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Diga-Me Que Curso Fazes e Eu Te Direi Quem És
Tell Me What Course You Do and I Will Tell You Who You Are
Revista Administração em Diálogo, vol. 21, núm. 2, pp. 164-190, 2019
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Artigo


Recepção: 10 Outubro 2018

Aprovação: 20 Fevereiro 2019

DOI: https://doi.org/10.23925/2178-0080.2019v21i2.39653

Resumo: Esta pesquisa de caráter qualitativo se propôs a conhecer os aspectos simbólicos presentes nos “personagens” metaforizados por alunos de graduação ao analisarem seu curso e os outros existentes na Ifes estudada. Como referencial teórico, têm-se as relações entre significado representacional e o discurso como uma prática social (Fairclough, 1992). Os alunos foram convidados a pensar em uma metáfora. Essas metáforas foram interpretadas a partir da abordagem teórica-metodológica da análise de discurso crítica. Como resultados, observou-se sete significados representacionais. A relevância teórica desta pesquisa reside em compreender que cada personagem metaforizado pode representar percepções e estereótipos de poder sobre os cursos e profissões dentro de uma organização.

Palavras-chave: Poder, Significado Representacional, Análise de Discurso Crítica.

Abstract: This qualitative research aimed to know the symbolic aspects present in the "characters" metaphorized by undergraduate students when analyzing their course and the others in the studied IFES. As a theoretical reference are the Relations between Representational Meaning and Discourse as a Social Practice (Fairclough, 1992). The students were invited to think of a metaphor. These metaphors were interpreted from the theoretical-methodological approach of Critical Discourse Analysis. As results, we observed seven representational meanings. The theoretical relevance of this research lies in understanding that each metaphorical character can represent perceptions and stereotypes of power over the courses and professions within an organization.

Keywords: Power, Representational Meaning, Critical Discourse Analysis.

Introdução

O presente trabalho procurou analisar representantes de quatro cursos de graduação distintos que compartilham um mesmo espaço físico e buscam se consolidar como uma estrutura social. Nesse cenário, pode-se notar lutas simbólicas por constituição de espaço e poder. A luta entre os grupos sociais é algo constante, pois alguns grupos tentam impor suas percepções e ideologias sobre grupos, intensificando assim a busca pelo monopólio.

Os representantes são de quatro cursos de graduação, sendo eles: Administração, Economia, Jornalismo e Serviço Social, ofertados por uma Instituição Federal de Ensino Superior (Ifes), localizada em Minas Gerais.

A pesquisa faz uma análise sobre como os grupos se configuram e se relacionam em um mesmo espaço social. Para tal, foi aplicado um questionário no qual, os alunos dos quatro cursos em questão deveriam escolher um personagem de histórias em quadrinhos ou de desenhos animados que melhor caracterizasse o seu curso e os outros três cursos do Instituto. Diante disso, a questão que sustenta este estudo é: quais são os aspectos simbólicos presentes nos “personagens” que foram metaforizados pelos alunos de graduação ao analisarem seu próprio curso e os outros cursos existentes na Ifes estudada?

Nesse sentido, analisou-se os significados representacionais dos personagens atribuídos ao próprio curso e aos outros cursos do IES estudado. Para tanto, foram traçados alguns objetivos específicos, são eles: 1) apontar as identidades atribuídas aos cursos; 2) identificar e compreender os significados representacionais e 3) mapear o campo de possibilidades simbólicas disponíveis. A importância deste estudo se justifica em compreender que cada personagem metaforizado pode representar percepções e estereótipos de poder sobre os cursos e profissões dentro de uma organização.

A análise de discurso crítica de Fairclough (1992) foi escolhida como abordagem teórico-metodológica deste estudo. Para Fairclough (1992), o discurso pode moldar ou até restringir a construção de todas as dimensões da estrutura social, como também as relações e identidades que lhe são subjacentes. O discurso é uma prática e não apenas uma representação do mundo, mas de significação dele. O mesmo autor propõe uma análise tridimensional do discurso, ou seja, o que o entrevistado diz deve ser analisado de acordo com três perspectivas. No primeiro momento, é preciso compreender o discurso como texto, para depois analisá-lo como prática discursiva e, por fim, como prática social.

Como resultados, tem-se que representantes de um mesmo curso podem se apresentar como grupos coesos que compartilham significados, possuem comportamentos similares, além de crenças, valores e interpretações comuns. Além disso, verifica-se que a realidade dos sujeitos do mesmo curso é fortemente compartilhada e a visão dos graduandos em relação aos alunos dos outros cursos também são semelhantes. Percebe-se que os sujeitos pertencentes a um mesmo grupo social compartilham concepções, ideologias e uma realidade própria, classificam a si mesmos e aos outros, e também são classificados dentro desse sistema social.

Esta pesquisa está estruturada em seis sessões incluindo-se esta introdução. Na segunda sessão, são apresentados o referencial teórico utilizado. Na terceira sessão, o caminho teórico e metodológico escolhido. Na análise de dados, quarta sessão, são apresentados os dados à luz da análise de discurso crítica de Fairclough (1992). As duas últimas sessões, constituídas pelas considerações finais e referências bibliográficas, se referem, respectivamente, a uma breve discussão sobre os resultados obtidos e a identificação da bibliografia utilizada para o desenvolvimento desta pesquisa.

Significado Representacional e Discurso

Na análise de discurso crítica (Fairclough, 1992), vertente da teoria social do discurso, o discurso pode ser entendido como um elemento das práticas sociais. A percepção da linguagem como parte da vida social que é dialeticamente interconectada a outros elementos sociais. A interação entre vida social e dialética constitui um modelo-teórico metodológico capaz de mapear relações interdiscursivas entre os recursos linguísticos utilizados pelos atores sociais em seus grupos e as formas de dominação ou subversão dos discursos (Pereira, 2017; Resende, & Ramalho, 2004).

O significado representacional está relacionado à perspectiva de mundo adotada pelas pessoas, à representação de mundo, à posição que o sujeito ocupa no mundo, sua identidade pessoal e social, e às relações que as pessoas estabelecem umas com as outras (Fairclough, 2003). O significado representacional se relaciona ao discurso como modo de representação de aspectos do mundo (Resende, & Ramalho, 2006). Diferentes discursos representam diferentes perspectivas de mundo, associadas a diferentes relações que as pessoas estabelecem com o mundo e que dependem de suas posições e as relações que estabelecem com outras pessoas (Fairclough, 2003).


Figura 1 -
Movimento Dialético do Discurso.
Fonte: Elaborada pelos autores.

A Figura 1. Movimento dialético do discurso indica uma sincronia entre dialética e discurso, a construção dos significados representacionais em gêneros e estilos, que determinam as ações e identidades dos atores sociais. O movimento circular, representado pelo espiral, diz respeito à dimensão dialética do discurso. Assim, ao alcançar camadas mais profundas da análise tendendo ao ponto das categorias de análise adotadas na pesquisa, que é a interdiscursividade e a representação dos atores sociais, esses movimentos buscam estudar o fenômeno da língua através de um recorte, portanto, são diacrônicos e obedecem a uma determinada fase ou época da história (Pereira, 2017).

A interdiscursividade refere-se à mistura particular de gêneros, de discursos, de estilos sobre os quais ela desenha e, também, como diferentes gêneros, discursos ou estilos são articulados (ou trabalhados) juntos no texto. É um nível de análise mediática entre a análise linguística de um texto e as diversas formas de análise de eventos e práticas sociais (Chouliaraki, & Fairclough, 1999). Tal categoria analítica permite acessar a heterogeneidade de um texto em termos da articulação de diferentes discursos.

A representação de atores sociais é o número de escolhas disponíveis na representação de atores sociais, ou seja, os participantes dos processos sociais podem ser analisados gramaticalmente por substantivos, pronomes, voz passiva ou voz ativa na oração, representados pessoalmente ou impessoalmente. Essa categoria analítica pode ser profícua na análise de ideologias em textos e interações “as maneiras como os atores sociais são representados em textos podem indicar posicionamentos ideológicos em relação a eles e as suas atividades” (Resende, & Ramalho, 2006, p. 72)

Discurso como Prática Social

Entender o discurso como prática social é compreendê-lo como ideologia e poder. Poder este que se manifesta como uma hegemonia, uma vez que as relações de poder se apresentam através de lutas hegemônicas (Fairclough, 2001).

A ideologia pode ser entendida como um conjunto de valores e adesão dos sujeitos a eles (Souza, de Oliveira, & da Silva, 2014), mas também significações ou construções da realidade (Fairclough, 2010). As práticas discursivas estão embutidas de ideologias, elas tornam natural algo que na verdade não é. Elas são verdades produzidas, são certos modos de produções subjetivas, que são tomadas como algo natural, mesmo não sendo. Contudo, a ideologia não é causadora de alienação, embora os valores difundidos pelos discursos podem ser internalizados de uma forma tão forte que deixam de ser “apenas” valores e se tornam um “estilo de vida”.

Os sujeitos assumem posições ideológicas, sendo assim, eles possuem a opção de realizar suas próprias conexões entre as diversas práticas e ideologias a que são expostos (Fairclough, 1992). As ideologias estão no texto, apesar de não ser possível lê-las neles.

Isso porque os sentidos são produzidos por meio de interpretações dos textos e os textos estão abertos a diversas interpretações que podem diferir em sua importância ideológica e porque os processos ideológicos pertencem aos discursos como eventos sociais complexos, são processes entre as pessoas, não apenas aos textos que são momentos de tais eventos. (Fairclough, 2010, p. 119).

As práticas discursivas tomadas por ideologias têm o poder de estruturar ou afetar as relações de poder e dominação (Fairclough, 2001). Essas relações de dominação fazem com que o discurso se construa na direção da ideologia e dos interesses dos grupos dominantes. As relações de poder e de ideologia como sistemas de dominação dão sustentação à hegemonia das classes dominantes, a hegemonia tem dimensões ideológicas.

Hegemonia é o poder sobre a sociedade como um todo de uma das classes economicamente definidas como fundamental em aliança com outras forças sociais, mas nunca atingido senão parcial e temporariamente, como um ‘equilíbrio instável’. Hegemonia é a construção de alianças e a integração muito mais do que simplesmente a dominação de classes subalternas, mediante concessões ou meios ideológicos para ganhar seu consentimento. Hegemonia é um foco de constante luta sobre pontos de maior instabilidade entre classes e blocos para construir, manter ou romper alianças e relações de dominação/subordinação, que assume formas econômicas, políticas e ideológicas. (Fairclough, 2010, p. 122).

Para Joseph (2003), a hegemonia sempre desempenha um papel importante na garantia da reprodução das estruturas sociais e de suas combinações e, em razão do mundo ser um sistema aberto, a hegemonia é necessária para garantir a coesão social.

As lutas hegemônicas são uma tentativa de articular, desarticular e rearticular a prática discursiva que é dialética. Essa prática discursiva, a produção, a distribuição e o consumo dos textos são uma faceta da luta hegemônica. Faceta esta que contribui em variadas instâncias para a reprodução ou transformação não apenas da ordem de discurso existente, mas também das relações sociais e assimétricas existentes (Fairclough, 2001).

O conceito de hegemonia permite analisar a prática social na qual o discurso está inserido no que diz respeito às relações de poder, que podem se manifestar com diferentes perspectivas, elas podem reproduzir, reestruturar ou até mesmo desafiar as hegemonias existentes. Sendo assim, a prática discursiva pode se manifestar como uma luta contra os interesses dos dominantes, ou, em outras palavras, uma luta contra a hegemonia, uma luta contra os discursos existentes.

A Organização Entendida como Lugar

O lugar pode ser entendido como um construto social no qual os indivíduos estabelecem relações e sentimentos de pertencimento (Teixeira, Saraiva, & Carrieri, 2015). Esse lugar transcende o espaço físico, ele é repleto de representações e simbolismos que permitem uma construção social e não representações estáticas do mundo (Daskalaki, Stara, & Imas, 2008). A noção de lugar pode ser melhor compreendida partindo-se da ideia de identidade.

Não obstante, autores como Fischer (1994), Silva e Saraiva (2013) abordam que a concepção de organização remete à ideia de lugar. Para eles, o lugar não é apenas uma dimensão objetiva, ou apenas um ponto geográfico. O lugar deve ser entendido também como uma produção social “edificada e mobiliada por sentimentos, interpretações, memórias dos sujeitos que lá estabelecem ou estabeleceram suas ações” (Silva, & Saraiva, 2013, p. 384)

Ao buscar entender o lugar dos alunos dos cursos de graduação do Instituto estudado, busca-se compreender também as identidades que se constroem nesses espaços que estão em constante edificação e são alvos de disputas entre aqueles que neles estão inseridos (Spink, 2001). Hall (2006) propõe que o sujeito sociológico possui uma identidade que se forma a partir das interações entre o eu e a sociedade. Isso não quer dizer que o sujeito não tenha uma essência, mas que esta pode ser formada e modificada em um diálogo constante com os mundos culturais nos quais o sujeito está inserido e com as identidades que esses mundos oferecem.

A identidade refere-se à autodefinição do sujeito, sendo o reflexo na interação entre o eu e a sociedade. A identidade, destarte é construída de acordo com as relações que vão sendo estabelecidas pelo sujeito. Ou seja, a identidade é um processo que ocorre em um dado período temporal, na qual as interações sociais são os alicerces (Dubar, 2001). Ao estabelecer relações com essas outras identidades ou mundos culturais, o sujeito passa a internalizar seus significados e valores, contribuindo para alinhar os seus sentimentos subjetivos com os lugares objetivos que eles ocupam no mundo social e cultural. A identidade então liga o sujeito à estrutura, ao lugar que o influencia (Hall, 2006).

Segundo Saraiva, Carrieri e Soares (2014), o lugar é “produzido” socialmente pelos grupos que o compõem, respondendo às múltiplas representações sociais dos envolvidos, gerando assim um sentimento de pertencimento aos grupos sociais. Um mesmo espaço pode ser apropriado, ressignificado e produzido, dependendo do grupo que dele se apropria e o ocupa geográfica e identitariamente, gerando assim um sentimento de pertencimento, o qual contribui para a cristalização das representações sociais e simbólicas (Teixeira et al., 2015).

A caracterização da organização como um lugar, portanto, sugere a existência de relações sociais, construção de identidade e indivíduos inseridos em um sistema simbólico. Assim, compreende-se que a organização como lugar reúne elementos de diversos aspectos da vida política, econômica, cultural e social.

Procedimentos Metodológicos

A natureza desta pesquisa caracteriza-se como qualitativa e exploratória. Os sujeitos do estudo foram alunos das áreas de Administração, Economia, Jornalismo e Serviço Social de uma instituição federal de ensino superior situada no estado de Minas Gerais. Foi selecionada uma amostra de dez alunos de cada um desses cursos. No entanto, os alunos do curso de Economia não demonstraram interesse em participar da pesquisa, não havendo questionários respondidos por eles, apenas a visão dos demais cursos em relação a essa área. A escolha por essa instituição de ensino considerou principalmente a facilidade de acesso e disponibilidade dos graduandos em participar da pesquisa.

A coleta de dados foi realizada por meio da aplicação de questionários compostos por questões fechadas e discursivas. Foram coletadas e analisadas 27 respostas. Entretanto, neste estudo foi utilizado um recorte: a questão discursiva relacionada às metáforas. Dentre os personagens identificados pelos alunos, selecionou-se aqueles que foram ditos mais de uma vez, ou seja, foram escolhidos para serem analisados os personagens que foram citados por mais de um aluno independente do curso a que ele foi destinado.

Os dados obtidos foram analisados por meio da abordagem teórica-metodológica de análise de discurso crítica (ADC), haja vista que as metáforas podem ser consideradas como produto da atividade discursiva, possibilitando ao pesquisador considerar o contexto em que o discurso está inserido. Essa abordagem teórica-metodológica “procura estabelecer um quadro analítico capaz de mapear a conexão entre relações de poder e recursos linguísticos selecionados por pessoas ou grupos sociais” (Resende, & Ramalho, 2004, p. 185). Ainda, segundo as mesmas autoras, o discurso deve ser compreendido como uma prática social, isto é, um modo de ação sobre o mundo e sobre a sociedade. Diante disso, é possível afirmar que o discurso é socialmente construído e ele é capaz de constituir as estruturas sociais e ao mesmo tempo se constituir a partir desses domínios sociais.

Uma característica marcante da análise do discurso crítica é seu caráter emancipatório. Uma vez que, vislumbrado um caminho que permite a desnaturalização de crenças que dão sustentação às estruturas de dominação e relações de poder, a investigação das relações entre discurso e prática social se apresenta como uma possibilidade de emancipação (Resende, & Ramalho, 2004, p. 186).

De acordo com Ramalho e Resende (2004), o modelo tridimensional de análise do discurso crítica, proposto por Fairclough, distingue três dimensões no discurso: o texto, prática discursiva e a prática social, podendo ser percebida na Figura 2. Modelo Tridimensional da ADC segundo Fairclough (2001).


Figura 2 -
Modelo Tridimensional da ADC segundo Fairclough (2001).
Fonte: Adaptado de Ramalho & Rezende (2004).

A partir da Figura 2, é possível observar que a análise do discurso, aqui proposta, se dá em três estágios. Inicialmente, é preciso compreender o discurso como texto e todo texto é constituído por uma semântica gramatical. A segunda etapa consiste em analisar o discurso como uma prática discursiva que diz respeito ao texto e a interação de discurso, específica a natureza dos processes de produção e interpretação textual. Por fim, a última fase a ser realizada é a do discurso como prática social que se dá pelo texto. É através dessa prática que se exploram as estruturas de dominação, as operações de ideologia e as relações sociais (Fairclough, 1992; Resende, & Ramalho, 2004).

Essa relação dialética entre o discurso e as práticas sociais faz com que o primeiro seja pensado como algo temporal que pode a todo tempo se desfazer e se reconstruir, de acordo com as novas perspectivas do meio em que ele está se constituindo. “Não é possível assumir o papel do discurso nas práticas sociais como dado, devendo ele ser estabelecido a partir da análise. E o discurso pode ser mais ou menos importante em conjuntos específicos de práticas, além de poder mudar no/com o tempo” (Fairclough, 2010, p. 226).

Ao entender a análise de discurso crítica como uma prática social, torna-se imprescindível considerar o papel do contexto (Pedrosa, 2005) e as relações entre linguagem e poder nele existentes. O discurso estabelece uma relação dialética com os outros elementos das práticas sociais que o compõem, “o discurso incorpora e é incorporado por outros elementos, sem que nenhum deles possa ser reduzido ao outro ou isolado. Eles são diferentes, mas não discretos” (Fairclough, 2010, p. 227)

A prática discursiva contribui para reproduzir a sociedade (identidades sociais, relates sociais, sistemas de conhecimento e crença) e ainda vai além ao possibilitar transformar essa sociedade (Fairclough, 1992). Assim, estudar a linguagem é importante, pois ela “é um meio de dominação e de força social, servindo para legitimar as relações de poder estabelecidas institucionalmente” (Pedrosa, 2005).

Além disso, a análise do discurso permite captar aquilo que não está explícito no discurso, por meio da interpretação da linguagem. No discurso o sujeito revela sua compreensão sobre determinado contexto sócio histórico. Assim, utilizou-se uma metodologia que permitisse interpretar a subjetividade do pesquisado.

Com o objetivo de analisar quais os significados representacionais existentes nos personagens animados que os pesquisados atribuíram ao próprio curso e aos outros cursos do IES estudado, além de buscar responder quais são os aspectos simbólicos presentes nesses personagens que foram metaforizados pelos alunos de graduação, optou-se pela utilização do modelo tridimensional de análise de discurso crítica proposto de Fairclough em 2001.

Contexto de Estudo

O Instituto Federal de Ensino Superior estudado foi criado no ano de 2008 a partir da adesão ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), abrigando quatro cursos de graduação em um campus localizado no estado de Minas Gerais. Desde sua criação, o Ifes tem como objetivo principal possibilitar uma ampla e adequada formação aos profissionais de Administração, Ciências Econômicas, Jornalismo e Serviço Social. No site do Instituto, nota-se o destaque dado à flexibilidade curricular, além de aliar as novas tecnologias à reflexão acerca das relações sociais.

De acordo com o site institucional, o curso de Administração teve início no segundo semestre de 2008 e tem como principal objetivo a formação de profissionais dotados de competências para se tornarem gestores de empresas públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos. Os primeiros cursos de Administração no Brasil foram fundados em 1952 e a partir de então, houve a sua difusão, sempre buscando se adequar às demandas do setor produtivo brasileiro. Dessa forma, o curso se propõe a dar suporte ao mercado globalizado, contribuindo para a evolução sustentável da sociedade.

No mesmo semestre de 2008, foi criado o curso de Jornalismo, estruturado para articular os múltiplos aspectos do campo da Comunicação e do Jornalismo numa formação acadêmico-profissional voltada para amplas habilidades práticas e domínio teórico consistente, com ênfase na ética, cidadania e papel social do comunicador. Já o curso de Ciências Econômicas foi implantado no primeiro semestre de 2009 e ele tem como objetivo formar profissionais com autonomia para atuar nos ramos do mercado de trabalho ligados a atividades que demandam poder de análise econômica, planejamento e tomada de decisões. Por fim, o curso de Serviço Social, assim como o curso de Ciências Econômicas, teve seu início no primeiro semestre de 2009 e tem por objetivo formar assistentes sociais críticos, compromissados com a democracia, com a justiça social e com a cidadania.

O Instituto estudado é um lugar marcado por conflitos sociais, muitos deles de cunho homofóbico e sexista. É possível encontrar reportagens em jornais eletrônicos com notícias sobre alguns momentos de tensão vividos no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas em decorrência da homofobia e preconceito.

Em 2011, comentários homofóbicos e sexistas foram escritos em uma página do Instituto em uma famosa rede social. Esse ato gerou uma mobilização na instituição com o objetivo de conscientizar os alunos para o respeito às diferenças. Umas das iniciativas consistiu em elaborar placas em que a pessoa se identificava e afirmava “batalhar” contra a homofobia. As placas feitas pelos alunos foram postadas na mesma rede social. A palavra “batalha” fazia uma alusão à “batalha de vaga”, prática realizada por algumas repúblicas da Universidade, nas quais para o estudante ser aceito ele precisa carregar uma placa com um apelido dado a ele e o nome da casa que pleiteia por uma vaga.

Assim, ao trazer elementos do contexto social do Instituto que ajudassem a compreender os significados presentes nos discursos, amplia-se o corpus de análise resgatando cartas abertas ao público escritas pelos alunos de graduação que contém julgamentos e revelam significações da prática social analisada. A codificação e seleção das amostras no corpus foram feitas por meio de um recorte, na qual buscou-se utilizar os personagens que foram atribuídos para mais de um curso, e decompô-lo em significados particulares, sendo eles: econômicos, ideológicos, culturais e históricos da sociedade, os quais dão origem a questões contemporâneas.

Pretende-se analisar não apenas as características linguísticas dos textos, mas também as relações sociais que estão envolvidas na interação com os leitores e as relações econômicas que determinam sua produção e circulação. Dessa forma, nota-se a importância da análise do discurso como uma forma de análise e questionamento dos textos, sejam estes orais ou escritos, através de uma visão crítica que analisa além do que está explícito, bem como todas as relações que estão envolvidas na produção de determinado discurso.

Análise dos Dados

Com o intuito de responder a pergunta de pesquisa instaurada neste trabalho, buscou-se por meio da análise de discurso crítica, segundo Fairclough (1992), analisar as três dimensões do discurso, quais sejam: textual, discursiva e social, que estão superpostas na produção e consumo do texto pelos alunos participantes. Devido ao grande volume análises produzidas neste estudo, optou-se por inserir no corpo do texto desta seção uma sumarização realizada com base no quadro analítico indicado abaixo, contendo os elementos da tridimensionalidade da ADC (Fairclough, 1992; Pedrosa, 2005).


Figura 3 -
Elementos de Análise.
Fonte: Elaborado pelos autores com base em Fairclough (1992) e Pedrosa (2005).

Percepções e Estereótipos de Poder nas Atribuições dos Personagens

O discurso considera o uso da linguagem como uma forma de prática social, sendo assim, ele é entendido como uma atividade em que as pessoas têm a possibilidade de agir sobre o mundo e sobre os outros, como também um modo de representação. Além disso, implica uma relação de diálogo entre o discurso e a estrutura social, na qual a estrutura social é tanto uma condição como um efeito do discurso. Assim, o discurso não é somente uma prática de representação, mas também de construção de significados.

As Meninas Superpoderosas

A personagem “As Meninas Super Poderosas” foi atribuída a três cursos do instituto, são eles: Administração, Jornalismo e Serviço Social. É importante ressaltar que tal personagem foi atribuída aos grupos por eles mesmos.


Figura 4 -
The Powerpuff Girls.
Fonte: Cartoon Network (1998).

Os alunos dos cursos de Administração, Jornalismo e Serviço Social atribuem a si próprios a metáfora "as meninas superpoderosas", o que denota a preocupação de todos os cursos em transformar a sociedade com seus “superpoderes”, interpretados aqui como as teorias e práticas sociais aprendidas no curso.

Unir nossas forças com nosso poder X para transformar e vencer [De graduandos em Administração para graduandos em Administração].

Papel de guardião da sociedade, que está na identidade desta profissão e muitas vezes esse papel é ácido como as personagens [De graduandos em Jornalismo para graduandos em Jornalismo].

Ajudam as pessoas que necessitam [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Serviço Social].

Entretanto, nota-se que, as metáforas desse mesmo desenho têm representações distintas, ou seja, em relação a Administração, o superpoder está vinculado a união de forças, aos alunos de Jornalismo, o superpoder está ligado a pretensão do profissional em levar a informação aos demais ajudando-os e se tornando o guardião da sociedade. Os alunos de Serviço Social caracterizam os superpoderes como ajudar as pessoas que necessitam, o que corresponde com a visão de assistência presentes nas teorias e práticas sociais deste curso.

Fairclough (1992) aponta que o discurso possui três aspectos construtivos, a saber: 1) o discurso contribui para a construção das identidades sociais e posição dos sujeitos sociais (linguagem identitária); 2) através do discurso as pessoas conseguem estabelecer relações sociais (linguagem relacional) e 3) o discurso contribui para a construção de sistemas de conhecimento e crença (linguagem ideacional).

As palavras representam um significado cultural, variável e mutável, assim como um modo de luta e hegemonia. Nota-se que as palavras "poder", "transformar" e "vencer", no discurso dos alunos de Administração, contribuem para a construção de um discurso gerencialista que está em consonância com a visão de mundo compartilhada por eles.

Os alunos de Jornalismo, por sua vez ao utilizam "guardião da sociedade" "identidade desta profissão" e "papel é ácido" "reportagem" "ajudar as pessoas", denotam a preocupação destes em levar informação às pessoas. Tais profissionais têm o intuito de levar aos espectadores os acontecimentos do mundo, mesmo que para isso, tenham que enfrentar muitos obstáculos.

Já os alunos de Serviço Social, dado à sua perspectiva de assistência às pessoas, revelam no seu discurso uma preocupação em atender às demandas dos que necessitam, como pode ser percebido em "ajudar" e "pessoas que necessitam".

Superman

O personagem Superman foi associado aos cursos de Jornalismo e Serviço Social. Os alunos de Jornalismo, associam positivamente o personagem a si e aos alunos de Serviço Social. Por outro lado, o personagem foi atribuído de forma irônica ao curso de Serviço Social, pelos alunos de Administração.


Figura 5 -
Superman.
Fonte: Dc Comics (1938).

Os alunos de Jornalismo associam positivamente o personagem a si e aos alunos de Serviço Social, entretanto, o recorte para o curso de Jornalismo está relacionado a força da mídia, e o objetivo é alcançado quando a notícia é levada às pessoas. Em relação ao curso de Serviço Social a mudança do mundo não acontece, e não será alcançada por causa de uma fraqueza, que é representada pelos políticos da cidade. Os alunos de Administração, associam o personagem Superman ao curso de Serviço Social, porém não acreditam que a salvação do mundo pode acontecer.

Pensa que vai salvar o mundo [De graduandos em Administração para graduandos em Serviço Social].

Porque ele representa a força da mídia. Jornalista que ao mesmo tempo é super-herói, levando a notícia e salvando o mundo. [De graduandos em Jornalismo para graduandos em Jornalismo].

Os alunos do curso, acreditam que podem mudar o mundo, no caso a cidade onde fica o instituto. Mas muita das vezes encontram uma Kryptonita, os políticos da cidade. [De graduandos em Jornalismo para graduandos em Serviço Social].

Ao usar o termo discurso, Fairclough (2001) considera o uso da linguagem como uma forma de prática social e não como uma ação de cada indivíduo, isso implica que o discurso é uma atividade em que as pessoas têm a possibilidade de agir sobre o mundo e sobre os outros, como também um modo de representação. Além disso, implica em uma relação de diálogo entre o discurso e a estrutura social, na qual a estrutura social é tanto uma condição como um efeito do discurso, assim, o discurso não é somente uma prática de representação, mas também de construção de significados (Fairclough, 2001).

Portanto, percebe-se que cada curso tem sua visão particular de "salvar o mundo", por isso o termo apresenta um significado variável e mutável, Jornalismo atribui o termo à informação e para os alunos de Administração "salvar o mundo" está relacionado à manutenção do sistema de poder e da ordem dominante, por isso atribuem pejorativamente a personagem ao curso de Serviço Social.

Cada curso possui a sua ideologia, e seus objetivos políticos. Mesmo que seus discursos compartilhem a interação com a sociedade, percebe-se que esses sistemas de conhecimento e crenças particulares fazem com que os mesmos discordem das práticas e ações sociais dos outros cursos.

As práticas discursivas "salvar o mundo" e "mudar o mundo", foram produzidas obedecendo a lógica discursiva que cada área apresenta. Esses sociais e particulares representam como as ideias são constituídas na mente dos alunos. Os discursos são diferentes, para o Jornalismo, levar informação é primordial, para Administração, a manutenção da ordem vigente é o primordial, sendo assim, para estes cursos o curso de Serviço Social, que possui outra visão, não alcançou seu objetivo.

Velma

A personagem Velma foi associada aos cursos de Administração e Jornalismo pelos alunos de Serviço Social.


Figura 6 -
Velma.
Fonte: Hanna-Barbera (1969).

Por possuírem ideologias distintas dentro do instituto, o curso de Serviço Social associou pejorativamente a personagem ao curso de Administração. Entretanto, em relação ao curso de Jornalismo a associação é positiva e denotam as qualidades que os alunos de Serviço Social veem no curso de Jornalismo.

Calculista [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Administração].

Sempre atenta aos fatos desvendando diversos fatos [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Jornalismo].

Há um embate dentro do Instituto entre as visões de mundo defendidas pelos alunos do curso de Serviço Social e os alunos de Administração. Os primeiros consideram os segundos como um área acrítica, que contribui para as mazelas da sociedade. Em contraposição, os segundos veem os objetivos dos primeiros como uma utopia, algo muito difícil de acontecer, isto pode ser percebido no quadro da personagem Superman.

A metáfora “Velma (Scoob Doo)” adquiriu sentidos diferentes, pois foram construídas em um contexto particular do discurso compartilhado pelos alunos do curso de Serviço Social. Ao atribuir a personagem ao curso de Administração, as semelhanças vistas entre eles foram a característica “calculista”, e ao atribuir ao curso de Jornalismo a semelhança foi “atenta” e “desvendando fatos”.

Pato Donald

O personagem do Pato Donald foi atribuído os alunos de Administração e Economia pelos alunos de Jornalismo e Serviço Social, respectivamente.


Figura 7 -
Pato Donald.
Fonte: Walt Disney (1934).

A metáfora "Pato Donald" proferida pelos alunos do curso de Jornalismo ao curso de Administração reproduz funções materiais utilitárias e valores sociais atribuídos ao curso. Nota-se que o personagem foi atribuído de forma pejorativa aos cursos de Economia e Jornalismo.

É tranquilo, mas sabe cuidar bem das coisas [De graduandos em Jornalismo para graduandos em Administração].

Sempre em busca de uma nova estratégia para se dar bem [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Economia].

Fala muito, mas ninguém entende [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Jornalismo].

As expressões "é tranquilo" e "mas sabe cuidar" denotam que os alunos do curso de Jornalismo percebem os alunos de Administração como pessoas tranquilas e que sabem alcançar seus objetivos. Já os alunos de Serviço Social, pelo uso das expressões "nova estratégia" e "se dar bem" atribuem ao curso de Economia, uma visão de utilização de ferramentas de gestão como a estratégia, para ganhar vantagens competitivas, ou "se dar bem". Em relação ao curso de Jornalismo, os alunos de Serviço Social atribuem "fala muito" e "ninguém entende" caracterizando o curso de Jornalismo comunicativo e destoante.

Riquinho Rico


Figura 8 -
Richie Rich.
Fonte: Harvey Comics (1953).

Administra sua herança [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Administração].

Como pode ser percebido em outras metáforas como a do personagem Tio Patinhas, os alunos de Administração e Economia foram vinculados tanto pelos alunos do curso de Jornalismo quanto pelos de Serviço Social a herdeiros de famílias ricas, que pretendem manter sua fortuna.

O personagem Riquinho foi metaforizado pelos alunos de Serviço Social para representar os discentes de Administração e Economia e pelos alunos de Jornalismo aludindo aos de Economia. A associação feita pelos alunos de Serviço Social tem uma conotação irônica ao afirmar que o estudante de Administração tem por objetivo administrar a herança que recebem de suas famílias abastadas.

A expressão "administra sua herança" também foi produzida por outro sujeito de pesquisa do curso de Serviço Social para o curso de Administração no personagem "Batman: superplanos para Administrar toda sua herança". Isso denota a presença de elementos materiais na construção simbólica e percepção de pressupostos sobre as famílias dos alunos de Administração. Nessa concepção, tais alunos seriam herdeiros de algo a ser administrado e mantido. Percebe-se aqui um estereótipo que pessoas que cursam Administração são ricas e têm como objetivo manter a sua fortuna.

Pink e o Cérebro

Alunos de Serviço Social associaram o personagem Pink e o Cérebro ao curso de Economia e os discentes de Administração relacionaram o curso de Serviço Social ao mesmo personagem. Ambas as metáforas traçadas têm um caráter pejorativo e os discursos apontam crenças particulares.


Figura 9 -
Pinky and the Brain.
Fonte: Harvey Comics (1953).

O personagem "Pink e Cérebro", metaforizado pelos alunos de Serviço Social e Administração, mantém uma crítica em comum: o uso pejorativo do termo para caracterizar os cursos e críticas a ideologia de cada um desses cursos.

Estão sempre pensando em como dominar o mundo [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Economia].

Querem dominar o mundo todos os dias com suas teorias sociais, mas não conseguem [De graduandos em Administração para graduandos em Serviço Social].

Entretanto, o sentido atribuído é diferente. O curso de Serviço Social atribui ao curso de Economia o sentido da dominação de classes por meio de suas teorias que beneficiam as classes dominantes. Já a Administração usou o termo em um sentido pejorativo, atribuindo ao curso de Serviço Social uma “ineficiência” das teorias sociais por não conseguir “dominar o mundo”.

Zé Carioca

O personagem Zé Carioca foi atribuído aos alunos de Economia pelos alunos de Administração fazendo referência à aspiração pelo capital e esperteza em relação ao dinheiro. Já os alunos de Serviço Social associaram o mesmo personagem ao curso de Jornalismo para fazer uma alusão ao aspecto comunicativo e espontâneo dos últimos.


Figura 10 -
José Carioca.
Fonte: Walt Disney (1940).

Os diferentes discursos não só representam o mundo “concreto”, mas projetam também as diferentes possibilidades da “realidade”. Através de discursos que se complementam ou que competem os recursos utilizados por atores sociais se relacionam, cooperam, competem, dominam (Resende, & Ramalho, 2006). Assim, o personagem "Zé Carioca", atribuído a ambos os cursos, tem significações distintas.

São econômicos, ligado ao capital [De graduandos em Administração para graduandos em Economia].

Comunicativo e espontâneo [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Jornalismo].

As palavras "econômicos" e "capital" usadas pelos alunos de Administração atribuída ao curso de Economia estão interligadas e trazem elementos lexicais de significação, tanto política quanto ideológica, que o produtor do texto compartilha com os outros de seu grupo. As palavras "comunicativo" e “espontâneo”, usadas pelos alunos de Serviço Social, são enunciados que fazem parte da construção social e identidade do curso de Jornalismo dentro do Instituto, considerando-se os eventos e manifestações que esse grupo tem feito dentro do Instituto.

Tio Patinhas

O personagem Tio Patinhas é referenciado para descrever os alunos do curso de Administração e Economia.


Figura 11 -
Scrooge McDuck.
Fonte: Walt Disney (1940).

Todas as associações feitas, a ambos os cursos, fazem alusão ao lucro, fortuna dinheiro, capital ou economia/poupança. Apesar de os alunos dos cursos de Administração, Jornalismo e Serviço Social compartilharem um modo de ver que constrói a identidade social dos alunos do curso de Economia, os últimos não demonstraram interesse em responder o questionário e por consequência participar da pesquisa.

Nota-se, também, pelas análises sobre cada personagem, que os alunos dos outros cursos pouco se referem aos discentes de Economia, eles aparecem nas análises, mas em uma frequência bem menor do que os outros três cursos.

Pela vontade de maximizar os seus recursos...Visa lucro [De graduandos em Administração para graduandos em Administração].

Porque ele é muito rico, sabe economizar, fica atento as questões econômicas. A sua riqueza e suas atitudes podem mudar o rumo do país [De graduandos em Administração para graduandos em Economia].

Administra sua fortuna [De graduandos em Jornalismo para graduandos em Administração].

Porque o tio Patinhas é preocupado com o dinheiro. Não gosta de gastar o dinheiro, pelo contrário quer aumentar o que já tem [De graduandos em Jornalismo para graduandos em Economia].

Visa o lucro e sempre está rodeado de dinheiro... Porque ele sempre pensa como ter dinheiro [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Administração.

É pão duro... Só pensa em dinheiro [De graduandos em Serviço Social para graduandos em Economia].

A metáfora da personagem Tio Patinhas é utilizada com significações diferentes, embora façam luz a orientação para o acúmulo de capital. Os alunos de Administração se caracterizam como "vontade de maximizar seus recursos". Jornalismo atribuiu ao curso o fato do personagem administrar sua fortuna. E o Serviço Social atribuiu ao curso o fato de o personagem estar rodeado de dinheiro. Em relação ao curso de Economia, os discursos envolvem o pensamento voltado para o lucro, economia e dinheiro.

Esses grupos distintos e coesos entre si, envolvidos em lutas simbólicas por construção de identidade e identificação de espaço, adotam discursos ideológicos particulares. E são essas questões ideológicas que contribuem para a distinção entre os grupos.

Conclusões

O presente artigo objetivou analisar quais os significados representacionais existentes nos personagens atribuídos ao próprio curso e aos outros cursos do IES estudado, especificamente buscou-se apontar as identidades atribuídas aos cursos; identificar e compreender as representações existentes e mapear o campo de possibilidades simbólicas disponíveis. Conclui-se que cada personagem atribuído ao próprio curso e ao curso dos outros possui representações identificadas pelos sujeitos que relacionam as características do personagem ao curso. Além disso, tais representações variam juntamente com o lugar que cada sujeito que atribui a representação ocupa no espaço, o qual é identificado como o Instituto.

Nota-se que as personagens “as meninas superpoderosas” foram atribuídas a três cursos (Administração, Jornalismo e Serviço Social) pelos próprios estudantes desses cursos, no entanto, sob visões diferentes, que constituem a forma como cada um dos sujeitos se veem dentro do instituto. No curso de Administração, houve a construção de um discurso gerencialista. No curso de Jornalismo, esta personagem indicou a preocupação dos estudantes em disseminar a informação. Já no curso de Serviço Social, percebeu-se a preocupação dos indivíduos em ajudar pessoas que necessitam.

Outro personagem atribuído ao curso de Jornalismo pelos próprios estudantes foi o “Superman”, haja vista que estes se veem como super-heróis que transmitem as notícias para a população. No entanto, os cursos de Administração e Jornalismo atribuíram esse personagem, ao curso de Serviço Social, pelo fato de que há uma visão que acompanha este curso envolvendo a preocupação em mudar o mundo e ajudar as pessoas necessitadas, tarefas as quais são consideradas como sendo de um super-herói. A personagem Velma, que possui características como atenta, curiosa e um perfil calculista, foi atribuída pelo curso de Serviço Social aos cursos de Jornalismo e Administração, justamente pela maneira como são vistos estes cursos no instituto.

O personagem “Pato Donald” foi atribuído pelo curso de Jornalismo ao curso de Administração, pela característica de saber organizar e pelos alunos de Serviço Social aos cursos de Economia e Jornalismo, no primeiro por trabalhar com estratégias para obter sucesso e no segundo por transmitir muitas mensagens que não trazem informações. Já o personagem “Riquinho” foi atribuído pelo curso de Serviço Social a Administração e pelo curso de Jornalismo a Economia, pelos estereótipos que envolvem ambos os cursos, os quais tratam o dinheiro como principal.

“Pink, o cérebro” foi atribuído pelos alunos de Serviço Social a Economia e por Administração ao Serviço Social, pelos mesmos motivos, ambos os grupos de estudantes indicaram que o outro curso tem a intenção de dominar o mundo assim como esse personagem. “Zé Carioca” foi atribuído pelos estudantes de Administração a Economia e Serviço Social a Jornalismo, também pelas próprias características dos cursos, econômicos e comunicativos, respectivamente. Por fim, tem-se o personagem mais citado pelos estudantes, “Tio Patinhas”, atribuído pelos três cursos aos cursos de Administração e Economia, o que pode ser explicado pela relação com o dinheiro e o lucro, bem como a necessidade de economizar.

Dessa maneira, percebe-se que todas as representações que cada sujeito possui do seu próprio curso e do curso do próximo está diretamente ligada a identidade de cada curso, a qual é ilustrada pelas características que foram compondo os cursos ao longo do tempo. Nota-se também que as representações são diretamente relacionadas às características de cada personagem, que podem ser atribuídos a diferentes cursos, mas com visões diversificadas. Assim, fica evidente que as representações que os sujeitos constroem de si próprios e dos outros dependem do lugar em que estes ocupam no espaço.

Referências

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