Resumo: A gestão de riscos tem emergido como campo de pesquisa promissor em gestão de operações, pela maior exposição das organizações aos riscos internos e externos. Este artigo, de caráter teórico, tem por objetivo discutir e propor um modelo conceitual embasado na convergência entre gestão de riscos relacionais, confiança e custos de transação (pressupostos comportamentais - oportunismo e racionalidade limitada), no âmbito da gestão de relacionamentos em díades (comprador-fornecedor). Após a articulação dos conceitos e teorias, propõe-se um modelo conceitual com oito hipóteses a serem testadas em estudos futuros. Como contribuições são sugeridas oportunidades de pesquisa no campo de gestão de riscos, sobretudo em díades, que podem ser ampliadas e testadas em relações como redes interorganizacionais e em cadeias de suprimentos.
Palavras-chave: Gestão de RiscosGestão de Riscos,Custos de TransaçãoCustos de Transação,ConfiançaConfiança.
Abstract: Risk management has emerged as a promising field of research in operations management, due to the greater exposure of organizations to internal and external risks. This theoretical article has the objective of discussing and proposing a conceptual model based on the convergence between relational risk management, trust and transaction costs (behavioral assumptions - opportunism and limited rationality), in the context of relationship management in buyer- provider). After the articulation of concepts and theories, a conceptual model with eight hypotheses to be tested in future studies is proposed. As contributions, research opportunities are suggested in the field of risk management, especially in dyads, which can be expanded and tested in relationships such as interorganizational networks and supply chains.
Keywords: Risk Management, Transaction Costs, Trust.
Artigo
Gestão de Riscos Relacionais, Confiança, Custos de Transação e Relacionamentos Colaborativos: Proposta de Modelo1
Relational Risk Management, Trust, Transaction Costs and Collaborative Relationships: Model Proposal
Recepção: 22 Outubro 2018
Aprovação: 20 Fevereiro 2019
A literatura sobre gestão de riscos em cadeia de suprimentos tem recebido, no últimos anos, atenção especial dos pesquisadores que observam um potencial promissor para proteger as cadeias de perturbações internas e externas ao ambiente (Fan, & Stevenson, 2018; Jüttner, Peck, & Christopher, 2003; Kauppi, Longoni, Caniato, & Kuula, 2016). A gestão do risco surgiu como importante ferramenta no gerenciamento da cadeia de suprimentos, devido aos vários fatores enfrentados pelas indústrias atualmente, como: globalização, terceirização, crescente dependência de fornecedores e parceiros comerciais (Tang, & Musa, 2011). Se por um lado essas tendências aumentam as possibilidades de atuação em novos mercados, também aumentam a probabilidade de eventos adversos que ameaçam a continuidade das operações (Chang, Ellinger, & Blackhurst, 2015; Fan & Stevenson, 2018).
A gestão de riscos da cadeia de suprimentos gera a necessidade de desenvolver novas capabilidades, caracterizando um sistema complexo onde as organizações precisam se adaptar. Assim a gestão de riscos na cadeia de suprimentos (Supply Chain Risk Management - SCRM) envolve a identificação, avaliação e controle dos riscos internos ou externos que podem afetar o desempenho da cadeia, por meio da aplicação coordenada e econômica dos recursos para minimizar, monitorar e controlar a probabilidade ou impacto dos acontecimentos que possam interferir na cadeia como um todo (Jüttner et al., 2003).
Conforme exposto por Adobor (2011), a confiança reduz os custos de transação e funciona como uma espécie de “cola” que permite que relacionamentos se desenvolvam de forma mais eficiente. De maneira geral existem duas possíveis perspectivas para identificar o efeito da confiança nos custos de transação. A princípio, a confiança pode ser considerada como um fator que inibe comportamentos oportunistas através da relação de confiança mútua que inibe desvios nesse sentido. Tal comportamento facilita o compartilhamento de conhecimentos e informações e reduz o medo de oportunismo entre os parceiros. Por outro lado, a confiança pode oferecer suporte para obtenção de vantagens competitivas através do relacionamento colaborativo. Assim, para uma avaliação da presença de confiança em organizações, é relevante entender como essa influencia os custos de transação (Zanini, Lusk, & Wolff, 2009) e permite condições favoráveis para a construção de relacionamentos fortes, cooperativos e colaborativos.
Embora a confiança possa ser utilizada como mecanismo para evitar comportamentos oportunistas, não é a única forma. Assim, para detectar membros que violem normas e acordos entre parcerias, a gestão de riscos relacionais monitora e controla os riscos inerentes às parcerias, para manter um relacionamento saudável. A literatura tende a ver controle e confiança como mecanismos opostos. Pesquisas recentes propõe uma perspectiva integrativa para resolver o impacto de confiança e controle sobre relações interorganizacionais (Ning, 2017; Palmatier, Dant, & Grewal, 2007). Neste artigo, discutimos essa relação que insere confiança e gestão de riscos para mitigar comportamentos oportunistas e racionalidade limitada em relacionamentos.
Este artigo, de caráter teórico e exploratório, tem por objetivo elucidar hipóteses de pesquisa a partir de um modelo conceitual embasado na convergência entre gestão de risco relacional, confiança e custos de transação a partir dos pressupostos comportamentais (oportunismo e racionalidade limitada), no âmbito da gestão de relacionamentos em díades (comprador-fornecedor).
Após esta breve introdução, será apresentada as bases teóricas envolvidas no estudo passando por uma discussão acerca do termo gestão de riscos em cadeias de suprimentos e gestão de riscos relacionais, seguida por uma abordagem envolvendo a economia dos custos de transação e, posterirormente, suas relações com confiança e relacionamento colaborativo. Na sequência, será proposto um modelo conceitual com as relações entre a economia dos custos de transação, gestão de riscos e confiança. Ao final, serão apresentadas as considerações finais e sugestões para estudos futuros.
O presente subtítulo tem como objetivo apresentar a discussão teórica utilizada para a construção do modelo que será apresentado. Sendo assim, serão abordados os temas gestão de riscos em cadeias de suprimentos, gestão de riscos relacional, custos de transação, confiança e relacionamento colaborativo.
Genericamente risco compreende a probabilidade de ocorrência de um determinado evento, causado pelo homem ou pela natureza e os possíveis impactos resultantes, que podem ser negativos ou positivos (Tang & Musa, 2011). O conceito de risco é amplo e compreende diferentes tipos de enquadramentos na literatura de acordo com abordagem e área do conhecimento. Kaplan e Garrick (1981) definem risco como um tripé (si, pi, ci), onde si consiste no cenário, pi a probabilidade de ocorrência desse cenário e ci suas consequências. Assim, o risco pode ser considerado como a incerteza sobre a gravidade das consequências de uma atividade ou a combinação bidimensional de consequências e incertezas (Aven, & Aven, 2015; Heckmann, Comes, & Nickel, 2015). Essa conceituação de risco será adotada neste estudo. A Figura 1 apresenta um resumo da diversidade de escopo de risco em gestão.

Atualmente com a concorrência, o ambiente turbulento e as incertezas dos mercados, todas as organizações estão expostas em maior ou menor grau a situações inesperadas que podem interromper suas operações (Annarelli, & Nonino, 2016). Dessa forma, a compreensão de como as empresas podem gerenciar interrupções, riscos e incertezas, tornando-se mais preparadas para enfrentar adversidades, é um tema que vem ganhando atenção de pesquisadores (Chung, Tse, & Choi, 2015; Jüttner et al., 2003; Trkman, Oliveira, & McCormack, 2016).
A gestão de riscos na cadeia de suprimentos (SCRM) envolve a identificação, avaliação e controle dos riscos internos/externos que podem afetar o desempenho da cadeia por meio da aplicação coordenada e econômica dos recursos para minimizar, monitorar e controlar a probabilidade ou impacto dos acontecimentos que possam interferir na cadeia como um todo (Jüttner et al., 2003). A ISO (2015, p. 4) define gestão de riscos “como o mapeamento estruturado dos riscos inerentes ao negócio, contendo quatro elementos: fontes, eventos, causas e consequências”.
Existem riscos que podem ser prevenidos e outros que devem ser mitigados para evitar maiores consequências. Cabe ressaltar que os riscos internos possuem maior probabilidade de ocorrência, enquanto os externos apresentam maior impacto na cadeia, já que, geralmente, estão associados a eventos com graves consequências, entretanto apresentam menor previsibilidade (Chaudhuri, Boer, & Taran, 2018).
Aguiar e Gonçalves (2012) verificam os principais fatores de risco que envolvem a globalização, o ambiente de concorrência (ambiente externo), a estrutura e configuração das redes e o conflito de interesses, sendo estes, segundo o autor, os que merecem maior atenção por parte dos gestores. Tais conflitos de interesse podem derivar em relações oportunistas. Dessa foram, existe a necessidade de aprofundar o entendimento sobre os riscos inerentes em relacionamentos inteorganizacionais, evitando problemas relacionais e proporcionando benefícios mútuos para os envolvidos. No presente estudo, será utilizado o termo gestão de riscos relacionais para nomear o gerenciamento de riscos que podem afetar relacionamentos díades (comprador-fornecedor).
O objetivo de qualquer aliança ou parceira é a geração de vantagens e valor para os negócios, clientes e parceiros, entretanto, esse processo envolve riscos. Estudos recomendam atenção aos mecanismos e práticas de gestão em função das incertezas relacionadas ao cumprimento dos acordos e das mudanças tanto nas leis quanto na inclinação do parceiro em cumprir com as regras estabelecidas (Day, Fawcett, Fawcett, & Magnan, 2013; Earle, 2010; Nooteboom, Berger, & Noorderhaven, 1997; Pérez & Cambra-Fierro, 2015). Portanto, o acompanhamento dos riscos em relacionamentos pode oferecer oportunidades para antecipar e evitar consequências indesejáveis ao negócio.
Existem vários motivos para não alcançar os objetivos esperados ou desempenho projetado com uma parceria. A maior dificuldade em estabelecer relacionamentos colaborativos duradouros reside na dinâmica da gestão das empresas, ou seja, quando não compartilham princípios e valores semelhantes (Palmatier et al., 2007). Assim a ocorrência de comportamento oportunista, choques culturais, controle gerenciais e excessos contratuais podem minar os relacionamentos colaborativos e aumentar os riscos de rupturas nos relacionamentos. Além do risco inerente ao negócio, o relacionamento entre empresas carrega um certo risco em termos de cooperação.
O risco relacional refere-se ao risco de que os parceiros não conseguirão cooperar de boa-fé, em vez disso, operam com base em interesses próprios, ou seja, de forma oportunista (Schuhmann & Eichhorn, 2017). Assim a ocorrência de problemas relacionais pode impactar no desempenho e comprometer a realização de objetivos estratégicos, considerando que os parceiros não cooperam plenamente (Krishnan, Martin, & Noorderhaven, 2006). Portanto, gestão de riscos relacionais se refere à identificação, avaliação e controle dos riscos que podem afetar os relacionamentos por meio da aplicação de recursos para minimizar e controlar a probabilidade ou impacto dos acontecimentos (Jia, & Rutherford, 2010).
Uma das fontes mais importantes de risco relacional é a preocupação com o comportamento oportunista do parceiro, ou seja, a busca do interesse própria em detrimento dos interesses mútuos. Exemplos de comportamento oportunista inclui retenção ou distorção de informações, evasão ou não cumprimento de promessas e obrigações, apropriação de tecnologia ou de parceria chave da empresa, pagamentos em atraso e entrega de produtos em qualidade inferior.
A capacidade de detectar e evitar riscos negativos e prejudiciais é vital para a sobrevivência das empresas. Uma forma de avaliar o risco relacional é codificar e aprender com experiências passadas, a fim de diminuir o impacto de riscos em atividades críticas (Yang, Qian, & Zheng, 2017). Outra forma para evitar riscos relacionais é utilizando garantias estabelecidas em contrato. Tais garantias são dispositivos colocados durante a negociação de um acordo comercial, com o objetivo de manter os termos do acordo (Judge, & Dooley, 2006), prevendo inclusive sansões em caso de descumprimento de uma das partes. Tais garantias têm a função de deixar claro as “regras do jogo”.
Quando metas e expectativas são claramente definidas sob forma de contratos, os custos de transação são reduzidos (Kogut, 1988). Embora seja uma forma cada vez mais utilizada para proteger as parcerias, os riscos relacionais, advindos principalmente do comportamento humano inconsistente, da diversidade de valores entre os parceiros e da variação de comportamento do sistema, nem sempre pode ser coberto apenas por mecanismos formais, necessitando de instrumentos mais diversificados como a incorporação de relacionamentos colaborativos e confiança entre membros de uma cadeia de suprimentos.
Os estudos sobre a economia dos custos de transação (ECT) representam uma tentativa de convergir aspectos do institucionalismo com a teoria econômica, com o objetivo de oferecer uma explicação para as estruturas de governança no escopo institucional (Judge, & Dooley, 2006). De acordo com a ECT, toda atividade econômica gira em torno de uma transação, que é uma forma de troca de um bem ou serviço entre dois ou mais atores econômicos, que pode ser exemplificado através das relações entre empresas fornecedoras e compradoras, onde efetuam transações com produtos e serviços. Para otimizar essas trocas, um mecanismo de governança apropriado deve ser introduzido à natureza da transação (Williamson, 1985). Existem três formas gerais de mecanismos de governança dentro do ECT: (1) Governança “comercial” onde os preços governam; (2) Governança “intermediária”, onde traços complexos e alianças estratégicas governam; (3) Governação “hierárquica” onde os gerentes governam dentro dos limites da empresa (Barney, 1999).
A economia de custos de transações sugere que, para escolher a forma mais eficiente de gerenciar as relações de troca, o custo de governança deve ser levado em consideração. A ECT tem como base dois pressupostos básicos acerca dos atores econômicos (pessoas e firmas) envolvidos em transações e que afetam a forma como a empresa irá decidir acerca da governança, que são: racionalidade limitada e oportunismo. A racionalidade limitada significa que os envolvidos em transações econômicas agem de forma intencional com racionalidade, entretanto de modo limitado (Simon, 1964), entendendo que não é possível prever todos os resultados possíveis numa relação de troca.
Essa situação é decorrente do fato de que os atores econômicos têm dados e habilidades de processamento de informação limitados e que o futuro é muitas vezes uma incógnita. Assim, caso a racionalidade limitada não existisse, toda atividade econômica poderia ser organizada de forma eficiente, pois tudo poderia ser previsto e planejado, entretanto, os atores econômicos simplesmente não podem prever todos os resultados ou formular respostas contratuais “completas” diante das eventualidades (Williamson, 1985), assim é tratada como uma restrição pela ECT.
Em geral, quanto mais elaborada a estrutura de governança, mais onerosa é para organização, o que leva a supor que minimizar o custo da governança é o principal objetivo de uma empresa. Na maioria das cadeias de suprimentos saudáveis, os membros compartilham valor colaborativo ou normas com o fornecedor e, portanto, informam comportamentos oportunistas de membros sempre que tomar conhecimento (Huo, Fu, Zhao, & Zhu, 2016). Dessa forma é possível supor que a incorporação de relacionamentos e alianças pode desencorajar o oportunismo dos parceiros (Adobor, 2011). Tal tática tem a função de desenvolver uma espécie de proteção entre os membros, que criam normas de conduta para manter o ambiente saudável.
A confiança relaciona-se com a expectativa ou crença sobre as motivações e habilidades do administrador, que ele cumprirá o acordo e atenderá as expectativas da relação (Das & Teng, 2001), podendo influenciar a confiança em parcerias comerciais. Estudos sugerem que a confiança é uma peça chave em parcerias e relacionamentos a longo prazo, inclusive reduzindo a incerteza e a ocorrência de oportunismo (Day et al., 2013; Ning, 2017; Pomponi, Fratocchi, & Tafuri, 2015). Assim quando a confiança está presente, o relacionamento é capaz de resistir a incertezas e volatilidade do ambiente, bem como a mudanças organizacionais (Parkhe, 1993).
De outra forma, quando existe fé na competência e benevolência de seus parceiros, ambos estão mais propensos a investir na parceria, inclusive melhorando a qualidade da relação (Jiang, Bao, Xie, & Gao, 2016). A teoria do compromisso-confiança de Morgan e Hunt (1994) ajuda a compreender que o sucesso dos relacionamentos inteorganizacionais requer compromisso por parte dos parceiros e confiança, para gerar cooperação, e benefícios na redução dos custos, flexibilidade e agilidade nas operações.
Em relacionamentos entre empresas, a confiança pode funcionar como uma estrutura complementar de governança, podendo reduzir o uso de hierarquias para mitigar comportamentos oportunistas (Delerue, 2005; Sako & Helper, 1998). Dessa forma, a confiança pode reduzir a necessidade da aplicação de mecanismos formais contra comportamentos oportunistas entre parceiros, diminuindo assim os custos com monitoramento e controle formais (Wacker, Yang, & Sheu, 2016; Zanini et al., 2009). A existência de confiança em relações intraorganizacionais que envolvem cargos hierárquicos numa organização pode contribuir para o aumento da eficiência organizacional, criando um ambiente favorável para colaboração.
Pesquisas empíricas revelam que confiança interpessoal possui um papel de mediação e está diretamente relacionada a vários elementos da gestão, tais como o compartilhamento de informações, redução de conflitos, satisfação e motivação dos empregados e, finalmente, eficiência e desempenho mais elevados (Aime, Humphrey, Derue, & Paul, 2014; Ertürk & Vurgun, 2015). Assim em parcerias, a confiança permite a interpretação construtiva do fornecedor, reduzindo potenciais conflitos e encorajando um fluxo de informação mais precisos, contínuos e ricos entre os parceiros.
À medida que um parceiro mantém uma atitude positiva em relação ao outro, e este corresponde às expectativas estabelecidas em uma troca de relacional, a confiança é construída e fortalecida. O estudo de Adobor (2011) demonstrou que o compartilhamento de visões semelhantes e ambientes parecidos torna mais provável o estabelecimento de relacionamentos com confiança, sendo peça chave em relacionamentos de longo prazo, inclusive reduzindo a incerteza e o oportunismo.
A colaboração entre organizações representa um campo de pesquisa estabelecido na literatura acerca da gestão de redes e cadeias de suprimentos (Cao, & Zhang, 2011; Castro, Bronzo, Resende, & Oliveira, 2015). Entre os aspectos estudados estão os fatores de sucesso dos relacionamentos, contribuindo para ganhos múltiplos, por parte tanto do fornecedor quanto do comprador.
Estudos sugerem que o relacionamento colaborativo entre as empresas oferece benefícios como redução dos custos, redução de riscos, maior acesso a capital financeiro, aumento da aprendizagem organizacional, melhor adaptação a mudanças, transferência de conhecimento e melhor capacidade de responder às oscilações do mercado (Cao, & Zhang, 2011; Desai, 2018; Judge, & Dooley, 2006; Narayanan, Narasimhan, & Schoenherr, 2015). De acordo com a visão relacional, a estratégia coletiva cria uma fonte valiosa de recursos, dando acesso a informações, compartilhamento de conhecimento, complementaridade de recursos, investimentos específicos de relacionamento (Balestrin, Verschoore, & Perucia, 2014), planejamento colaborativo, integração de sistemas e governança eficiente, que trazem benefícios imediatos e a longo prazo (Li, Fan, Lee, & Cheng, 2015).
Barrat (2004) afirma que a efetividade do relacionamento colaborativo não está apenas na capacidade da organização em ter relacionamentos duradouros e confiáveis com as empresas da cadeia, mas com clientes e fornecedores estratégicos. Ou seja, colaboração só existe quando todos os envolvidos são mapeados e considerados (Liao, Hu, & Ding, 2017), oferecendo benefícios para ambos os parceiros, ao permitir que os parceiros se apropriem de recursos, informações e conhecimento que podem ser usados para obtenção de vantagens competitivas e que não conseguiriam sozinhos (Desai, 2018). Assim, relacionamento colaborativo pode aumentar a capacidade para superar incertezas do mercado e eventuais rupturas na organização e nas cadeias, além de vantagens competitivas.
Desse modo, a colaboração é mais que estabelecer parcerias comerciais, usando estruturas formais como contratos, representa estabelecer laços que permitam confiar e ser confiável para que as informações circulem na quantidade, velocidade e qualidade desejadas, permitindo que a colaboração se efetive (Adobor, 2011; Morgan & Hunt, 1994). Colaboração não existe sem confiança entre os parceiros em uma cadeia de suprimentos (Pomponi et al., 2015). Além disso, empresas que desenvolvem relacionamentos colaborativos através de alianças estratégicas e confiáveis têm geralmente desempenho superior em relação àqueles que não utilizam essa estratégia (Cao, & Zhang, 2011), sobretudo em ambientes instáveis e sujeitos a elevada incerteza ambiental (Judge, & Dooley, 2006). A Figura 2 traz um resumo sobre algumas abordagens de relacionamento colaborativo.

As redes interorganizacionais são importantes para unir forças e resolver problemas complexos e, para tanto, é necessário que exista colaboração. Quatrin e Pereira (2017) identificaram os critérios para seleção de associados em redes interorganizacionais, e o compromisso foi o fator mais preponderante, demonstrando a preocupação com o comprometimento dos associados na busca de objetivos em comum.
Considerando a discussão das relações entre gestão de riscos e confiança em cadeias de suprimentos (B2B), será proposto um modelo conceitual com o objetivo de avaliar a força existente nas relações, conforme demonstra a Figura 3.

O modelo propõe interações entre gestão de riscos e comportamento oportunista. A discussão considera que a interação ocorre em ambos os sentidos, pois, se por um lado a gestão de riscos influencia a redução do oportunismo em relacionamentos, por outro lado a elevação da percepção de oportunismo influencia a gestão de riscos, aumentando as estruturas de controle, monitoramento, avaliação de riscos e a salvaguardas necessárias para gestão (Judge & Dooley, 2006).
Na primeira direção, tem-se que a gestão de riscos monitora condutas oportunistas, atuando em situações que possam minar a qualidade da relação, seja através de salvaguardas contratuais (Huo et al., 2016), seja aprendendo com as experiências passadas (Yang et al., 2017). Assim, caso o parceiro viole as normas da parceria, será detectado e advertido ou punido (El Akremi, Mignonac, & Perrigot, 2010). Na segunda direção, tem-se que o aumento do comportamento oportunista eleva a necessidade de salvaguardas, mecanismos de controle e vigilância, pois representa um risco relacional que pode minar os benefícios esperados com a parceria (Dong, Liu, Yu, & Zheng, 2015). Falta de sinergia e coesão em relação aos objetivos entre parceiros comerciais é comummente associada a comportamentos oportunistas. A partir dessa discussão, apresenta-se a hipótese 1:
H1: Existe uma relação negativa entre gestão de riscos e oportunismo.
A interação entre gestão de riscos e confiança considera que a interação ocorre em ambos os sentidos, uma vez que a gestão de riscos influencia o aumento da confiança em relacionamentos, através do compartilhamento de informações e riscos. Na primeira direção, tem-se que a gestão de riscos monitora o ambiente, o comportamento do parceiro e compartilha informações de processos. Como os relacionamentos entre parceiros não são a prova de falhas, a gestão de riscos atua para minimizar a probabilidade de rupturas que causariam problemas maiores na relação, antecipando-se às consequências dos riscos. O monitoramento pode estimular a confiança, permitindo maior integração entre os parceiros, processos mais estáveis e melhor troca de informações.
Na segunda direção, tem-se que a desconfiança pode acarretar aumento de estruturas formais de controle e monitoramento, impactando na qualidade do relacionamento e nos custos de transação (Wacker et al., 2016; Yang, Wacker, & Sheu, 2012). Além da desconfiança com relação ao cumprimento dos acordos, pode resultar em riscos quanto à qualidade da parceria. Considerando-se o exposto, elabora-se a segunda hipótese:
H2: Existe uma relação positiva entre gestão de riscos e confiança.
A interação entre gestão de riscos e racionalidade limitada possui foco na redução de incertezas. A discussão considera que a interação ocorre em ambos os sentidos, pois se por um lado a gestão de riscos influencia a redução da incerteza, por outro lado a elevação da incerteza influencia a gestão de riscos, aumentando as estruturas de controle, monitoramento, avaliação de riscos e a salvaguardas necessárias para gestão.
Na primeira direção, tem-se que a gestão de riscos reduz a racionalidade limitada do tomador de decisão. Como as empresas executam o processo de decisão a partir das informações disponíveis, a gestão de riscos atua minimizando o impacto da racionalidade limitada, coletando informações com o objetivo de monitorar a qualidade do relacionamento, identificando os riscos e mensurando os impactos negativos.
Na segunda direção, a complexidade, a dificuldade de compartilhamentos de informações e a qualidade da informação (incompleta, imperfeita ou inexistente) entre os parceiros podem elevar a racionalidade limitada do tomador de decisão. Desse modo, para lidar com a racionalidade limitada, são necessários métodos para auxiliar a tomada de decisão com objetivo de reduzir os impactos da limitação no que se refere à capacidade de processamento de informação. A partir dessa discussão apresenta-se a hipótese 3:
H3: Existe uma relação negativa entre gestão de riscos e a racionalidade limitada.
O modelo também propõe interações entre confiança, comportamento oportunístico e racionalidade limitada. A discussão sugere que as interações ocorrem nos dois sentidos, de forma que a confiança influencia o comportamento oportunista e a racionalidade limitada e estes atuam sobre a confiança. Na primeira direção, a existência da confiança nas relações reduz a percepção de riscos relacionais associados ao oportunismo (Parkhe, 1993), já que os parceiros consideram que o relacionamento será duradouro. Assim a confiança no parceiro comercial com relação ao cumprimento e zelo com o relacionamento, que pode ser traduzido com fidelidade, reduzem a probabilidade de ocorrência de comportamentos oportunistas (Judge & Dooley, 2006).
Na segunda direção, o fato de uma das partes da relação acreditar que pode ser vítima de comportamento oportunista pode reduzir a confiança nessa relação. Assim o parceiro assume uma postura de vigilância, avaliando com mais cuidado cada investimento que porventura possa ser feito nessa relação. Dessa forma, a hipótese 4a estabelece que:
H4a: Existe uma relação negativa entre confiança e o comportamento oportunista das empresas.
A integração entre racionalidade limitada e confiança tem relação com o compartilhamento de informações. Uma vez que a informação é matéria prima básica para tomada de decisão, ter informação de qualidade, na quantidade desejada torna-se crucial para qualquer processo decisório. O fato de não ter as informações por parte do parceiro pode prejudicar a racionalidade da empresa e processo de decisão (Wacker et al., 2016; Wang, Wang, Wang, & Lai, 2017). A falta de confiança, causada sobretudo pelos riscos inerentes ao compartilhamento de informações, em relação a exposição de processos e tecnologias usadas pela empresa, bem como dados sigilosos, pode inviabilizar o compartilhamento de informações (Filho, Faria, Martins, & Di Serio, 2015; Kaipia, Holmström, Småros, & Rajala, 2017).
Em tais situações, os relacionamentos são caracterizados pela assimetria de informações, onde alguns parceiros recebem mais informações que outros, de acordo com o grau de confiança depositado. A assimetria de informações resulta no aumento da racionalidade limitada e dificuldade de compartilhamento de informações. Assim é apresentada a hipótese 4b:
H4b: Existe uma relação negativa entre confiança e a racionalidade limitada das empresas.
O modelo também propõe interações entre comportamento oportunista e colaboração, estabelecendo uma relação negativa entre eles, uma vez que, quanto maior a ocorrência de comportamentos oportunistas, menor a probabilidade de desenvolver relacionamentos colaborativos entre os parceiros (Huo et al., 2016). O fato de uma das partes da relação acreditar que pode ser vítima de comportamento oportunista pode aumentar a necessidade de estruturas formais de controle e monitoramento (Huo et al., 2016; Judge & Dooley, 2006), aumentando os custos de transação.
Assim o parceiro assume uma postura de vigilância, avaliando com mais cuidado cada investimento em ativos que porventura possa ser feito nessa relação (Dong et al., 2015). Essa vigilância excessiva é um mecanismo de proteção que inibe o compartilhamento de informações e a colaboração entre os parceiros. Dessa forma, a hipótese 5 estabelece:
H5: Existe uma relação negativa entre oportunismo e colaboração.
O nível de confiança pode influenciar os custos de transação, permitindo que ambos sejam beneficiados na relação (Wacker et al., 2016; C. Yang et al., 2012), conferindo maior sinergia e troca relacional. Dessa forma, relacionamentos colaborativos permitem confiar e ser confiável para que as informações circulem na quantidade, velocidade e qualidade desejadas, possibilitando que a colaboração se efetive (Castro et al., 2015; Desai, 2018).
Relacionamentos estruturados com alta confiança podem reduzir o uso de estruturas formais de governança e consequentemente os custos de transação. Em relacionamentos baseados em confiança, o compartilhamento de informações entre parceiros acontece de forma mais saudável (Johnston, Mccutcheon, Stuart, & Kerwood, 2004; Morgan, & Hunt, 1994), além de favorecer o processo decisório e redução da incerteza. A partir dessa discussão apresenta-se a hipótese 6:
H6: Existe uma relação positiva entre confiança e colaboração.
A relação entre racionalidade limitada e colaboração refere-se ao compartilhamento de informações e redução da incerteza. Uma vez que a informação é matéria-prima básica para tomada de decisão, ter informação de qualidade e na quantidade desejada torna-se crucial para qualquer processo decisório e para construção de relacionamentos colaborativos saudáveis, pois permite que ambos possam planejar suas ações com base na transparência entre os parceiros. Não ter as informações por parte do parceiro pode limitar a racionalidade da empresa e, consequentemente, o processo de decisão, elevando os custos de transação e dificultando a colaboração entre as empresas.
Em tais situações, os relacionamentos são caracterizados pela assimetria de informações, que resulta no aumento da incerteza e da dificuldade de cooperação (Yang et al., 2012), que, por sua vez, pode inibir a colaboração entre empresas. Assim, é apresentada a sétima hipótese de pesquisa do modelo:
H7: Existe uma relação negativa entre racionalidade limitada e colaboração.
Adicionalmente, o modelo propõe interações entre oportunismo e racionalidade limitada. A discussão considera que a interação ocorre em ambos os sentidos, pois se por um lado a racionalidade influencia o oportunismo, por outro lado o oportunismo influencia a racionalidade limitada ao dificultar o compartilhamento de informações.
Na primeira direção, tem-se que o oportunismo eleva a probabilidade de dificultar o processo decisório, pois não ter informações por parte do parceiro pode limitar a racionalidade da empresa e, consequentemente, o processo de decisão, elevando os custos de transação e dificultando a colaboração entre as empresas. Na segunda direção, a complexidade, a dificuldade de compartilhamentos de informações e a qualidade da informação (incompleta, imperfeita ou inexistente) entre os parceiros podem elevar comportamentos oportunistas. Desse modo, conforme o nível de incerteza e complexidade aumentam (Bode & Wagner, 2015), maior a probabilidade de condutas oportunistas. A partir dessa discussão apresenta-se a hipótese 8:
H8: Existe uma relação positiva entre oportunismo e racionalidade limitada.
O presente trabalho teve como objetivo explanar hipóteses de pesquisa a partir de um modelo conceitual embasado na convergência entre gestão de riscos, confiança e custos de transação. A proposta em tela ilustra o interesse em pesquisas sobre gestão de riscos investigarem o efeito da confiança em relacionamentos entre parceiros, sob a ótica da teoria dos custos de transação.
A partir do exposto, o presente trabalho articula a confiança e a gestão de riscos na relação entre fornecedor-comprador a dois pressupostos comportamentais da teoria dos custos de transação - racionalidade limitada e oportunismo - com o objetivo de estabelecer hipóteses a partir de um modelo conceitual. A primeira delas contempla a relação negativa entre gestão de riscos e oportunismo, convergindo com o fato de que, conhecendo as incertezas e coletando informações sobre o comportamento dos parceiros, é possível gerenciar os possíveis relacionados ao comportamento oportunista.
Já a segunda hipótese propõe uma relação positiva entre gestão de riscos e confiança, partindo do pressuposto de que o monitoramento, controle e uso de estratégias de mitigação/prevenção de riscos tornam as parcerias mais confiáveis. Já a terceira hipótese propõe uma relação negativa entre gestão de riscos e racionalidade limitada, uma vez que gerenciar os riscos e incertezas implica em tomar decisões mais eficientes e eficazes, baseadas no compartilhamento de informações entre os parceiros. A quarta hipótese propõe uma relação negativa entre confiança e oportunismo/racionalidade limitada, pois a confiança tende a melhorar o fluxo de informações e reduzir a probabilidade de condutas oportunistas.
A quinta hipótese aponta uma relação negativa entre oportunismo e colaboração, mutuamente influenciadas e influenciadores, uma vez que o aumento do oportunismo impacta na redução da colaboração, assim como a colaboração provoca uma redução no comportamento oportunista entre comprador-fornecedor. A sexta hipótese propõe uma relação positiva entre confiança e colaboração, pois não existe colaboração sem confiança, e assim quanto maior a confiança no parceiro, maior o compartilhamento de informações, fortalecendo os relacionamentos colaborativos.
A sétima hipótese propõe uma relação negativa entre racionalidade limitada e colaboração. O fato de não ter as informações por parte do parceiro pode prejudicar a racionalidade da empresa e o processo de decisão; desse modo, a racionalidade limitada tende a reduzir a capacidade de os parceiros colaborarem entre si. Por fim, a oitava e última hipótese aponta para uma relação positiva entre oportunismo e racionalidade limitada. Adicionalmente poderia testar a relação indireta entre gestão de risco relacionais e colaboração mediada por confiança, oportunismo e racionalidade limitada.
Cabe dizer que o presente trabalho contempla conceitos presentes na teoria dos custos de transação. Embora essa teoria auxilie na compreensão de estudos que abordam o relacionamento entre parcerias, novos estudos podem testar hipóteses à luz de outras teorias, além de desenvolver medidas para mensurar os construtos. Como sugestão de pesquisas futuras, por se tratar de um modelo, sugere-se coletar dados, através de uma survey, amostra com empresas para testar as relações construídas teoricamente. Devido aos vários níveis de relações entre os construtos, sugere-se analisar os dados através de uma abordagem de modelagem de equações estruturais (SEM).


