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Os pequenos municípios brasileiros: viabilidade, direitos sociais e desenvolvimento local
The small brazilian municipalities: viability, social rights and local development
Los pequeños municipios brasileños: viabilidad, derechos sociales y desarrollo local
Redes. Revista do Desenvolvimento Regional, vol. 27, 2022
Universidade de Santa Cruz do Sul

Artigos


Recepción: 06 Octubre 2021

Aprobación: 08 Abril 2022

DOI: https://doi.org/10.17058/redes.v27i.17018

Resumo: Existem, no Brasil, 5.570 municípios dos quais 1.253 possuem menos que 5.000 habitantes. A PEC 188/2019 propõe a incorporação de parte destas localidades por municípios vizinhos e com maior capacidade financeira. A receita própria dos municípios é o segundo critério previsto na PEC. Este trabalho mostra que, por habitante, os municípios com população inferior a 5.000 habitantes arrecadam mais que os municípios do grupo com população maior. Mesmo as despesas administrativas destes municípios pequenos não são significativamente maiores. Os direitos sociais dos cidadãos, previstos na Constituição Federal, são atendidos de forma mais eficiente nos municípios menores, se considerados os valores per capita. Em algumas das funções orçamentárias, como a saúde por exemplo, as diferenças nos volumes de investimento são bastante elevadas. Os municípios pequenos também atuam como promotores do desenvolvimento ao incentivar as atividades econômicas e o fazem com investimentos maiores, mais uma vez usando o cidadão como unidade. Não é adequado, deste modo, prejulgar e condenar municípios baseados apenas do número de habitantes e nos valores que arrecadam. Os municípios, antes de tudo, são proponentes e executores de políticas públicas onde o lucro financeiro não pode se constituir em medida de avaliação.

Palavras-chave: Municípios, Incorporação de Municípios, Direitos Sociais, Incentivos Públicos.

Abstract: There are 5,570 municipalities in Brazil, of which 1,253 have less than 5,000 inhabitants. The Proposed Amendment to the Constitution no. 188/2019 proposes incorporating part of these municipalities into neighboring municipalities with more significant financial capacity; the municipality’s revenue is the second criterion provided for in this legislative instrument. Given this context, this study sought to show that municipalities with fewer than 5,000 inhabitants collect more than the municipalities of the group with a larger population per inhabitant. Even the administrative expenses of these small municipalities are not significantly higher. The social rights of citizens, which are provided for in the Federal Constitution, are more efficiently served in smaller municipalities if the per capita values are considered. For instance, in some of the budgetary functions (e.g., health), the differences in investment volumes are quite high. Additionally, small municipalities act as promoters of development by encouraging economic activities and do so with larger investments, once again using the citizen as a unit. Therefore, it is not appropriate to prejudge and condemn municipalities solely based on the number of inhabitants and the amounts they collect. The municipalities, first and foremost, are proponents and executors of public policies where financial profit cannot be constituted as an evaluation measure.

Keywords: Municipalities, Incorporation of Municipalities, Social Rights, Public Incentives.

Resumen: En Brasil, hay 5.570 municipios de los cuales 1.253 tienen menos de 5.000 habitantes. El PEC 188/2019 propone la incorporación de parte de estos municipios por municipios vecinos con mayor capacidad financiera. Los ingresos propios del municipio son el segundo criterio previsto en el PEC. Esta obra muestra que, por habitante, los municipios con una población inferior a 5.000 habitantes recogen más que los municipios del grupo con una población mayor. Ni siquiera los gastos administrativos de estos pequeños municipios son significativamente mayores. Los derechos sociales de los ciudadanos, previstos en la Constitución Federal, son atendidos de manera más eficiente en los municipios más pequeños, si se consideran valores per cápita. En algunas de las funciones presupuestarias, como la salud, por ejemplo, las diferencias en los volúmenes de inversión son bastante altas. Los pequeños municipios también actúan como promotores del desarrollo fomentando las actividades económicas y lo hacen con mayores inversiones, utilizando una vez más al ciudadano como unidad. Por lo tanto, no es apropiado prejuzgar y condenar a los municipios basándose únicamente en el número de habitantes y las cantidades que recaudan. Los municipios, en primer lugar, son proponentes y ejecutores de políticas públicas donde el beneficio financiero no puede constituirse como una medida de evaluación.

Palabras clave: Municipios, Incorporación de Municipios, Derechos Sociales, Incentivos públicos.

1 Introdução

O Brasil conta, atualmente, com 5.570 municípios, incluindo o Distrito Federal. Este número é resultado de diversas ondas emancipacionistas, as quais ocorreram em maior ou menor intensidade, como pode ser observado na tabela nº 1, ao longo do período republicano da história Brasileira. Uma explicação para tais oscilações advém das diversas Constituições da República, vigentes nas épocas em que estes municípios foram criados, as quais eram complementadas por diversos instrumentos legais que simplificavam, ou restringiam, estes processos emancipatórios.

Tabela 1
Crescimento absoluto e relativo no número de municípios no Brasil, por intervalos constitucionais

Fonte: (NUNES, 2017)

Destacam-se, nestes diversos períodos, as Constituições de 1946 e a de 1988, em função do grande número de municípios criados em suas vigências. São consideradas, desta forma, Constituições “municipalistas” (NUNES; MATOS, 2019, p. 1). Uma diferença significativa, dentre tantas, entre a Constituição atual e as demais é que, pela primeira vez, o município passou a ser considerado um dos entes federativos integrantes da república (BRASIL, 1988), além de também simplificar o processo de criação de novos municípios. O represamento existente desde a instalação do Governo Militar, em 1964, foi rompido e, desta forma, verificou-se em poucos anos o surgimento de um número significativo de novos municípios (NUNES; MATOS, 2019; SOUZA, 2015).

Esta profusão de emancipações ocasionou reações que resultaram na imposição de freios à novos processos emancipacionistas. Um dos primeiros foi estabelecido pela Emenda Constitucional nº 15, de 1996, ao dar uma nova redação ao parágrafo 4º do artigo 18:

§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por lei complementar federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei. (BRASIL, 1996)

O Congresso Nacional, por sua vez, também contribuiu para as dificuldades impostas à novos processos de criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios ao não estabelecer, ou regulamentar, o conjunto de novos instrumentos legais apontados na Emenda Constitucional (CIGOLINI, 2017; NUNES; MATOS, 2019; SOUZA, 2015; TOMIO, 2005). Esta indiferença do poder legislativo parece ser proposital pois a superação destes obstáculos, caso aconteça, permite supor uma leva significativa de novos municípios.

O Governo Federal, adicionalmente, também tem desempenhado um papel preponderante para a não superação destes novos empecilhos. Apesar da aparente letargia demonstrada pelo Congresso Nacional, a Presidência da República, em duas oportunidades, vetou integralmente iniciativas definidas pelo poder legislativo as quais estabeleciam critérios para a regulamentação necessária a partir da Emenda Constitucional nº 15 (BRASIL, 2013, 2014).

A iniciativa mais recente, também originária no poder executivo, vem na direção oposta das até aqui observadas. Em novembro de 2019 a Presidência da República submeteu ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 188/2019 a qual embutia o propósito de extinção de pequenos municípios não sustentáveis financeiramente (SENADO FEDERAL, 2019). Esta intenção, aparentemente, atendia a muitas manifestações que rotineiramente são apregoadas em órgãos da imprensa (CID, 2020; SATURNO, 2019; TRISOTTO, 2019), por diversas associações empresariais, industriais ou financeiras e, até mesmo, por instituições públicas ou o próprio poder executivo federal (LIMA, 2020; MARTINS, 2020). Para tais atores os pequenos municípios são um fardo para a nação, visto que dependem, quase que exclusivamente, de transferências orçamentárias governamentais. Consideram, ainda, que os principais interesses na criação de novos municípios, ou manutenção dos atuais, residem em fatores econômicos e na disponibilidade de novos cargos públicos a serem preenchidos, principalmente os de natureza política (NUNES, 2017; REZENDE, 2011).

A submissão desta proposta também provocou, imediatamente, inúmeras reações em sentido contrário, tanto por parte dos próprios municípios a serem atingidos com a proposta, quanto de associações de municípios ou mesmo de outras instituições (CNM, 2020). Apesar do possível corporativismo manifestado por estas instituições elas representam, fundamentalmente, os interesses das comunidades envolvidas, na tentativa de rechaçar os argumentos em que se enfatizam o excesso, tanto no número de municípios quanto nos gastos realizados por estes.

A busca pelos direitos sociais, por meio da criação de um novo município, estão presentes na maior parte das manifestações dos cidadãos envolvidos. Cigolini (2017), Souza (2015) e Nunes (2017) relatam estudos de diversos pesquisadores1, cujas conclusões podem ser dispostas em dois pontos principais:

a) Ausência de serviços públicos como educação, saúde, saneamento, transporte, iluminação pública, energia elétrica e habitação. Estes fatores estão, normalmente, associados com o descaso verificado na administração pública e, ainda, à grande extensão territorial do município de origem;

b) A existência de forte atividade econômica nas comunidades emancipacionistas às quais, normalmente, estão relacionadas à existência de infraestrutura de serviços públicos tão satisfatória não justificando mais a subordinação ao município de origem.

A criação de municípios, deste modo, pode ser observada sob a perspectiva das aspirações dos cidadãos, as quais relacionam-se de forma muito acentuada com o artigo 6º da Constituição Federal de 1988, onde:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988)

Este conjunto de posições polarizadas representam, obviamente, a inexistência de consenso em relação às funções dos municípios, preponderantemente àquelas de caráter social, muito embora as opiniões que julgam o município como um ente financeiro, exclusivamente, sejam mais ruidosas. Este trabalho pretende, em sentido oposto, mostrar os municípios, especialmente àqueles considerados de pequeno porte, como entes sociais e principais executores das políticas públicas voltadas ao atendimento dos direitos sociais previstos na Constituição Federal e na promoção do desenvolvimento local. A intenção é mostrar que, apesar de serem considerados pelo próprio Governo Federal e pela mídia, de um modo geral, como não sustentáveis financeiramente e, desta forma, constituírem-se em um peso para a nação, os pequenos municípios, quando confrontados com seus opostos, são mais eficientes e transferem uma maior quantidade de recursos públicos aos seus cidadãos.

Tabela 2
Distribuição municipal por faixa populacional - Brasil - 2019

Fonte: (IBGE, 2019)

O trabalho é de natureza quantitativa e baseia-se, fundamentalmente, na execução orçamentária de 5.067 municípios brasileiros no ano de 2019, obtidas na Secretaria do Tesouro Nacional (STN) que, por meio do Sistemas de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi), armazena e disponibiliza informações contábeis em uma base de dados denominada Finanças do Brasil (Finbra) obtidas em diversos entes públicos, dentre eles os municípios. Para efeitos de comparação, tanto da receita arrecadada quanto da despesa por função, os municípios foram separados em diversos grupos, apresentados na tabela nº 2, com destaque para os municípios com população menor que 50.000 habitantes2 no mesmo ano de 2019 adotando, para tanto, as estimativas populacionais produzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Este artigo é composto por, além desta introdução, três outras seções. A primeira delas apresenta a distribuição geográfica dos municípios brasileiros com destaque para aqueles com população inferior à 5.000 habitantes. Na seção seguinte os municípios são analisados sob o ponto de vista de sua sustentabilidade financeira, como sugere a PEC 188/2019. Na última seção são observados o atendimento, por parte dos municípios, aos direitos sociais dos cidadãos, conforme prevê a Constituição Federal de 1988 além da verificação dos incentivos em relação à sua economia, principalmente à agricultura, comércio, energia e indústria. As considerações finais encerram este texto de forma a analisar em conjunto as principais informações apresentadas.

2 A distribuição geográfica dos pequenos municípios brasileiros

A distribuição dos municípios no território brasileiro, como pode-se observar no mapa apresentado na figura nº 1, onde cada ponto representa uma localidade, não é uniforme. As regiões sul, sudeste e nordeste são intensamente povoadas e contém a maior parte dos municípios. As regiões norte e centro-oeste (ao menos uma parte deste) do país, por sua vez, possuem um menor número de municípios. O mapa também apresenta a intensa concentração de municípios em toda a faixa litorânea e nas suas adjacências.

O mapa diferencia, adicionalmente, os municípios com base em sua população estimada pelo IBGE para o ano de 2019 (IBGE, 2019). Os pontos representam a centroide3 da malha geográfica de todos os 5.570 municípios do Brasil. O primeiro grupo de municípios, representados pelos pontos em azul, referem-se àqueles cuja população estimada é superior a 5.000 habitantes e são em número de 4.317 ou 77,5% dos municípios brasileiros. Este conjunto de municípios é quase hegemônico na região norte e em boa parte da região centro-oeste. Nas demais regiões geográficas do país distribuem-se, principalmente, pela faixa litorânea. Nos estados da Bahia, Maranhão, Ceará, Pernambuco e Alagoas a quase totalidade destes municípios pertencem a esta categoria.

Os pontos em vermelho representam os 1.253 municípios com menos de 5.000 habitantes, alvos da PEC 188/2019 (SENADO FEDERAL, 2019), os quais correspondem a 22,5% do total. Uma característica significativa, ao menos na história recente, mostra que grande parte destes pequenos municípios são resultado da divisão de outros municípios também com pequeno número de habitantes (CIGOLINI; CACHATORI, 2012; MAGALHÃES, 2007). Pode-se destacar, de imediato, o fato de que este fenômeno não ocorre nos Estados do Acre, Amapá, Rio de Janeiro e Roraima e é quase imperceptível nos estados do Amazonas, Ceará, Espírito Santo, Pará, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Pernambuco, Alagoas e Rondônia onde a quantidade não ultrapassa a cinco municípios com população inferior a 5.000 habitantes. Estes estados, em conjunto, somam apenas 26 municípios.


Figura 1
Municípios por faixa populacional Brasil 2019
Fonte: (IBGE, 2019)

A segunda metade dos Estados Brasileiros contém os 1.227 municípios restantes o que, por si só, mostra que a existência de municípios com população inferior a 5.000 habitantes não é, exatamente, um problema nacional. Os Estados de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul lideram em números absolutos: cada um com 231 municípios candidatos à extinção de acordo com a PEC 188/2019 (SENADO FEDERAL, 2019). Com números não tão expressivos, mas superando os 100 municípios cada, estão os Estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Dos demais cabe referência aos Estados de Goiás, Piauí, Tocantins e Paraíba, todos contabilizando mais de 50 municípios.

Este ranking sofre mudanças quando construído sob o ponto de vista relativo. Além do fato destes 1.253 municípios representarem quase um quarto das municipalidades brasileiras em alguns estados esta proporção é ainda maior. Os Estados do Tocantins (49,64%) e Rio Grande do Sul (46,48%) poderão perder, praticamente, a metade de seus municípios. Com índices um pouco menores, mas ainda significativos, estão os estados de Goiás, Santa Catarina, Piauí, e Paraíba, todos com coeficientes superiores a 30%. Finalmente, com percentuais superiores aos verificado à nível nacional, estão os Estados do Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso e São Paulo.

3 Os municípios e sua viabilidade econômica

As Administrações públicas no Brasil, em nível Federal, Estadual e Municipal, têm sua execução orçamentária, de forma especial suas despesas, normatizadas pela Lei Complementar 101, denominada de Lei de Responsabilidade Fiscal (BRASIL, 2000). Um dos motivos para a existência de tal instrumento foi, sem sombra de dúvida, o descontrole e o descompasso entre as receitas e os gastos públicos. Outro objetivo, mesmo que indireto, é a garantia da viabilidade econômica de tais entes públicos. Cabe citar também que a Lei não discrimina nem o tipo nem o porte do ente público.

A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) estabelece as alternativas, pelos quais os entes públicos podem obter os recursos financeiros necessários para a execução de suas funções. No caso dos municípios estão incluídas as receitas próprias, decorrentes da cobrança de tributos específicos, além das transferências de parte das arrecadações estadual e federal. Estas transferências, por força da legislação, compõe a receita municipal e, com exceção das transferências voluntárias, não se constituem em qualquer espécie de socorro financeiro, ou de benesse, de parte dos governos de instâncias superiores aos municípios brasileiros.

Apesar de todo o arcabouço legal que se aplica às finanças públicas, do consequente e necessário controle e verificação de parte dos poderes legislativos municipais e dos órgãos fiscalizadores, são frequentes as manifestações de diversas instituições e associações de classe, principalmente governamentais, políticas, empresariais e financeiras, em relação aos pequenos municípios, ou, como caracterizam, inviáveis economicamente. Um exemplo são as exposições de motivos, presentes nas mensagens dos vetos presidenciais aos projetos de lei aprovados pelo Congresso Nacional (BRASIL, 2013, 2014) e na PEC 188/2019 (SENADO FEDERAL, 2019) que ressaltam, sobremaneira, o aumento de despesas sem a reciprocidade da necessária arrecadação financeira, elevando o problema dos novos municípios a uma simples questão envolvendo a responsabilidade fiscal nos entes públicos.

Outra ocorrência na mesma direção, a qual será analisada nesta seção, é a proposta governamental embutida na PEC 188/2019 (SENADO FEDERAL, 2019) a qual estabelece o índice de sustentabilidade financeira como critério adicional, além da população inferior a 5.000 habitantes, para a definição tanto dos municípios a serem incorporados quanto dos municípios incorporadores. O texto proposto contém:

§ 1º A sustentabilidade financeira do Município é atestada mediante a comprovação de que o respectivo produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 da Constituição Federal corresponde a, no mínimo, dez por cento da sua receita. (SENADO FEDERAL, 2019)

Este índice de 10% de receita própria em relação à receita total de um município é, sem necessidade de maiores explicações, totalmente aleatório, mesmo combinado com o fator populacional do município em questão. O texto da Proposta de Emenda Constitucional não apresenta os motivos pelos quais os municípios que não atingissem, ou superassem, este percentual, seriam insustentáveis financeiramente, ou sustentáveis, conforme o caso.

O gráfico, em formato de caixa, apresentado na figura nº 2 ilustra o comportamento da relação existente entre a receita própria e a receita total, de acordo com a população municipal. O gráfico exibe adicionalmente, nos pontos em vermelho, a média aritmética da relação estudada. Em todos os grupos de municípios exibidos esta medida estatística situa-se acima da mediana, demonstrando, de certa forma, estar sendo influenciada pelos valores atípicos.


Figura 2
Relação entre receita própria e receita total nos municípios Brasileiros 2019
Fonte. (STN, 2019)

Os municípios com população inferior a 5.000 habitantes apresentam, de fato, um menor índice de sustentabilidade financeira, caso se adote a definição constante na PEC 188/2019. É possível observar, no gráfico, que a quase totalidade dos entes municipais deste grupo situam-se abaixo do patamar de 10%. Poucos municípios colocam-se acima deste índice e, portanto, não correm o risco de serem incorporados por localidades vizinhas, caso a PEC seja aprovada.

Um quadro que, se não é igual aproxima-se bastante aos pequenos municípios, é o apresentado por uma parcela de municípios com mais do que 5.000 habitantes. A grande maioria dos municípios das faixas com população inferior a 20.000 habitantes, em conjunto com boa parte daqueles com população entre 20.000 e 50.000 habitantes, tem a relação entre receita própria e receita total inferior aos 10% estabelecidos pela PEC. Este índice, pelo menos da forma como foi proposto, não se mostra adequado para a identificação de municípios inviáveis financeiramente. Se assim fosse um número superior a 2.500 municípios seriam passíveis de incorporação retornando a um quadro próximo àquele da primeira república.

O gráfico da figura nº 3 propõe uma análise sob um ângulo distinto, embora o objeto seja o mesmo: a receita própria dos municípios. A redução da arrecadação ao nível individual, para cada habitante, mostra os vários grupos de municípios com comportamentos praticamente idênticos. Nas cinco primeiras faixas populacionais, englobando os municípios com menos de 100.000 habitantes, quase todos possuem arrecadação própria per capita inferior a R$ 500,00. A semelhança entre estas distribuições mostra que, na pior das hipóteses, os municípios menores têm o mesmo nível de eficiência arrecadatória que os municípios com maior população. O gráfico aponta, ainda, para a hipótese de que a inferioridade dos pequenos municípios, em se tratando do índice de sustentabilidade financeira, pode ser em decorrência das transferências governamentais que contribuem para a receita total do município. Os volumes destas transferências, quando em valores absolutos, são significativos em relação à pequena arrecadação municipal.


Figura 3
Receita própria por habitante nos municípios Brasileiros 2019
Fonte. (STN, 2019)

As despesas administrativas, necessárias às administrações dos municípios, constituem-se em um contraponto às questões levantadas quando das análises sobre as receitas municipais. Os valores liquidados, relativos ao orçamento de 2019, nas funções Administração e Legislativa, são mostrados no gráfico da figura nº 4, mais uma vez de forma per capita. A primeira constatação é a de que, em todos os grupos de municípios, as despesas com administração são muito maiores que as despesas com a função legislativa. Evidencia-se, desta forma, que o custo com as Câmaras de Vereadores, com exceção, talvez, dos municípios com menos de 10.000 habitantes, é pequeno em relação às despesas administrativas.

Outro ponto evidente no gráfico é o fato de que quanto maior for a população municipal menores serão os custos administrativos e legislativo, se tomados em valores per capita. Neste sentido é verdadeira a premissa de que os pequenos municípios dispendem valores mais elevados que os municípios com população superior a 5.000 habitantes, tanto na administração municipal (função Administração) como na Câmara de Vereadores (função Legislativa). Na função Administração, entretanto, as diferenças são bem mais significativas. Duas breves razões podem ser elencadas para tais comportamentos:

a) As administrações públicas exigem uma estrutura mínima para o seu funcionamento. Além do Prefeito e Vice, definidos na Constituição Federal de 1988, existe a necessidade de oferecimento de serviços à população. O conjunto de recursos, humanos e financeiros, empregados para a execução destes serviços não é proporcional ao tamanho da população.

b) O número de vereadores segue uma escala discreta de acordo com a Constituição Federal de 1988. Qualquer município, com qualquer população terá, ao menos, nove vereadores. Este é o caso do grupo de municípios com menos de 5.000 habitantes. Esta estrutura fixa para a atividade legislativa certamente impulsiona o seu custo por habitante. (BRASIL, 1988)


Figura 4
Despesas administrativas por habitante nos municípios Brasileiros 2019
Fonte. (STN, 2019)

A comparação entre receitas próprias e despesas administrativas, em poucas oportunidades, será favorável nos pequenos municípios, seja empregando seus valores absolutos, seja usando os valores per capita. A observação, simultânea, dos gráficos das figuras 3 e 4 deixa este fato em evidência. Tem-se, por um lado, 75% (ou mais) dos municípios com população menor que 5.000 habitantes com receitas próprias que não atingem R$ 500,00 por habitante. No outro lado, apenas nas despesas da função “Administração” a quase totalidade destes municípios dispendem um valor per capita superior a estes mesmos R$ 500,00.

Os municípios maiores que 5.000 habitantes, por sua vez, também comprometem parte significativa de suas receitas, ou do total de suas despesas, com as suas atividades administrativas e legislativas. As informações disponíveis no Siconfi (STN, 2019) permitem estabelecer a proporção, em percentuais, existentes entre a despesa administrativa dos municípios e suas receitas e despesas totais, e, além de corroborar que este contexto ocorre com maior intensidade nos pequenos municípios, ilustram também que as diferenças para os municípios maiores não são expressivas.

Um exemplo concreto pode ser apresentado a partir da ordenação destas relações, tanto a participação na despesa quanto o comprometimento da receita. A linha demarcatória do primeiro quartil mostra que as despesas administrativas de 75% dos municípios com menos de 5.000 habitantes compreendem, no mínimo, a 17,4% de suas despesas totais enquanto para 75% do grupo de municípios maiores (considerando todas as faixas populacionais) este índice é de 12,6%. A diferença, olhando agora para a receita, é semelhante. 75% dos municípios menores comprometem, no mínimo, 14% de sua receita total. Nos municípios do segundo grupo, 75% deles consomem um valor superior a 10,9% da receita total. Não se pode afirmar, sem análises mais específicas, a significância destas diferenças. Pode-se, todavia, reconhecer que também são valores expressivos.

A análise destas questões por meio de um ponto de vista puramente econômico pode conduzir a encaminhamentos inapropriados, como é o caso específico da PEC 188/2019. É recomendado lembrar que os municípios, todos eles, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, tornaram-se proponentes e executores de políticas e serviços públicos, principalmente na área da saúde e da educação. É fundamental, desta forma, que se observe o papel, principalmente dos pequenos municípios, neste contexto. A próxima seção trata destes, e dos demais, direitos dos cidadãos estabelecidos pela Constituição em vigor.

4 Os municípios, os direitos sociais e o estímulo às atividades econômicas

A definição, pela Constituição Federal de 1988, dos municípios como entes federativos não significou apenas o seu reconhecimento, mas, sobretudo, trouxe consigo um expressivo acréscimo de autonomia política, financeira e administrativa. Esta autonomia acarreta, além de maior liberdade para auto-organização, um conjunto mais amplo de responsabilidades, traduzidas em novas competências e atribuições. Dentre estas incumbências está a formulação e implementação de políticas que resultem no oferecimento de bens e serviços públicos aos cidadãos e que, de forma prática e concreta, traduzem-se nos direitos sociais referenciados no artigo sexto da Constituição (BRASIL, 1988).

Alguns pesquisadores, ao estudarem emancipações distritais, dedicaram atenção à efetividade dos pequenos municípios em relação aos avanços sociais nestas localidades. Souza (2018, p. 109), ao abordar esta questão, é enfático ao dizer que “a emancipação proporcionou avanços e contribuiu para o desenvolvimento local em vários pequenos municípios brasileiros”. Em outro trabalho, Klering, Kruel e Stranz analisam indicadores de gestão, os quais

evidenciam que a descentralização da administração pública tem efeitos bastante positivos na melhoria da performance ou qualidade de gestão dos municípios. Pode-se confirmar assim que ser pequeno é interessante e estratégico, em termos de melhoria da qualidade de vida, especialmente para as populações locais diretamente interessadas em resolverem suas necessidades, como para os respectivos estados e mesmo para o Brasil, sendo que todos saem obtendo vantagens. (KLERING; KRUEL; STRANZ, 2012, p. 42)

A atenção que os municípios dedicam ao conjunto de direitos sociais estabelecidos na Carta Magna pode ser medida de diversas formas. Este trabalho empregou, a partir da base de dados Finbra (STN, 2019), as despesas liquidadas por função orçamentária. Embora nem todas as funções orçamentárias relacionem-se diretamente a estes direitos, algumas podem ser tomadas como proxies de forma a permitir o estudo em questão. Assim, das 28 funções orçamentárias previstas para as despesas municipais, nove funções foram analisadas: Assistência Social, Desporto e Lazer, Educação, Habitação, Saneamento, Saúde, Segurança Pública, Trabalho e Transporte. As duas principais, saúde e educação, estão expostas no gráfico da figura nº 5, o qual apresenta a distribuição percentil para cada uma das cinco faixas populacionais estabelecidas.


Figura 5
Despesas em saúde e educação por habitante nos municípios Brasileiros 2019
Fonte. (STN, 2019)

É possível visualizar, nas duas funções orçamentárias, que os maiores valores per capita são dispendidos por municípios com menor população, especialmente àqueles com menos de 5.000 habitantes. Não se pode estabelecer uma regra geral em função de que existem muitas sobreposições, mas a aparência de escada, no gráfico, em conjunto com um possível agrupamento de duas ou mais faixas populacionais, indicam uma maior preocupação dos pequenos municípios tanto em educação quanto no atendimento à saúde.

Em educação nenhuma das faixas populacionais se destaca completamente das que as seguem. Embora a aparência do gráfico indique uma supremacia dos municípios menores é necessário levar em consideração que o inverso também é verdadeiro, isto é, muitos municípios com população maior investem mais em educação, em valores per capita, que localidades com menos habitantes.

As despesas em saúde, no gráfico, chamam a atenção para três pontos significativos. Em primeiro lugar um desgarramento dos municípios com população inferior a 5.000 habitantes de modo que, em quase sua totalidade, apresentam valores por habitante superior a qualquer outra faixa populacional. Exibe também, para as demais faixas, o mesmo comportamento visto quando dos investimentos em educação, isto é, as diferenças entre os grupos populacionais não são evidentes. Por último pode-se verificar um comportamento diferente dos municípios maiores, principalmente àqueles com população superior a 50.000 habitantes. Nestas faixas populacionais há uma inversão na tendência de queda nos investimentos em saúde por habitante.

Tabela 3
Distribuição de municípios por função orçamentária de natureza social, grupos de investimentos e faixas populacionais - Brasil - 2019

Fonte. (STN, 2019) * Os números correspondem ao número de municípios em cada um dos quartis na respectiva função orçamentária.

A tabela nº 3 apresenta as medidas separatrizes4, identificadas como quartis, referentes ao emprego de recursos municipais, em valores per capita, em cada uma das nove funções orçamentárias adotadas para análise do atendimento dos direitos sociais definidos na Constituição Federal. O quartil 1, na tabela, representa o grupo de municípios que menos dispenderam valores em cada função orçamentária, enquanto o quartil número 4 engloba aqueles que mais empregaram seus recursos.

Os dados referentes à educação e saúde ratificam e complementam a impressão obtida quando da análise do gráfico da figura nº 5. Em educação quase metade dos municípios que se localizam no quarto quartil, isto é, dos que mais aplicam recursos, possuem menos que 5.000 habitantes e quase 20% estão na faixa populacional seguinte, com população inferior à 10.000 pessoas. No primeiro quartil, daqueles que menos investem, por habitante, em educação apenas 5%, aproximadamente, são classificados como pequenos municípios. Na saúde os municípios menores se destacam de maneira ainda mais acentuada. No último quartil mais de 80% dos municípios integrantes possuem menos de 10.000 habitantes ressaltando que a quase totalidade destes são da primeira faixa populacional, com menos de 5.000. Estes mesmos municípios, no primeiro quartil, compõe menos de 1% do total. O grupo municipal seguinte, entre 5.000 e 10.000 pessoas, compreende pouco mais de 10% dos integrantes deste quartil, indicando que nas três faixas populacionais que restam estão localizados a grande maioria das localidades que menos concentram recursos orçamentários na área da saúde.

As demais sete funções orçamentárias apresentam modelos diversos. O primeiro deles é que em apenas uma das funções, Segurança Pública, os municípios com mais de 50.000 habitantes, no seu conjunto, dispendem valores superiores aos demais grupos de municípios. Em outras funções o padrão verificado em educação e saúde onde os pequenos municípios se destacam por investimentos maiores se repete, como é o caso da Assistência Social, Desporto e Lazer, Transporte, Habitação e Trabalho. Nas três primeiras, adicionalmente, são verificados poucos municípios maiores que 50.000 habitantes entre aqueles que mais aplicam seus recursos financeiros. Por fim, entre os municípios que menos aplicam recursos nestas áreas, identificados no primeiro quartil, pode-se observar uma distribuição semelhante entre os diversos grupos populacionais onde nenhum deles destaca-se em relação aos outros.

O desempenho dos municípios com menor número de habitantes, nestas funções orçamentárias que retratam o atendimento aos direitos sociais dos cidadãos preconizados na Constituição Federal, é amplamente superior aos demais municípios. Em algumas delas, como a saúde e educação, onde o ordenamento legal determina parâmetros mínimos de investimentos para todos os entes federativos esta ascendência é ainda mais significativa.

Os municípios dedicam parcelas de seus orçamentos em áreas onde a legislação, de forma explicita, não os obriga, mas são vistos como importantes para o desenvolvimento local. São os casos, dentre outros, dos incentivos concedidos à agricultura, indústria, energia e comércio e serviços. Assim, além das questões sociais, os municípios têm desempenhado importante papel na promoção do desenvolvimento econômico, embora não se verifiquem, costumeiramente, transferências de recursos dos níveis estaduais e federal de governo para estas funções específicas. Os municípios, deste modo, para o alargamento das atividades comerciais, industriais ou agropecuárias, têm empregado recursos próprios ou, eventualmente, resultantes do apoio de parlamentares, pelo emprego de emendas ao orçamento da República (DEGENHART; VOGT; ZONATTO, 2016; KLERING et al., 2011; SIMÕES, 2004).

A Agricultura, para os municípios menores representa um novo destaque. A grande maioria dos pequenos municípios investem mais recursos, por habitante, nesta função. É também natural que isto aconteça pois, como mostra o mapa da figura nº 1, os pequenos municípios, na sua maior parte, localizam-se no interior Brasileiro e tem na agricultura o motor de suas atividades econômicas (SILVA NETO; FRANTZ, 2003). De qualquer forma os valores dispendidos pelos municípios menores são significativamente superiores aos dos outros grupos de municípios. A tabela nº4, construída nos mesmos moldes da anterior, deixa este fato em evidência. Os grandes municípios, consequentemente, quase não são percebidos entre os que mais atuam nesta área.

Tabela 4
Distribuição de municípios por função orçamentária de natureza econômica, grupos de investimentos e faixas populacionais - Brasil - 2019

Fonte. (STN, 2019) * Os números correspondem ao número de municípios em cada um dos quartis na respectiva função orçamentária.

Nas despesas relacionadas às funções de energia e indústria também são maioria entre os que mais empregam recursos. No primeiro caso os municípios com população inferior a 5.000 habitantes representam mais de 35% do conjunto e, quando incorporada a faixa populacional seguinte, esta proporção ultrapassa os 55%. Na indústria estes números são ainda mais expressivos pois apenas a primeira faixa populacional responde por quase 45% do todo. É importante salientar que nestas duas funções orçamentárias os municípios maiores, com população superior a 50.000 habitantes, representam as menores parcelas. Finalmente, nos investimentos municipais relacionados ao comércio não se pode vislumbrar nenhum grupo de municípios que se destaque dos demais pois, nos dois quartis apresentados, há um razoável equilíbrio.

5 Considerações finais

Este trabalho procurou desconstruir a ideia, preconcebida, de que os pequenos municípios, notadamente aqueles cuja população é inferior a 5.000 habitantes, são inviáveis e, como propõe a PEC 188/2019, devem ser incorporados por outros com maior capacidade financeira. Este prejulgamento, de parte de diversos atores, leva em consideração apenas o resultado aritmético de sua capacidade de arrecadação tributária. Deixam de considerar, por outro lado, o papel fundamental de promotores e executores de políticas públicas.

O Brasil contava, de acordo com as estimativas para o ano de 2019, 1.253 municípios com menos de 5.000 habitantes e 4.317 com população igual ou superior a este parâmetro. A PEC estabeleceu, como critério adicional, que estes municípios menores, de forma a continuarem existindo, apresentassem um índice de sustentabilidade financeira igual ou superior a 10%. Assim, em um passe de mágica, mais de 1.000 municípios deixariam de existir. Tudo isto sem uma investigação mais profunda da atuação de cada município, até mesmo daqueles que exibem uma população maior.

É correto afirmar que pouquíssimos municípios do grupo com menor população ultrapassariam o limite de 10% na relação entre receita própria e receita total. Ocorre, todavia, o mesmo fenômeno com os de maior população. Esta questão envolvendo o quanto cada município consegue arrecadar obedece a uma lógica puramente econômica, como se os municípios fossem entidades regidas por um padrão puramente comercial. A Constituição Federal, entretanto, atribui aos municípios, ao descentralizar as funções do Estado, um considerável conjunto de responsabilidades.

As administrações dos pequenos municípios, é certo, pesam mais em seus orçamentos do que os do grupo oposto. É preciso notar, contudo, que isto é uma verdade quase que inconteste apenas se forem considerados em valores absolutos. Com a execução orçamentária a nível de habitante este fato deixa de ser tão simplista pois também se verifica nos maiores municípios. Assim o custo administrativo, englobando os poderes executivo e legislativo, não pode ser um parâmetro de avaliação único.

É evidente que, mais uma vez em valores absolutos, os municípios menores possuem orçamentos mais reduzidos o que lhes impedem de realizar grandes investimentos. Estão, por outro lado, mais próximos dos cidadãos e o pouco que têm o transferem de forma mais eficiente para cada um de seus moradores. Os denominados direitos sociais, explícitos na Constituição Federal, retratados por meio de funções orçamentárias equivalentes, mostram perfeitamente uma melhor distribuição dos recursos públicos disponíveis nos municípios.

Os pequenos municípios, ainda, executam suas funções como promotores e indutores do desenvolvimento local. Em algumas áreas, como a agricultura por exemplo, são muito mais incisivos. Em outras, como a indústria, comércio, serviços, energia e ciência e tecnologia também superam os municípios com maior população mesmo que esta superioridade seja menos impactante.

É possível que o saldo da equação receita própria menos despesas administrativas, nos pequenos municípios, seja negativo. De outro lado estes municípios transferem os recursos existentes, próprios ou recebidos de outras esferas governamentais, em níveis mais elevados para cada um de seus habitantes. Mesmo que esta conta esteja no vermelho existem maiores investimentos aos cidadãos municipais.

Pode-se questionar o fato de que estas afirmações estão baseadas em valores gastos pelos municípios e de forma per capita. Pode-se argumentar que os municípios não empregam adequadamente seus recursos. É preciso notar, contudo, que estas alegações devem valer para todos, pequenos e grandes municípios. A intenção de condenar os pequenos municípios precisa ser fundamentada de forma mais categórica. Corre-se o risco, entretanto, de chamar a atenção para problemas muito maiores, não localizados, necessariamente, nos municípios com menor população.

Este trabalho empregou, como ponto de corte, o limite de 5.000 habitante para a diferenciação dos pequenos municípios. Isto foi decorrência, pura e simples, do parâmetro apontado na PEC188/2019. Não existem elemento que possibilitem inferir o contrário para uma localidade com 5.001 moradores. Parâmetros numéricos, e discretos, nem sempre são adequados para a tomada de decisões, ainda mais complexas e importantes como a extinção de municípios.

REFERÊNCIAS

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Notas

1 Cigolini cita, em seu artigo, trabalhos desenvolvidos por Breameker (1992), Mello (1992) e Noronha (1997). Souza e Nunes referem-se aos trabalhos realizados por Breameker.
2 Os municípios com população superior a 50.000 habitantes foram incluídos em uma única faixa em função de que o objetivo principal do trabalho é a observação dos pequenos municípios bem como a necessidade de que as diversas faixas populacionais não contenham um número de municípios discrepantes entre si.
3 O centroide corresponde a um ponto cujas coordenadas são as médias das coordenadas dos pontos que formam uma figura geométrica ou, ainda, o centro geométrico de uma figura (MICHAELIS, 2020).
4 Medidas separatrizes, no caso específico os quartis, são determinados pela ordenação crescente dos valores em estudo e, este rol, separados em quatro partes contendo o mesmo número de observações. A medida referente ao primeiro quartil identifica que 25% dos integrantes da população estudada, ou amostra, apresentam valores inferiores a um determinado valor (do quartil) e, consequentemente, 75% exibem valores superiores à medida correspondente.


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