Resumo: O objetivo desse artigo é analisar a trajetória da Companhia Telefônica Catarinense (CTC) dentro da formação econômica de Santa Catarina no processo de integração do sistema nacional de telecomunicações. A trajetória da CTC será analisada combinando dois movimentos: a modernização e a obsolescência da sua capacidade de expansão comercial e produtiva, que envolve desde a fundação da empresa, em 1927, até sua estatização, em 1969. Para analisar esse período dividimos a trajetória da CTC em quatro momentos: a) modernização extensiva e contínua (1927-1943); b) obsolescência forçada e temporária (1943-1947); c) modernização intensiva e limitada (1947-1961); e d) obsolescência irreversível e insolvência financeira (1961-1969). O texto está dividido em três tópicos. Iniciamos com uma introdução que aborda as comunicações em Santa Catarina e define as categorias de análise. Em seguida, o tópico formação, expansão e estatização da CTC apresenta os momentos de modernização e obsolescência. Por fim, temos as considerações finais que sintetiza o movimento geral da estatização da telefonia em Santa Catarina.
Palavras-chave:TelefoniaTelefonia,TerritórioTerritório,HistóriaHistória,EconomiaEconomia,Santa CatarinaSanta Catarina.
Abstract: The objective of this article is to analyze the trajectory of Companhia Telefônica Catarinense (CTC) within the economic formation of Santa Catarina in the process of integration of the national telecommunications system. The CTC's trajectory will be analyzed combining two movements: the modernization and the obsolescence of its capacity for commercial and productive expansion, which has involved since the company's foundation in 1927, until its estatization in 1969. To analyze this period, we have divided the trajectory of CTC in four moments: a) extensive and continuous modernization (1927-1943); b) forced and temporary obsolescence (1943-1947); c) intensive and limited modernization (1947-1961); and d) irreversible obsolescence and financial insolvency (1961-1969). The text is divided into three topics. We begin with an introduction that addresses communications in Santa Catarina and defines the categories of analysis. Then, the topic formation, expansion and nationalization of CTC presents the moments of modernization and obsolescence.
Keywords: Telephony, Territory, History, Economy, Santa Catarina.
Resumen: El objetivo de este artículo es analizar la trayectoria de Companhia Telefônica Catarinense (CTC) dentro de la formación económica de Santa Catarina en el proceso de integración del sistema nacional de telecomunicaciones. La trayectoria del CTC se analizará combinando dos movimientos: la modernización y la obsolescencia de su capacidad de expansión comercial y productiva, que há involucrado desde la fundación de la compañía en 1927, hasta su nacionalización en 1969. Para analizar este período, hemos dividido la trayectoria de CTC en cuatro momentos: a) modernización extensa y continua (1927-1943); b) obsolescencia forzada y temporal (1943-1947); c) modernización intensiva y limitada (1947-1961); yd) obsolescencia irreversible e insolvencia financiera (1961-1969). El texto está dividido en tres temas. Comenzamos con una introducción que aborda las comunicaciones en Santa Catarina y define las categorías de análisis. Luego, el tema de formación, expansión y nacionalización de CTC presenta los momentos de modernización y obsolescencia. Finalmente, tenemos las consideraciones finales que traen una síntese del estatizacion del telefonía en Santa Catarina.
Palabras clave: Telefonía, Territorio, História, Economía, Santa Catarina.
Comunicação, Cultura e Desenvolvimento Regional
Entre modernização e obsolescência: a trajetória da Companhia Telefônica Catarinense (1927-1969)
Between modernization and obsolescence: the trajectory of the Companhia Telefônica Catarinense (1927-1969)
Entre la modernización y la obsolescencia: la trayectoria de la Companhia Telefônica Catarinense (1927-1969)
Recepción: 03 Mayo 2020
Aprobación: 03 Noviembre 2020
A disponibilidade de transportes e comunicações circunscrita a um território definido e específico está associada à existência de fluxos comerciais, demográficos e militares que desenham as características do sistema regional de economia. Os sistemas regionais são parte constitutiva do sistema nacional de economia (LIST, 1986), ao qual estão subordinados e obedecem a uma hierarquia. A predominância de uma atividade econômica (agrária, mercantil, extrativista ou produtiva) especializa uma região criando unidades de negócios e instituições que se articulam com o setor líder da economia. A especialização regional promove a diversificação econômica, a integração produtiva e a articulação comercial, formando um sistema regional de economia. A infraestrutura social básica possibilita a reprodução ampliada desse sistema regional ao mesmo tempo que se moderniza com os avanços das forças produtivas que ajudou a impulsionar.
A infraestrutura social básica – que são os objetos técnicos fixos, na definição de Milton Santos (2012) – é formada por um conjunto de camadas geoeconômicas que se combinam e se sobrepõem em temporalidades diferentes: transportes (estradas, ferrovias, navegação), comunicações (correios, telégrafos, telefonia, web), energia, gás, água e outros (saneamento, fibra ótica, TV a cabo, internet). A presença de uma nova camada pode anular a presença de outra ou podem se combinar e obter melhor desempenho. A abertura de uma estrada possibilita o tráfego das linhas postais, a construção das linhas do telégrafo e da telefonia e o posteamento para os fios elétricos. Ao mesmo tempo permite o aterramento do sistema de abastecimento de água e da rede de gás e fibra ótica. Cada camada geoeconômica é disponibilizada em tempos diferentes e traz consigo testemunhos de uma época determinada.
Em países em que o capitalismo se formou tardiamente, o Estado assumiu formas superiores de organização econômica. Obras públicas, empresas estatais e financiamento do setor privado via bancos de fomento público são mecanismos de intervenção do Estado para a formação do mercado interno. No Brasil, o Estado se fez e ainda se faz presente em diversas cidades e regiões por meio de ações diretas ou indiretas, construindo e definindo sistemas regionais de economia. Cada ação do Estado na construção de uma camada geoeconômica resulta em nova configuração territorial. A presença de uma estrada, uma linha postal ou uma rede de energia elétrica e de telefonia, mais do que progresso material, significa o adensamento do Estado e do capital no território.
Portanto, a rede de telefonia, que compõe as camadas geoeconômicas, forma o sistema regional de economia e adensa o Estado e o capital no território. Mesmo a telefonia em Santa Catarina sendo um serviço privado até 1969, a expansão das linhas se dava por meio do assentamento de postes nas margens das estradas ou das ferrovias. A integração das diversas linhas isoladas formando um sistema estadual de telefonia só foi possível com a intervenção estatal pós-1969 por meio da Companhia Catarinense de Telecomunicações (COTESC), o que nos permite afirmar que a rede de telefonia em Santa Catarina, enquanto camada geoeconômica, também foi disponibilizada pelo Estado.
Uma das características de economia de industrialização tardia é que sua a infraestrutura social básica é formada pela presença e combinação dos capitais nacional, externo e estatal. Em grande medida, os canais de financiamento eram acionados pelo Tesouro Nacional – que financiava as estatais – e os empréstimos externos – que financiavam suas filiais no Brasil. O capital nacional, cujo grau de alavancagem financeira era ainda atrofiado, caminhava em um ritmo de acumulação lento e contínuo. No caso específico da telefonia brasileira, houve a combinação de duas grandes atuações: o capital externo operando nas grandes capitais brasileiras – Companhia Telefônica Brasileira (CTB) no Sudeste, e o capital nacional atuando nas demais cidades. Entre as empresas de telefonia de propriedade nacional, havia organizações de diversos tamanhos, como a Companhia Telefônica Riograndense (CTR), que operava em quase todo o Rio Grande do Sul, e outras de pequeno porte, que atendiam pontualmente uma cidade, como a empresa de João Schneider, pequeno capitalista lagunense que, em 1915, recebeu a concessão para instalar os serviços telefônicos em Laguna (SC).
Os serviços de telefonia de atendimento ao público chegaram a Santa Catarina no ano de 1907, quando, na cidade de Joinville, a Empresa Telefônica Joinvillense, da firma Grossenbacher & Trinks, instalou uma central manual e 60 aparelhos. Florianópolis foi a segunda cidade a ser atendida pelos serviços por meio da mesma empresa, quando em 1909 instalou outra central manual e 100 aparelhos. Em seguida, a telefonia municipal chegou ao interior do estado nas cidades de São José, Blumenau, Itajaí e Gaspar, que inauguraram os serviços em 1913, e em Laguna em 1918. A primeira linha intermunicipal foi inaugurada em 1924 ligando as cidades de Paraty (atual Itapoá), São Francisco do Sul e Joinville.
A concessionária de Florianópolis, que alterou sua razão social para Paulo Trinks & Ehlke, atuava com muitas restrições e dificuldade para atender à crescente demanda por novos aparelhos e linhas telefônicas. Uma iniciativa tomada pelo governo estadual e pela prefeitura de Florianópolis foi abrir a concessão dos serviços para outras empresas. Para tanto, foi aprovada a Lei Municipal nº 144, de 7 de junho de 1924, que outorgava o privilégio para a Companhia Tração, Luz e Força de Florianópolis oferecer os serviços de energia elétrica pública e particular na capital do estado (REPÚBLICA, 14/06/1924). Tendo como referência a Lei Estadual nº 1.001, o governador Hercílio Luz, em 8 de maio de 1924, concedeu a esta mesma companhia o direito exclusivo para instalar uma rede de telefonia em Santa Catarina (REPÚBLICA, 02/02/1927). A expectativa era de que a empresa assumisse essa grande empreitada, pois era uma companhia que nascia fazendo promessas de novos investimentos em serviços públicos na capital catarinense. O esperado não aconteceu e, em fevereiro de 1927, a pedido do governo, a Companhia Tração, Luz e Força de Florianópolis desistiu de instalar e explorar os serviços telefônicos em Santa Catarina, conforme cláusula número 66 do contrato assinado em 1924 (REPÚBLICA, 02/02/1927). O panorama geral da telefonia em Santa Catarina era o de um sistema fragmentado e de lenta expansão. Em 1926, as cidades atendidas por serviços telefônicos eram as seguintes: Florianópolis, Joinville, Blumenau, Laguna e São Francisco do Sul.
Não bastavam apenas os serviços nos municípios, a necessidade urgente era a ligação entre si para formar uma rede estadual de telefonia. As companhias locais eram incapazes, do ponto de vista técnico e financeiro, de iniciar um projeto de construção de linhas de longa distância. Até 1927, havia apenas a linha entre Paraty-São Francisco do Sul-Joinville, realizada pela Empresa São Francisco de Ligação a Joinville. A Grossenbacher & Trinks tinha desde 1908 a concessão para estender seus serviços até São Bento do Sul, e a Companhia Tração, Luz e Força de Florianópolis para abranger todo o estado. As duas maiores companhias catarinenses de telefonia, Grossenbacher & Trinks, Elhke & Cia, eram incapazes de dar um salto à frente da demanda para desentravar os serviços telefônicos no estado.
A atitude unilateral da Companhia Tração, Luz e Força de Florianópolis desagradou o governo estadual que, no mesmo ano, em 1927, tratou de buscar um novo capitalista para assumir a empreitada de construir a rede catarinense de telefonia. A solução, temporária, surgiu com a disponibilidade do empresário Juan Ganzo Fernandes para assumir as obras previstas no contrato.
A partir do desenvolvimento das categorias camadas geoeconômicas, sistemas regionais de economia . adensamento do estado e do capital no território, o objetivo desse artigo é analisar a trajetória da Companhia Telefônica Catarinense (CTC) dentro da formação econômica de Santa Catarina no processo de integração do sistema nacional de telecomunicações. A trajetória da CTC será analisada combinando dois movimentos simultâneos e díspares: a modernização e a obsolescência da sua capacidade de expansão comercial e produtiva, que envolve desde a fundação da empresa, em 1927, até sua estatização, em 1969. Para analisar esse período de 42 anos dividimos a trajetória da CTC em quatro momentos: a) modernização extensiva e contínua (1927-1943); b) obsolescência forçada e temporária (1943-1947); c) modernização intensiva e limitada (1947-1961); e d) obsolescência irreversível e insolvência financeira (1961-1969). As principias fontes de análise foram as os Relatórios da Diretoria e as Atas das Assembleias, ambas disponíveis no Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, em formato físico, disponível na Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina, entre os anos de 1940 e 1969. Destaca-se também notícias e notas publicadas nos jornais O Estado, A Notícia e República, todos disponíveis na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. Por fim, as Mensagens do Governadores e a Coleção de Leis, também foram fontes utilizadas com relativa frequência.
O ano de 1927 foi emblemático para a história da telefonia em Santa Catarina. No dia 15 de janeiro a Companhia Tração, Luz e Força de Florianópolis desistiu do privilégio outorgado pelo governo estadual (REPÚBLICA, 02/02/1927). No dia 22 de junho, Juan Ganzo Fernandez visita o governador Adolpho Konder e expõe suas intenções de instalar em Santa Catarina uma rede de telefonia, começando pela instalação de uma estação radiotelegráfica na capital (REPÚBLICA, 23/06/1927). No dia 09 de julho, na presença do governador e de diversas autoridades locais e estaduais, Juan Ganzo inaugura a estação radiotelegráfica em Florianópolis, localizada na Praça 15 de Novembro (REPÚBLICA, 09/07/1927). Empolgado com os feitos do novo capitalista presente em solo catarinense, no dia 21 de setembro foi aprovada a Lei Estadual nº 1.578, que autorizava o executivo a conceder novo privilégio, por 35 anos, para explorar os serviços de telefonia intermunicipal em todo o território barriga verde. Porém, em consonância com o Decreto nº 199, de 6 de fevereiro de 1890, garantia às prefeituras o direito de conceder o privilégio para explorar os serviços nos municípios. As obras deveriam começar no prazo de um ano a contar da assinatura do contrato (REPÚBLICA, 08/12/1927; SANTA CATARINA, 1928). No dia 2 de dezembro, a bordo do hidroavião Ipiranga, proveniente de Porto Alegre, Juan Ganzo Fernandez chegou a Florianópolis para assinar o contrato com o governo do estado a fim de executar os planos de implantação da rede de telefonia em Santa Catarina (REPÚBLICA, 03/12/1927). No dia 19 de dezembro foram iniciadas as obras de aterro dos postes e instalação de fios a partir de Florianópolis em direção ao norte (REPÚBLICA, 20/12/1927).
Juan Ganzo Fernandes (1872-1957) foi um empresário de origem espanhola que passou um tempo em Montevideo e se estabeleceu com negócios nos ramos elétrico e de comunicações, tendo assentado a linha telefônica entre a capital uruguaia e as cidades de Canelones e San Jose de Mayo. Em 1899 estava na fronteira com o Brasil, onde instalou a ligação internacional entre os dois países, conectando-os pelo município de Jaguarão. Em 1900 a linha chegou a Bagé, e em 1905 na cidade de Rio Grande. Estando estabelecido no Rio Grande do Sul, na cidade de Porto Alegre, no ano de 1907 fundou a Companhia Telefônica Rio-Grandense (CTR), que se converteu numa grande e próspera empresa de telefonia gaúcha (LLOYD, 1913). A vinda para Santa Catarina, em 1927, está associada à venda da maioria das ações da CTR à multinacional International Telephone & Telegraph (IT&T), que lançava seus tentáculos na América do Sul. Na assembleia geral extraordinária da CTR, em 30 de julho de 1927, houve uma reforma estatutária que alterou composição da diretoria, deslocando Juan Ganzo Fernandes para o cargo de “administrador”, excluindo-o da diretoria (A FEDERAÇÃO, 02/08/1927). No Relatório da CTR de 1927, publicado em 31 de março de 1928, Walter F. Flanley assinava com diretor (A FEDERAÇÃO, 28/03/1928).
No contrato assinado com o governo estadual no dia 2 de dezembro de 1927, estava prevista a seguinte cláusula:
Cláusula 2: O concessionário compromete-se a estabelecer uma ampla rede de telefones para servir as comunicações da capital e seus municípios, bem como ligar a capital às cidades de Itajaí, Blumenau, Joinville e Laguna por meio de linhas duplas de cobre ou ferro galvanizado, estendendo o serviço ao resto do território do estado, à medida que se torne técnica e comercialmente viável, e instalar uma estação de rádio na cidade de Lages e em outros pontos onde convier ao concessionário, mediante a autorização do governo do estado (REPÚBLICA, p. 4, 08/12/1927).
O prazo previsto para iniciar as obras era de seis meses após a assinatura do contrato, e a inauguração das ligações entre Florianópolis e os demais municípios, incluindo Lages, deveria ocorrer em 30 meses. O contrato também previa a instalação, em Florianópolis, de serviços de telefonia automática e a extensão das linhas aos estados vizinhos. Ficava a cargo do governo estadual a definição dos valores das tarifas e seus reajustes. O prazo de vigência da concessão era de 35 anos a partir da conclusão das obras. Entre as obrigações previstas, a única que não foi cumprida da cláusula 2 foi a instalação de uma estação de rádio em Lages, e a cidade foi integrada na rede de telefonia somente em 1942, ou seja, 13 anos após o acordado.
Após a assinatura do contrato, Juan Ganzo Fernandes fundou a Companhia Telefônica Catarinense (CTC), empresa que ficaria encarregada de organizar e manter a rede de telefonia em Santa Catarina. Porém, os limites técnicos e financeiros da empresa frustraram os planos do governo estadual.
O contrato previa a instalação da rede nas áreas mais urbanizadas, onde se concentrava a maior demanda pelos serviços telefônicos. Priorizar Florianópolis, Laguna, Blumenau, Itajaí e Joinville era reforçar a concentração regional em torno do litoral e do Vale do Itajaí. O sistema regional de economia, pautado no complexo ervateiro do planalto norte e em Joinville, criava as condições comerciais favoráveis para a CTC rapidamente estender sua linha até Porto União. O dinamismo econômico de Blumenau e de outras cidades do Vale do Itajaí, como Brusque e Rio do Sul, fundadas na indústria têxtil e madeireira, também era promissor e justificava os investimentos. A cidade de Itajaí naturalmente se reafirmava como importante centro portuário para escoar a produção advinda do Vale, além de entreposto comercial com sede de bancos e armazém de depósitos. Laguna se colocava como o principal centro urbano e comercial do sul catarinense, e por onde escoava boa parte da produção de carvão advinda das minas de Lauro Muller, Urussanga e Criciúma.
Cada cidade selecionada para ser um centro da rede de telefonia se constituía com o “capital” dos sistemas regionais de economia. Foi justamente nessas cidades que ocorreu a abertura das primeiras estradas, foram instaladas as primeiras agências dos correios e estendidas as linhas postais, disponibilizada a linha de telégrafo e introduzida a energia elétrica. A força econômica de cada cidade atraía os adventos da modernidade e reforçava a sua condição de cidade polo. As camadas geoeconômicas sobrepostas adensavam o estado no território e reforçavam as especialidades e a diversificação do sistema regional de economia. Estradas, correios, telégrafos, telefonia e energia eram camadas que se sobrepunham e se combinavam, sendo essenciais para a reprodução ampliada do capital e da existência e convivência social. Como fonte de valorização e instrumento de integração social, no início do século XX, a telefonia se colocava como o principal serviço de comunicação e exigia modernização constante e mecanismos regulatórios para o seu disciplinamento.
Sobreposta às linhas postais e telegráficas, a telefonia surge e se desenvolve como um objeto técnico de alta complexidade e de renovação constante de seus métodos de funcionamento. Da necessidade de solicitar ligação às centrais manuais, passando pelo telefone magneto e automático, seguindo para a transmissão digital e via satélite, a evolução tecnológica deste aparelho e serviço a cada momento exigia maior capacidade de financiamento e investimento. A aventura de pequenos capitalistas municipais foi sendo substituída por empresas de maior porte até ser assumida por oligopólios. A incapacidade de as empresas menores darem saltos à frente da demanda e modernizarem constantemente os serviços por meio da renovação contínua dos equipamentos colocava a sua credibilidade em risco, o que exigia do estado uma postura mais enérgica em prol de serviços melhores. Além da qualidade dos serviços, ao estado também interessava a unidade territorial e a integração dos sistemas regionais por meio das diversas camadas geoeconômicas. Ter controle sobre o território faz parte da razão de ser do estado.
Os 42 anos de existência da CTC foram marcados por diversas fases no seu processo de modernização. Parece que obsolescência era mais rápida que a maturação da modernização. Após a implantação de novos equipamentos, rapidamente eles se tornavam obsoletos e exigiam novos investimentos. Para entendermos esse duelo entre modernização e obsolescência basta acompanharmos a evolução da telefonia celular nos últimos dez anos. Não são necessários apenas novos aparelhos e aplicativos, deve-se também melhorar a capacidade de transmissão do sinal, alcançando o mais longe possível. Portanto, deixar áreas descobertas da telefonia implica a obsolescência de seus serviços.
No dia seguinte à assinatura do contrato em Florianópolis, Juan Ganzo Fernandes e Carlos Wendhausen se dirigiram às cidades de Joinville e Blumenau, onde entraram em contato com as empresas locais de telefonia, Grossenbacher & Trinks e Empresa Telefônica de Blumenau, no intento de adquiri-las e monopolizar os serviços nas duas cidades (O ESTADO, 14/12/1927). Somente em Blumenau obtiveram êxito, em Joinville a CTC nunca conseguiu entrar.
Dezessete dias após a assinatura do contrato entre Juan Ganzo Fernandes e o governo estadual, em 19/12/1927, foram iniciadas as obras de assentamento dos postes e linhas a partir de Florianópolis em direção a Joinville (norte) e Laguna (sul).
Numerosas turmas de operários dirigidas por profissionais vindos de Porto Alegre atacaram imediatamente vários trechos ligando os municípios de Palhoça, São José, Porto Belo, Tijucas e Itajaí a esta capital. A construção dos ramais de Campeche e de Laguna foi também iniciada (REPÚBLICA, 15/05/1928).
As obras iniciais foram executadas pela CTR, na qual Ganzo ainda atuava como diretor administrativo. Os serviços seguiram em marcha contínua com o objetivo de cumprir antecipadamente as cláusulas do contrato. A primeira linha inaugurada foi entre Florianópolis e Tijucas passando por São José, no dia 13 de maio de 1928, com uma extensão de 50 quilômetros. No mesmo dia deveria ser inaugurado o Aeroporto Adolpho Konder com uma linha telefônica até o centro da capital, mas em função da ausência do governador, ambas as inaugurações não tiveram atos oficiais (REPÚBLICA, 15/05/1928).
Em outubro de 1928 foram inauguradas as linhas de Florianópolis a Blumenau (160 km), passando pelas cidades de Itajaí e Gaspar. A partir de Tijucas a linha se estendia até Brusque (55 km). Em direção ao sul, foram conectados Imbituba e Paulo Lopes (35 km), que era um trecho da linha proveniente de Laguna. Em setembro, a CTC alcançou seu maior objetivo e integrou Joinville e Jaraguá do Sul, além de comprar a linha até São Francisco do Sul (REPÚBLICA, 20/09/1928).
Em cada cidade que a CTC chegava era instalada uma estação ou uma central, e nas cidades em que os serviços locais eram fornecidos por um capitalista local, a CTC comprava a empresa e a concessão municipal, como ocorreu em Laguna, Florianópolis e Blumenau. Por meio da Lei Municipal nº 600, de 20 de abril de 1928, a Prefeitura da capital isentou Juan Ganzo de todos os impostos e taxas nos serviços telefônicos que realizasse na cidade (REPÚBLICA, 21/04/1928). Dessa forma, abriu espaço para ele adquirir a Paulo Trinks & Ehlke.
Após um ano, desde o início das obras, a CTC já acumulava uma rede de 357 quilômetros e 479 aparelhos instalados. No ano seguinte, em 1929, foi concluída a linha sul, entre Laguna e Florianópolis (130 km) e acrescido Camboriú na linha norte, totalizando 426 quilômetros. No mesmo ano iniciaram as obras em Florianópolis para a instalação da rede subterrânea de telefones automáticos, também prevista no contrato (SANTA CATARINA, 1929). Porém, ainda faltava chegar até Lages.
O telefone automático chegou ao Brasil em 1922, quando a CTR inaugurou em Porto Alegre a primeira linha deste novo sistema que dispensava a telefonista e fazia a ligação direta entre assinantes. Bastava discar o número do telefone da pessoa com quem se desejava falar que noutro lado da linha o aparelho seria chamado por meio de um sinal e ambos poderiam conversar de forma sigilosa. Com a experiência adquiria na instalação da telefonia automática, Juan Ganzo, com base no contrato assinado em 1927, comprometeu-se em instalar este moderno serviço em Florianópolis. As obras começaram com o aterramento da fiação, que seria toda subterrânea. Em janeiro de 1930, chegaram a Florianópolis os equipamentos importados da Bélgica, do fabricante Bell Company, compostos por 142 volumes, pesando 24 toneladas (O ESTADO, 10/01/1930). Os serviços foram inaugurados na capital (a quinta cidade brasileira com telefone automático) no dia 21 de setembro de 1930, em solenidade oficial com a presença do governador em exercício (Antônio Vicente Bulcão Viana) e do eleito (Fulvio Aducci), quando foram entregues 1.000 assinaturas (O ESTADO, 23/09/1930). A expectativa era de que o moderno serviço também chegasse às principais cidades catarinenses, o que veio a ocorrer ao longo das décadas de 1930 e 1940.
A segunda cidade catarinense a ter os serviços automáticos foi Joinville, inaugurados em 30 de janeiro de 1932. Em março de 1931 a Empresa Sul Brasileira de Eletricidade (Empresul) adquiriu a Empresa Telefônica Joinvillense e assumiu o compromisso, perante contrato assinado com a prefeitura municipal, de instalar telefones automáticos no prazo de um ano (EMPRESA SUL BRASILEIRA DE ELETRICIDADE, 17/04/1931). A Empresul era uma subsidiária da companhia alemã AEG (Allgemeine Elektricitäts-Gesellschaft), que havia se fixado em Joinville em 1929 para fornecer energia elétrica, mas que também passou a operar na telefonia. Cumprindo o prazo acordado, no dia 31 de janeiro de 1932 foi inaugurada a rede de telefone automática na cidade. Em ato oficial, além das autoridades locais, também estava presente Juan Ganzo Fernandes. Empresul e CTC firmaram um contrato de tráfego mútuo interurbano, ou seja, os assinantes de Joinville poderiam fazer ligações para todas as cidades catarinenses atendidas pela CTC (A NOTÍCA, 10/02/1932). Posteriormente, em 15 de abril, a CTC inaugurou a linha Joinville a São Bento do Sul, passando por Campo Alegre e Rio Negrinho, abrindo caminho para todo o planalto norte. A Empresul ampliou os serviços para as cidades de Mafra e Rio Negro (Paraná), contudo a linha que integrava era de propriedade da CTC, que tinha o privilégio concedido pelo contrato de 1927.
O serviço conjugado entre as duas empresas durou quatro anos. No dia 26 de março de 1936, a CTC publicou no jornal A Notícia que estaria interrompendo os serviços de atendimento da zona rural de Joinville e de todos os municípios do estado (A NOTÍCIA, 26/03/1936). Essa atitude unilateral de Juan Ganzo deixou a comunidade local perplexa. A intenção era fragilizar a Empresul e forçar a prefeitura a ceder a concessão para a CTC, que alegava também ter direito de exploração em todo o território catarinense (A NOTÍCIA, 29/03/1936). A CTC, mesmo sem autorização da prefeitura, chegou a iniciar as obras de instalação das linhas em Joinville com a abertura de valas na Rua dos Príncipes, mas teve que paralisá-las em seguida. Diante desse ato insólito e arrogante, a imprensa e as elites locais iniciaram uma batalha de desmoralização da figura de Juan Ganzo (A NOTÍCIA, 25/04/1936).
O problema se arrastou por quatro anos, isolando Joinville e Mafra da rede estadual de telefonia. Inclusive a relação de Juan Ganzo com o governo estadual foi abalada, o que levou Nereu Ramos a registrar, em mensagem enviada à Assembleia Legislativa, uma crítica aos serviços prestados pela CTC na capital:
Telefones: Não tem, na capital, funcionado ultimamente esses serviços, de que é concessionária a Companhia Telefônica Catarinense, com a perfeição desejada. Está sendo o respectivo contrato estudado pela Secretaria de Viação e Obras Públicas, para as medidas que possam sanar as irregularidades de certo tempo para cá verificadas, quer na capital, quer nas ligações intermunicipais (SANTA CATARINA, p. 211, 1936).
Foi somente com a mediação da Associação Comercial e Industrial de Joinville e do governo estadual que as duas empresas retomaram as negociações e assinaram um novo contrato em 2 de setembro de 1940 (A NOTÍCIA, 03/09/1940).
Da segunda metade dos anos de 1930 até o início da Segunda Guerra Mundial, o desgaste do conflito com a Empresul e problemas de ordem técnica e financeira reduziram o ritmo de expansão da CTC. A Companhia abandonou a ideia de atingir todo o território catarinense, como idealizava o governo estadual e estava previsto no contrato, para atender apenas os centros urbanos maiores. Porém, instalou telefones em cidades importantes, como Criciúma e Urussanga, em 1937, Rio do Sul, em 1939, e Blumenau, que foi ligada a Jaraguá do Sul via Pomedore, completando a linha norte. No início da década de 1940, a CTC tinha uma rede de 1.000 km e instalados 2.350 aparelhos telefônicos, distribuídos nas seguintes localidades:
* Linha Sul: Criciúma, Urussanga, Imbituba, Laguna, Orleans, Braço do Norte, Pedras Grandes, Tubarão e Vila Nova;
* Linha Leste: Florianópolis, Biguaçu, Palhoça, Paulo Lopes, Pinha, Santo Amaro, São José e Tijucas;
* Linha Vale do Itajaí: Itajaí, Blumenau, Pomerode, Brusque, Gaspar, Trombudo Central, Indaial, Ilhota, Lontra e Timbó;
* Linha Norte e Planalto Norte: Bananal (Guaramirim), Jaraguá do Sul, São Francisco do Sul, Paraty (Itapoá), Rio Negrinho e São Bento (SANTA CATARINA, 1941).
Em Joinville, Rio Negro e Mafra, a Empresul dispunha de uma linha com 132 quilômetros e fornecia 617 aparelhos. Em Porto União, os serviços eram prestados pela Empresa de Eletricidade e Telefones Alexandre Schlemm SA. No Quadro 1 podemos acompanhar os dados referentes à abertura e expansão das linhas e a formação da rede de telefonia em Santa Catarina.
A meta de a CTC chegar até o planalto serrano era constantemente adiada, desrespeitando o contrato assinado em 1927. Somente em 1937 os primeiros serviços telefônicos chegaram ao planalto, quando entrou em operação a linha Painel a Santana (atual localidade de Cruzeiro, em Urubicí) (Mapas 1 e 2). Em seguida, partindo de Rio do Sul a linha chegou a Lages, em 14 de março de 1942. Finalmente, em 24 de abril de 1943, a capital foi ligada a Lages pela linha que passava por Rancho Queimado e Bocaina (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, 1942; 1943; SANTA CATARINA, 1937).
A demora em chegar até Lages talvez seja explicada pelo alto risco nos investimentos com expectativa de baixo retorno. Lages, localizada no centro do território, foi o nó que atou Santa Catarina por meio da disponibilidade das diversas camadas geoeconômicas: estradas, correios e telégrafos. No entanto, do ponto de vista econômico, até os anos de 1940, a cidade era pouco dinâmica e não atraía investimos. Cabia ao estado assumir a função de promover a integração territorial.
Com relação à instalação de telefones automáticos, após a compra da Empresa Telefônica de Blumenau, a terceira cidade que a CTC atendeu foi Blumenau, em 1936. Com a extensão da linha até Lages, em 1942, foram instalados apenas automáticos, pois não justificava colocar o antigo sistema manual via telefonista. Sendo assim, as principais cidades catarinenses – Florianópolis, Joinville, Blumenau e Lages –, antes da entrada do Brasil na Segunda Guerra, já estavam operando com telefones automáticos.
A modernização da telefonia em Santa Catarina entre 1927 e 1943, comandada pela CTC, deu-se por meio de duas grandes ações. A primeira foi a expansão contínua da linha até 1943, com ritmos diferenciados antes e após 1935. De Laguna até Joinville, de Itajaí e Florianópolis até Lages, formou-se uma rede estadual de telefonia, porém com limites, pois a chegada a Lages foi tardia e a CTC não apresentava mais planos de expansão em direção ao oeste (Mapas 3 e 4). A segunda ação foi a instalação das centrais automáticas de telefone, que ocorreu nas cidades de Florianópolis (1930), Blumenau (1936) e Lages (1942). Competindo com a CTC, a Empresul atendia o município de Joinville, um grande e promissor mercado cobiçado por Juan Ganzo, onde também instalou automáticos (1932).
A integração de Lages com Florianópolis, inaugurada em 1943, foi o último suspiro da CTC nesse período caracterizado como modernização extensiva e contínua. As dificuldades em importar equipamentos e o desinteresse em seguir em direção ao oeste inaugurou uma fase de obsolescência da rede. Forçado pela contingência externa e temporária pelo curto período em que perdurou, esse movimento também foi intencional, pois para a CTC não interessava mais atender o oeste catarinense. Nessa região ainda persistia uma baixa densidade populacional e não havia vantagens econômicas que estimulassem a empresa a estender suas linhas até a fronteira.
Podemos acompanhar a obsolescência e as restrições externas nos Relatórios da CTC publicados no Diário Oficial do Estado de Santa Catarina. No Relatório de 1943, no tocante às operações, temos a seguinte observação:
Em virtude da falta absoluta de alguns elementos e grande carestia de outros essenciais à construção de novas linhas e estabelecimento de novas centrais, neste ano nada foi feito digno de menção a não ser a duplicação da linha a Rio Testo (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, p. 7, 1944).
No ano seguinte, 1944, o problema continuava:
Persistindo ainda a mesma falta absoluta de alguns elementos e grande carestia de outros essenciais a construções, só foi iniciada a construção da rede da localidade de Presidente Getúlio. Limitando-se a cuidar da conservação das atuais redes, linhas e centrais, mudando instalações, comutadores telefônicos e algumas centrais (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, p. 6, 1945).
Mesmo após o término da guerra, quando o comércio internacional voltava à normalidade, a CTC continuava sofrendo restrições:
Continuando ainda as mesmas dificuldades oriundas da guerra, as quais não diminuíram, não foram possíveis maiores atividades em novas construções, senão apenas a ultimação de uma construção e assim foi entregue ao tráfego em 1º de junho de 1945, o prolongamento da linha de Ibirama a Presidente Getúlio, bem como a rede local desta localidade (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, p. 8, 1946).
A volta à normalidade no Atlântico e a estabilidade política e econômica no Brasil e em Santa Catarina não foram suficientes para que a CTC retomasse o processo de modernização da rede e das centrais telefônicas. Houve apenas a manutenção necessária realizada em algumas linhas por meio da introdução de circuito metálico e modificações em centrais municipais. O avanço se deu com o início das obras de extensão da linha até a cidade de Caçador, onde seria instalada uma central automática Ericson com capacidade para 250 posições. O plano era seguir em direção a Videira e integrar Curitibanos a Taió (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, 1947).
Com a conclusão prevista da linha entre Videira e Caçador, somando-se aos serviços já disponíveis em Lages, a CTC lentamente avançava no território catarinense, mas ainda deixava uma grande lacuna: o oeste. A fronteira estabelecida pela companhia foi o rio do Peixe, portanto o máximo do alcance seria Joaçaba (Mapa 5). Essa não era a intenção do governo estadual, que almejava levar os serviços telefônicos até a fronteira com a Argentina o mais rápido possível. Caso os serviços não fossem feitos pela CTC, seriam concedidos privilégios a outras empresas interessadas.
O período entre 1947 e 1960, caracterizou-se pelo fim das dificuldades em importar novos equipamentos e pela retomada dos investimentos da CTC para modernizar as linhas e as centrais já instaladas, além da ampliar seus serviços até Joaçaba. A modernização, porém, é intensificada e concentrada onde a CTC já operava. Novas localidades também foram atendidas, mas, excluindo Joaçaba, estavam circunscritas à proximidade das linhas regionais.
Nos pós-guerra assistimos na economia catarinense uma diversificação e ampliação dos sistemas regionais de economia. Ocorre uma diversificação porque surgem novos setores como o de papel, papelão, pasta mecânica, no planalto serrano; cerâmico, no sul; metalomecânico, materiais elétricos e indústrias ligadas ao setor de transporte no norte. Há uma ampliação porque os setores como o carbonífero, no sul, e o têxtil, no Vale do Itajaí, ampliaram a capacidade produtiva, e a agricultura, no oeste, começou a se industrializar, transitando do complexo agrocomercial para o complexo agroindustrial (GOULARTI FILHO, 2002). Cada sistema regional tinha uma cidade polo que concentrava a maior parte das atividades econômicas e dos serviços urbanos: Criciúma, Blumenau, Joinville, Itajaí e Lages consolidavam-se como as capitais regionais e, no oeste, Joaçaba e Chapecó compartilhavam esta função.
Há uma relação muito estreita entre a consolidação dos sistemas regionais de economia e a necessidade de disponibilizar investimentos em infraestrutura, aumentando a oferta de serviços de energia, transportes, comunicações, água e outros. Logo, há uma simbiose entre os sistemas regionais e as camadas geoeconômicas, que se entrelaçam e se dinamizam, gerando simultaneamente novas demandas. É a reprodução ampliada do capital impulsionando novas forças produtivas e configurando o território.
Seguindo com a modernização, entre 1948 e 1960 as quatro principais linhas que entraram em operação foram a do Vale do Rio do Peixe, com a inclusão de Videira, Fraiburgo, Tangará e Caçador, além das diversas localidades em direção a Curitibanos, fechando o circuito com o planalto serrano. Outra linha foi a que integrou Lages à rede, conectando-a com o Vale do Itajaí, o norte, o sul e a região da capital. Rumo ao oeste o limite foi Joaçaba, onde, em setembro de 1950, a CTC adquiriu a Empresa Telefônica de Cruzeiro do Sul e passou a monopolizar os serviços locais. Em seguida, estendeu a linha em direção ao Baixo Vale do Rio do Peixe até a cidade de Capinzal. No planalto norte, a CTC ampliou sua linha até Porto União, onde comprou, em junho de 1951, a Empresa de Eletricidade e Telefones Alexandre Schlemm SA, e Mafra, onde adquiriu a Irmãos Bley & Cia Ltda, fechando todo circuito de Joinville até Porto União e seguindo em direção a Caçador e Curitibanos. Em resumo, estas foram as novas linhas:
* Linha Vale do Rio do Peixe: Videira, Tangará e Caçador
* Linha Meio-Oeste: Joaçaba a Capinzal
* Linha Planalto Serrano: Lages, São Joaquim, Ponte Alta e Curitibanos
* Linha Planalto Norte: Porto União, Mafra e Canoinhas
Muitas linhas foram estendidas dos centros urbanos maiores para cidades próximas ou pequenas localidades. No sul, a linha partiu de Criciúma até Araranguá, passando por Maracajá; no Vale do Itajaí, de Rio do Sul chegou a Laurentido e Rio do Oeste; no Vale do Rio do Peixe, de Caçador passou por Ipoméia, Rio das Antas e Pinheiro Preto. A integração das linhas intermunicipais formava grandes circuitos, e a soma de ambos formava a Rede Catarinense de Telefonia. Como exemplo, temos os circuitos:
* Joinville-Porto União-Caçador-Lages-Rio do Sul-Blumenau-Itajaí-Joinville
* Florianópolis-Lages-Rio do Sul-Brusque-Florianópolis
* Laguna-Orleans-Urussanga-Criciúma-Araranguá-Tubarão-Laguna
* Lages-Curitibanos-Caçador-Porto União-Mafra-Ponte Alta-Lages
As rápidas mudanças tecnológicas no mundo das telecomunicações exigiam da CTC alterações constantes nas linhas, nas centrais e nos aparelhos. As linhas inicialmente eram de galvanizados, mas em seguida tiveram que ser substituídas por cobre, que era mais resistente e melhorava a transmissão da voz, porém muito mais caro. Com a integração das linhas, veio o circuito direto de alta frequência (sistema carrier), implantado pela primeira vez em 1950 entre Florianópolis e Blumenau, Itajaí e São Francisco do Sul, e Itajaí e Rio do Sul. Em 1954, o sistema carrier foi implantado em todo o planalto norte. Em 1956 chegou a Joaçaba, e em seguida, em 1959, Itajaí foi ligada com Curitiba com a Companhia Telefônica Nacional (Mapas 6 e 7).
Na integração com os estados vizinhos, a primeira ligação foi realizada em 13 de setembro de 1952 entre Joinville e Curitiba, passando por Garuva, em uma extensão total de 45 quilômetros. A CTC unia-se à rede da Companhia Telefônica Nacional (CTN), que havia sido formada da fusão entre a IT&T e CTB, ocorrida em 1951, e que atuava em todo o sudeste brasileiro. Em 1957, já era possível falar de Blumenau direto com Curitiba em alta frequência. Porto União, que estava ligada ao circuito do planalto norte, conectou-se à rede da CTN em 1959, estendendo sua conexão até Curitiba (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, VÁRIOS ANOS). Com certo atraso, a capital catarinense obteve os serviços de longa distância até Curitiba, passando por Itajaí e Blumenau somente em setembro de 1960, com a instalação de três novos circuitos. Estando em contato com Curitiba era possível fazer ligação com todo o estado do Paraná e São Paulo, uma vez que a CTN também tinha tráfego mútuo com a CTB (O ESTADO, 07/09/1960).
Com o Rio Grande do Sul, o projeto de integração surgiu após um encontro realizado nos dias 23 e 24 de novembro de 1956, na cidade de Torres, entre o governador gaúcho Ildo Meneghetti e o catarinense Jorge Lacerda. No encontro foram assinados protocolos de intenções que previam ações conjuntas em várias frentes (O ESTADO, 21/11/1956). A conexão entre os dois estados seria feita entre a CTC e a CTR, porém no oeste, como estava previsto (Concórdia, Chapecó, Seara, Itá e Mondaí), a companhia catarinense não operava. No ano seguinte, 1957, foram realizados os primeiros testes de transmissão pelo sistema de micro-ondas entre Porto Alegre e Florianópolis. No entanto, a integração por meio de linhas entre Florianópolis e Porto Alegre via Torres-Araranguá-Laguna não foi executada pela CTC e veio a ocorrer somente com a COTESC.
Outro setor da telefonia que exigia investimentos, manutenção e modernização constantes eram as centrais, em razão da substituição do sistema manual pelo automático. O sistema manual continuou sendo instalado até os anos de 1940, mas quando uma nova cidade de porte médio entrava na rede não compensava mais instalar uma central manual. Posteriormente à retomada dos investimentos da CTC pós-1947, todas as principais cidades catarinenses passaram a receber posições para automáticos. No Quadro 2, podemos acompanhar os dados de instalação dos telefones automáticos em diversas cidades catarinenses. Às vezes os equipamentos antigos eram reutilizados em comunidades menores, onde eram ofertados poucos números à população local. No entanto, na maioria dos casos, a companhia tinha que depreciar o seu capital imobilizado.
Em virtude da implantação das novas centrais automáticas com seus telefones, cabos, ferragens, etc. foram retiradas as antigas centrais manuais com todos os seus aparelhos, postes, isoladores, fios e ferragens nas seguintes cidades deste estado: Itajaí, São Francisco do Sul, Rio do Sul, Tangará e Lages. No curso do ano de 1952 serão retiradas idênticas redes das seguintes cidades: Brusque, Laguna, Porto União, União da Vitória, Curitibanos, Ibirama e uma grande parte desta capital e Estreito. Todos esses velhos materiais recolhidos, e a recolher, representam vários milhões de cruzeiros, os quais terão de ser depreciados em diversos exercícios começando no exercício correspondente ao ano de 1951 (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, p. 4, 1952).
Com o avanço da telefonia de longa distância e as ligações com o Paraná e o Sudeste, novas e complexas demandas surgiam para a CTC. Em 1958, foi contratada uma empresa paulista para implantar o sistema de ondas portadoras de até 140 kc que estava previsto num plano de desenvolvimento da longa distância para ser instalado entre Florianópolis e Itajaí. Com tal modernização, a CTC imaginava “atender o aumento normal do tráfego interurbano nos próximos 20 anos” (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, p. 9, 1959).
A ausência dos serviços telefônicos da CTC no oeste catarinense precisou ser suprida com iniciativas municipais por meio da criação de empresas municipais. A criação dessas empresas de telefonia, de certa forma, não atrapalhava os negócios da CTC, pelo contrário, livrava-a do “fardo” de ampliar as linhas em direção à fronteira. As reclamações da má qualidade dos serviços da CTC e a deficiência na estrutura da oferta, com poucos aparelhos à disposição diante da demanda crescente, estava debilitando a imagem e as finanças da empresa. A baixa capacidade de alavancagem financeira retardava a renovação da rede, que rebatia na queda da qualidade. O sinal de alerta soou quando em Criciúma, no dia 03 de maio de 1961, um grupo de empresários criou a Companhia Criciumense de Telefones, por meio da incorporação do patrimônio da CTC (COMPANHIA CRICIUMENSE DE TELEFONES, p. 9, 09/05/1961).
A CTC estava se tornando ineficiente e incapaz de promover a integração plena dos serviços telefônicos em Santa Catarina (Mapa 8). Durante os anos de 1961 a 1969, os problemas (técnicos e financeiros) foram apenas se agravando. O alargamento da divisão social do trabalho e a expansão demográfica em Santa Catarina, que geraram saltos de demanda à frente da oferta, transformaram a CTC, empresa promotora da integração parcial da telefonia até os anos de 1950, em um entrave para continuar a integração plena do território catarinense. Essa barreira deveria ser transposta o quanto antes.
2.4 Obsolescência irreversível e insolvência financeira (1961-1969)
Em Santa Catarina, a institucionalização da telefonia começou no governo Celso Ramos com a criação do Conselho Estadual de Telecomunicações (CONTEL) por meio da Lei nº 3.635, de 10 de maio de 1965. Entre as suas atribuições, estava a elaboração do Plano Estadual de Telecomunicações e a integração de todos os serviços num Sistema Estadual de Telecomunicações. Em seguida, por meio da Lei nº 3.642, de 08 de junho de 1965, foi criada a Companhia Catarinense de Telecomunicações SA (CIATEL). A Ciatel tinha por finalidade implantar, melhorar e expandir comercialmente os serviços de telecomunicações no estado, ou seja, estava nascendo uma estatal catarinense de telefonia. O cerco em torno da CTC estava se fechando e o governo, tanto na esfera federal como na estadual, anunciava que iria alargar suas funções para desenvolver o serviço de telefonia no país.
Durante o período que se estende entre 1961, quando em Criciúma um grupo de empresários criou a Companhia Criciumense de Telefones (CCT) e deslocou a CTC da cidade, e 1969, quando a companhia foi encampada pela COTESC, a CTC pouco alterou sua estrutura física. Esta vinha num processo de desinvestimento desde 1966, quando surgiram os rumores de sua estatização. Não construiu novas linhas nem ampliou o número de assinantes. Em 1960, havia 9.207 assinantes, em 1968, eram 8.946, ou seja, na verdade houve uma queda no número de assinantes. Com a modernização dos serviços em Florianópolis, havia uma promessa de ampliar para 10.000 assinantes, porém, em 1967 havia apenas 2.200, muito aquém do esperado. Na Tabela 1 podemos acompanhar a evolução do número de aparelhos instalados em Santa Catarina pela CTC.
Na Assembleia Geral Extraordinária do dia 20 de junho de 1961, Florinda Di Mônaco Ganzo (viúva de Juan Ganzo Fernandes, falecido em 1957) sugeriu que a CTC ampliasse sua rede para regiões que ainda não explorava. Mesmo sendo aprovada pela maioria da Assembleia, a proposta não foi executada. Nessa mesma reunião, foi aprovado um empréstimo com o Consórcio de Desenvolvimento Econômico SA. (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, p. 20, 25/05/1962). No entanto poucas obras de modernização foram executadas, com exceção de Blumenau, onde foi instalada uma nova central automática com disponibilidade para 2.000 posições do tipo Crossbar de comandos indiretos. Porém, já estava sendo desenvolvido o sistema digital de programas armazenados, que logo tornaria obsoleto o Crossbar. A CTC optou por construir novas sedes para melhor atender ao público nos municípios de Itajaí, Curitibanos, Tubarão, Lages, Pomerode, Gaspar, Rio do Sul, Araranguá e Porto União (O ESTADO, 07/05/1968). A justificativa alegada pela empresa para o baixo investimento na expansão da linha era “a inflação vertiginosa”.
Quanto às ampliações da rede urbana nas várias cidades do estado, podemos asseverar que efetivamente está havendo algum atraso. Atraso, que aliás foi devido à inflação vertiginosa que ocorreu no período de execução do nosso plano, fazendo com que as nossas previsões de custos para dois anos praticamente ficassem superadas em dois meses (O ESTADO, p. 3, 07/05/1968).
Com o objetivo de agilizar os serviços técnicos e financeiros, na reunião da Assembleia Geral Extraordinária de 17 de janeiro de 1967 foi aprovada a criação do Departamento Técnico e do Departamento Econômico, ambos com plena autonomia. O primeiro seria responsável pela elaboração de plantas, projetos e execução das obras; o segundo pela elaboração de planejamento financeiro, administrativo e organizacional (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, 1967).
A agilidade se fazia necessária, pois após a criação do CONTEL o governo estadual iniciou uma série de obras para melhorar os serviços de telecomunicações em Santa Catarina. Em parceria como Departamento de Correios e Telégrafos, o CONTEL, em 1967 foi construída a linha carrier no trecho entre Blumenau e Joinville e de Blumenau a Lages, passando por Rio do Sul (SANTA CATARINA, 1967). No ano seguinte, ambas as linhas entram em operação e o CONTEL iniciou a execução das obras na linha entre Lages e Vacaria (SANTA CATARINA, 1968). Segundo Santos (1999), nesse mesmo período o governo catarinense, por meio da Secretaria do Oeste, fez levantamentos topográficos e implantou linhas telefônicas entre Chapecó, Xaxim, Xanxerê, Caxambu do Sul, Águas de Chapecó e São Carlos. Também foram realizados convênios com algumas prefeituras municipais no oeste para a construção de linhas locais e a disponibilização de aparelhos para órgãos públicos.
Em setembro de 1966 iniciaram as tratativas entre o diretor-presidente da CTC, Djalma Araújo, e o presidente do CONTEL, Coronel Danilo Klaes – um agente da repressão – para a aquisição de todo o patrimônio da empresa. Portanto, a partir desse momento não seria mais prudente fazer novos investimentos, seja na modernização das centrais, seja na expansão da linha, isto é, a CTC estagnou.
O ano de 1968 foi crítico para a empresa, sobretudo do ponto de vista financeiro, pois apresentou um prejuízo de Cr$ 692.864,41 (aproximadamente US$ 205.600,00) (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, 06/05/1969). A empresa já não divulgava nos balanços publicados no Diário Oficial do Estado de Santa Catarina o resultado detalhado do exercício desde 1959, o que sugere inferir que sua situação financeira estava entrando numa rota de insolvência. Na nota de esclarecimento enviada à Assembleia Legislativa de Santa Catarina em 29 de abril de 1968, endereçada ao Deputado Estadual Pedro Ivo Campos, referente ao pronunciamento feito na tribuna da Assembleia sobre as deficiências dos serviços telefônicos, Juan Carlos Ganzo Fernandes alegava que após o governo estadual ter constituído a Comissão Especial de Tombamento para encampar a CTC (criada em 16 de março de 1967), a empresa passou a ter enormes dificuldades em obter financiamento com os bancos para cobrir seus custos, inclusive com o próprio BDE, um banco de fomento estatal, em “cujas portas”, segundo Ganzo, “a Telefônica bateu infrutiferamente em busca de auxílio” (O ESTADO, p. 3, 07/05/1968). Essa situação de insolvência afugentava os assinantes, que deixaram de cumprir os compromissos com a CTC, agravando ainda mais a crise financeira e obrigando a empresa a transferir os recursos destinados à aquisição de novos equipamentos para saldar débitos.
Em entrevista coletiva dada em 16 de fevereiro de 1967, o presidente do CONTEL manifestou que havia interesse do estado em adquirir a CTC, declaração que inclusive tomou de surpresa Juan Carlos Ganzo Fernandes (O ESTADO, 19/02/1967). Em seguida, em 16 de março, foi confirmada oficialmente pelo CONTEL a criação de uma Comissão Especial de Tombamento para continuar com as tratativas para a aquisição da CTC, que já haviam iniciado em setembro de 1966 (O ESTADO, 17/03/1967).
Em 1º de novembro de 1968, o Ministério das Comunicações editou a Portaria nº 1.331, que criou uma Comissão Especial coordenada pelo Departamento Nacional de Telecomunicações (DENTEL) para analisar o problema existente entre o governo estadual e a CTC. As tarefas desta Comissão seriam:
· entrar em negociações com a Companhia Telefônica Catarinense para estabelecer as condições da transação de compra desejada pelo Governo do Estado de Santa Catarina;
· proceder à perícia contábil e ao tombamento dos bens da Companhia Telefônica Catarinense, visando determinar o justo valor de seu patrimônio líquido;
· preparar as minutas dos atos administrativos necessários à realização da transação caso se chegue a um termo satisfatório para as mesmas (DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, p. 9.786, 08/11/1968)
O prazo para a conclusão dos trabalhos era de dois meses. Apesar de a CTC afirmar que foi “pega” de surpresa, o problema na estrutura da oferta dos serviços telefônicos era amplamente conhecido em Santa Catarina, e a solução encontrada pelo governo federal era a estatização. No dia 25 de janeiro de 1969, a diretoria da Companhia Telefônica Catarinense se reuniu para deliberar sobre a Portaria nº 1.331 e apresentou uma avaliação financeira do capital imobilizado que contrastava com a apresentada pela Comissão Especial. Na avaliação feita pela CTC, o capital imobilizado em 31/12/1968 somava Cr$ 7.007.676,39; na avaliação da Comissão, era de Cr$ 1.273.439,36 (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, 31/01/1969). Por fim, na Assembleia Geral Extraordinária em 08 de março de 1969, foi criada uma comissão de liquidante para acertar os trâmites de transferência do patrimônio para o estado de Santa Catarina (COMPANHIA TELEFÔNICA CATARINENSE, 19/05/1969).
Em seguida, o governo federal, agora sob a égide do AI-5 que escancarava a ditadura, no dia 2 de abril de 1969 editou o Decreto nº 64.301, que autorizou a transferência dos bens e das instalações da CTC para o governo catarinense. O mesmo decreto caducou todas as concessões outorgadas à CTC e deu prazo de 120 dias para que fosse estruturada uma empresa estadual para executar os serviços telefônicos em Santa Catarina. Em resposta, no dia 17 de abril de 1969, por meio da Lei Estadual nº 4.299, o governo catarinense autorizou a constituição da Companhia Catarinense de Telecomunicações SA (COTESC).
No dia 03 de julho todo o patrimônio da CTC foi finalmente incorporado pela COTESC, sob a supervisão do Alcides Abreu, que havia sido indicado para presidir a nova empresa estatal (O ESTADO, 04/06/1969). A Escritura Pública de fundação da COTESC foi assinada em reunião ocorrida no dia 14 de julho de 1969, com a presença do governado Ivo Silveira (COMPANHIA CATARINENSE DE TELECOMUNICAÇÕES, 25/07/1969). Estava aberto o caminho para formar uma rede estadual de telecomunicações, promover uma modernização contínua dos serviços telefônicos e ampliar a oferta de novos números/aparelhos, chegando a todas as cidades catarinenses. Diante daquelas condições materiais, não havia outra saída: ou estatizava ou retrocedia nas comunicações.
3 Considerações finais
A estatização da CTC e a constituição da COTESC revelam o conflito de interesse entre o capital privado e o estado. No início dos anos de 1960, a CTC chegou ao limite da sua acumulação: não expandia mais suas linhas e apenas executava manutenção nas centrais. Por que a CTC não avançou em direção ao oeste e à fronteira? Simplesmente porque exigiria um alto volume de investimento com baixa expectativa de retorno, pois a região ainda carecia de infraestrutura e apresentava baixa densidade demográfica. Ademais, os rumores da uma possível estatização, que começou com a criação, em 1965, do CONTEL e da CIATEL, retraía a CTC para se aventurar numa empreitada de alto risco.
Como a ausência e a precariedade dos serviços telefônicos estavam prejudicando os negócios das empresas catarinenses, facilmente a elite local assumiu o discurso da estatização e assistiu passivamente à encampação da CTC e o alargamento das funções da COTESC. O espírito da época, associado ao alto grau de autoritarismo promovido pela ditadura, revestiam a estatização de uma aura otimista e necessária para o progresso econômico e social. Não restam dúvidas de que o Estado é o elemento central na condução de um projeto nacional de desenvolvimento, entretanto a estatização, em um regime autoritário, reforçará o caráter excludente do capitalismo. A promoção do desenvolvimento socioeconômico exige a participação estatal na economia, contudo somente num regime democrático teremos mais justiça social.
Ao longo do processo de industrialização e de formação do amplo mercado interno da sociedade brasileira, o Estado foi alargando suas funções e adensando-se no território. Incialmente a presença estatal era mais intensa nos transportes. Em seguida, começou a assumir funções no sistema de geração e distribuição de energia elétrica. Nas comunicações, atuava nos correios e telégrafos, mas, com o advento da telefonia, também necessitou assumir a oferta deste novo serviço. Hoje, opera no sistema de distribuição do gás advindo da Bolívia e na implantação da rede de fibra ótica. As privatizações e concessões dos anos 1990 reduziram a participação do Estado em alguns setores da infraestrutura logística, porém não enfraqueceram sua capacidade em definir os rumos da economia e conduzir os investimentos em campos estratégicos.