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ANATOMIA: AGENTE INTEGRADOR DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM
ANATOMIA: AGENTE INTEGRADOR DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM
Revista Conexão UEPG, vol. 16, núm. 1, pp. 01-07, 2020
Universidade Estadual de Ponta Grossa
Recepção: 13 Março 2019
Aprovação: 16 Janeiro 2020
Resumo: A falta de estrutura fisica nas escolas inviabiliza a prática de atividades na disciplina de Ciências e, consequentemente, pode acarretar a tião consolidação plena do conteúdo estudado, como em relação aos conhecimentos de Anatomia. A vista disso, f01 desenvolvido o projeto "Anatomia: agente integrador do processo de ensino-aprendizagem", a fim de amenizar tais circunstâncias. Destarte, o objetivo do presente trabalho é apresentar as atividades desenvolvidas no projeto, bem como aproximar a comunidade escolar da cidade de Londrina-PR e região das instalações e da dinâmica de ensino desenvolvidas no Departamento de Anatomia da UEL. O projeto recebeu escolas de Londrina e região do estado do Parana, beneficiando um total de 444 escolas e 19.983 indivíduos das mais variadas faixas etárias (no período entre agosto de 2012 e maio de 2015). Portanto, J?Ode-se verificar o importante papel socioeducacional que o Departamento de Anatomia da Universidade Estadual de Londrina exerce por meio desse projeto de extensão, ressaltando a importância de a universidade aproximar a comunidade por meio aa visitação em suas instalações.
Palavras-chave: Anatomia humana, Museu, Extensão universitária, Laboratório, Ensino.
Abstract: Lack of appropriate physical structures in schools can make the practice of activities in science subjects unfeasible and, consequently, may lead to failure regarding the full consolidation of the contents studied (as in relation to knowledge of Anatomy). ln view of this, the project "Anatomy: integrating agent m the teaching-learning process" was developed to ameliorate these circumstances. Thus, the objective of this paper is to present the activities developed in the project, as well as bring the school community closer to the city of Londrina-PR and its surrounding region in relation to the teaching facilities and dynamics developed at the UEL Anatomy Department. The project received schools from Londrina in Paraná State and neighboring towns, benefiting a total of 444 schools and 19,983 individuals from various age groups (from August 2012 to May 2015). Therefore, we could verify the relevant socio-educational role that the Department of Anatomy of the State University of Londrina plays through this extension project, emphasizing the importance of the visits to the university facilities in fostering closer relationships with the community.
Keywords: Human anatomy, Museum, University extension, Laboratory, Teaching.
Introdução
No final do século XX, o ensino de c1encias no Brasil passou por uma reestruturação no sentido de garantir uma melhor qualidade no processo de ensino aprendizagem (RICKMANN, 2009). Essas reformas educacionais foram importantes, pois introduziram e ampliaram o uso de metodologias voltadas para a formação de um cidadão crítico e criativo (BRASIL, 1998).
Ainda nesse contexto, o Ministério da Educação aponta que o estudo de ciências, quando realizado apenas com ferramentas teóricas, não possibilita ao estudante ampliar e aprender de forma plena o conteúdo ministrado pelo professor (BRASIL, 1998). Nesse sentido, a utilização de metodologias ativas de ensino, como, por exemplo, a observação de estruturas anatômicas, pode despertar ainda mais o interesse dos estudantes pelo conteúdo ensinado (SANTOS et al., 2019).
No entanto, como as escolas não apresentam laboratórios práticos de Anatomia Humana, os professores devem buscar alternativas para que seus estudantes possam vivenciar na prática os assuntos abordados em sala de aula teórica (QUEIROZ et al., 2011). Dessa forma, uma estratégia seria a interlocução entre escola-universidade por meio de projetos de extensão voltados à visitação dos laboratórios de Anatomia, condição que favorece uma maior consolidação do conteúdo teórico já estudado (CONTO, 2014; BLANCO; ARAUJO; COELHO NETO, 2017).
Destarte, é de suma importância que as universidades proporcionem maneiras para socializar os espaços, o acervo e os conteúdos com a comunidade, no intuito de facilitar o entendimento e a aprendizagem dos estudantes, além de contribuir para o desenvolvimento de estudos e inovações pedagógicas para melhorar e dinamizar o atendimento dos escolares de instituições que não possuem um acervo de peças anatômicas (SILVA et al., 2016).
Neste ínterim, a Universidade Estadual de Londrina (UEL) desenvolve o projeto de extensão "Anatomia: agente integrador do processo de ensino-aprendizagem". Assim, o objetivo do presente trabalho é apresentar as atividades desenvolvidas no projeto, bem como aproximar a comunidade escolar da cidade de Londrina-PR e região das instalações e da dinâmica de ensino desenvolvidas no Departamento de Anatomia da UEL.
Metodologia
Infraestrutura para realização do projeto e colaboradores
A UEL está localizada no norte do estado do Paraná e consolida-se como uma das principais instituições de ensino superior do país. A instituição apresenta como missão a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, com plena autonomia didático científica, comprometida com o desenvolvimento e a transformação social, econômica, política e cultural do Estado do Paraná e do Brasil. Anualmente, atrai uma grande quantidade de visitantes de diversas localidades para os mais variados centros de estudo (UEL, 2019).
O projeto "Anatomia: agente integrador do processo de ensino-aprendizagem" é desenvolvido no Departamento de Anatomia. Os dados para a realização do presente estudo foram coletados nos períodos entre agosto de 2012 e maio de 2015. O Departamento de Anatomia da UEL conta com: 3 salas de aula teórica, 5 laboratórios de aula prática, 1 sala de tanques para armazenamento das peças cadavéricas humanas, 1 sala de tanques para armazenamento de peças de anatomia animal, 1 sala para armazenamento de ossos e o Museu de Anatomia Prof. Carlos da Costa Branco (Figura 1). Para a condução das atividades, participaram 7 docentes, 5 servidores técnico administrativos e 25 discentes das áreas biológicas e da saúde.
Atividades desenvolvidas
No primeiro semestre de 2012, foram enviados convites a todas as escolas cadastradas na Secretaria Municipal de Ensino da região de Londrina-PR para que participassem do projeto, cujo público-alvo eram escolares na faixa etária de 10 a 17 anos. Após o convite, as instituições de ensino começaram a entrar em contato com a secretaria do Departamento de Anatomia da UEL para agendar as visitas, que ocorrem exclusivamente nas segundas, quartas e sextas-feiras. A coordenação do projeto, semanalmente, organiza a equipe de monitores e colaboradores em relação à quantidade de visitantes que serão recebidos em cada dia e o nível de escolaridade dos alunos.
Assim, no dia agendado, ao chegarem no Departamento de Anatomia da UEL, os visitantes são, primeiramente, direcionados para uma sala de aula teórica, na qual é proferida uma palestra de esclarecimento quanto à obtenção, conservação e guarda do material cadavérico, a importância desses materiais e também a forma de aquisição dos corpos por meio de doação direta ou pelo Conselho Estadual de Distribuição de Cadáveres do Paraná (Figura 2). Após a palestra, os monitores conduzem os visitantes ao laboratório de aula prática, que é previamente organizado e dividido por estações (sendo que cada estação se refere a um sistema corporal), para que, assim, os visitantes contem com uma maior facilidade para entender as apresentações das estruturas anatômicas, suas funções e características (Figura 3). A duração da exposição pode variar entre 40 minutos e 1 hora, tempo dividido entre apresentação e esclarecimento de possíveis dúvidas. Concluído o tempo estipulado de cada exposição, os alunos visitantes são conduzidos para a mesa seguinte, até que todos tenham vivenciado cada sistema do corpo humano.
Findada a apresentação no laboratório de aula prática, os visitantes são conduzidos ao museu de Anatomia, que contém em seu acervo tanto peças cadavéricas de humanos como de animais (Figura 4). A visitação dura cerca de 3 horas e o número de pessoas e de instituições que visitam o Departamento de Anatomia é contabilizado, como forma de acompanhamento, por meio de um livro de frequência que os alunos participantes assinam logo ao adentrar o museu.
Resultado e discussão
Entre os meses de agosto de 2012 e maio de 2015, 19.983 pessoas visitaram o laboratório e o museu de Anatomia por meio do projeto de extensão "Anatomia: agente integrador do processo de ensino-aprendizagem", desenvolvido no Departamento de Anatomia da UEL, no qual, durante a realização do projeto, foram realizadas 444 visitas (Tabela 1). Nesse período, as populações atendidas foram professores e estudantes das escolas da cidade de Londrina e região.
A literatura aponta que a falta de laboratórios, a carência de equipamentos e as dificuldades para a aquisição de materiais didáticos para as aulas de ciências, na maioria das escolas brasileiras, limitam os professores a abordar o conteúdo de Anatomia Humana apenas de forma teórica (ZUANON; DINIZ, 2004). Segundo Ribeiro et al. (2011), tal condição distancia os escolares da realidade e a memorização de conteúdos ensinados apenas de forma teórica impede a fixação plena do conhecimento estudado. Em decorrência disso, os professores de escolas que pretendem ensinar Anatomia Humana de forma prática devem buscar alternativas, como a realização de trabalhos didáticos voltados à montagem de estruturas anatômicas e/ou contatar instituições de ensino superior para visitar os laboratórios práticos de Anatomia Humana (FORNAZIERO et al., 2010).
Assim, conforme apresentado na Tabela 1 do presente estudo, o grande número de visitas que o Departamento de Anatomia da UEL recebeu num curto período fortalece a teoria sobre a necessidade de os escolares dependerem das atividades extensionistas das instituições de ensino superior para o estudo prático de Anatomia. Nesse contexto, evidencia-se que a aproximação entre universidade e escola, além de fornecer um ambiente de ensino-aprendizagem enriquecedor, também oportuniza aos escolares conhecer sobre as atividades de graduação na universidade (LEÃO et al., 2015). Essa questão também foi observada na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, onde os visitantes puderam conhecer o material cadavérico dos laboratórios de aula prática e tiraram possíveis dúvidas sobre o conteúdo de Anatomia com os integrantes do projeto (DA COSTA et al., 2013). Nesse sentido, o ensino não-formal que ocorre por meio de visitações a laboratórios e museus de instituições de nível superior desperta um maior interesse nos alunos em aprender novos conteúdos (LIMA; PEREIRA, 2010).
Tendo em vista a necessidade de disseminação do conhecimento e a responsabilidade social da universidade em transpassar seus muros, projetos como esse oportunizam à comunidade o acesso ao conhecimento produzido em seus limites institucionais. Ainda, o projeto realizado neste estudo, similar ao realizado por Dos Santos Silva et al. (2019), assume aspectos de compromisso com os alunos participantes, favorecendo, assim, um trabalho educativo-social e de inclusão com a comunidade externa da universidade. Logo, conforme mencionam Silva et al. (2016), tal condição poderá facilitar o entendimento e aprendizagem dos alunos, bem como contribuir para o desenvolvimento de estudos e inovações pedagógicas que se destinam a realizar melhoras nesse processo de ensino-aprendizagem, sobretudo dinamizando o atendimento aos indivíduos de instituições que não possuem um acervo de peças anatômicas.
Dessa forma, fica evidente a relevância dos projetos de extensão similares ao realizado no Departamento de Anatomia da UEL, pois, além de exercer um papel transformador para a população da cidade e região, também favorece a própria comunidade universitária por integrar docentes, técnicos e graduandos no empenho de produzir materiais didáticos, por meio da dissecação, para apresentar aos visitantes (SILVA; VASCONCELOS, 2006).
Conclusão
Diante do exposto, pode-se verificar o importante papel socioeducacional que o Departamento de Anatomia da Universidade Estadual de Londrina exerce por meio desse projeto de extensão, considerando que recebe pessoas de diferentes faixas etárias e instituições de ensino de Londrina e, portanto, reforça a relevância de a universidade aproximar a comunidade por meio da visitação de suas instalações, como os laboratórios e o museu de Anatomia.
Referências
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