Servicios
Descargas
Buscar
Idiomas
P. Completa
Neoplasias cutâneas em hospital de referência em Campos dos Goytacazes: integração dos registros e sua interface com a política em saúde
Ana Paula Moura de Almeida; Eduardo Shimoda
Ana Paula Moura de Almeida; Eduardo Shimoda
Neoplasias cutâneas em hospital de referência em Campos dos Goytacazes: integração dos registros e sua interface com a política em saúde
Skin neoplasm in a reference hospital of Campos dos Goytacazes municipality: record integration and its interface with the health policy
Neoplasias cutáneas en un hospital de referencia de Campos dos Goytacazes: integración de los historiales médicos y su interrelación con la política sanitaria
Redes. Revista do Desenvolvimento Regional, vol. 27, 2022
Universidade de Santa Cruz do Sul
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: Dada sua importância e multidimensionalidade, a saúde ocupa lugar de destaque na área de políticas públicas. O câncer de pele é o tipo de neoplasia mais frequentemente encontrado no Brasil e é considerado um problema de saúde pública. Neste sentido, a presente pesquisa aborda a temática do câncer de pele, sendo realizado um diagnóstico da sua incidência no município de Campos dos Goytacazes – RJ, por meio do Registro Hospitalar de Câncer (RHC). Esses registros obtiveram dados de todos os pacientes atendidos em um hospital de referência (Hospital Escola Álvaro Alvim), que apresentavam diagnóstico confirmado do câncer de pele entre os anos de 2012 e 2017, totalizando 656 casos. Através da análise estatística descritiva de variáveis como idade, profissão, local do tumor, bairro e sexo foi possível traçar um perfil dos pacientes acometidos pelo câncer de pele no município, detectando setores da área onde a população local é mais afetada pela doença, além de fatores ambientais que possam estar relacionados e a raça mais acometida. Os resultados do estudo evidenciam que a população de pele clara (69,1%) e a faixa etária acima de 55 anos de idade (com idade predominante dos 70 a 74 anos para os carcinomas basocelulares e dos 80 a 84 anos para os carcinomas espinocelulares), configuram o grupo mais acometido pelo câncer de pele. As informações obtidas desses registros seriam capazes de auxiliar nas políticas públicas e campanhas junto à população, visando melhorar as estratégias para sua prevenção e diagnóstico precoce.

Palavras-chave: Carcinoma basocelular, Carcinoma de células escamosas, Políticas públicas, Melanoma, Câncer de pele.

Abstract: Given its importance and multidimensionality, health occupies a prominent place in the area of public policy. Skin cancer is the most common type of neoplasm found in Brazil and is considered a public health problem. In this sense, this research addresses the theme of skin cancer, with a diagnosis of its incidence in the city of Campos dos Goytacazes - RJ, through the Hospital Cancer Registry (RHC). These records obtained data from all patients treated at a reference hospital (Hospital Escola Álvaro Alvim), who had a confirmed diagnosis of skin cancer between 2012 and 2017, totaling 656 cases. Through descriptive statistical analysis of variables such as age, occupation, tumor location, neighborhood and gender, it was possible to draw a profile of patients affected by skin cancer in the city, detecting sectors of the area where the local population is most affected by the disease, in addition to environmental factors that may be related and the most affected race. The results of the study show that the fair-skinned population (69.1%) and the age group above 55 years of age (with a predominant age of 70 to 74 years for basal cell carcinomas and 80 to 84 years for squamous cell carcinomas), make up the group most affected by skin cancer. The information obtained from these records would be able to assist in public policies and campaigns with the population, aiming to improve strategies for its prevention and early diagnosis.

Keywords: Basal cell carcinoma, Squamous cell carcinoma, Public policy, Melanoma, Skin cancer.

Resumen: Dada su importancia y multidimensionalidad, la salud ocupa un lugar destacado en el ámbito de las políticas públicas. El cáncer de piel es el tipo de neoplasia más común que se encuentra en Brasil y se considera un problema de salud pública. En este sentido, esta investigación aborda la temática del cáncer de piel, con un diagnóstico de su incidencia en la ciudad de Campos dos Goytacazes - RJ, a través del Registro Hospitalario de Cáncer (RHC). Estos registros obtuvieron datos de todos los pacientes atendidos en un hospital de referencia (Hospital Escola Álvaro Alvim), que tenían un diagnóstico confirmado de cáncer de piel entre 2012 y 2017, totalizando 656 casos. A través del análisis estadístico descriptivo de variables como edad, ocupación, localización del tumor, barrio y sexo, se pudo trazar un perfil de pacientes afectados por cáncer de piel en la ciudad, detectando sectores de la zona donde la población local es más afectada por el cáncer de piel. enfermedad, además de los factores ambientales que pueden estar relacionados y la raza más afectada. Los resultados del estudio muestran que la población de piel clara (69,1%) y el grupo de edad por encima de los 55 años (con una edad predominante de 70 a 74 años para los carcinomas de células basales y de 80 a 84 años para los carcinomas de células escamosas), constituyen el grupo más afectado por el cáncer de piel. La información obtenida de estos registros podría ayudar en políticas públicas y campañas con la población, con el objetivo de mejorar las estrategias para su prevención y diagnóstico precoz.

Palabras clave: Carcinoma basocelular, Carcinoma de células escamosas, Políticas públicas, Melanoma, Cáncer de piel.

Carátula del artículo

Artigos

Neoplasias cutâneas em hospital de referência em Campos dos Goytacazes: integração dos registros e sua interface com a política em saúde

Skin neoplasm in a reference hospital of Campos dos Goytacazes municipality: record integration and its interface with the health policy

Neoplasias cutáneas en un hospital de referencia de Campos dos Goytacazes: integración de los historiales médicos y su interrelación con la política sanitaria

Ana Paula Moura de Almeida
Universidade Candido Mendes, Brasil
Eduardo Shimoda
Universidade Candido Mendes, Brasil
Redes. Revista do Desenvolvimento Regional, vol. 27, 2022
Universidade de Santa Cruz do Sul

Recepción: 20 Agosto 2021

Aprobación: 17 Febrero 2022

1 Introdução

O processo global de industrialização, ocorrido principalmente no século passado, conduziu a uma crescente integração das economias e das sociedades dos vários países, desencadeando a redefinição de padrões de vida com uniformização das condições de trabalho, nutrição e consumo. Paralelamente, deu-se uma significativa alteração na demografia mundial, devido à redução nas taxas de mortalidade e natalidade, com aumento da expectativa de vida e envelhecimento populacional. Este processo de reorganização global determinou grande modificação nos padrões de saúde-doença no mundo. Essa transição epidemiológica foi caracterizada pela mudança no perfil de mortalidade, com diminuição da taxa de doenças infecciosas e aumento concomitante da taxa de doenças crônico-degenerativas e o câncer. Porém, nos países da América Latina, ao contrário dos países desenvolvidos, esta transição epidemiológica ainda não se completou, observando-se aumento de doenças crônico-degenerativas, enquanto a frequência de doenças infecciosas permanece elevada (GUERRA; GALLO, MENDENÇA, 2005).

O câncer é o principal problema de saúde pública em nível mundial e configura uma posição entre as quatro principais causas de morte em pacientes com idade inferior a 70 anos. A incidência e a mortalidade por câncer vêm apresentando índices crescentes em todo o mundo, em parte pelo envelhecimento populacional, como já citado, mas também pelo crescimento populacional e pela mudança na distribuição e na prevalência dos fatores de risco para seu desenvolvimento, principalmente os associados ao desenvolvimento socioeconômico. Dessa forma, os principais tipos de câncer observados nos países em desenvolvimento vêm também apresentando uma transição, com declínio dos tipos associados a infecções, em contrapartida um aumento daqueles associados à melhoria das condições socioeconômicas, com a incorporação de hábitos e atitudes associados à urbanização, como o sedentarismo e alimentação inadequada (BRAY et al., 2018).

Governos em diversas partes do mundo têm solicitado mais pesquisas que auxiliem principalmente países de média e baixa rendas a elaborarem políticas e programas de aperfeiçoamento e controle do câncer. A Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), em resposta a essas solicitações, lançaram dois estudos. O primeiro deles: Report on cancer: setting priorities, investing wisely and providing care for all foi realizado pela OMS e visa definir a agenda global sobre câncer, mobilizar parceiros e auxiliar países a estabelecerem prioridades no investimento de controle do câncer e na cobertura universal de saúde. O segundo estudo, que foi realizado pela IARC: World Cancer Report: Cancer research for cancer prevention, tem foco na prevenção ao câncer e oferece ampla visão das pesquisas mais relevantes disponíveis. A OMS destaca ainda a necessidade na intensificação de serviços de câncer nos países de baixa e média rendas, já que caso permaneçam na mesma situação, o mundo verá um aumento de 60% nos casos de câncer nas próximas duas décadas. Esse aumento seria às custas principalmente dos casos novos nos países de baixa e média rendas, nos quais as taxas de sobrevivência são atualmente mais baixas. Esse fato ocorre principalmente devido a esses países concentrarem recursos limitados de saúde no combate a doenças infecciosas e na melhoria da saúde materna e infantil, deixando os serviços de saúde sem o recurso adequado para prevenir, diagnosticar e tratar câncer (INCA, 2020).

No Brasil, os Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP) fornecem informações sobre o impacto do câncer nas comunidades, configurando-se uma condição necessária para o planejamento e a avaliação das ações de prevenção e controle de câncer. O RCBP, em conjunto com os Registros Hospitalares de Câncer (RHC) e com o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS), formam o eixo estruturante para a vigilância de câncer e para o desenvolvimento de pesquisas em áreas afins (INCA, 2020)

Uma recente estimativa mundial, do ano de 2018, aponta que ocorreram no mundo 18 milhões de casos novos de câncer (17 milhões sem contar os casos de câncer de pele não melanoma) e 9,6 milhões de óbitos (9,5 milhões excluindo os cânceres de pele não melanoma). O câncer de pulmão é o mais incidente no mundo (2,09 milhões) seguido pelo câncer de mama (2,08 milhões), cólon e reto (1,8 milhão) e próstata (1,3 milhão). Para ambos os sexos combinados, estima-se que quase metade dos casos e mais da metade das mortes por câncer no mundo ocorreram na Ásia no ano de 2018, em parte porque perto de 60% da população global reside lá (BRAY et al., 2018; INCA, 2020).

O câncer de pele é o câncer mais comum mundialmente, sendo o melanoma, o carcinoma basocelular e o carcinoma espinocelular os tipos mais frequentes da doença, os dois últimos classificados como ‘não melanoma’ (AMERICAN CANCER SOCIETY, 2016 apud INCA, 2018). Em 2018, foi estimada mundialmente, 1,04 milhão (5,8%) de casos novos de câncer de pele não melanoma e 290.000 (1,6%) de casos de câncer de pele melanoma. As maiores taxas de incidência do câncer de pele não melanoma se situam na Austrália e Nova Zelândia, América do Norte e nos países da Europa Ocidental, tanto para homens quanto para mulheres. No que se refere ao câncer de pele melanoma, as maiores incidências estão na Austrália e Nova Zelândia e nos países do Norte, Centro e Leste Europeu (BRAY et al., 2018; FERLAY et al., 2018).

A luz ultravioleta (UV) foi identificada como o mais importante fator ambiental no desenvolvimento do câncer de pele e estudos epidemiológicos e laboratoriais mostram que a exposição solar é o principal fator de risco. Estima-se que, 90% dos casos de câncer de pele não melanoma e 65% dos melanomas no mundo estão associados à exposição a radiação UV. O uso do protetor solar é um fator muito importante na prevenção a esse câncer, porém outros meios como: o uso de roupas e chapéus, evitar o sol nos horários mais quentes e roupas adequadas não podem ser deixados de lado (THOMAS-GAVELAN et al., 2011; AZULAY, 2017).

Assim como existem campanhas e diretrizes para a prevenção e diagnóstico precoce de diversos tipos de câncer, como o de mama, próstata e intestino, o câncer de pele, como sendo o mais comum, teria um grande impacto com a implantação de políticas públicas visando a redução de sua incidência. Vale ressaltar que, por geralmente não necessitar de exames complementares, a prevenção e detecção precoce do câncer de pele, pode ser feita através de medidas simples e de baixo custo.

Este contexto corrobora a relevância de análises estatísticas acerca dos tumores primários da pele por ofertar ferramentas epidemiológicas úteis na identificação de subgrupos de risco e na promoção da prevenção como medida ímpar neste cenário.

2 Objetivos

A presente pesquisa visa coletar os dados por meio do Registro Hospitalar de Câncer, dos pacientes atendidos no hospital de referência a ser estudado, com diagnóstico confirmado de câncer. A partir desta análise objetiva-se detectar setores da área onde a população local é mais afetada pela doença, fatores ambientais que possam estar relacionados, além de identificar grupos étnicos mais afetados. As informações obtidas desses registros também são capazes de auxiliar nas políticas públicas e campanhas junto à população, na detecção precoce e prevenção do câncer.

3 Área de estudo: o município de Campos dos Goytacazes

O município de Campos dos Goytacazes localiza-se no Norte Fluminense, situado entre o Estado do Espírito Santo e as regiões Noroeste Fluminense, Serrana e Baixada Litorânea. A região Norte Fluminense é formada por oito municípios: Macaé, Conceição de Macabu, Carapebus e Quissamã, Campos dos Goytacazes, São Fidelis, São João da Barra e São Francisco de Itabapoana. Esta região corresponde a 21% da área total do Estado e o município de Campos dos Goytacazes é responsável por 44% da Região (IBGE, 2020).

Campos dos Goytacazes possui uma população estimada de 507.548 habitantes e uma área de 4.032,487 km., sendo considerado o maior município do Estado em área, conforme dados do Censo Demográfico Territorial de 2010 (IBGE, 2020).

4 População amostral e amostra

Trata-se de estudo epidemiológico, descritivo e retrospectivo, realizado no Hospital Escola Álvaro Alvim no município de Campos dos Goytacazes, Estado do Rio de Janeiro, no qual situa-se a Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON). Este corresponde a uma das unidades hospitalares que possuem condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento dos cânceres mais prevalentes.

5 Análise dos resultados e discussão

A amostra do estudo revela, ainda que parcialmente, o perfil epidemiológico dos tipos mais comuns de câncer de pele sob a análise estatística retrospectiva de um hospital-escola em Campos dos Goytacazes. A instituição desempenha um papel de referência para muitos serviços locais, sendo ponto de drenagem para diversos casos de neoplasias, fazendo desta análise um potencial espelho da realidade.

Dos 4.259 pacientes registrados no banco de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) do Hospital Escola Álvaro Alvim no período de Janeiro de 2012 a Dezembro de 2017, uma amostra de 656 casos (15,4%) de câncer de pele (total de casos de câncer de pele registrados no período) foi selecionada para o estudo. Conforme demonstrado na Figura 1, destes 656 tumores, 455 (69,4%) foram casos de carcinoma basocelular, 113 (17,2%) de espinocelular e 69 (10,5%) de melanoma. Ainda foram incluídos no estudo a presença de outros tumores cutâneos, correspondendo a 19 casos (2,9%).


Figura 1
Distribuição dos casos novos de câncer de pele por tipo clínico

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020)

Como anuncia a vasta literatura existente acerca da prevalência dos tumores malignos da pele, o CBC é o subtipo mais frequente e corresponde a 70-80% de todos os casos (CHINEM; MIOT, 2011). Cameron et al. (2019) reforça essa estimativa e demonstra em estudo realizado que os CBCs podem alcançar até 80% dos tumores de origem queratinocítica.

De modo geral, conforme observado na Figura 2, o acometimento dos diferentes sítios anatômicos foi variado, tendo ocorrido, em relação ao CBC, na face o maior número de casos (61,5%), seguida do tronco (18,7%) e membros superiores (3,3%). No que diz respeito aos CECs, a face também foi o local mais acometido (38,1%), seguido pelo tronco (31,9%) e membros superiores (6,2%). O melanoma teve uma incidência maior no tronco (34,8%), seguido pela face (29,0%) e membros inferiores (8,7%).


Figura 2
Distribuição do tipo de câncer de pele por sítio anatômico

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

A prevalência das neoplasias em áreas consideradas de fotoexposição, como a face, membros e couro cabeludo, corrobora o importante papel da radiação ultravioleta na gênese desses tumores (INCA, 2019). Vale ressaltar uma quantidade representativa do número total das neoplasias cutâneas registradas sem informação de localização (13,3%).

A distribuição por sexo, como demonstrada na Figura 3, revela que, no que se refere ao CBC, houve uma proporção praticamente igual entre mulheres (69,5%) e homens (69,3%). Entre os carcinomas espinocelulares, o sexo masculino foi o principal acometido, com 19,8% dos casos em relação ao sexo feminino, com 14,3%. Nos melanomas ocorreu o inverso, com as mulheres (13,6%) sendo mais acometidas do que os homens (7,8%).


Figura 3
Distribuição do câncer de pele por sexo
Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

Quando compara-se a raça com cada tipo de câncer de pele, observa-se, como demonstrado na Figura 4, que em todas as raças o carcinoma basocelular foi o mais prevalente, principalmente entre os pacientes brancos, sendo responsável por 74,3% dos casos. O carcinoma espinocelular foi o segundo mais incidente nas raças pardas e brancas, com 19,1% e 14,2% respectivamente. Entre os pacientes de cor preta não houve incidência de carcinoma espinocelular nem melanoma, tendo sim uma representação significativa de outros tumores relatados (42,9%).


Figura 4
Distribuição das raças por tipo de câncer de pele

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

Na literatura está definido que as pessoas de pele clara possuem um risco aumentado para o desenvolvimento do câncer de pele, principalmente quando expostos em maior intensidade à radiação ultravioleta, sendo tanto o câncer de pele melanoma como o não melanoma os tipos mais comuns de câncer em populações brancas (LEITER, 2014). A baixa incidência de neoplasias cutâneas em grupos de pele mais escura é resultado principalmente da fotoproteção proporcionada pela quantidade maior de melanina epidérmica, que fornece uma proteção natural maior aos negros. A melanina epidérmica nos pacientes negros filtra duas vezes mais radiação UVB do que comparado aos caucasianos (NARAYANAN, 2010).

Como demonstrado na Figura 5, o maior número de casos do carcinoma basocelular e espinocelular ocorreu nos pacientes a partir dos 55 anos de idade, sendo mais significativa entre os CBCs, dos 70 aos 74 anos (69 casos) e entre os CECs, dos 80 aos 84 anos (24 casos). O melanoma apresenta-se distribuído em quase todas as faixas etárias incluídas no estudo.


Figura 5
Distribuição dos tipos de câncer de pele por faixa etária

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

No que se refere a faixa etária, é importante ter em mente que o envelhecimento representa o acúmulo de mudanças no ser humano ao longo do tempo, abrangendo mudanças físicas, psicológicas e sociais. O envelhecimento está entre os maiores fatores de risco conhecidos para a maioria das doenças, e é um dos fatores de risco mais importantes para o câncer (RIBEIRO et al., 2018). A faixa etária mais acometida no presente estudo foi acima dos 55 anos, que foi similar a várias publicações na literatura, demonstrando que os indivíduos de mais idade sofrem um efeito cumulativo do sol.

Ao correlacionar as áreas geográficas do município de Campos dos Goytacazes com a incidência do câncer de pele, o bairro de residência do maior número de casos registrados foi o Centro (55) seguido por Goytacazes (37) e após, com o mesmo número de casos, o Farol de São Thomé e o Jockey Club (29).

Corroborando com este achado, na Tabela 3. pode-se observar as profissões mais expostas nesses bairros. No Centro e em Goytacazes, os pacientes do lar foram os mais acometidos, com 70,4% e 60,0% respectivamente, enquanto no Farol de São Thomé, a pesca foi a profissão mais acometida pela ocorrência do câncer de pele, correspondendo a 44,4% da profissão desses pacientes.

Tabela 3
Distribuição dos tipos de profissão por bairro

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

Chama a atenção nessa análise por bairros que, o Farol de São Thomé, que foi o terceiro bairro mais acometido, ocupando a mesma posição com o Jockey Club, tem a atividade pesqueira como uma importante atividade econômica. A população que faz parte dessa economia pesqueira estaria mais exposta à radiação ultravioleta, fazendo parte de um grupo de maior risco para o desenvolvimento do câncer de pele e deve ser considerado um grupo alvo para a implantação de políticas públicas com foco na prevenção e orientação dessa população.

Como já evidenciado no nosso estudo, a exposição solar à radiação ultravioleta é o principal fator de risco para o desenvolvimento do câncer de pele. Um estudo europeu realizado por Trakatelli et al. (2016), corrobora com este fato, em que os autores demonstraram que trabalhadores ao ar livre tiveram comportamentos de maior risco, com mais exposição UV (ocupacional e de lazer) e menor utilização de filtro solar, o que resultou em maior exposição solar, com maior fotodano e consequentemente um risco aumentado de desenvolver pré-neoplasias e neoplasias cutâneas. Esse estudo vai ao encontro do que foi evidenciado de resultado em relação às profissões mais expostas ao sol, com uma predisposição maior ao desenvolvimento do câncer de pele.

Corroborando os dados já enfatizados no que diz respeito às profissões de maior exposição solar e consequentemente maior risco de desenvolvimento das neoplasias cutâneas, foi demonstrado na Figura 20., que os pacientes do lar (57,6%), domésticas (6,2%), agricultor (5,5%), pedreiro (4,1%), marceneiro (3,4%) e motorista (3,4%) foram os mais acometidos. Dentre as inúmeras profissões listadas no estudo, as que possuem um maior hábito de exposição solar são as principais listadas, tornando assim evidente a associação entre o tipo de profissão com o risco de desenvolvimento do câncer de pele.

Em artigo publicado por Sena et al. (2016), trabalhadores ao ar livre são mais vulneráveis ao desenvolvimento de câncer de pele ocupacional, estimando que profissionais com baixo nível de instrução e ascendência européia correm um risco maior de desenvolver esse câncer. Portanto, as empresas precisam investir mais na saúde dos trabalhadores, fornecendo equipamentos de proteção e, assim, prevenindo o câncer de pele ocupacional.

6 A importância da adoção de Políticas Públicas no planejamento

Os dados colhidos para o presente trabalho, através da base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC), sob a guarda do Instituto Nacional de Câncer (INCA), sendo este um registro obrigatório para hospitais habilitados na Atenção Especializada em Oncologia do Sistema Único de Saúde (SUS) demonstram a necessidade de adoção de políticas públicas que possam levar a um atendimento mais rápido e objetivo às populações que demonstram possuir maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de câncer de pele.

Trata-se de um trabalho voltado para o município de Campos dos Goytacazes-RJ, mas que poderia ser também elaborado para outros municípios a partir da mesma base de dados.

É importante notar que os dados disponibilizados pelos SUS, tanto para câncer de pele, como para outras doenças possui alta capilaridade e é significativamente estruturante na organização e dinâmica das redes urbanas, permitindo efetuar investimentos de forma mais coerente, gerando empregos e renda, além do fortalecimento de trajetórios regionais de desenvolvimento em diversas escalas (GADELHA et al, 2011; FEITOSA; GUIMARÃES, 2015).

O Art. 196 da Constituição Federal (Brasil, 1988) ao definir a saúde como direito de todos e dever do Estado, institui a garantia da mesma através de “políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Sendo que o Art. 198 rege que as ações e serviços públicos de saúde devem constituir uma rede regionalizada e hierarquizada integrando um sistema único, cuja organização deve orientar-se por três diretrizes: (i) descentralização, com direção única em cada esfera de governo; (ii) atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; e (iii) participação da comunidade (RIBEIRO; OLIVEIRA; RODRIGUES, 2022)

Diante do exposto, sugerimos com base nos dados de RHC a adoção de um planejamento regional de políticas públicas, que possam atender tanto aos doentes, como atuação na prevenção de doenças como o câncer de pele.

7 Conclusão

O fato de o câncer de pele ser a neoplasia de maior incidência no Brasil e no mundo merece uma profunda reflexão. O presente estudo obteve dados relevantes à caracterização da população acometida por esta doença.

Torna-se então fundamental que o monitoramento da morbimortalidade por câncer incorpore-se na rotina da gestão da saúde de modo a corresponder a um instrumento essencial para o estabelecimento de ações de prevenção e controle do câncer e de seus fatores de risco. Esse monitoramento engloba a supervisão e a avaliação de programas, como ações necessárias para o conhecimento da situação e do impacto no perfil de morbimortalidade da população, bem como a manutenção de um sistema de vigilância com informações oportunas e de qualidade que subsidie análises epidemiológicas para as tomadas de decisões.

Esta necessidade imediata de melhorar as estratégias de prevenção é corroborada pelas estatísticas crescentes de casos de câncer de pele e pelas evidências dos custos econômicos associados principalmente aos tratamentos desse tipo de neoplasia. Além do impacto financeiro, a prevenção poderia evitar cirurgias mutiladoras ou com resultados cosméticos indesejáveis. Por essa razão, políticas públicas com ênfase mais forte na prevenção são necessárias para conscientizar a população dos riscos relacionados à exposição inadequada à radiação ultravioleta.

É de suma importância o desenvolvimento de um plano de prevenção e diagnóstico do Câncer de Pele, que inclua a divulgação de informações de fotoproteção em escolas, empresas, órgãos do sistema de saúde, assim como rastreio e detecção precoce de casos, por profissionais de saúde, devidamente treinados. A educação preventiva visa que esses hábitos sejam inseridos no dia a dia da população, buscando no futuro reduzir a morbidade e mortalidade da população, decorrente desse agravo à saúde e, consequentemente, redução de custos para o tratamento desse tipo de câncer, que é o que detêm o maior número de pessoas acometidas no Brasil.

O quadro de risco atual do câncer no Brasil e suas tendências mostram relevância no âmbito da saúde pública e evidenciam a necessidade continua de realização de pesquisas sobre este tema, as quais são essenciais para o desenvolvimento de políticas de saúde adequadas que visem ao controle de câncer no país. Uma efetiva política de controle dessa neoplasia deve considerar também a situação socioeconômica e as desigualdades existentes nas diversas regiões do Brasil.

Deve-se salientar que este estudo demonstra ser um valioso instrumento no auxílio ao controle da doença no município. É preciso, no entanto, incentivar medidas para que se obtenha um diagnóstico mais precoce da doença. Além disso, a instituição do tratamento adequado e da ampliação do acesso às informações sobre a doença e suas formas de prevenção são requisitos fundamentais para o sucesso do seu controle.

Material suplementario
REFERÊNCIAS
AZULAY, R.D; AZULAY, D.R. Neoplasias epiteliais. In: AZULAY, R.D (ed.); AZULAY, D.R (ed). Dermatologia. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. p. 510-26.
AZULAY, R.D. Dermatologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.
BRAY, Freddie; FERLAY, Jacques; SOERJOMATARAM, Isabelle; SIEGEL, Rebecca L.; TORRE, Lindsey A.; JEMAL, Ahmedin. Global cancer statistics 2018: globocan estimates of incidence and mortality worldwide for 36 cancers in 185 countries. Ca: A Cancer Journal for Clinicians, v. 68, n. 6, p. 394-424, 12 set. 2018.
CAMERON, Michael C.; LEE, Erica; HIBLER, Brian P.; BARKER, Christopher A.; MORI, Shoko; CORDOVA, Miguel; NEHAL, Kishwer S.; ROSSI, Anthony M. Basal cell carcinoma. Journal of The American Academy of Dermatology, v. 80, n. 2, p. 303-317, 2019.
CHINEM, Valquiria Pessoa; MIOT, Hélio Amante. Epidemiology of basal cell carcinoma. Anais Brasileiros de Dermatologia, Rio de Janeiro, v. 86, n. 2, p. 292-305, 2011.
FEITOSA, Luciana da Costa; GUIMARÃES, Raul Borges. Pacto federativo e política regional da saúde no contexto do desenvolvimento regional do território brasileiro. Espaço & Geografia, Vol.18, No 3 (2015), 495:516.
FERLAY, J.; COLOMBET, M.; SOERJOMATARAM, I.; MATHERS, C.; PARKIN, D.M.; PIÑEROS, M.; ZNAOR, A.; BRAY, F. Estimating the global cancer incidence and mortality in 2018: globocan sources and methods. International Journal Of Cancer, v. 144, n. 8, p. 1941-1953, 2018.
GADELHA, Carlos Augusto Grabois; MACHADO, Cristiani Vieira; LIMA, Luciana Dias de; BAPTISTA, Tatiana Wargas de Faria. Saúde e territorialização na perspectiva do desenvolvimento. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 6, p. 3003-3016, Junho 2011.
GUERRA, Maximiliano Ribeiro; GALLO, Cláudia Vitória de Moura; MENDONÇA, Gulnar Azevedo e Silva. Risco de câncer no Brasil: tendências e estudos epidemiológicos mais recentes. Revista Brasileira de Cancerologia, Rio de Janeiro, v. 51, n. 3, p. 227-234, 2005.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. SIDRA: Sistema do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de Recuperação Automática. Rio de Janeiro: IBGE, 2020. Disponível em: www.sidra.ibge.gov.br>Acesso em 25/jul/2020.
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. (INCA). Dados de epidemiologia do câncer na Internet: acesso durante o ano 2020. Rio de Janeiro: INCA, 2020. Disponível em: http://www.inca.gov.br. Acesso em: 08 Ago 2020.
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA.Estimativas 2018: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2019: Disponível em: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/estimativa-2018-incidencia-de-cancer-no-brasil/. Acesso em: 24 jun 2019.
LEITER, Ulrike; EIGENTLER, Thomas; GARBE, Claus. Epidemiology of Skin Cancer. Sunlight, Vitamin D And Skin Cancer, p. 120-140, 2014.
NARAYANAN, Deevya L.; SALADI, Rao N.; FOX, Joshua L. Review: ultraviolet radiation and skin cancer. International Journal of Dermatology, v. 49, n. 9, p. 978-986, 2010.
RIBEIRO, Luis Henrique Leandro; OLIVEIRA, Ricardo Dantas de; RODRIGUES, Juciano Martins. Elementos para o planejamento regional em saúde. Plataforma Região e Redes. Disponível em: https://www.resbr.net.br/elementos-para-o-planejamento-regional-em-saude/#.YiAeCujMLrc. Acesso em 02/03/2022.
RIBERO, Simone; STUCCI, Luigia S.; MARRA, Elena; MARCONCINI, Riccardo; SPAGNOLO, Francesco; ORGIANO, Laura; PICASSO, Virginia; QUEIROLO, Paola; PALMIERI, Guiseppe; QUAGLINO, Pietro; BATAILLE, Veronique. Effect of Age on Melanoma Risk, Prognosis and Treatment Response. Acta Dermato Venereologica, v. 98, n. 7, p. 624-629, 2018.
SENA, Jéssica Suellen; GIRÃO, Régio José Santiago; CARVALHO, Sionara Melo Figueiredo de; TAVARES, Rosielly Melo; FONSECA, Fernando Luiz Affonso; SILVA, Patrícia Barros Aquino; BARBOSA, Maria Clara Fortes Portela. Occupational skin cancer: systematic review. Revista da Associação Médica Brasileira, São Paulo, v. 62, n. 3, p. 280-286, 2016.
THOMAS-GAVELAN, Elizabeth; SÁENZ-ANDUAGA, Eliana; RAMOS, Willy; SÁNCHEZ-SALDAÑA, Leonardo; SIALER, María del Carmen. Knowledge, attitudes and practices about sun exposure and photoprotection in outpatients attending dermatology clinics at four hospitals in Lima, Peru. Anais Brasileiros de Dermatologia, Rio de Janeiro, v. 86, n. 6, p. 1122-1128, 2011.
TRAKATELLI, M.; BARKITZI, K.; APAP, C.; MAJEWSKI, S.; VRIES, E. de. Skin cancer risk in outdoor workers: a european multicenter case-control study. Journal of The European Academy of Dermatology and Venereology, v. 30, p. 5-11, 2016.
Notas

Figura 1
Distribuição dos casos novos de câncer de pele por tipo clínico

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020)

Figura 2
Distribuição do tipo de câncer de pele por sítio anatômico

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

Figura 3
Distribuição do câncer de pele por sexo
Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

Figura 4
Distribuição das raças por tipo de câncer de pele

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).

Figura 5
Distribuição dos tipos de câncer de pele por faixa etária

CBC: carcinoma basocelular, CEC: carcinoma espinocelular, Outros: outros tumores cutâneos

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).
Tabela 3
Distribuição dos tipos de profissão por bairro

Fonte: Base de dados do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) (2020).
Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Visor de artículos científicos generados a partir de XML-JATS4R por Redalyc