos de graduação da UFG, sua importância para a sociedade, para a economia e para sustentabilidade.

Os estudantes fizeram questão de indagar sobre a atuação dos diversos cursos, com destaque para a Veterinária, Biologia e Direito (ainda denominando de advocacia). Aproveitaram para interagir com os dois estudantes monitores do projeto a respeito da satisfação deles com a frequência universitária, no caso as atividades do curso de Geologia. Ao mesmo tempo, nessa integração, os estudantes da UFG revelaram suas descobertas e curiosidades, especialmente àquelas relacionadas às áreas que atuam.

Foi realizada a produção dos três tipos de cartografias: mental, híbrida e digital, como já referido. Assim, a cartografia mental, ou auto cartografia, foi mediada de diversas formas, como referido na metodologia, em que se destaca àquela que revela o mundo vivido, as experiências no espaço a partir do trajeto casa-escola. Nesse sentido, as crianças perceberam que viver em uma metrópole como Goiânia revela a obrigatoriedade de grandes deslocamentos.

Desse modo, discutimos com as crianças a importância da auto cartografia, através dos mapas mentais como ferramenta para a produção de conhecimento de forma autônoma (Figura 2). Foi reforçado que eles podem cartografar de forma livre.

Nesse sentido, o exemplo de mapa mental realizado por uma das crianças revelou a sua percepção sobre a estrutura intraurbana do bairro onde a escola está localizada: lotes vazios, áreas verdes, residências, comércios e pavimentação. A organização intraurbana da cidade de Goiânia realmente revela grandes vazios, considerados por Moraes (2003) como as "terras de engorda", que é prática perversa de se criar bolsões de reserva de lotes ou loteamentos na cidade.

Essas áreas oferecem riscos para a saúde, pois todos os anos ocorrem incêndios que comprometem a qualidade do ar. Além disso, o lixo, que é depositado nos lotes baldios, acumula água, que se toma criadouro do mosquito da dengue. Isso as crianças perceberam muito bem.

A representação revela ainda um espaço verde, um parque ou uma praça, que é diferente do 'lote', espaço vazio sem destinação adequada, como referido acima. Os espaços verdes são importantes reservas da flora e fauna do Cerrado. Aproveitamos desse momento para também esclarecer as principais funções das áreas verdes em cidades, dentre as quais a função estética, social para lazer e função ecológica para o conforte térmico e qualidade do ar (VIEIRA, 2004).

Figura 2 - Percepção do espaço a partir do trajeto casa-escola.
Figura 2 - Percepção do espaço a partir do trajeto casa-escola.
Fonte: Elaborado por estudante participante das oficinas de cartografia.

O mapa mental da Figura 3 evidencia a distância (aproximadamente 3 km) percorrida pela estudante que o elaborou, cujos marcadores espaciais mais significativos foram comércios, outras escolas e sua casa. Além disso, mostra que ela encontra pelo seu caminho quatro outras escolas, mas é para a Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves que a estudante se destina, certamente pela estrutura física e qualidade do ensino. Nas discussões para elaboração dos mapas mentais, as crianças revelaram a importância dessa escola para suas vidas, muitas referiram a qualidade e frequência das refeições servidas (no mínimo três ao dia), as atividades de dança, de música que são oferecidas pelas parcerias realizadas pela escola, especialmente com a Universidade Federal de Goiás.

No mapa está representado ainda uma geometria comum nas vias de Goiânia, os pontos de intersecção, popularmente conhecidas como rotatórias. Essa geometria dificulta a mobilidade dos pedestres, pois prioriza a circulação dos veiculas.

Figura 3 - Percepção do espaço a partir do trajeto casa-escola.
Figura 3 - Percepção do espaço a partir do trajeto casa-escola.
Fonte: Elaborado por estudante participante das oficinas de cartografia.

Da cartografia híbrida destacamos uma representação que valorizou o conhecimento da divisão político-administrativo em regiões do Brasil (Figura 4). Observamos que esse conhecimento está sedimentado, pois as crianças apresentaram domínio satisfatório para a faixa etária. Além disso, aproveitamos essa representação para discutir os elementos indispensáveis ao mapa, na perspectiva cartesiana: título, legenda, localização (rosa-dos-ventos), fonte dos dados e autoria. A escala foi obtida de forma aproximada.

O mapa base para essa atividade leva em conta as características físicas ou naturais, do relevo, do clima, da vegetação, da hidrografia, como também das atividades econômicas e culturais de cada uma.

O reconhecimento das regiões se associa aos estudos geográficos e o estado atual é reflexo de diversas formas de organizações políticas administrativas de seu espaço, as primeiras divisões começam no período colonial com a formação das capitanias hereditárias (MARQUES, 2017), conteúdo da história, que se vale dos mapas para suas representações.

A complementação do conteúdo desse tópico foi obtida diretamente do site do IBGE, aproveitando-se a oportunidade para reconhecer a atribuição e a importância desse órgão para o Brasil e para os brasileiros, incluindo a contagem em tempo real do número de habitantes do País.

Figura 4 - Cartografia híbrida das grandes regiões do Brasil. Escala aproximada: l/2.600.000.
Figura 4 - Cartografia híbrida das grandes regiões do Brasil. Escala aproximada: l/2.600.000.
Fonte: Mapa de base do IBGE e conhecimento das regiões por estudante participante das oficinas de cartografia.

A cartografia digital foi a perspectiva mais explorada, pois os estudantes apresentaram entusiasmo para as ferramentas geotecnológicas, observadas a partir do contato com o site do IBGE e do SIEG Goiás. A interatividade, proporcionada pela possibilidade de alteração das cores, o movimento dos mapas em ambientes computacionais atraíram a atenção.

Nesta perspectiva, exploramos as ferramentas WebCart Beta, SIEG Mapas, IPEAdata e IBGE Mapas, como referido. Os estudantes mapearam os tipos de climas do Brasil. Esse tema foi a oportunidade para discutir, inclusive, como o clima influencia nas atividades econômicas do País.

Outro tema gerador foi sobre unidades de conservação, cuja discussão foi adaptada para a idade dos estudantes, deixando claro que, de forma básica, o Estado Brasileiro, através de legislação específica, classifica as unidades de conservação em dois tipos: de proteção integral e uso sustentável. Falamos dos parques municipais, estaduais e federais, e, nesse sentido, valendo-se dos dados do SIEG, mapeamos os parques estaduais e federais localizados no Estado de Goiás. Além da elaboração dos mapas, as crianças pesquisaram fotos dessas áreas protegidas por lei.

Associados aos parques, exploramos os mapas interativos, Mapas Físicos e Ambientais, do IBGE, disponibilizados no link: http://mapasinterativos.ibge.gov.br/sigibge/. Essa ferramenta é importante, e devido à sua interatividade, empolga as crianças. Os mapas apresentam pictogramas que representam os animais ameaçados de extinção no País. Ao clicar nas figuras no site do IBGE, é disponibilizado o sistema de classificação dos seres vivos: classe, ordem e família dos animais. Após a organização dos dados e informações, os estudantes definiram, de acordo com seus interesses, quais os mapas seriam impressos.

Contudo, antes das apresentações dos mapas interativos, fizemos um levantamento sobre o conhecimento dos estudantes quanto aos animais ameaçados de extinção no País. Observamos que os animais mais citados são aqueles divulgados pela mídia, especialmente a televisão. Desses animais, foram lembrados a arara-azul, lobo­ guará e onça-pintada e o mico-leão-dourado.

Estes observaram que as áreas protegidas são importantes para preservação da fauna, mas também da flora, que no Cerrado Goiano foi apropriado predatoriamente para produção de grãos (SILVA, 2013).

O transporte foi tema de reflexão nas oficinas temáticas e configurou tema gerador para elaboração dos mapas. Desse modo, destaque foi dado para sua importância, os impactos sobre a vida em sociedade, especialmente a partir da ocorrência de acidentes (Figura 5).

Nesse sentido, considerando que a frota de veículos tem crescido, e que é uma das variáveis observadas na ocorrência de acidentes, mapeou-se o número de veículos, portanto, a frota no Estado de Goiás. Nesse momento das atividades, os estudantes exploraram a localização dos municípios. Essa sempre é uma atividade totalmente interativa, em que eles exploram os 'lugares' dos pais, onde nasceram, onde nasceram outros parentes e para onde viajam nas férias. Por alguns momentos, a atividade mais importante, de fato, não foi o mapeamento convencional, mas o mapeamento dos lugares ouvidos dos pais e familiares.

Exploramos ainda a questão da poluição pelos veículos, o impacto sobre o trânsito, a ocorrência de congestionamentos e comportamentos de risco. Desse modo, é importante referir que ações de educação para o trânsito, a partir dos dados do IBGE, dos Departamentos Estaduais de Trânsito e do IPEA Data devem ser ampliadas nas escolas, assim como fez Santos (2018). Para o autor, "o trânsito é uma das atividades humanas que requer maior reflexão sobre comportamento, respeito e compreensão para convivência saudável" em sociedade (SANTOS, 2018, p. 20).

Mapeamos o número de vítimas de acidentes de trânsito no Brasil. Selecionamos para essa publicação os dados do ano de 2017, os mais atuais. A partir do mapa, observamos que os estados Acre e Amapá apresentaram menores números de vítimas de acidentes no trânsito. Por outro lado, os estados da Região Sudeste apresentaram maior número de vítimas.

Figura 5 - Número de vitimas de acidentes de trânsito no Brasil, ano de 2017.
Figura 5 - Número de vitimas de acidentes de trânsito no Brasil, ano de 2017.
Fonte: DataSUS e IPEA Data, mapa elaborado por estudantes participantes das oficinas de cartografia.

Além do exposto, destacamos como resultado a organização da exposição cartográfica (Figura 6) com mapas dos três tipos de cartografias apresentadas: mental, híbrida e digital. A escola enviou convites para os pais e possibilitou que toda a comunidade escolar participasse.

Na oportunidade, foi explicado a respeito da realização do evento, do que se tratava, sobre as formas de exposições. Nesse momento, os estudantes participantes das atividades do projeto responderam curiosidades do projeto aos demais colegas da escola. Além disso, discutiram as preferências no universo das ferramentas utilizadas.

Figura 6 - Convite e realização da exposição "Cartografias dos estudantes do ensino fundamental".
Figura 6 - Convite e realização da exposição "Cartografias dos estudantes do ensino fundamental".
Fonte: Elaborado pelos autores.

Por fim, foi realizada a avaliação das atividades do projeto de extensão. A avaliação para os estudantes do ensino fundamental incidiu sobre a satisfação com as atividades desenvolvidas, sobre os assuntos tratados e ferramentas utilizadas, relevância social, interação a partir do contato com os pais, identificação da universidade, sua importância e o uso do espaço do laboratório.

Desse modo, 80% dos inquiridos atribuíram nota máxima ao projeto, 20% avaliaram com nota 8. Sobre a equipe que realizou as atividades, a totalidade dos estudantes avaliou como "Ótimo" e com nota máxima.

Ao avaliarem as atividades realizadas, os estudantes revelaram o entusiasmo pelos mapas digitais, pois a maioria destacou essas atividades como as mais satisfatórias. Inclusive, todos os estudantes revelaram que conversaram e informaram os seus pais sobre as atividades desenvolvidas.

Essa informação é relevante, na medida em que o conhecimento extrapolou o ambiente do laboratório, chegando aos pais e familiares. Além disso, 80% dos inquiridos revelaram também que as atividades contribuíram para que utilizassem mais vezes os computadores da escola. Os demais relataram que já utilizavam o laboratório muitas vezes por semana.

Nesse sentido, não se identificou, para o período mais recente, pesquisas, especialmente em Goiânia, sobre como e qual a periodicidade de utilização dos espaços dos laboratórios de informáticas em escolas municipais. Contudo, em nível nacional, segundo o censo da educação do ano de 2017, 81% das escolas públicas possuíam laboratórios de informática, no entanto, 59% era utilizados. As informações do censo precisam ser analisadas de forma criteriosa, pois Santos (2018), ao realizar atividades de extensão numa escola da rede estadual de ensino na cidade de Goiânia, observou que o laboratório só existia nos documentos oficiais. Ocorria que, na prática, os equipamentos encontravam-se guardados em armários, porque a escola não possuía, nos seus quadros, um técnico de laboratório.

A escola também avaliou com nota máxima as atividades do projeto de extensão, enaltecendo o empenho da equipe composta pela coordenação, a discente bolsista e o discente voluntário. Não foram identificadas pela escola reclamações dos pais ou dos estudantes sobre a condução das atividades.

Por fim, a escola reforçou que é preciso "continuar com esses projetos nas escolas públicas, oferecendo oportunidades para novas aprendizagens".

Considerações Finais

Apesar dos resultados, que indicaram valorização da cartografia digital, é importante demarcar que todas são importantes e devem ser utilizadas de forma integrada. A cartografia 'mental' ou auto cartografia e a cartografia híbrida são atividades indispensáveis em escolas que não possuem os recursos tecnológicos necessários para a cartografia digital. Além disso, referir que o mapa, apesar de sua relevância para diversas abordagens, não é o foco dos debates, mas sim, os conteúdos trabalhados de forma exaustiva.

Além do exposto, vale mencionar que o protagonismo da escola foi decisivo para o sucesso das atividades. No caso em tela, a escola assumiu a responsabilidade da alteração de horários comunicados aos pais, deixando a equipe do projeto de extensão muito livre e apoiando nas demandas que surgiram. Essa informação diz muito sobre o porquê da Escola Municipal Professora Maria Nosidia Palmeiras das Neves ter rendimento do IDEB acima da média na cidade de Goiânia, e isso é valorizado pelos pais e estudantes.

Referências

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