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O Sistema de Garantia de Direitos e a Proteção Integral à criança e ao adolescente: uma revisão bibliográfica
O Social em Questão, vol. 19, núm. 35, pp. 63-86, 2016
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro



Resumo: A realidade brasileira, a despeito dos avanços da legislação em relação aos direitos infanto-

-juvenis, é permeada por lacunas que comprometem a garantia e a efetivação desses direi- tos, gerando condições de vida adversas às crianças e adolescentes. O presente trabalho objetiva conhecer a configuração e a atuação do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA) e compreender os aspectos normativos e doutriná- rios integrantes dessa estrutura, analisando os entraves e fatores que interferem na efetiva proteção integral a essa população.

Palavras-chave: Direitos humanos, Criança e adolescente, Sistema de Garantia de Direitos, Proteção. Integral.

Abstract: The Brazilian reality, despite the advances in legislation in relation to children rights, is permeated by gaps jeopardizing the security and enforcement of those rights, gene- rating adverse living conditions for children and adolescents. This paper aims to know the configuration and performance of the System of Granted Rights for Children and Adolescents (SGDCA) and understand the normative and doctrinal aspects members of this structure, analyzing barriers and factors that interfere with effective full protection to this population.

Human rights; Child and adolescent; System for Guaranteeing Rights; Full protection.

Keywords: Human rights, Child and adolescent, System for Guaranteeing Rights, Full protection.

O Sistema de Garantia de Direitos caracteriza-se pela relação de profissionais, instituições e saberes, alicerçado em três eixos que interagem e se retroalimen- tam com um objetivo comum: a garantia de direitos.

Segundo normativa específica (Resolução nº113/2006 do CONANDA), o SGDCA se estrutura em três eixos principais: a promoção relaciona-se direta- mente aos atendimentos, aos serviços oferecido nas diversas áreas visando a pro- teção da população infanto-juvenil, destacando as linhas e diretrizes da política de atendimento previstas nos artigos 86 e 87 do ECA. A defesa atua na respon- sabilização das violações dos direitos previstos e o controle ocorre por meio da fiscalização e avaliação do funcionamento geral do Sistema.

As entidades de defesa e garantia dos direitos infanto-juvenis perpassam esses três eixos: os Conselhos de Direitos – em nível federal, estadual e municipal

– e os Conselhos Tutelares, atendendo às diretrizes enunciadas no art. 204 da Constituição de 1988 para o desenvolvimento das políticas públicas, assumidas integralmente e detalhados no ECA: a articulação, a descentralização político-

-administrativa e a participação popular.

A pesquisa bibliográfica realizada no presente estudo apontou intercorrências conceituais e sócio-históricas que comprometem a operacionalização do SGDCA, atendendo as reais necessidades desse segmento populacional.

De igual maneira, o ECA, após 24 anos de existência, o destaque na sociedade atual é que não se trata mais de fundamentar os direitos à criança e ao adoles- cente, mas sim de protegê-los, de estruturar e reestruturar nossa capacidade de respeitá-los, materializá-los dentro de um Sistema eficaz e eficiente para atender essa finalidade dentro dos princípios e pressupostos da proteção integral. Nes- se sentido, reconhecem-se as dificuldades de pensar esses direitos, incluindo a novidade histórica e complexidade dessa temática, além dos entraves culturais mencionados à sua aceitação e assimilação.

Muitos atores e operadores do SGDCA, no atendimento às demandas da po- pulação infanto-juvenil, consoante os princípios constitucionais e legais, perce- bem o direito como irreal e inatingível, verdadeira utopia. Importante contrapor essa concepção, destacando que concretamente a utopia não está no direito, mas

no seu exercício. Dessa forma, a legislação em si não é suficiente e requer a inser- ção no processo cultural, com avanços, retrocessos, adesões e resistências.

Os conflitos e contradições estão presentes nas estruturas que integram o SG- DCA e devem ser acolhidos e trabalhados com vistas à efetivação do paradigma da proteção integral, em todas as suas nuances. Para os envolvidos nesse empreendi- mento, trata-se de um aprendizado constante no campo do direito, da formulação de políticas públicas, da construção de soluções técnicas e, principalmente, de vivência e convivência democrática.

Nesse contexto, importante destacar a necessidade de ações mais efetivas e contínuas no âmbito das políticas públicas.

A ação protetiva do Estado, estabelecida constitucionalmente, vem se apresen- tando ineficiente no combate às injustiças sociais e na redução das desigualdades. Constata-se um descompasso entre as normas jurídicas e a efetividade das políti- cas públicas, que não respondem às reais necessidades e demandas da população infanto-juvenil frente à questão social, reafirmando diferenças e exclusão social.

Sob a ótica neoliberal, o Estado reduz sua atuação na elaboração e exe- cução das políticas públicas, ampliando a descentralização desses processos às demais esferas federativas. Os estados e, principalmente, os municípios (que tiveram seu poder e responsabilidade de atuação ampliada), enfrentam limites de infraestrutura, de competência e qualificação profissional, de pla- nejamento e, principalmente, de orçamento para assumir efetivamente as responsabilidades legais sobre a formulação e realização das políticas de aten- dimento. Alia-se aos aspectos elencados a falta de vontade política nas três esferas de governo, lacuna que também compromete e até mesmo impede a operacionalização dessa legislação avançada.

Os Conselhos Municipais da Criança e do Adolescente e os Conselhos Tu- telares expressam essas dificuldades para o exercício de suas atribuições dentro de contexto da proteção integral. Os gestores de políticas públicas direcionadas à criança e ao adolescente devem compreender a necessidade de continuidade e integração entre as políticas de proteção especial (destinadas especificamente a enfrentar a violação de direitos) e as políticas sociais básicas (destinadas a promover direitos e prevenir violações).

O desafio do SGDCA na perspectiva da atuação sistêmica é empreender es- forços para avançar na articulação intersetorial, com empoderamento dos conse- lhos, instâncias de participação, fiscalização e controle das ações, funções essen- ciais à efetivação dessa política de atendimento.

A articulação pressupõe a construção das redes de atendimento. Os mar- cos normativos e legais do SGD sustentam a articulação e a atuação em rede. A cultura do trabalho em rede é processo em construção, que ainda enfrenta tendências centralizadoras, pouco participativas ou pouco transparentes dos profissionais, gestores e outros atores sociais que integram programas e insti- tuições dos eixos de atuação desse sistema.

Autores pesquisados registram que o trabalho em rede consiste em dis- posição para agir de forma colaborativa e compartilhada, que gradativa- mente está sendo incorporado no SGDCA frente à necessidade da atuação integrada como forma de garantir a proteção integral às crianças e aos adolescentes, diante da relativa efetividade das ações isoladas, por melhor organizadas que sejam, no enfrentamento das questões afetas a essa popula- ção e suas famílias. As parcerias e atividades concretas, a interlocução entre as esferas governamentais e não governamentais, entre outras ações, abrem possibilidades de sensibilização de diversos setores sociais na perspectiva de viabilização de direitos.

A revisão bibliográfica proposta permitiu a identificação e compreensão dos limites e desafios presentes na estruturação e operacionalização do Sistema de Garantia de Direitos frente à proteção integral de crianças e adolescentes.

O resultado do presente estudo poderá contribuir para o conhecimento dos fundamentos legais e para a atuação do SGDCA na interface com os aspec- tos históricos, culturais, sociais e econômicos presentes na realidade brasileira, ampliando o olhar e o entendimento das variáveis presentes nesse processo, impulsionando novas pesquisas a partir da constatação dos limites e desafios elencados no trabalho.

À comunidade como um todo, corresponsável e coparticipante desse pro- cesso, o estudo poderá oferecer subsídios para a elaboração de políticas públi- cas e sociais efetivas, coerentes e comprometidas com as demandas concretas das crianças e adolescentes.

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Notas

1 Assistente social e Especialista em Políticas Públicas da Criança e do Adolescente pelo Centro Universitário de Araraquara – UNIARA. E-mail: mc.farinelli@hotmail.com
2 Mestre em Ciências Sociais Aplicadas e Doutorando em Desenvolvimento Territorial e Meio ambiente pelo Centro Universitário de Araraquara – UNIARA. E-mail: alexandrepierini@ hotmail.com Artigo recebido em dezembro de 2015 e aprovado para publicação em fevereiro de 2016.


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