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DIAGNÓSTICO DE LESÕES ORAIS E ANÁLISE DEMOGRÁFICA EM CAMPANHAS DE PREVENÇÃO DO CÂNCER BUCAL: IMPACTO DE AÇÕES EXTENSIONISTAS REALIZADAS EM UMA POPULAÇÃO DO NORDESTE BRASILEIRO
DIAGNOSIS OF ORAL LESIONS AND DEMOGRAPHIC ANALYSIS IN ORAL CANCER PREVENTION CAMPAIGNS: IMPACT OF UNIVERSITY OUTREACH ACTIONS CARRIED OUT IN A POPULATION IN BRAZILIAN NORTHEAST
Revista Conexão UEPG, vol. 19, núm. 1, pp. 01-13, 2023
Universidade Estadual de Ponta Grossa

ARTIGOS



Recepción: 05 Octubre 2023

Aprobación: 01 Febrero 2024

DOI: https://doi.org/10.5212/Rev.Conexao.v19.22484.061

Resumo: Campanhas de prevenção do câncer de boca têm atuado como importantes ferramentas na detecção precoce de lesões orais. Nesse sentido, o objetivo deste artigo foi relatar o impacto de ações extensionistas, realizadas pela Liga Acadêmica de EstomatoPatologia em uma população do nordeste brasileiro, através da análise de fichas clínicas de campanhas de prevenção do câncer bucal. Dos 355 participantes que foram submetidos a exame clínico, 57,8% dos que foram diagnosticados com lesões eram do sexo feminino. As lesões infecciosas foram as mais prevalentes (42,8%), seguidas das desordens orais potencialmente malignas (16,7%), lesões reativas/inflamatórias (15,5%) e defeitos de desenvolvimento (9,5%). Torna-se evidente a relevância do projeto e o impacto positivo gerado na sociedade, uma vez que permite a expansão do conhecimento acerca da população examinada e traz benefícios para os participantes, por meio da ampliação do acesso ao cirurgião-dentista e maior conscientização da importância do autoexame na prevenção de lesões orais.

Palavras-chave: Neoplasias Bucais, Doenças Estomatognáticas, Características da População, Campanhas de Saúde.

Abstract: Mouth cancer prevention campaigns have been used as important tools in the early detection of oral lesions. For this reason, the objective of this article was to report the impact of university outreach actions, carried out by the Liga Acadêmica de EstomatoPatologia, in a population in northeastern Brazil by analyzing clinical records from oral cancer prevention campaigns. Of the 355 participants who underwent clinical examination, 57.8% of those who were diagnosed with injuries were female. Infectious lesions were the most prevalent (42.8%), followed by potentially malignant oral disorders (16.7%), reactive/inflammatory lesions (15.5%) and developmental defects (9.5%). The relevance of the project and the positive impact generated on society were evident since it promoted increased knowledge about the population examined and brought benefits to the participants, through expanded access to dental surgeons and greater awareness of the importance of self-examination in the prevention of oral lesions.

Keywords: Oral Neoplasms, Stomatognathic Diseases, Population Characteristics, Health Campaigns.

Introdução

O câncer de boca é considerado um problema de saúde pública e representa cerca de 3,0% dos casos de câncer no mundo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se em torno de 27 milhões de novos casos para o ano de 2030 (Torres et al., 2016). Campanhas de prevenção contra o câncer bucal, apesar de terem como objetivo maior a detecção de neoplasias malignas, são de extrema importância para o diagnóstico precoce e prevenção de lesões diversas na cavidade oral, fornecendo orientações à população referentes ao autocuidado, especialmente em locais onde o acesso à saúde não é tão igualitário e os fatores socioeconômicos são marcantes, como no nordeste brasileiro. Além disso, a Região Nordeste possui elevadas temperaturas, com um considerável percentual de pessoas que trabalham, por longos períodos, expostas ao sol, fator crucial para o desenvolvimento de lesões em lábio (Freitas et al., 2016).

A mucosa bucal é o principal foco das ações preventivas contra o câncer de boca e pode responder a uma variedade de estímulos (intrínsecos, extrínsecos, locais ou gerais) por meio de crescimento excessivo do tecido epitelial e/ou mesenquimal (Naderi et al., 2012; Seguyën et al., 2015). Vários são os tipos de lesões que podem acometer a cavidade oral, inclusive as não-neoplásicas, sendo as mais comumente descritas: a hiperplasia fibroepitelial, o granuloma piogênico e o granuloma periférico de células gigantes. Nessa região também são comuns lesões pigmentadas e infecciosas (Kashyap et al., 2012; Gondak et al., 2012; Prabhu et al., 2013). Outras alterações que podem estar presentes correspondem às desordens orais potencialmente malignas (DOPM), as quais consistem em alterações teciduais benignas que apresentam um risco maior que o normal de desenvolver uma neoplasia maligna; por esse motivo, o diagnóstico precoce e o tratamento adequado são cruciais para a prevenção do câncer bucal (Kumar et al., 2015; Rodrigues et al., 2018).

Fatores como sexo, etnia, exposição a fatores de risco e estado geral de saúde influenciam na prevalência dessas lesões (Bánóczy et al., 1993), motivo pelo qual campanhas de abordagens coletivas são de extrema importância para as políticas públicas relativas à saúde bucal, fornecendo informações sobre dados demográficos e frequência das lesões nas populações em estudo. Além disso, também atuam como importantes instrumentos para prevenção e diagnóstico de lesões malignas e/ou potencialmente malignas, representando uma fonte relevante de dados de prevalência/incidência de lesões (Costa et al., 2013).

Nesse contexto, a Liga Acadêmica de EstomatoPatologia (LAEP) exerce um papel fundamental, atuando na promoção e prevenção em saúde. Por meio de atividades educativas voltadas para o autoexame da cavidade oral, permite maior acesso da população ao cirurgião-dentista, contribuindo na detecção precoce de lesões orais e redução das taxas de morbidade e mortalidade.

Tendo-se em vista a grande variabilidade de lesões na cavidade bucal e a importância de se compreender o seu acometimento nos indivíduos, em especial, em países de ampla pluralidade sociocultural e extensão territorial como o Brasil, este estudo objetivou relatar o impacto das ações de extensão desenvolvidas pela Liga Acadêmica de EstomatoPatologia (LAEP) do Departamento de Odontologia da Universidade de Pernambuco, da descrição de dados secundários contendo as lesões diagnosticadas em populares, examinados em campanhas de prevenção e/ou rastreamento de câncer de boca no estado de Pernambuco, possibilitando, assim, a realização de uma análise demográfica da população estudada.

Metodologia

Desenho do estudo

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Pernambuco (Parecer nº 6,282,703; CAAE: 71473823.0.0000.5207) e realizado de acordo com a Declaração de Helsinki. A presente pesquisa caracteriza-se como um estudo observacional retrospectivo com fonte de dados secundários. Foram analisadas fichas clínicas de pacientes atendidos em campanhas de prevenção e/ou rastreamento de câncer de boca no município de Recife/PE e região metropolitana, referentes a atividades extensionistas, desenvolvidas nos meses de julho dos anos de 2018 e 2019, pela Liga Acadêmica de EstomatoPatologia da Universidade de Pernambuco, em alusão à prevenção do câncer de cabeça e pescoço – “Julho Verde”. O recrutamento dos pacientes foi feito através de meios de comunicação (internet, rádio e banners).

Calibração dos examinadores

Para as campanhas de prevenção, os alunos de graduação, participantes do projeto de extensão da Liga Acadêmica de EstomatoPatologia, foram previamente treinados por uma professora especialista em Patologia Oral da Universidade de Pernambuco, recebendo instruções quanto ao correto exame e diagnóstico de lesões em cavidade oral. Também foram orientados a instruir os pacientes sobre a realização do autoexame na boca e quanto à importância do diagnóstico precoce de lesões orais potencialmente malignas.

Amostra populacional

O exame intraoral foi realizado em todos os participantes, de modo voluntário, utilizando-se espátulas de madeira e iluminação apropriada. Os pacientes incluídos para avaliação nas campanhas de prevenção apresentaram, no mínimo, 20 anos de idade: devido ao perfil epidemiológico das lesões bucais no Brasil, apenas pacientes com essa idade ou acima foram submetidos para avaliação, sendo excluídos aqueles abaixo dessa faixa etária. Com relação às fichas clínicas para avaliação dos dados secundários, foram excluídas apenas aquelas com informações incompletas e/ou insuficientes a respeito dos diagnósticos clínicos das lesões. Dados como sexo, idade, cor da pele autodeclarada, localização anatômica e diagnóstico clínico da lesão foram coletados a partir da ficha clínica elaborada para a campanha de rastreamento de lesões.

Diagnóstico final

Os participantes que apresentaram lesões suspeitas de malignidade foram encaminhados para o serviço de Estomatologia e Patologia Oral da Universidade de Pernambuco, onde foram reavaliados e obtiveram o correto diagnóstico.

Categorização das lesões

As desordens orais potencialmente malignas (DOPM), os tumores de tecidos moles e tumores odontogênicos foram classificados com base na Organização Mundial de Saúde, do ano de 2022, e as demais lesões orais agrupadas de acordo com o Manual de Patologia Oral e Maxilofacial (5ª edição). Deste modo, as lesões foram categorizadas em: DOPM, lesões reacionais/inflamatórias, defeitos do desenvolvimento da região oral e maxilofacial, lesões odontogênicas, lesões infecciosas, neoplasias de tecidos moles, lesões físicas e químicas, e lesões dermatológicas.

Análise estatística

Os dados foram analisados utilizando-se o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS 22.0; IBM Corp., Armonk, Estados Unidos da América). A estatística descritiva foi adotada para a caracterização dos participantes. As variáveis foram expressas como número absoluto de casos e valores percentuais. O teste do qui-quadrado de Pearson foi utilizado para verificar possíveis associações entre sexo, idade, localização anatômica e lesão. Em todos os testes, p ≤ 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.

Resultados

No presente estudo, 355 participantes foram submetidos a exame intraoral durante campanhas de prevenção do câncer bucal. Destes, 272 (76,6%) não apresentaram lesões, enquanto 83 (23,4%) apresentaram pelo menos uma lesão. Observou-se que 55,5% (n = 151) dos participantes sem lesão eram do sexo masculino e apresentavam idade média de 43,3 ± 14,7 anos (variação: 20 – 85 anos). Por outro lado, 57,8% (n = 48) dos participantes diagnosticados com lesões eram do sexo feminino e apresentavam idade média de 47,1 ± 12,8 anos (variação: 23 – 75 anos) (Figura 1A).

A Figura 1B apresenta a distribuição absoluta e relativa dos participantes de acordo com as décadas de vida. No grupo com lesões bucais, notou-se que houve alta frequência de participantes na quinta década de vida (40 – 49 anos: n = 26; 32,1%) e que não houve associação significativa entre o sexo e a idade (p = 0,057). Com relação à cor da pele, observou-se que, no grupo de participantes sem lesões, 51,2% (n = 107) apresentavam pele parda, enquanto 27,8% (n = 58) e 21,1% (n = 44) apresentavam pele branca e preta, respectivamente. Da mesma forma, a maioria dos participantes com diagnóstico de lesões bucais apresentava pele parda 40,0% (n = 20), seguida de pele branca (n = 15; 30,0%) e negra (n = 15; 30,0%).



Figura 1. Perfil de sexo e idade dos participantes.

(A) Distribuição dos participantes de acordo com a presença de lesões orais e o perfil sexual de cada grupo (Dados expressos em número e percentual de participantes [n (%)]). (B) Distribuição dos participantes de acordo com a década de vida (Dados representados em porcentagem. O número de participantes (n) está descrito nos pontos das linhas). (C) Distribuição do sexo segundo idade (Dados expressos em número e percentual de participantes [n (%)]).

Fonte:Autor, 2023.

Clinicamente, 94,0% (n = 78) dos participantes foram diagnosticados com apenas uma lesão no exame intraoral, 4,8% (n = 4) apresentaram duas lesões do mesmo tipo na mesma localização anatômica, e 1,2% (n = 1) exibiram dois tipos diferentes de lesão oral diagnosticada em dois sítios anatômicos distintos. Conforme apresentado na Figura 2A, palato (n = 28; 41,8%), língua (n = 16; 23,9%) e lábios (n = 11; 16,4%) foram os locais anatômicos mais acometidos pelas lesões orais. Quanto à classificação da lesão, notou-se que as lesões infecciosas (n = 36; 42,8%), as doenças orais potencialmente malignas (n = 14; 16,7%) e as lesões reativas/inflamatórias (n = 13; 15,5%) corresponderam aos tipos mais frequentes de lesões orais (Figura 2B).



Figura 2. Localização anatômica e tipo de lesões diagnosticadas nos participantes.

(A) Distribuição das localizações anatômicas acometidas pelas lesões orais e (B) lesões de acordo com sua classificação (Dados expressos em número e percentual de participantes [n (%)]).

Fonte: Autor, 2023.

A Figura 3 descreve detalhadamente a frequência de cada lesão bucal diagnosticada em cada grupo de lesões. De modo geral, observou-se que a candidíase oral (queilite angular e candidíase eritematosa) (n = 33), a queilite actínica (n = 7), as anomalias de língua (anquiloglossia, língua fissurada e língua pilosa) (n = 7) e a língua geográfica (n = 7) foram as lesões mais frequentes diagnosticadas. Além disso, houve associação significativa entre sexo e localização anatômica (p < 0,0001). Notou-se que os participantes do sexo feminino apresentaram maior frequência de lesões diagnosticadas em palato e língua. Além disso, foi revelada associação significativa entre sexo e classificação do grupo de lesões (p = 0,026). Observou-se, também, que os participantes do sexo feminino apresentaram mais lesões infecciosas e os participantes do sexo masculino mais alterações orais potencialmente malignas.



Figura 3. Os gráficos mostram os tipos de lesões bucais diagnosticadas nos participantes e sua distribuição de acordo com sua classificação:

(A) Lesões infecciosas, (B) Distúrbios orais potencialmente malignos, (C) Lesões reativas/inflamatórias, (D) Defeitos de desenvolvimento, (E) Lesões dermatológicas, (F) Neoplasias, (G) Lesões físicas e químicas, (H) Lesões odontogências (Dados representados em porcentagem. O número de casos (n) é apresentado na lateral das barras).

Fonte:Autor, 2023.


Tabela 1. Associação entre localização anatômica e diagnóstico clínico da lesão com sexo e idade.

Fonte: Autor, 2023. (*): Resultado estatisticamente significante. (a): Teste qui-quadrado de Pearson.

Discussão

Os resultados mostram que o percentual de participantes que apresentaram pelo menos uma lesão na mucosa bucal correspondeu a 23,4% (n = 83). Os achados corroboram a literatura, apontando para uma prevalência entre 25,0 a 50,0%, a depender da população estudada, de fatores demográficos, do delineamento metodológico utilizado, bem como da categorização das lesões que variam de um estudo para outro (Andreasen et al., 1986). Além disso, a Fig. 1B evidencia uma maior frequência de lesões na quinta década de vida (40-49 anos), semelhantemente aos estudos de Hoff et al. (2015) e Suzin et al. (2014), demonstrando que pessoas nesta faixa etária são as que mais procuram atendimento, e isso se deve, muitas vezes, ao fato de esses pacientes serem portadores de próteses, o que aumenta a chance do aparecimento de lesões proliferativas hiperplásicas outro (Andreasen et al., 1986).

Semelhantemente a outros estudos (Casnati et al., 2013; Radwan-Ocszko et al., 2022; Pentenero et al., 2008), os resultados desta pesquisa revelaram maior frequência do sexo feminino (57,8%) nos participantes com diagnóstico de lesões orais, o que pode ser explicado pelo fato de mulheres, em geral, se preocuparem mais com a saúde e, com isso, procurarem atendimento diante de qualquer alteração. O palato foi o local mais acometido, apresentando lesão em 28 indivíduos (33,3%) e divergindo do estudo realizado por Collins James et al. (2021), realizado na República Dominicana, no qual afirmam que a localização mais comum é a gengiva maxilar e mandibular. Por sua vez, outros autores (Alshayebet et al., 2019; Rohini et al., 2020) relatam que a prevalência de lesões na mucosa jugal é maior, por esta ser mais exposta a fatores de risco, como os produtos do tabaco. No entanto, a localização da lesão pode variar de acordo com a população estudada, hábitos e costumes culturais de cada país/região.

Foi observada uma associação estatisticamente significativa entre sexo e localização anatômica, e sexo e classificação do grupo de lesões. Participantes do sexo feminino apresentaram maior frequência de lesões diagnosticadas em palato e língua e um número maior de lesões infecciosas, assim como observado por Souza et al. (2019). Com metodologia similar à metodologia deste estudo, os autores analisaram dados secundários com base no levantamento de 384 prontuários de pacientes com diagnóstico de doença infecciosa, em um Centro de Referência de Lesões Bucais, evidenciando-se ser o palato a localização anatômica mais acometida por lesões infecciosas. Já os participantes do sexo masculino apresentaram um quantitativo maior de alterações orais potencialmente malignas, especialmente a queilite actínica. Arnaud et al. (2014) e Carvalho et al. (2019) ressaltaram que a maior ocorrência no sexo masculino se deve ao fato de os homens se exporem mais a atividades ao ar livre, em virtude da natureza de suas ocupações na região estudada; além disso, a menor probabilidade das mulheres desenvolverem a lesão ocorre devido ao uso do batom, que pode, parcialmente, proteger os lábios da exposição à radiação UV.

Das lesões infecciosas encontradas, a mais comum foi a candidíase, semelhante ao estudo de Souza et al. (2019), em que a principal foi a estomatite protética, uma variante clínica da candidíase eritematosa, apontando a prótese como principal fator de risco para o seu desenvolvimento. Vale ressaltar que vários fatores estão envolvidos na incidência dessas lesões, como observado por Al-Maweri et al. (2017), os quais relataram que os participantes de áreas rurais eram mais propensos a certas lesões, a exemplo das induzidas por khat, da leucoplasia e lesões induzidas por tabaco sem fumaça, em comparação com aqueles que residiam em áreas urbanas. Fatores comportamentais também foram relatados, sendo os mais comuns a exposição ao tabaco, a ingestão de álcool e o uso de próteses dentárias, os quais têm sido associados à presença de lesões orais. Além disso, a falta de conscientização sobre autocuidado e monitoramento bucal, fatores de risco, desnutrição, falta de acesso a serviços odontológicos e instalações médicas de saúde e fatores socioeconômicos foram descritos como pontos importantes na progressão dessas lesões (Torres-Pereira et al., 2012).

Estudos envolvendo campanhas de prevenção contra o câncer de boca (Oliveira et al., 2021; Sassi et al., 2013), m diferentes estados do Brasil, investigaram a ocorrência dos tipos de lesões que mais afetam a mucosa oral: o primeiro, em Fernandópolis/SP, apresentou a hiperplasia fibrosa inflamatória como o tipo mais comum (18,2%), seguida do hemangioma (16,0%) e da candidíase oral (16,0%), enquanto o segundo estudo, realizado no estado do Paraná, demonstrou serem as lesões de origem traumática as mais prevalentes (46,2%), seguidas das lesões inflamatórias (25,6%), e, em terceiro lugar, as lesões brancas (14,2%).

As divergências apresentadas com o presente estudo provavelmente estão atreladas às diferenças metodológicas: as campanhas de prevenção realizadas em São Paulo e no estado do Paraná situam se, respectivamente, no sudeste e sul brasileiro. O Brasil, com sua vasta extensão territorial, possui grande variação no clima e cultura de acordo com a região, fatores estes que podem influenciar nas manifestações clínicas das lesões. Outro ponto importante diz respeito ao critério de classificação apresentado pelos estudos citados, os quais não utilizaram uma forma padronizada de categorização das lesões, diferentemente do presente estudo, que as classificou de acordo com fontes de referências mundiais, buscando padronizar os resultados encontrados, a fim de garantir a fidedignidade da pesquisa.

Pesquisas epidemiológicas de lesões bucais em regiões geográficas específicas estabelecem as reais necessidades dessa população e fornecem informações para o desenvolvimento de planos de tratamento e ações preventivas para as lesões encontradas (Kniest et al., 2011). Por se tratar de um estudo retrospectivo, uma das suas limitações é a possibilidade de preenchimento incompleto dos prontuários. A ausência de uma padronização no delineamento metodológico utilizado nos estudos é um fator que limita a comparação, além disso, os diagnósticos apresentados não são definitivos: indivíduos com lesões foram encaminhados para serviço de Estomatologia e Patologia Oral para confirmação do diagnóstico e tratamento adequado.

Considerações finais

A partir dos resultados obtidos, constatou-se que as lesões apresentaram uma maior predominância no sexo feminino, em indivíduos de cor parda e na quinta década de vida. As lesões infecciosas foram as mais prevalentes, sendo a candidíase a alteração mais encontrada e o palato o sítio mais afetado nos populares examinados.

A Liga Acadêmica de EstomatoPatologia voltou a atenção para a figura do cirurgião-dentista como profissional de saúde, o qual não pode restringir o cuidado apenas aos dentes e suas estruturas de suporte, mas tem como dever realizar o exame sistemático da região de cabeça e pescoço, objetivando o diagnóstico das mais diversas afecções orais, além de contribuir para a conscientização da importância da prevenção e do autocuidado.

O nordeste brasileiro é historicamente conhecido por sua vulnerabilidade socioeconômica e ambiental, influenciado pelas suas características morfoclimáticas. Diante do contexto de ampla extensão territorial, diversidade ambiental e sociocultural do Brasil, vários fatores podem incidir de modo a influenciar no padrão de acometimento das lesões orais. Nesse sentido, a Liga Acadêmica de EstomatoPatologia representa um projeto de extensão de grande relevância social, permitindo adquirir um conhecimento mais profundo a respeito das características demográficas, além de possibilitar o acesso da população marginalizada ao cirurgião-dentista, de modo a contribuir na promoção da saúde e prevenção de lesões orais.

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