ATITUDES E FORMAÇÃO DE CONSCIÊNCIA AMBIENTAL: UM ESTUDO SOBRE AS IMPLICAÇÕES DE UM PROGRAMA DE COLETA SELETIVA DE RESÍDUOS SÓLIDOS EM CAMPO GRANDE-MS
ATITUDES E FORMAÇÃO DE CONSCIÊNCIA AMBIENTAL: UM ESTUDO SOBRE AS IMPLICAÇÕES DE UM PROGRAMA DE COLETA SELETIVA DE RESÍDUOS SÓLIDOS EM CAMPO GRANDE-MS
GESTÃO E DESENVOLVIMENTO, vol. 13, núm. 1, pp. 144-155, 2016
Centro Universitário Feevale
Resumo: O objetivo deste estudo é verificar a adesão ao Programa de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, em termos de atitudes e de disposições a priori para a formação de consciência ambiental dos moradores de bairros atendidos pelo projeto piloto em Campo Grande/MS. Além disso, o estudo pretende reportar, entre outros aspectos, a percepção do usuário quanto à qualidade do serviço prestado e, especialmente, a suas práticas sustentáveis. O artigo está organizado em cinco seções. A introdução, revisão bibliográfica sobre desenvolvimento sustentável e Gestão Ambiental, e na terceira seção, são descritos os procedimentos metodológicos da pesquisa realizada e, apresenta-se na quarta seção a análise dos principais resultados encontrados. Assim, buscou-se investigar a influência do Programa de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos no nível de engajamento ambiental do público visado. Por fim, na quinta seção, argumenta-se a título de considerações finais que a população atendida pelo serviço de coleta seletiva já possuía predisposições e indicadores de uma formação “em curso”, de consciência ambiental. Porém, os dados revelam que a adesão ao programa propiciou novos hábitos aos moradores envolvidos e uma reflexão mais ampliada sobre os problemas socioambientais.
Palavras-chave: Sustentabilidade, Gestão de Resíduos Sólidos, Coleta Seletiva.
Abstract: This study aims to assess the adherence the Program of Solid Waste Integrated Management in terms of attitudes and training of environmental awareness among residents of neighborhoods assisted by the pilot project in Campo Grande-MS. In addition, the study aims to report, among other things, the user’s perception about the quality of the service and, especially, their sustainable practices. The paper is organized in five sections. The introduction, a literature review on environmental management and sustainable development, and, in the third section, the methodological procedures of the research are described and in the fourth section the analysis of the main results is presented. Thus, we sought to investigate the influence of Integrated Solid Waste Management Program in the environmental engagement level of the intended audience. Finally, in the fifth section, it is argued that the population assisted by selective collection service already had predispositions and indicators of an environmental consciousness training “ongoing”. However, the data show that joining the program provided new habits to the residents involved and a broader reflection on the social and environmental problems.
Keywords: Sustainability, Solid Waste Management, Selective collect.
1 INTRODUÇÃO
Há uma crescente participação do consumidor em ações de preservação ambiental, especialmente, por meio da formação de consciência sobre o uso de produtos e o descarte racional. No entanto, pouco se conhece sobre a formação dessa consciência ou sobre as atitudes que direcionam as escolhas pessoais no que tange à questão ambiental (DEUS, et. al. 2014, p. 4).
Cerca de um terço do total do lixo urbano produzido no Brasil é potencialmente reciclável. Contudo, apenas 3% dos resíduos sólidos descartados como lixo doméstico nas cidades brasileiras são destinados à reciclagem. A seleção dos resíduos e o seu encaminhamento para reciclagem, ainda que seja de forma incipiente, de modo geral, tem ocorrido como consequência dos esforços de catadores independentes. Falta apoio do poder público para lidar com a questão da coleta e correta destinação dos resíduos e, considerando o desconhecimento da população quanto à separação adequada do lixo, faltam programas que atuem no sentido de promover a conscientização (PAULA, 2014).
Reconhecendo o problema, o diretor da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE), Carlos Roberto Vieira Filho, afirmou que o Brasil é responsável pela produção de sessenta e três milhões de toneladas de resíduos sólidos anualmente, o que o posiciona como o quinto produtor de lixo do planeta. O diretor observa ainda que “[...] cada brasileiro produz 383 quilos de lixo per capta por ano [...]”, o que representa um crescimento de 21% na última década. Este dado evidencia o descompasso num comparativo com o crescimento populacional brasileiro de 9,6% no mesmo período (PAULA, 2014).
Quanto à coleta seletiva, o diretor da ABRELPE ressalta que 60% dos municípios brasileiros possuem alguma iniciativa de coleta e separação de resíduos (PAULA, 2014). Este é o caso, por exemplo, de Campo Grande- MS onde uma parcela dos moradores separa e destina os resíduos sólidos para reaproveitamento no município. A coleta é orientada pelo Decreto n.º 11.797/2012, que institui o Plano Municipal de Saneamento Básico – Gestão Integrada de Resíduos Sólidos do município de Campo Grande. A partir de diagnóstico prévio, foram estabelecidas as diretrizes, os objetivos, as metas e as ações a serem adotadas pelo Município em prol da melhoria e maior eficiência na prestação dos serviços e da sua universalização.
A Gestão Integrada de Resíduos Sólidos teve início com a prestação do serviço de coleta seletiva de materiais recicláveis, a partir do ano de 2011, como um projeto piloto de caráter experimental, efetivado como uma parceria pública privada (PPP). Esse serviço de coleta seletiva atende 32.000 domicílios, em 13 bairros da cidade de Campo Grande, situados na região centro/leste do município. Segundo as informações disponibilizadas pela SOLURB Soluções Ambientais, a separação e destinação dos materiais recicláveis, realizadas pelos moradores, alcançou a marca de 670 toneladas de resíduos sólidos entre os meses de junho a dezembro de 2011.
O estudo parte do pressuposto que a oferta do serviço requer certa preparação da população atendida pelo Projeto piloto, executado pela SOLURB a fim de separar e destinar corretamente os resíduos sólidos. A partir deste momento espera-se um engajamento gradativo e crescente e, portanto, o sucesso do programa poderia ser medido pela demonstração crescente de hábitos sustentáveis e formação de uma nova consciência ambiental. O artigo está organizado em cinco seções. Após a introdução, a revisão bibliográfica sobre desenvolvimento sustentável e Gestão Ambiental é ofertada, após são descritos os procedimentos metodológicos da pesquisa realizada e, na quarta seção, apresenta-se a análise dos principais resultados encontrados. Assim, buscou-se investigar a influência do Programa de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos no nível de engajamento ambiental do público visado. Por fim, na quinta seção, argumenta-se a título de conclusão que a população atendida pelo serviço de coleta seletiva já possuía predisposições e indicadores de uma formação “em curso” de consciência ambiental. Ademais, os dados revelam que a adesão ao programa propiciou novos hábitos aos moradores envolvidos e uma reflexão mais ampliada sobre os problemas socioambientais.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Desenvolvimento Sustentável: princípios e conceitos
Durante a maior parte da história humana, o crescimento da população urbana, a degradação do meio ambiente e o esgotamento dos recursos naturais, a reestruturação das sociedades, bem como o desenvolvimento de novas tecnologias têm sido geralmente tão lentos a ponto de serem imperceptíveis (Meadows et al., 1992 apud MEBRATU, 1998, p.495). No entanto, durante os últimos dois séculos, a economia mundial tem mostrado um crescimento incrível, transformando o caráter do planeta e, especialmente, da vida humana (MEBRATU, 1998, p. 496).
Todas estas transformações históricas culminaram num estado de conflito entre o meio ambiente e o crescimento econômico. A formação de um problema ambiental mundial deu abertura para que houvesse um diálogo entre as partes na busca da conciliação. A primeira inicativa relevante ocorreu em Estocolmo em 1972, durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano. Durante o encontro foi sumariado o consenso científico sobre a ocorrência de desequilíbrios ecológicos e chegou-se à conclusão de que os danos infligidos por atividades humanas sobre o ambiente natural torna essas atividades insustentáveis (EKINS; JACOBS, 1995, p. 5). Este ponto tornou-se cada vez mais evidente após a conferência de 1972.
Nos anos seguintes, de acordo com Mebratu (1998, p. 504), a terminologia evoluiu para termos como “ambiente e desenvolvimento”, “desenvolvimento sem destruição”, e “desenvolvimento ambientalmente saudável.” Finalmente, o termo “eco-desenvolvimento” apareceu na revisão do Programa Ambiental da ONU em 1978, porque, naquele momento, a questão ambiental já disponha de reconhecimento internacional. A partir desse cenário, reconfigura-se a necessidade de um imbricamento entre as ideias ambientais e a perspectiva de desenvolvimento econômico – necessários à sociedade, desde que considerados simultaneamente (MEBRATU, 1998). O momento criou a necessidade de uma nova visão de mundo para servir como base em busca de um consenso global, o que, posteriormente, levou à cunhagem do termo “desenvolvimento sustentável” (MEBRATU, 1998, p. 504).
Novos rumos sobre a questão ambiental direcionados pelo relatório Our Common Future – Report of the Commission on Environment end Development (WCED), organizado pelas Nações Unidas, 1987. A Comissão Mundial de Desenvimento delimitou e orientou atitudes e práticas viáveis para o futuro do nosso planeta, de modo a contribuir para delimitar direcionamentos mundiais. Essa Comissão debruçou-se sobre as temáticas do Meio Ambiente e do Desenvolvimento e definiu o termo “desenvolvimento sustentável” como “[...] o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades” (BRUNTLAND, 1987, p. 37).
Desde então, como salienta Mebratu (1998, p. 493), desencadearam-se, várias iniciativas que foram tomadas a nível local, nacional e em níveis globais em uma tentativa de abordar os diferentes aspectos dos desafios ambientais. A influência do conceito aumentou significativamente no desenvolvimento da política nacional e internacional, tornando-se o elemento central dos documentos de políticas de governos, agências internacionais e das organizações empresariais (MEBRATU, 1998, p. 494). Influências que se desdobraram em novas legislações no Brasil, a exemplo da Lei nº 12.305/10 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, a qual traz em suas diretrizes a preocupação com o meio ambiente.
Já a Conferência Rio+20, realizada em 2012, pretendeu mobilizar os chefes de estados e sociedade em prol da mediação e conscientização de governos e seguimentos sociais sobre o uso de recursos ambientais. Em certa medida, essa efetivação pode ocorrer por meio da disseminação de conceitos, como comportamento ambientalmente consciente, preservação dos recursos naturais, conscientização, desenvolvimento sustentável, dentre outros (DEUS, et. al., 2014, p. 3).
O termo sustentabilidade, por si só, tem como primeira característica a sua relação com o futuro. Além de promover uma utilização racional dos recursos naturais disponíveis, seja i) através dos recursos renováveis, respeitando o seu tempo de recuperação e/ou ii) ao prever a finitude dos recursos e, assim, congregar forças de modo a evitar o seu esgotamento.
Para Azevedo et al. (2010 p.120), a sociedade tem que enfrentar a crise ambiental, buscando opções de soluções, sendo essa busca uma progressão contínua dos objetivos atrelados à sustentabilidade ambiental. De um modo geral, Desenvolvimento Sustentável é hoje, no debate econômico, um ponto obrigatório, mediado pelo conflituoso viés do crescimento econômico.
Dentro da ótica do Desenvolvimento Sustentável e em busca de soluções plausíveis de desenvolvimento, encontra-se a Gestão de Resíduos Sólidos que contempla vários aspectos, institucionais, financeiros, administrativos, sociais e ambientais. E envolve a administração pública, o setor privado e toda a sociedade, sendo a participação desta última considerada como parte essencial deste modelo de gestão.
2.2 Gestão Ambiental e o Programa de Gestão de Resíduos Sólidos
As relações entre ecossistemas e sistemas econômicos podem ser consideradas o centro de muitos dos problemas de cunho ambientais atuais mais prementes: chuva ácida, aquecimento global, extinção de espécies, ilimitado consumo, descarte inadequado de lixo, distribuição desigual da riqueza, dentre outras (COSTANZA, 1989, p. 2). Para Costanza et. al. (1997, p. 119), os paradigmas econômicos atuais estão relacionados, sobretudo, à energia e aos recursos naturais, considerados pelos economistas tradicionais como inesgotáveis e usufruídos em prol da “saúde” econômica, independente do grau de uso dos recursos econômicos – concepções alicerçadas no ideário de manutenção de uma taxa estável e do crescimento econômico. Para a os autores, a concepção de crescimento baseado no Produto Interno Bruto - PIB de um país é equivocada. O foco deveria se voltar a um desenvolvimento econômico sem que haja crescimento, mas aumento da qualidade de vida. O desafio é encontrar um referencial próximo de prosperidade, mas que não traga essa ideia de crescer.
Conforme a Lei 12.305/2010 entende-se por gestão integrada de resíduos sólidos: o “conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável”.
Na perspectiva do campo Gestão Ambiental, a gestão de resíduos sólidos é compreendida como mecanismo viável e capaz de abranger as atividades referentes à tomada de decisões estratégicas e à organização do setor para esse fim, envolvendo instituições públicas, políticas, instrumentos e meios. Assim, entende-se Modelo de Gestão de Resíduos Sólidos como um conjunto de referências político estratégicos, institucionais, legais e financeiras capaz de orientar a organização do setor (SCHALCH, et. al. 2002, p. 75).
A Gestão Ambiental, através do sistema de gestão de resíduos sólidos, é um caminho para a melhoria da coleta e tratamento dos resíduos sólidos urbanos, capaz de aperfeiçoar a sua viabilidade de comercialização (BRASIL, 2007, pág. 9).
Nessa direção, algumas iniciativas são verificadas no Brasil, por exemplo, o programa de Lei da Política Nacional de Saneamento Básico (Lei nº 11.445/2007). A legislação indica a necessidade dos Municípios elaborarem seus Planos de Saneamento, na qual está incluído o manejo dos resíduos sólidos. Já a Lei Federal nº 12.305/10 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que englobam os resíduos domiciliares, isto é, aqueles originários de atividades domésticas em residências urbanas, bem como de outros serviços de limpeza urbana. Campo específico, no qual, encontra-se o objeto deste estudo.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa empírica foi realizada entre os dias 28 de julho e o dia 6 agosto de 2014 1. As entrevistas foram realizadas em nove bairros do universo total de treze bairros atendidos pelo Projeto piloto como iniciativa do Programa de Gestão de Resíduos Sólidos na cidade de Campo Grande MS, localizados na região centro/leste. Entende-se que a entrevista é uma técnica que permite estreitar relações entre pessoas. Conforme Richardson (1999, p. 208), “o termo entrevista refere-se ao ato de perceber realizado entre duas pessoas”, ou seja, uma comunicação bilateral por definição, como apregoa o autor.
Participaram da pesquisa 42 moradores escolhidos aleatoriamente dentre os bairros assistidos. Os dados foram obtidos por meio da aplicação de entrevistas estruturadas, nas quais se buscou observar os construtos de consciência ambiental, práticas que possam evidenciar a formação de consciência através de novos hábitos adquiridos após o início da oferta de serviços de coleta seletiva.
Richardson (1999, p. 36) compreende que a generalização deve ser constatada a partir da observação de um número de casos concretos, suficientemente confirmador da suposta realidade, logo, induz do particular para representar o geral. Neste caso, a população pesquisada é constituída de 32000 domicílios de Campo Grande que gozam dos serviços de coleta seletiva de resíduos sólidos.
Em um primeiro momento da entrevista havia dezenove questões compostas por perguntas relacionadas ao perfil do entrevistado (faixa etária, gênero, grau de instrução do entrevistado, grau de instrução do chefe da família, ocupação, renda). Nessa seção, a pesquisa elegeu os Critérios de Classificação Econômica Brasil2, da Associação Brasileira de Empresa de Pesquisa – ABEP para indicar a classe social dos participantes da amostra.
Em um segundo momento, os entrevistados foram questionados a respeito dos hábitos sustentáveis e possíveis influências, perceptíveis ao usuário, a partir da implantação do programa de gestão de resíduos sólidos. Estas questões, de predominância qualitativa, tiveram o intuito de captar o grau de satisfação do cliente atendido pela coleta de materiais recicláveis, as influências do programa de gestão de resíduos sólidos, além de identificar e reconhecer outras práticas de preservação do meio ambiente, adotadas pelas famílias. Do ponto de vista qualitativo, os entrevistados puderam responder as questões livremente, contando apenas com intervenções do pesquisador resumidas a: descreva, por favor; como assim; Por quê? Quais? E especifique, por favor, no intuito de incentivá-los a novas reflexões sobre a questão.
No tratamento dos dados utilizou-se do programa estatístico Minitab, o qual possibilitou o cruzamento das informações obtidas como a estratificação e comparação entre os dados referentes à classe social e escolaridade com o nível de participação dos moradores na atividade de coleta, por exemplo.
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Esta seção apresenta a análise dos dados empíricos coletados com vista à identificação dos fatores associados com a formação de uma consciência ambiental sustentável.
4.1 O perfil dos entrevistados
Foram entrevistadas 42 pessoas, entre eles, 23 mulheres (55%) e 19 homens (45%). Os participantes informaram, em 45% dos casos, possuírem curso superior completo e em 38%, ensino médio completo.
No tratamento dos dados foram utilizadas as diretrizes do Critério Brasil para classificar a classe social dos entrevistados. Nessa direção, a classe social é resultado da somatória entre a correspondência do grau de instrução daquele considerado como mantenedor e chefe da família, conforme quadro abaixo e a quantificação dos itens de confortos da residência. Essa somatória identificou que 88% dos entrevistados pertencem às classificações sociais A, B1 e B2.
A predominância de moradores de classe média justifica-se, ao passo que, o Projeto piloto de coleta seletiva de resíduos sólidos está restrito a uma região circunscrita ao perímetro central da cidade, identificada geograficamente no estudo como centro/leste. Esta região é predominantemente ocupada por imóveis de médio e alto padrão, dentre eles: bairro Cachoeira, bairro Santa Fé e bairro Vilas Boas.
4.2 Questões relacionadas aos hábitos sustentáveis
Visando a encontrar a relação existente entre os hábitos sustentáveis e os construtos de consciência ambiental, os moradores foram inquiridos sobre a importância que atribuem às questões ambientais, seja no manejo de recursos reaproveitáveis, nos procedimentos anteriores ao serviço de coleta ofertada pela prefeitura ou em outros hábitos sustentáveis, por exemplo.
Entre os entrevistados, 86% responderam que, sim, os moradores da residência participam da Coleta Seletiva de materiais recicláveis realizada no bairro. Enquanto 14% respondem que (não) participam da atividade de coleta realizada no bairro.
Com a finalidade de conhecer a percepção do usuário do serviço, quanto à participação do programa de gestão de resíduos e coleta seletiva na transformação dos hábitos de seus familiares, foram feitas as perguntas e respectivas respostas que se seguem:
Quando perguntado ao entrevistado se ele ou alguém da residência já separava o lixo em período anterior à coleta seletiva, 30% responderam que sim, já separavam o lixo reciclável anteriormente. Outros 70% responderam que não separavam e reconheceram que adquiriram este hábito sustentável após o início do programa de gestão de resíduos em seu bairro.
Você considera que a coleta de materiais recicláveis em seu bairro auxiliou a sua família na criação de novos hábitos socioambientais? Sim, Não e Por quê?

As justificativas dos moradores para a criação ou não de novos hábitos socioambientais foram diversas. Então, as informações foram agrupadas em positivas e negativas com as respectivas alegações, a tabela abaixo apresenta as principais incidências:

Entre os que responderam que a coleta seletiva, sim, os auxiliou em novos hábitos encontram-se as falas: “meus filhos já sabem que os recicláveis vão para o saco verde”; “hoje as crianças já separam os materiais recicláveis” ou que “a separação dos recicláveis nos auxiliou a ter consciência ambiental” e, ainda, que “a separação de materiais educa as crianças para preservarem o meio ambiente”. É possível observar que os moradores atribuem significado à cor dos sacos [verde] oferecido pelo serviço de coleta e os reconhecem como próprios para este tipo de descartes. Estabelecem um paralelo entre o início do serviço de coleta seletiva e a formação de consciência dos familiares sobre a maneira sustentável de descarte, além de indicarem que a coleta seletiva auxilia na educação dos filhos e na formação de consciência ecológica.
Com a finalidade de verificar o grau de satisfação dos entrevistados com o serviço, questionou-se: como você avalia a qualidade do serviço de coleta de matérias recicláveis prestados pela (SOLURB)? 81% dos entrevistados avaliaram os serviços como ótimo ou bom.

Os entrevistados que demonstram um elevado grau de satisfação aos serviços prestados apontam justificativas diversas, a aprovação, entre eles, indica que os coletores “passam nos dias certos / todas as semanas /são pontuais”; “fazem o serviço corretamente /certinho/ são responsáveis”; “doam o saco verde / saco verde”, e ainda, ao classificar “A atitude é louvável, me sinto um cidadão de um país responsável pelo seu próprio lixo”.
Entre os 5% de moradores que consideram o serviço de coleta como regular, encontram-se as justificativas que “a atitude de doar o saco verde foi boa, mas pode melhorar inovar com outras ações” “falta campanha / maior divulgação” e que “deveriam informar a designação do lixo/destino”. Observou-se que as insatisfações estão, em certa medida, mais relacionadas à falta de divulgação e sensibilização dos moradores do que, propriamente, à qualidade do atendimento ao cliente/usuário.
Com o objetivo de observar outras práticas, fez-se a seguinte pergunta: Além da Coleta Seletiva, você têm outros hábitos sustentáveis? Essa pergunta foi realizada em dois momentos da pesquisa. Primeiramente, de modo espontâneo, para verificar se o entrevistado indicaria, sem indução, ações que justificassem preocupações com o meio ambiente; assim, foi obtido um total de 72 respostas, dentre elas, relataram que realizam o reaproveitamento e a economia de água, o descarte adequado de óleo vegetal e pilhas e que evitam o desperdício de energia elétrica. Em seguida, a mesma pergunta ocorreu de modo estimulado, com a apresentação de cartão com algumas indicações de hábitos sustentáveis. Nesse caso, o intuito foi relembrar ações esquecidas pelos entrevistados na questão anterior e verificar a ocorrência das frequências, a qual teve 103 respostas, um crescimento de 43% conforme representa a tabela 2:

Quando questionados sobre o destino dos materiais recicláveis recolhidos em Campo Grande, 16% dos entrevistados disseram que desconhecem o destino final dos materiais, fato já indicado anteriormente, quando avaliada a qualidade dos serviços prestados, como um dos motivos para insatisfação dos usuários, isto é, a falta de comunicação e de divulgação do setor.

O índice de reclamações quanto à falta informação sobre o destino final dos materiais recicláveis pode ser um ponto para os responsáveis pela prestação do serviço público trabalharem para melhorias. A pesquisa evidenciou que os moradores anseiam por uma comunicação que esclareça o processo de tratamento e destino dos resíduos3. Durante as entrevistas foi observado que mesmo entre aqueles que alegam conhecer a destinação respondiam a questão de forma mais genérica, como por exemplo: “mandam para o estado do Paraná; levam para o estado de São Paulo ou usina de reciclagem/ indústria de reciclagem”, sem especificar.
Para Deus, et. al. (2014 p. 3) é possível perceber uma crescente preocupação ambiental por parte da sociedade, o que pode implicar a consolidação de comportamento ambientalmente consciente. Quando os responsáveis pela prestação de serviços públicos estimularem a participação pública, manterem um relacionamento estreito com as partes interessadas, valorizando a participação da comunidade, provavelmente esta comunidade se identificará com o programa de reciclagem proposto. Comunicação ao usuário está prevista na lei 12.305/2010, através de programas e ações de educação ambiental que promovam a redução, a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos.
Para Nunes e Maia (2002, p. 3), uma Gestão Integrada poderá significar uma forte participação da população, e induzir também ao conceito de responsabilidade ampliada. O envolvimento das partes com a ampla participação da sociedade se mostra de vital importância para o sucesso do programa de gestão de resíduos sólidos.
Assim, a comunicação com os usuários do programa de coleta seletiva torna-se vital, sobretudo, nesse processo de conscientização e de necessária expansão dos serviços, tendo em vista que as prefeituras terão que implantar o programa de acordo com a legislação. Porém, com a participação da sociedade civil e a formação do voluntário, poderá conferir o êxito do programa, além de estar intrinsecamente relacionada à formação de uma sociedade com consciência ambiental.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conjecturou-se, inicialmente, se o usuário do serviço público “o consumidor” estaria disposto, comprometido e consciente ambientalmente, de modo a adotar novos hábitos voltados à preservação do meio ambiente, o que, em certa medida, seriam ações características de uma consciência ecológica.
Nessa direção, a pesquisa observou que a população atendida pela coleta seletiva, possuía pré-disposições e indicadores de uma formação, “em curso” de consciência ambiental, ou seja, parte dos entrevistados já demonstrava preocupação com as questões socioambientais, em período anterior à coleta seletiva. Relataram, inclusive, que realizavam o reaproveitamento e a economia de água, o descarte adequado de óleo vegetal e pilhas e que evitam o desperdício de energia elétrica, dentre outras práticas sustentáveis, o que indica disposições a priori à oferta do serviço público.
Contudo, verificou-se que não existia, na maioria dos casos, o hábito de separar e destinar corretamente os resíduos sólidos, de modo a prevenir-se sobre o seu reaproveitamento, quando fosse o caso, e reduzir, assim, os danos à natureza. A destinação e o reaproveitamento eram conjecturados apenas por uma pequena parcela dos indivíduos. As ações habituais ocorreram a partir da oferta do serviço de coleta de resíduos sólidos e gradativamente foram, de acordo com os entrevistados, estabelecendo novos hábitos, especialmente, a inserção da prática na rotina familiar. Conforme os entrevistados, a prática de separação de resíduos orgânicos e sólidos desdobrou-se no engajamento e numa reflexão mais ampliada sobre as problemáticas socioambientais.
Problemáticas irrevogáveis do século XXI que deve ser dialogada pela construção de consciência ambiental, sobretudo, que alie os princípios dos desenvolvimentos sustentáveis, dos campos ambiental, social e econômico, de modo integrador e, assim, coexistindo o crescimento econômico aliado à conservação do capital natural. Nessa direção, a gestão de resíduos sólidos como mecanismo da Gestão Ambiental congrega os setores públicos, a sociedade civil organizada e a cooperação da população com predisposições às causas ambientais, setores centrais que alinhados oferecem instrumentalidades eficazes ao programa instituído pela administração pública em conformidade com a legislação, o que se mostra viável como política estratégica de conservação e redução de danos ambientais.
Referências
AZEVEDO, D. B; PEDROZO, E. A; MALAFAIA, G.C. The Innovation Process Under The Perspective Of Stakeholders: A Sustainable Development Point Of View. Global Journal of Management and Business Research, v. 10, p. 115-122, 2010.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente; Ministério das Cidades. O mecanismo de desenvolvimento limpo aplicado a resíduos sólidos. Brasília: 2007.
BRUNTLAND. G. H. Out Common Future: World Commission on Environment and Development. Oxford University Press: Oxford, 1987.
COSTANZA, R. What is ecological economics? Ecological Economics. Elsevier Science Publishers B.V. Amsterdam, v. 1, p.1-7, 1989.
COSTANZA, R.; et al. An introduction to ecological economics. Boca Raton: St. Lucie Press, 1997.
DEUS, E. G. S. Q; AFONSO, Bruno Pellizzaro Dias; AFONSO, Tarcísio. Consciência Ambiental, Atitudes e Intenção de Uso de Sacolas Plásticas Não-Recicláveis. Revista de Gestão Ambiental e Sustentabilidade – GeAS, v. 3, n. 1. Jan./ Abr. 2014.
ERKINS, P.; JACOB, M. Environmental sustainability and the growth of GDP conditions for compatibility. In The North, the South and Sustainable Development. United Nations University Press: Tokyo,1995.
MEBRATU, Desta. Sustainability and sustainable development: Historical and Conceptual Review. Environ Impact Asses. 493–520. Elsevier Science. New York, 1998.
NUNES MAIA, M. F. A gestão de resíduos urbanos e seus limites. Revista Baiana de Tecnologia. Vol. 17. Jan/abr. Salvador, 2002.
PAULA, Lia de. Sem vontade política, Brasil recicla apenas 3% do lixo urbano. Brasília, Agência Senado, 2014.
RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa Social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1999.
SCHALCH, Valdir.; et al. A Gestão e Gerenciamento de Resíduos Sólidos. Apostila de gestão de resíduos – UFSCAR, São Carlos, 2002.
TORRES, Osmar; TORRES.; Eli Narciso. Sustentabilidade na lata do lixo: um estudo sobre a coleta Seletiva de resíduos sólidos em Campo Grande/MS. In: XI Congresso Internacional de Direitos Humanos, Ed. UFMS, Campo Grande, 2014, p. 24.