Resumo: Compreender o comportamento dos consumidores frente à oferta de produtos orgânicos possibilita conhecer os desafios que podem ser enfrentados por políticas públicas, as estratégias de comercialização pelas empresas e oportunidades que o mercado oferece para o crescimento dessa cadeia produtiva. O objetivo da pesquisa consistiu em investigar os determinantes da disposição dos consumidores a pagar um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos no município de São Lourenço do Oeste – SC. O Método aplicado é o de valoração contingente utilizando os modelos de regressão binários: MPL, logit e probit. Para obter as variáveis para a pesquisa foram aplicados questionários aos consumidores. Os resultados indicaram que alguns fatores aumentam a disposição a pagar por produtos orgânicos, como a idade e a escolaridade, enquanto algumas variáveis contribuem para reduzir a disposição a pagar por esses produtos, como a falta de informação sobre os orgânicos e os altos preços ou renda insuficiente. Ações públicas multisetoriais podem contribuir para melhorar diversos aspectos da cadeia produtiva dos orgânicos, aumentando assim sua produção e o consumo.
Palavras-chave: Método de valoração contingente, Produtos alternativos, Probit, Logit.
Abstract: Understanding the behavior of consumers when offering organic products makes it possible to understand the challenges that may be faced by public policies, the marketing strategies of companies and the opportunities that the market offers for the growth of this production chain. The objective of the research was to investigate the determinants of consumers' willingness to pay a higher price for organic fruits and vegetables in the municipality of São Lourenço do Oeste in the State of Santa Catarina. The method applied is the contingent valuation using binary regression models: MPL, logit and probit. To obtain the variables for the research, questionnaires were applied to consumers. The results indicated that some factors increase the willingness to pay for organic products, such as age and education, while some variables contribute to reduce the willingness to pay for these products, such as lack of information about organic products and high prices or income insufficient. Multisectoral public actions can contribute to improving various aspects of the organic production chain, thus increasing production and consumption.
Keywords: Contingent valuation method, Alternative products, Probit, Logit.
Resumen: Entender el comportamiento de los consumidores al ofrecer productos orgánicos permite comprender los desafíos que pueden enfrentar las políticas públicas, las estrategias de marketing de las empresas y las oportunidades que ofrece el mercado para el crecimiento de esta cadena productiva. El objetivo de la investigación fue investigar los determinantes de la disposición de los consumidores a pagar un precio más alto por frutas y verduras orgánicas en el municipio de São Lourenço do Oeste en el estado de Santa Catarina. El método aplicado es el de valoración contingente utilizando los modelos de regresión binaria: MPL, logit y probit. Para obtener las variables para la investigación se aplicaron cuestionarios a los consumidores. Los resultados indicaron que algunos factores aumentan la disposición a pagar por productos orgánicos, como la edad y la educación, mientras que algunas variables contribuyen a reducir la disposición a pagar por estos productos, como la falta de información sobre los productos orgánicos y los altos precios o ingresos insuficientes. Las acciones públicas multisectoriales pueden contribuir a mejorar varios aspectos de la cadena productiva orgánica, aumentando así la producción y el consumo.
Palabras clave: Método de valoración contingente, Productos alternativos, Probit, Logit.
Artigos
Disposição a pagar por produtos orgânicos: estudo para um município catarinense
Willing to pay for organic products: study for a municipality in the state of Santa Catarina
Dispuestos a pagar por productos orgánicos: estudio para un municipio del estado de Santa Catarina
Recepción: 06 Octubre 2021
Aprobación: 24 Marzo 2023
O sistema de produção orgânico busca melhorar a qualidade de vida do produtor e do consumidor, com base na sustentabilidade ambiental e social. Assim, é importante para esse tipo de produto, que seu processo produtivo seja ecologicamente sustentável, viável economicamente e integrado socialmente com práticas de bem-estar humano e ambiental. O mercado mundial de produtos orgânicos segue uma tendência de crescimento principalmente pelas mudanças de hábitos e conscientização dos indivíduos com relação à vida saudável e segura e menores impactos sociais e ambientais (TERRAZZAN; VALARINI, 2009).
As vendas de produtos orgânicos no mundo cresceram mais de 500% no período de 2000 a 2017, abrangendo aproximadamente 69,8 milhões de hectares de terras agricultáveis, sendo 10% apenas na América Latina (LIMA et al., 2020).
No Brasil, a área agrícola ocupada pela produção orgânica ultrapassou 1,13 milhão de hectares em 2017, representando 0,4% da área agricultável total brasileira contando com mais de 15 mil produtores (LIMA et al., 2020).
De acordo com Willer e Lernoud (2018), o Brasil constitui o maior mercado consumidor de produtos orgânicos da América Latina, sendo o terceiro com maior área de produção. A produção brasileira de orgânicos possui uma orientação de atendimento à crescente demanda interna e as compras institucionais para a alimentação escolar e para os serviços de alimentação de órgãos governamentais contribui fortemente para isso.
A agricultura orgânica é uma opção viável para a inserção dos pequenos agricultores no mercado, pois exige baixa dependência de insumos externos de alto valor e maior facilidade de manejo, além de possibilitar a diversificação. A diversificação reduz os riscos dos pequenos proprietários e garante renda estabilizada durante todo o ano. A agricultura familiar respondeu por 76% dos estabelecimentos com produção da agricultura ou pecuária orgânica brasileira em 2017 (IBGE, 2017). A agricultura orgânica se consolida também como estratégia de desenvolvimento rural ao gerar alternativas ao êxodo rural, inserir as mulheres na atividade e empoderá-las, pela geração de renda e redução da pobreza rural e melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores (CAUMO; STADUTO, 2014).
O processo produtivo dos orgânicos pode implicar em um valor final superior ao dos produtos não sustentáveis. Essa diferença de valores leva à necessidade de conhecer quais são os fatores que fazem com que os consumidores optem por pagarem mais para adquirir esses produtos. A disposição por pagar um valor superior representa uma tomada de decisão do comprador e está relacionada ao valor percebido e a satisfação. A disposição a pagar tem sido amplamente utilizada para compreender o comportamento de compra de produtos sustentáveis, sendo uma métrica que expressa quantitativamente a tomada de decisão (RAASCH; DE SOUSA JÚNIOR; DA ROCHA, 2021).
Nesse sentido, a questão norteadora desta pesquisa é: o que determina que o consumidor tenha disposição a pagar mais por frutas, verduras e legumes orgânicos? Assim, o objetivo é investigar os determinantes da disposição dos consumidores a pagar um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos no município de São Lourenço do Oeste – SC, utilizando o método de Valoração Contingente, o qual é realizado capturando informações por meio de pesquisas diretamente com os consumidores desses produtos.
Compreender as relações de mercado dos produtos orgânicos possibilita reflexões acerca do bem-estar humano e ambiental, importantes para a sustentabilidade da presente e futura geração. Entender o comportamento dos consumidores frente à oferta de produtos alternativos, como os orgânicos, favorece a compreensão sobre as motivações no consumo desses produtos, os desafios que podem ser enfrentados por políticas e a oportunidades que o mercado oferece para o crescimento dessa cadeia produtiva.
Quando as empresas não conhecem a real disposição de pagar de seus clientes, fica impossibilitada uma criação de estratégias de preços adequada, correndo o risco de ignorar fatores determinantes para os clientes. Saber a disposição a pagar dos clientes é fundamental também para as estratégias de marketing e ao desenvolvimento de novos produtos e serviços (RAASCH; DE SOUSA JÚNIOR; DA ROCHA, 2021).
Este trabalho está dividido em cinco seções, inclusa esta introdução. A segunda seção propõe uma breve discussão sobre os desafios e potenciais do mercado de orgânicos brasileiro, a terceira seção expõe a metodologia, a quarta seção apresenta os resultados e discussões e as considerações finais do estudo encontram-se na seção cinco.
O mercado de orgânicos ganhou ênfase a partir da preocupação das famílias com a qualidade da alimentação e o reconhecimento de que alimentos orgânicos contribuem com a saúde e a qualidade de vida das pessoas. Sendo assim, grande parte dos indivíduos opta pelo consumo de produtos orgânicos quando possuem condições financeiras suficientes para isso. É um mercado em ascensão em todo o mundo, especialmente nos países mais ricos, levando em consideração que os produtos orgânicos possuem preços, em geral, maiores que produtos convencionais (TERRAZZAN; VALARINI, 2009).
No Brasil, a discussão e implementação de propostas consideradas alternativas, opostas ao padrão da Revolução Verde, destacou-se a partir da década de 1970, contudo não houve incentivos públicos para tal. Mesmo com avanços teóricos e práticos nas duas décadas seguintes, os métodos sustentáveis de produção de alimentos entram nas agendas de políticas públicas efetivamente após os anos 2000 (RESENDE; RESENDE JÚNIOR, 2011).
O debate acerca do tema relacionado à produção orgânica culminou com a primeira Instrução Normativa referente à produção orgânica, nº 07/1999 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que foi revogada pela Instrução Normativa nº 64/2008 e, em seu artigo 10º, passa a definir que, “Para que um produto receba a denominação de orgânico, deverá ser proveniente de um sistema de produção onde tenham sido aplicados os princípios e normas estabelecidos na regulamentação da produção orgânica [...]”. Esses princípios e normas são também definidos pela mesma Instrução Normativa, que pontua requisitos gerais dos sistemas orgânicos de produção, que devem buscar a preservação de recursos ambientais, a valorização de aspectos culturais e regionais, as relações de trabalho legais e a melhoria da qualidade de vida de todos os agentes envolvidos na cadeia de produção (BRASIL, 2008).
O mercado de produtos orgânicos no Brasil apresenta fragilidades que são discutidas e estudadas a fim de promover melhorias na cadeia de produção e comercialização. Terrazzan e Valarini (2009), Neto et al. (2010), Barbosa e Souza (2012) e Padua-Gomes, Gomes e Padovan (2016) discutem e apontam diversos fatores como desafios da produção orgânica, destacando-se: a falta de assistência técnica pública; dificuldade de acesso ao crédito; os custos na conversão da produção convencional para a orgânica; os custos com a certificação permanente; falta de pesquisa e investimento em tecnologias destinadas à produção orgânica; escassez de informações para os consumidores; ausência de dados referentes ao mercado; utilização do mesmo canal convencional para comercialização dos orgânicos; demanda superior à oferta; constância na oferta dos produtos; corporações e empresas convencionais ocupando o espaço da produção orgânica; difícil acesso dos compradores pelo valor agregado maior; dificuldade em aumentar a produção por área; custos com burocracia; e a falta de incentivo governamental como um todo.
Por outro lado, as potencialidades do mercado brasileiro de orgânicos é nítida, Khatounian (2001), Fonseca e Medaets (2005), Schultz (2007), Barbosa e Souza (2012) e Ferreira et al. (2016) apontam como fatores potenciais: a eliminação no custo com insumos químicos; o aumento da demanda por alimentos com qualidade; a preocupação com aspectos ambientais e sociais na cadeia de produção dos alimentos; a necessidade menor de espaço territorial para produzir valor agregado maior; menor dependência de insumos externos; vantagens da diversificação da produção que proporcionam mais estabilidade frente a instabilidades do mercado; em ambiente macronacional, contribui com a geração de empregos e geração de renda para agricultores marginalizados; a tendência internacional de consumo consciente e sustentabilidade ambiental, além da segurança alimentar e social; e a possibilidade de aumentar a produção animal com práticas orgânicas e agroecológicas que ainda é pouco explorada no Brasil.
Nesse sentido, Aquino, Gazolla e Schneider (2017) discutem que as políticas públicas destinadas à agropecuária agroecológica no Brasil, como as políticas de crédito e extensão rural, são defasadas em relação a outros países. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, por exemplo, criado em meados da década de 1990, passou a atender linhas de crédito específicas para agroecologia a partir de 2005/2006 e ainda conta com valores considerados baixos. Além disso, em 2013 foi lançado o primeiro Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – PLANAPO (2013-2015), com objetivo de ampliar e fortalecer a produção orgânica e agroecológica, dando prioridade para agricultores familiares. O Plano foi reavaliado e relançado para o período 2016-2019. Desde 2019 até o presente momento (2021), ainda não foi lançado um novo plano. Os autores indicam que os recursos são insuficientes, assim como o aplicação de programas e políticas governamentais. O governo poderia efetivar suas práticas com políticas de desenvolvimento sustentável, a qual inclui a produção orgânica, dentro de um planejamento abrangente.
A valoração de ativos ambientais tem por objetivo indicar o preço de um recurso ambiental, para que seja possível utilizar esses valores na determinação de políticas que incluam a conservação do ambiente paralelamente à sua utilização para as necessidades econômicas (LIMA; SILVA, 2004). Similar a esta definição, Silva (2003) descreve a importância da valoração ambiental, que consiste em criar um valor de referência para o uso racional dos recursos ambientais. A valoração é essencial para fornecer informação tanto para o setor público como privado, com relação ao valor que as pessoas atribuem a determinados bens e como isso poderia afetar o bem-estar da população.
O método de valoração contingente, como indicam Lima e Silva (2004), é realizado capturando informações por meio de pesquisas diretamente com indivíduos afetados pelo recurso ambiental do estudo. Por meio do método é possível captar a disposição a pagar (DAP) das pessoas por determinado bem, levando em consideração que existem diferentes preferências por esses bens e que isso depende de inúmeros fatores.
O método de valoração contingente contribui para conciliar a preservação dos recursos ambientais com o crescimento da economia, de modo mais sustentável. A sustentabilidade ambiental se encontra nas agendas governamentais, contudo, muitas vezes é considerada um entrave para o crescimento econômico. Nesse sentido, estimar o valor da DAP por produtos ambientais ou que não agridem o meio ambiente, é uma forma de estimular a economia sem comprometer o bem-estar ambiental no longo prazo (SERRA et al., 2004).
Há inúmeras maneiras de se estimar a DAP dos consumidores por determinados produtos. No caso da presente pesquisa, o intuito é avaliar a DAP por produtos orgânicos. Os produtos orgânicos já possuem um mercado, contudo, dependendo de inúmeros fatores, o valor atribuído a esses produtos são diferentes, variando de indivíduo para indivíduo.
Neste estudo foram aplicados questionários como um dos procedimentos do método de valoração contingente para alcançar o objetivo de investigar os determinantes da disposição a pagar por frutas, verduras e legumes orgânicos em São Lourenço do Oeste – SC.
São Lourenço do Oeste é um município com população estimada para 2020 de 24.291 pessoas. O municípios fica localizado ao Sul do Brasil, no Estado de Santa Catarina, na mesorregião Oeste e faz divisa ao norte com o Estado do Paraná, especificamente com o município de Vitorino, cuja população estimada para 2020 é de 6.859 pessoas (IBGE, 2020).
O questionário aplicado passou por pré-teste com 3 pesquisadores e ficou disponível de forma online para respostas no período de 15 de abril a 15 de maio de 2021. A divulgação do questionário foi feita pelas redes sociais, através do WhatsApp, Facebook e Instagram. Não se procedeu com aplicação dos questionários de forma presencial em virtude das restrições sanitárias em decorrência da pandemia da Covid-19.
Como o questionário foi aplicado de forma online, foi necessário aplicar alguns filtros. Foi mantido apenas respostas com informações válidas para a idade, também foi mantido apenas os respondentes da cidade de São Lourenço do Oeste pertencente ao estado de Santa Catarina e respondentes do bairro Araucária Park da cidade de Vitorino, pertencente ao estado do Paraná, devido ao grande número de respondentes desse local. Esse bairro faz divisa com o perímetro urbano de São Lourenço do Oeste, fica mais próximo ao centro urbano catarinense do que paranaense e muitos residentes deste bairro são antigos moradores do perímetro urbano catarinense e desta forma, assume-se que eles possam continuar a consumir produtos em São Lourenço do Oeste.
Outros filtros aplicados para não enviesar a análise foram: se o respondente informou ser o responsável pelas compras de alimentos, principalmente frutas, verduras e legumes na sua residência; se na residência se consome frutas, verduras e legumes; e se o respondente conhece a definição de produtos orgânicos. Esses filtros foram aplicados com a premissa que, se o respondente não é o responsável pelas compras, ele não tem conhecimento dos preços ou até da existência ou não de diferença de preços entre orgânicos e não orgânicos. Além disso, se na residência não se consome frutas, verduras e legumes, automaticamente essa pessoa não estaria disposta a pagar mais por frutas, verduras e legumes orgânicos. A opção por retirar as pessoas que não conhecem a definição de orgânicos também se julgou importante para captar a realidade da disposição a pagar por orgânicos. A amostra final foi de 204 respondentes, sendo 19 respondentes de Vitorino – PR. Dessa forma se caracteriza que a amostra foi por acessibilidade ou conveniência conforme aponta Gil (2008).
Através do questionário aplicado foi possível construir as variáveis apresentadas no Quadro 1.
A escolha das perguntas para formar o questionário foi baseado em diversos estudos anteriores sobre o tema. Arguir sobre o perfil socioeconômico (idade, sexo, renda, estado civil, entre outras) é muito comum e imprescindível para esse tipo de análise, pois com essas questões pode-se encontrar padrões de consumidores. Além disso, o conhecimento sobre o comportamento do consumidor é uma ferramenta para empresas e governo que permite desenvolver mecanismos para estimular ou desestimular o comportamento dentro da sociedade. Em outras palavras, com esse conhecimento é possível elaborar estratégias mercadológicas e identificar oportunidades de mercado (DUARTE, 2016).
A pergunta relacionada ao responsável pelas compras da residência foi baseada em Corrêa (2016), que também incluiu perguntas relacionadas ao perfil socioeconômico. O questionamento sobre qual a definição de produtos orgânicos para medir o conhecimento sobre orgânicos foi baseado em Raposo (2018).
Silva (2015), Barros (2018) e Raposo (2018) também apresentaram questões relacionadas ao perfil socioeconômico. Com base nesses autores foram incluídas também questões relacionados à frequência do consumo de frutas, verduras e legumes orgânicos.
Também com base em Silva (2015) foi incluído um questionamento a respeito da facilidade em encontrar os produtos orgânicos. Essa variável foi incluída para verificar um outro determinante importante, acima de tudo dentro do mercado de orgânicos, que se refere a sua oferta no mercado, que influencia o preço, pois produtos mais escassos ou mais difíceis de serem produzidos possuem maior adicional de preço.
A influência do preço na disposição a pagar por orgânicos foi incluída através da variável motivos econômicos, onde o respondente informava os motivos que poderiam desestimular o consumo de orgânicos. Conforme aponta Mendes (2006), o preço é uma variável importante na decisão de comprar, e se espera que o sinal dessa variável seja negativa, ou seja, quanto maior o preço dos produtos orgânicos, menos dispostos a consumir são os respondentes.
A variável grupo de risco foi construída com base em Mendes (2006) com objetivo de verificar o caráter altruísta do consumidor, que não só estaria interessado em maximizar a sua utilidade com base apenas nos bens/serviços que ele consome, mas também nos efeitos que esses bens/serviços possam ter sobre o bem-estar de terceiros. Pessoas com essas características seriam mais vulneráveis aos efeitos dos problemas dos agrotóxicos na alimentação. A variável atitude e percepção de risco também foi baseado em Mendes (2006).
A variável grupo de risco tem relação se o respondente reside com pessoa com câncer. Em virtude da importância da discussão na literatura dos agrotóxicos como causadores de câncer se optou por questionar se o respondente já teve ou tem familiar com câncer, este podendo não residir com o respondente. Dessa forma pessoas com esse histórico estariam mais propensas a ter DAP maior em virtude desse conhecimento prévio e sensibilidade a este risco.
Segundo Raposo (2018), as principais motivações para o consumo de alimentos orgânicos são a preocupação com a saúde e cuidado com meio ambiente. Dessa forma os respondentes foram questionados se trabalham na área da saúde, pois trabalhando nessa área, pressupõe-se que estão mais propensos a conhecerem os benefícios de alimentos saudáveis. Ainda nesse sentido, baseado em Silva (2015), Brandão (2016) e Barros (2018), consumir pela preocupação com saúde, meio ambiente e para incentivar os produtores, foram incluídos.
No mercado de orgânicos existem alguns problemas, entre eles está a assimetria de informações, pois a qualidade orgânica não é observável, nem mesmo após o consumo. Dessa forma, muitas vezes somente o produtor ou quem comercializa tem essa informação, ficando o consumidor refém do que é anunciado, onde pode surgir outro problema, o oportunismo. Para enfrentar esses problemas surge a questão da certificação dos orgânicos, em que o objetivo é alcançar a confiança do consumidor e atestar a conformidade dos produtos orgânicos nos padrões exigidos. A certificação é controlada por agentes externos e esse agente externo precisa ser devidamente autorizado para auditar. Para os produtores a certificação pode representar oportunidades de ganho. Porém isso exige maior custo de produção (SOUZA; BATISTA; CÉSAR, 2019).
No questionário foi incluída uma pergunta se a falta de certificação poderia ser um impeditivo para o não consumo de orgânicos, baseado em Raposo (2018). No mesmo sentido, a variável teste/governo foi incluída para captar a preocupação com a segurança do alimento para os consumidores e na confiança dada ao governo para desempenhar o papel de certificador, conforme Mendes (2006) utilizou.
Segundo Corrêa (2016), relacionado à certificação, possuem importância os rótulos dos alimentos e a credibilidade das informações contidas neles. Como as informações sobre a certificação geralmente estão nos rótulos, foi questionado se os respondentes têm o hábito de lê-los.
Buscando investigar outros impeditivos para o consumo de orgânicos foram incluídas questões básicas relacionado ao marketing, como marcas e embalagens que podem subsidiar as decisões de produtores e comerciantes e as questões relacionadas aos hábitos e conhecimento desses produtos que podem subsidiar ações de políticas públicas. Essas questões foram adicionadas também baseadas em Cunha (2006), Corrêa (2016), Brandão (2016) e Barros (2018).
A variável dependente da pesquisa será binária (se o consumidor está disposto ou não a pagar um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos) e para esse formato de regressão qualitativa, Gujarati e Porter (2011) informam que há desafios na sua estimação e interpretação. Por esse motivo é necessário especificar e conhecer os modelos de regressão com variáveis dependentes qualitativas. Nesse caso, o objetivo é encontrar a probabilidade de determinada variável acontecer, ou seja, a probabilidade dos respondentes pagarem um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos. Para os dados obtidos pelo questionário aplicado, serão testados três modelos de regressões com variáveis dependentes binárias: o Modelo de probabilidade linear (MPL); o modelo logit; e o modelo probit. Eles serão especificados com base nas obras de Gujarati e Porter (2011) e Hill, Griffiths e Judge (2003).
O MPL é similar à regressão linear, contudo, a variável dependente é binária, assim, a variável dependente expressa uma probabilidade condicional do evento ocorrer dadas as variável independentes. Logo, a soma das probabilidades de ocorrer (Pi) ou não (1 - Pi) o evento é igual a 1. A probabilidade condicional pode ser expressa pela esperança matemática E(Yi|Xi) = β1 + β2Xi, e considerando a probabilidade de ocorrer (1) ou não (0) o evento, pode-se expressar a esperança em termos de E(Yi) = 0(1 - Pi) + 1(Pi) = Pi. Isso corresponde a dizer que: E(Yi|Xi) = β1 + β2Xi = Pi.
A partir disso, a probabilidade de Pi deve respeitar a restrição 0 ≤ E(Yi|Xi) ≤ 1, ou seja, a probabilidade condicional deve estar em 0 e 1.
Alguns problemas da estimação do MPL é que não há normalidade do termo de erro, além do termo de erro ser heterocedástico. Para o primeiro problema pode-se pressupor que eles sejam normalmente distribuídos para amostras grandes, apesar desse problema não afetar as estimativas pontuais por Mínimos Quadrados Ordinários (MQO) que continuam não tendenciosas mesmo para amostras pequenas. Para o segundo problema, o fato dos erros serem heterocedásticos faz com que os estimadores por MQO não sejam eficientes. Contudo, isso pode ser contornado usando Mínimos Quadrados Ponderados (MQP). Gujarati e Porter (2011) indicam ainda, que o coeficiente de determinação R2 também não se adequada para modelos com variável dependente qualitativa pelo fato que os valores dicotômicos (0,1) não se ajustam bem a um gráfico de dispersão e se encontram sempre dentro da faixa lógica 0-1.
Outro problema dessa estimação é que se admite a possibilidade da variável dependente estimada estar fora da faixa entre 0 e 1, não respeitando a restrição 0 ≤ E(Yi|Xi) ≤ 1. Isso ocorre porque como a probabilidade é linear, aumentos na variável independente têm efeito constante sobre a probabilidade da variável dependente. Uma forma de solucionar esse impasse é considerar como 0, a variável dependente estimada quando ela for negativa, e considerar como 1, quando ela for acima desse valor. Outra forma é usar técnicas de estimação que garantam que as probabilidades condicionais estimadas estejam entre 0 e 1 e isso pode ser feito por meio dos modelos logit e probit.
Apesar desse último problema ser solucionável, nota-se que ele não é muito atraente pela sua lógica de aumentar a probabilidade da variável independente linearmente com aumentos na variável independente, ou seja, na realidade, não se esperaria que a o efeito marginal da variável independente fosse constante o tempo todo, mas sim, que se aproximasse de 0 a taxas cada vez menores a medida que a variável independente decrescesse, e que se aproximasse de 1 a taxas cada vez menores quando a variável independente fica maior, com curva em formato de “S” e não linear (GUJARATI; PORTER, 2011).
Se o L foi positivo, ele demonstra que, quando o valor da variável independente aumenta, as chances da variável dependente ser igual a 1 aumentam, ou seja, indica aumento nas chances do evento ocorrer. Se L for negativo, as chances da variável dependente ser igual à 1 diminuem à medida que o valor da variável independente aumenta, logo, a razão de chances diminui.
A partir da estimação de Ii, estima-se 𝛽1 e 𝛽2. O índice será negativo sempre que Pi ≤ 0,5. Isso quer dizer que se Pi > 0,5, o evento ocorre e se Pi ≤ 0,5, o evento não ocorre.
Os resultados obtidos a partir de logit e probit são similares, a diferença é que na distribuição logística a probabilidade condicional Pi se aproxima de 0 ou 1 mais devagar no logit em comparação com o probit. Desta maneira, os dois modelos poderiam ser utilizados, contudo, muitos pesquisadores preferem o modelo logit por sua simplicidade matemática.
Após a definição das variáveis utilizadas para estimar os modelos logit e probit, construídas a partir da aplicação dos questionários, é necessário fazer alguns testes de ajustamento dos modelos. O primeiro passo é verificar o grau de multicolinearidade das variáveis explicativas. Conforme Fávero (2015), dentre os pressupostos conhecidos da regressão estimada por mínimos quadrados ordinários, esse é o único pressuposto que se deve preocupar nos modelos binários. Esse procedimento é recomendado para verificar se as variáveis independentes não contém informações similares para explicar o mesmo fenômeno. Conforme Hill, Griffiths e Judge (2003), como regra de bolso, quando o valor da Tolerance for menor que 1 não existe multicolinearidade ou quando o valor da Variance Inflaction Fator (VIF) estiver no intervalo de 1 até 10 a multicolinearidade é aceitável. Se alguma variável apresenta multicolinearidade fora do aceitável, ela precisa ser retirada das análises.
O próximo passo é verificar a significância de cada parâmetro dos modelos através da estatística z de Wald. A hipótese nula deste teste é que o valor do parâmetro é igual a zero, desta forma é necessário rejeitar a hipótese nula (AMARAL, 2019; NICKEL, 2019). Segundo Freitas (2013) o teste de Wald é semelhante aos valores do teste F ou t de significância na regressão linear. Quando os coeficientes forem significantes eles podem ser utilizados para identificar as relações que afetam as probabilidades. Inicialmente todas as variáveis do Quadro 1 entram na análise e as variáveis que não apresentarem significância mínima a 10% serão retiradas dos modelos. Isso será feito através do procedimento stepwise backward (regressão por etapas). O software utilizado neste trabalho será o Stata.
Uma estatística importante para analisar o ajustamento dos modelos binários é através do teste da razão de verossimilhança. Esse teste verifica a significância do coeficiente de uma variável comparando-se os valores observados da variável resposta com os valores preditos. Ele faz isso para dois modelos, o primeiro com a variável presente e o segundo sem essa variável. Dessa forma ele serve para comparar modelos quando se pretende incluir ou retirar variáveis e para verificar o ajuste global quando a comparação é feita com o modelo apenas com a constante. A hipótese nula deste teste é que os modelos são iguais (PEREIRA; TEIXEIRA; LIMA, 2009; AMARAL, 2019). Freitas (2013) considera esse teste assintoticamente equivalente ao teste de Wald, porém mais poderoso devido um maior aumento da probabilidade de rejeição da hipótese nula.
Outro teste importante para verificar o ajustamento dos modelos é o teste de Hosmer e Lemeshow. Esse teste mede o grau de acurácia do modelo logístico, correspondendo a um teste do Qui-quadrado (𝑋2) que divide o número de observações em dez classes e, em seguida, compara as frequências preditas com as observadas. A finalidade deste teste é verificar se existem diferenças significativas entre as previsões do modelo e a realidade observada. Busca-se não rejeitar a hipótese nula, ou seja, que não existem diferenças entre os valores preditos e observados (AMARAL, 2019).
Nos modelos binários, como a variável dependente é qualitativa, não faz sentido discutir o percentual de sua variância que é explicada pelas variáveis preditoras, ou seja, em modelos binários o R² não tem a mesma interpretação. Medidas semelhantes são calculadas, chamadas de Pseudo R², e servem apenas para a comparação de modelos, em que o maior valor denota o melhor modelo. Dessa forma o que importa são os sinais esperados dos coeficientes de regressão e sua significância estatística e/ou prática. Mesmo assim esses valores serão apresentados como uma forma de comparação entre o logit e probit (FÁVERO, 2015; GUJARATI; PORTER, 2011).
Outra medida simples de qualidade do ajustamento dos modelos é o count R². Ele nada mais é que o número de previsões corretas dividido pelo número total de observações. Vamos usar o ponto de corte, chamado de cutoff, de 0,50, então se a probabilidade prevista for maior que 0,5, classificamos como 1, mas, se for menor que 0,5, classificamos como 0 (GUJARATI; PORTER, 2011). Segundo Fávero (2015) o Count R² mede a eficiência global do modelo e é mais adequado para se avaliar o desempenho de uma modelagem do que o Pseudo R².
Derivado dessa medida de acertos de classificação existem as medidas de sensitividade e especificidade que também serão apresentadas. A sensitividade diz respeito ao percentual de acerto, para um cutoff aqui também de 0,5 que é o padrão, considerando apenas as observações que de fato são evento. Em outras palavras é a capacidade do modelo prever quais pessoas pagariam mais por orgânicos, visto que foi atribuído no banco de dados 1 caso a pessoa afirmasse que pagaria mais (FÁVERO, 2015).
A especificidade, por outro lado, refere-se ao percentual de acerto, dado um determinado cutoff, considerando apenas as observações que não são evento, ou seja, a capacidade do modelo de prever quem não pagaria a mais por orgânicos1. Ambas sensitividade e especificidade, quanto maior seu valor, melhor, mais ajustado é o modelo (FÁVERO, 2015).
Nesta seção será apresentada uma análise descritiva das informações coletadas através da aplicação do questionário aos 204 respondentes, iniciando pelo perfil socioeconômico. Foram entrevistadas pessoas entre 20 e 72 anos. A idade média da amostra foi de 38 anos. Dentre os entrevistados, 6,37% (13 pessoas) tinham 28 anos, 5,39% (11) com 37 anos, 4,41% (9) com 26 anos, 4,41% (9) com 40 anos e também 4,41% (9) com 42 anos, sendo essas as principais frequências.
Dos entrevistados, 16,18% (33) se declararam do gênero masculino e 83,82% (171) do feminino. Os declarados brancos foram 85,78% dos entrevistados (175 pessoas). A respeito do estado civil, 76% (155 pessoas) afirmaram ser casados ou com união estável, 17,1% (35 solteiros) e 6,9% (14) divorciados.
A renda pessoal que apareceu com maior frequência foi entre 2 e 3 salários mínimos (49 pessoas ou 24%). Em seguida, empatados, entre 3 e 5 salários (42 pessoas ou 20,6%) e entre 5 e 7 (42 pessoas ou 20,6%).
A escolaridade mais observada entre os respondentes foi pós-graduação completa ou incompleta (73 respondentes ou 35,8%), em seguida ensino superior completo (49 respondentes ou 24%) e ensino médio completo (41 respondentes ou 20,1%).
A respeito do número de pessoas habitantes da residência, para 65 respondentes ou 31,86% o número foi de 4 pessoas. Em seguida, para 57 respondentes ou 28%, a resposta foi de 2 pessoas, e para 48 pessoas ou 23,53%, 3 pessoas. Apenas 1 respondente informou residir em sua habitação 7 pessoas e 12 informaram morar sozinhos.
Na Tabela 1 consta a frequência de respondentes e o percentual para as demais variáveis (8ª a 26ª). Os dados se referem se o respondente apresentou o determinado atributo.
Em relação à Tabela 1, destaca-se que mais da metade dos respondentes informaram ter ou já ter tido algum familiar com câncer. Apenas 19 nunca compraram frutas, verduras e legumes orgânicos. Também 19 pessoas afirmaram ter dificuldade de encontrar produtos orgânicos, esses números, apesar de reduzidos, podem ser uma oportunidade de nicho de mercado e também ações de políticas públicas para incentivar o setor, assim como indicam Aquino, Gazolla e Schneider (2017). Menos de 10% dos entrevistados apontou não ter o hábito de consumir orgânicos e que o fato de não saber os benefícios dos produtos desencoraja o consumo. Um ponto positivo é que para mais de 90% dos entrevistados o motivo pelo que os leva a consumir produtos orgânicos é pela percepção que eles são mais saudáveis. Esses números indicam que os respondentes apresentam conhecimento sobre o assunto. Apesar disso, aumentar o conhecimento desses produtos pode servir como incentivo para outras pessoas consumirem, pois quase 5% da amostra foi retirada devido aos respondentes não saberem a definição correta de orgânicos.
Antes de apresentar os resultados dos modelos econométricos binários, a Tabela 2 mostra os resultados do teste de detecção do grau de multicolinearidade para as variáveis independentes dos modelos. Para encontrar esse resultado foi estimado o MPL que utiliza os mínimos quadrados ordinários, pois, através do logit e probit esse teste não é realizado. Como os valores de Tolerance foram menores que 1 e VIF menores que 10, pode-se prosseguir com as análises com essas variáveis. Todas as variáveis do Quadro 1 auferidas com a aplicação dos questionários foram testadas e apresentaram multicolinearidade aceitável, porém, na Tabela 2 é apresentada a estatística somente para as variáveis que foram estatisticamente significantes ao mínimo de 10%.
Após a detecção de multicolinearidade, foi rodado o modelo logit e probit com todas as variáveis auferidas com a aplicação dos questionários. Através do procedimento stepwise as variáveis que não apresentaram significância mínima de 10% foram sendo excluídas. Os modelos finais são apresentados na Tabela 3. Vamos considerar apenas logit e probit devido suas vantagens conforme apontado.
Conforme Tabela 3, através do teste da razão de verossimilhança, para ambos, probit e logit, pode-se concluir que eles estão ajustados ao retirar as variáveis estatisticamente não significativas os modelos não perdem relevância.
Outro teste utilizado para verificar o ajustamento dos modelos foi o teste de Hosmer e Lemeshow. Conforme Tabela 3, tanto no logit quanto no probit podemos concluir que os modelos estão bem ajustados.
Referente ao Pseudo R², na Tabela 3, os valores para probit e logit foram de 0,01 de diferença. Apesar da pequena diferença os demais resultados serão analisados, portanto, com base no logit. Ele foi escolhido também pois, a partir dele é possível analisar as razões de chances, ou seja, as chances de acontecer um evento, ou aquilo que a variável em questão indica.
Através do teste de Wald as variáveis “idade”, “familiar com câncer” e “teste/governo” foram estatisticamente significativos a 10%. “Percepção de risco”, “problema nas embalagens”, “não conhecer os benefícios” e “motivos econômicos” foram estatisticamente significativos a 5% e “escolaridade” estatisticamente significativo a 1%. Dessa forma os coeficientes estimados são diferentes de 0 e prossegue-se com as análises.
De acordo com o sinal positivo do coeficiente da variável idade, ao passo que aumenta a idade dos consumidores da pesquisa, aumenta a probabilidade deles pagarem um preço maior para consumir frutas, verduras e legumes orgânicos. Analisando a razão de chance, a cada ano a mais de idade o consumidor aumenta em 4,1% a chance de pagar a mais para consumir produtos orgânicos. A escolaridade teve o mesmo comportamento, e pode-se concluir que consumidores mais escolarizados tem probabilidade maior de pagar um preço maior por orgânicos. A chance de um consumidor aumentar seu consumo de orgânico é 41,5% maior a cada grau de escolaridade. Os sinais dos coeficientes se apresentaram conforme o esperado.
Os consumidores que relataram ter ou já ter tido algum familiar com câncer também têm probabilidade aumentada de pagar um preço maior para consumir frutas, verduras e legumes orgânicos. A chance de um consumidor com familiar com câncer consumir orgânicos chega a ser quase o dobro de uma pessoa que não possui essa característica, 95,8% a mais. Aquelas pessoas que no momento de realizarem as compras de frutas, verduras e legumes têm a preocupação da presença de agrotóxicos, também têm probabilidade maior de pagar um preço maior por esses produtos, conforme o esperado. As pessoas com essa percepção de risco tem 2,5 vezes mais chance de consumir orgânicos do que uma pessoa que não tem essa preocupação, ou 150% a mais de chance.
De acordo com os sinais negativos, um dos fatores que reduz a probabilidade do consumidor pagar a mais por frutas, verduras e legumes orgânicos são problemas nas embalagens desses produtos. Quando um consumidor percebe problemas na embalagem ele tem 15,2% menos chance de pagar a mais por aquele produto. Outro fator apontado que poderia desencorajar o pagamento a mais por esses produtos é o não conhecimento sobre os produtos orgânicos, que desestimularia o consumo em 24,2%.
O preço mais alto dos produtos orgânicos ou a renda insuficiente também se mostrou significativo e é um fator que reduz a probabilidade de consumo dos produtos orgânicos. A redução da probabilidade é na magnitude de 29,6% para os respondentes com essa característica. Para Mendes (2006) o preço alto também teve sinal negativo, indicando que diminui a disposição a pagar por orgânicos. Santos e Silva Júnior (2015) também encontraram relação semelhante, pois verificaram em seu estudo que a principal variável determinante da razão de chances de consumo de alimentos orgânicos em Pernambuco é a renda. O fato da produção de orgânicos incorrer em custos mais altos, determinando assim, preços também mais altos, condicionam que esses produtos sejam consumidos por pessoas de rendas maiores.
Dentre os fatores mais desafiadores do mercado de orgânicos no Brasil, discutidos e apontados por Terrazzan e Valarini (2009), Neto et al. (2010), Barbosa e Souza (2012) e Padua-Gomes, Gomes e Padovan (2016), estão as questões relacionadas ao alto custo da produção, inclusos os custos com burocracia, falta de assistência e tecnologias, dificuldade de acesso ao crédito, dentre outros, que provocam o valor superior do preço do produto orgânico frente ao produto convencional. Por este motivo, a ascensão desse mercado ainda contempla em maior proporção as classes de renda mais alta, assim como os países mais ricos.
O coeficiente estimado para a variável teste/governo apresentou sinal negativo e dessa forma indica que a escolha do governo como órgão certificador dos produtos orgânicos diminui a probabilidade do consumidor pagar mais por esses produtos. Mendes (2006) também encontrou esse coeficiente negativo. Uma possível explicação é que o consumidor esteja atrelando de alguma forma que, sendo o governo o órgão certificador, não haveria motivo para pagar a mais por esses produtos.
Como analisado na seção de análise descritiva, o perfil médio da amostra do estudo é um respondente com 38 anos, com pós-graduação e as respostas com maior frequência foi que tem ou já teve familiar com câncer e considera a renda baixa ou preço alto dos orgânicos um limitador do consumo. Um consumidor com esse perfil tem probabilidade de pagar a mais por frutas, verduras e legumes orgânicos de 86,4%. Se considerarmos o mesmo perfil, alterando apenas a escolaridade para ensino médio, a probabilidade de consumo de orgânicos passa para 69,2%. Se considerarmos o mesmo perfil inicial alterando apenas para não ter familiar com câncer a probabilidade cai para 77,7%.
Já um consumidor com 38 anos, com pós-graduação, que tem ou já teve familiar com câncer e que não considera a renda baixa ou preço alto dos orgânicos um limitador do consumo apresenta probabilidade de consumo de orgânicos de 95,5%. Esse mesmo perfil de consumidor, alterando a escolaridade para ensino médio, apresenta uma probabilidade de 88,3%.
Consumidor com 28 anos foi a maior frequência de idade identificada na amostra. O perfil de 28 anos, com pós-graduação, que tem ou já teve familiar com câncer e que considera a renda baixa ou preço alto dos orgânicos um limitador do consumo apresenta probabilidade de pagar a mais por orgânicos de 80,75%. Esse mesmo perfil alterando de pós-graduação para ensino superior completo a probabilidade passa a ser 74,8% e alterando para ensino médio cai para 59,8%.
Uma última simulação feita consiste em um consumidor com 20 anos, com ensino médio completo, não tem familiar com câncer (ou aqui não se preocuparia com esse quesito) e considera a renda ou preço um impeditivo, a probabilidade de consumo de orgânicos é de 37%.
Essas simulações deixam claro o impacto da idade e escolaridade na probabilidade de pagamento de um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos. Pessoas mais velhas e com maior escolaridade estão mais dispostas a pagar mais. Isso acontece pois esses fatores afetam positivamente o modo como as pessoas percebem os riscos para a saúde oferecidos pelos alimentos. A título de exemplo, Santos e Silva Júnior (2015) também encontraram essa relação para consumo de produtos orgânicos para variável idade e escolaridade, e Mendes (2006) e Corrêa (2016) para a escolaridade.
A Tabela 4 mostra a classificação dos modelos, para ambos logit e probit, pois esses resultados são iguais. Dos 156 respondentes que informaram estarem dispostos a pagar um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos, os modelos acertaram 147, ou seja, a sensitividade do modelo foi de 94,23%. Em relação aos 48 que não estavam dispostos a pagar um preço maior o modelo acertou 14, isso representa uma especificidade de 29,17%. Pode-se concluir que esses modelos são melhor para prever os consumidores dispostos a pagar um preço maior e não os que não estão dispostos a pagar. No geral o modelo conseguiu prever corretamente 161 observações, representando 78,92%.
A literatura identifica fatores em comum que são desafios a serem enfrentados pelo mercado de produtos orgânicos, como a falta de informação e os altos custos de produção (NETO et al., 2010; BARBOSA; SOUZA, 2012; PADUA-GOMES; GOMES; PADOVAN, 2016) e que os resultados da presente pesquisa corroboram. O preço mais alto ou mesmo rendas menores, é um fator redutor da probabilidade de aquisição de produtos orgânicos, isso quer dizer que os custos mais altos na sua produção prejudicam a comercialização em classes sociais mais baixas. Além disso, a falta de informações básicas, como o conceito de produtos orgânicos, retirou da amostra desta pesquisa cerca de 5% dos indivíduos.
Nesse sentido, Aquino, Gazolla e Schneider (2017), colocam o governo como um importante ator, capaz de incentivar e investir na estruturação do mercado por meio de crédito, de políticas de produção alternativas, de geração e ampliação das informações e de novas tecnologias, dentre outros aspectos de regulamentação e desburocratização.
Para além dos desafios enfrentados pelo setor, há inúmeras melhorias potenciais que podem ser estudadas e introduzidas por meio de políticas multisetoriais, indicadas por outras pesquisas, como os estudos de Khatounian (2001), Santos e Monteiro (2004), Fonseca e Medaets (2005), Schultz (2007), Barbosa e Souza (2012) e Ferreira et al. (2016), e reiteradas pelos resultados aqui encontrados para o município de São Lourenço do Oeste – SC.
A preocupação com o bem-estar ambiental, social e de saúde, contribui para o aumento do consumo de alimentos livres de insumos químicos, proporcionando bases para o aumento da disposição a pagar pelos produtos orgânicos. Além disso, o efeito é ampliado com o aumento das informações, seja por meio de escolarização formal, ou mesmo de campanhas informais, bem como com a redução do preço desses produtos, que pode ser atingido com inserção de tecnologias, com a ação de políticas públicas na certificação, desburocratização e regulamentação, com a facilitação do acesso ao crédito e à assistência técnica.
O objetivo desta pesquisa consistiu em investigar os determinantes da disposição dos consumidores a pagar um preço maior por frutas, verduras e legumes orgânicos no município de São Lourenço do Oeste – SC, utilizando os modelos de regressão binários MPL, logit e probit.
Os resultados econométricos indicaram que a idade afeta positivamente a disposição a pagar por produtos orgânicos no âmbito desta pesquisa. A razão de chance demonstrou que a cada ano a mais de idade o consumidor aumenta em 4,1% a chance de pagar mais. A escolaridade também apresentou relação positiva com a disposição a pagar mais por esses produtos. A cada grau adicional de escolaridade a chance do consumidor pagar um valor maior por produtos orgânicos aumenta em 41,5%.
De maneira similar, com relação positiva, o fato do indivíduo ter ou já ter tido familiar com câncer aumenta a probabilidade de pagar mais por produtos orgânicos em 95,8%. Igualmente, a percepção de risco com relação aos agrotóxicos determinou que esses indivíduos tem chance 2,5 vezes maior de pagar mais por orgânicos.
Por outro lado, os fatores que impactam negativamente na disposição a pagar mais por frutas, verduras e legumes orgânicos são: os problemas na embalagem, que reduz a disposição a pagar em 15,2%; a falta de conhecimento sobre orgânicos, reduz em 24,2% a disposição a pagar; e os fatores econômicos como alto preço e renda insuficiente reduz a probabilidade de pagar mais na magnitude de 29,6% para os respondentes com essa característica.
Nota-se que a preocupação com a saúde e com a qualidade de vida contribui para determinar o aumento no consumo de produtos orgânicos. Isso é demonstrado pelos resultados aqui encontrados, no qual a escolaridade, a idade, o aumento das informações disponíveis e a redução no preço foram alguns fatores chave para aumentar a probabilidade de um indivíduo pagar mais por frutas, verduras e legumes orgânicos. Nesse sentido, ações públicas multidimensionais podem melhorar a dinâmica desse mercado por meio de inserção de tecnologias, campanhas de disseminação de informações, programas de certificação, regulamentação e desburocratização, além de facilitação de acesso ao crédito.
Como proposta de pesquisas futuras, indica-se realizar o estudo para outros municípios e regiões, para fins de comparação. Também podem ser utilizadas outras variáveis, outras metodologias e outras formas de abordagem. Pesquisas a respeito das demandas e dificuldades dos produtores também são essenciais.