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Uma análise do relacionamento da Equipe de Assistência Social da Marinha do Brasil e agências envolvidas na resposta a desastre no Brasil – O caso de Nova Friburgo

Nádia Xavier Moreira
UFRJ, Brasil

Uma análise do relacionamento da Equipe de Assistência Social da Marinha do Brasil e agências envolvidas na resposta a desastre no Brasil – O caso de Nova Friburgo

O Social em Questão, vol. 21, núm. 40, pp. 385-406, 2018

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Resumo: Este artigo trata das relações interorganizacionais em situações de desastres. Toma como objeto de estudo o relacionamento estabelecido entre a Equipe de Assistên- cia Social da Marinha e as principais agências envolvidas nas respostas ao desastre ocorrido em Nova Friburgo em 2011. Desastre e relações interagências são catego- rias centrais desse ensaio. Trata-se de um estudo com abordagem metodológica qualitativa. Os sujeitos da pesquisa são três assistentes sociais e uma bacharela em direito militares, que compuseram as duas equipes em atendimento às vítimas nesse evento. Utilizou-se como instrumento de coleta de dados a entrevista do tipo se- miestruturada e a análise documental.

Palavras-chave: Desastre, Relações interorganizacionais, Assistência social, Marinha do Brasil.

Uma análise do relacionamento da Equipe de Assistência Social da Marinha do Brasil e

agências envolvidas na resposta a desastre no Brasil – O caso de Nova Friburgo

Nádia Xavier Moreira.

Resumo

Este artigo trata das relações interorganizacionais em situações de desastres. Toma como objeto de estudo o relacionamento estabelecido entre a Equipe de Assistên- cia Social da Marinha e as principais agências envolvidas nas respostas ao desastre ocorrido em Nova Friburgo em 2011. Desastre e relações interagências são catego- rias centrais desse ensaio. Trata-se de um estudo com abordagem metodológica qualitativa. Os sujeitos da pesquisa são três assistentes sociais e uma bacharela em direito militares, que compuseram as duas equipes em atendimento às vítimas nesse evento. Utilizou-se como instrumento de coleta de dados a entrevista do tipo se- miestruturada e a análise documental.

Palavras-chave

Desastre, Relações interorganizacionais, Assistência social, Marinha do Brasil.

An analysis of the relationship of the Social Welfare Team of the Navy and agencies involved in the response to the disaster in Brazil – The case of Nova Friburgo

Abstract

This article deals with interorganizational relationships in disaster situations. It takes as object of study the established relationship between the Marine Social Assistance Team and the main agencies involved in the responses to the disaster in Nova Fr- iburgo in 2011. Disaster and interagency relations are central categories of this essay. This is a study with a qualitative methodological approach. The research subjects are three social workers and a bachelor in direct military, who composed the two teams in attendance to the victims in that event. The semi-structured interview and the documentary analysis were used as data collection instrument.

Keywords

Disaster, Interorganizational relationships, Social work, Navy of Brazil.

Artigo recebido: outubro de 2017 Artigo aprovado: dezembro de 2017

Introdução

O acompanhamento e análise dos dados de desastres naturais no mundo e no Brasil indicam uma maior ocorrência desses fenômenos nas últimas décadas. Em anos mais recentes, o Japão, a República Po- pular da China (RPC), os Estados Unidos (EUA), as Filipinas, a Índia e a Indonésia foram os países mais atingidos por desastres como inun- dações, deslizamentos de terra, tempestades, terremotos, tempera- turas extremas, tsunamis e furacões. Os episódios como o terremoto na China e no Haiti, nos anos de 2008 e 2010 respectivamente, o ter- remoto e o tsunami no Japão, em 2011, o tufão nas Filipinas, em 2013, evidenciam a magnitude e a gravidade de eventos dessa natureza.

No caso específico do Brasil, o Atlas Brasileiro de Desastre Natu- rais (ABDN, 2012) aponta que ocorreram, no período de 1990 a 2000, 31.909 desastres, dos quais 8.671 na década de 1990 e 23.238 na dé- cada de 2000, o que evidencia uma elevação de 73% no número de desastres em 10 anos. Os dados trazidos pelo ABDN também indicam que os desastres mais recorrentes no país são as estiagens, as secas, as inundações bruscas e alagamentos.

O estudo técnico desenvolvido pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM, 2010), com dados da Defesa Civil, evidenciou que houve no Brasil, ao longo do período de 2003 a 2013, uma elevação dos atos administrativos de decretação municipal de situação de emer- gência (SE) e de estado de calamidade pública (ECP), reconhecidos através de portaria emitida pela Secretaria Nacional de Defesa Civil do Ministério da Integração Nacional (SEDEC/MI). Nesse período, foram publicadas 18.391 portarias em 3.951 municípios do território nacional. A recorrência dos desastres vem impactando diretamente na vida humana, ocasionando um considerável número de pessoas desaloja- das, desabrigadas, feridas, enfermas, mortas, dentre outros. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ, 2011), apenas no ano de 2011 os desastres na serra fluminense somaram mais de 900 óbitos. As con- sequências materiais e financeiras também ocorrem e podem ser per-

cebidas na destruição de instituições de saúde, educacionais, unida- des habitacionais, infraestrutura pública etc. e no aumento dos gastos em ações de defesa civil. Ressalta-se que esses últimos passaram de pouco mais de R$ 87 milhões, em 2004, para cerca de R$ 1 bilhão e 926 milhões, em 2013 (CNM, 2014).

O documento elaborado pelo Painel Brasileiro de Mudanças Climá- ticas (PBMC, 2014) relaciona a ocorrência dos desastres a mudanças na temperatura média da Terra acima de 2ºC. Esse fato vem ocasionando significativos desequilíbrios em ecossistemas fundamentais à sobre- vivência da humanidade. O mesmo documento aponta que, além das mudanças climáticas, são fatores determinantes para a ocorrência dos desastres a pressão demográfica, o crescimento urbano desordenado, a pobreza, a migração rural, o baixo investimento em infraestrutura e serviços, e os problemas relacionados à governança com a coordena- ção intersetorial. Outros estudos que trataram dessa questão também evidenciaram tais aspectos (VALENCIO 2014; QUARANTELLI, 2005).

No Brasil, a recorrência e a proporção tomada pelos desastres vêm ocasionando o frequente emprego das Forças Armadas (FFAA), notadamente em ações de resgate, de engenharia, de saúde e de as- sistência social às populações vitimadas. Os meios militares mais uti- lizados são as aeronaves usadas para o transporte de pessoal e itens de ajuda; a prestação de assistência médica, oferecida por meio de hospital de campanha e pessoal especializado; o emprego de pesso- al perito, em Coordenação Civil-Militar e o levantamento de neces- sidades; e logística (ARAÚJO, 2013).

Esse cenário vem colocando às FFAA brasileiras o desafio e a ne- cessidade de coordenarem seus esforços colaborativos com outras agências, entendidas como “organização ou instituição com estrutura e competência formalmente constituídas, podendo ser governamental ou não, militar ou civil, nacional ou internacional” (BRASIL, 2012, p.14-46). Portanto, o termo interagência, nesse cenário, refere-se à parceria e à união de esforços realizados pela FFAA com órgãos governamentais e

não governamentais, com vistas a atingir objetivos voltados a responder aos problemas advindos de situações desencadeadas por desastres.

A Marinha do Brasil (MB) vem participando de esforços colaborati- vos com outras organizações em eventos dessa natureza, em conjunto com as demais Forças singulares. Destaca-se, em anos mais recentes, a participação da MB nas Operações Itajaí-Açu (estado de Santa Ca- tarina, 2008), Enchentes (estados de Pernambuco e Alagoas, 2010) e Serrana (região Serrana do estado do Rio de Janeiro, 2011).

Nesse contexto, o artigo volta-se à análise do relacionamento en- tre a Equipe de Assistência Social (EAS) da MB e as principais agên- cias envolvidas na Operação Serrana, especificamente em Nova Fri- burgo. A opção por essa análise justifica-se pelos seguintes aspectos: o papel fundamental assumido pela assistência social nas situações do impacto e do pós-impacto dos desastres; foi em Nova Friburgo a primeira e única ocasião em que uma EAS da MB participou de uma operação nesses moldes, a qual exigiu um relacionamento des- sa equipe com outras agências.

As categorias-chaves desse trabalho são desastre e relação intera- gências. Além da legislação nacional que trata do fenômeno e da tipi- ficação dos desastres, os referenciais teóricos que serviram de base para entendimento da primeira categoria foram pautados no campo dos estudos da Sociologia dos Desastres. A segunda categoria do es- tudo pautou-se nas publicações do Ministério da Defesa (MD33-M-12, 2012) e do Exército Brasileiro (EB20-MC-10.201, 2013), que versam so- bre a doutrina das FFAA em operações interagências. A análise da rela- ção interagência também se fundamentou nos pressupostos teóricos de Raza (2012) e Moynihan (2005).

Trata-se de um estudo com uma abordagem metodológica de cunho qualitativa. Os sujeitos da pesquisa são três assistentes sociais e um bacharel em direito militares, que compuseram as duas equi- pes em atendimento às vítimas nesse evento. Utilizou-se como ins- trumento de coleta de dados a entrevista do tipo semiestruturada e

a análise documental. Buscando preservar o anonimato dos sujeitos, nos fragmentos das entrevistas, utilizou-se a letra E (equipe) seguido do número correspondente à sequência da entrevista.

Desastre – Um conceito multidimensional e multicausal

Para Valencio (2014) os estudos dos desastres são orientados por duas teorias distintas: a teoria dos hazards e a teoria dos desastres. A primeira, com um enfoque mais determinista, agrega várias áreas das chamadas ciências duras. Guiada por uma racionalidade técnica, essa teoria aborda os desastres como uma ameaça natural externa, originados de fenômenos geográficos, temporalmente delimitados. Dessa forma, ganham destaque nessa teoria os estudos de previ- são, de monitoramentos, bem como as análises dos mecanismos e das probabilidades da eclosão dos eventos físicos, entendidos como causadores dos desastres.

Já a teoria dos desastres vincula-se ao campo disciplinar sociológi- co e trata a questão como um tipo específico de problema social. Essa teoria parte do entendimento de que as catástrofes, mesmo quando qualificadas como naturais, são primeiramente e, antes de tudo, fe- nômenos de caráter social, o que é evidenciado por meio da sua fre- quente ocorrência em localidades específicas, com impactos regula- res e previsíveis. Tal fato demonstra que há fatores sociopolíticos na persistência e nos desdobramentos desses acontecimentos.

Entender os desastres sob o ponto de vista social implica considerar o conceito de vulnerabilidade, o qual, segundo Watts e Bolhe (1993), é composto por três riscos: o primeiro, de ser exposto às situações de crise; o segundo, de não ter os recursos necessários para enfren- tamento da situação; e, o terceiro, de sofrer consequências negativas após a exposição às crises. Adensando esse debate, Marandola Jr e D`Antona (2014) entendem o risco como a probabilidade de ocorrên- cia do perigo, e, este último como a concretização do fato, do evento em si. Nessa perspectiva, um desastre implica a realização de um risco.

Portanto, as coletividades com maior vulnerabilidade são aquelas que se encontram mais expostas a riscos e, ato contínuo, a situações de desastres, pois suas condições sociodemográficas (arranjo familiar, identidade de gênero, condições migratórias, chefia etc.), sociais (in- segurança, pobreza, desproteção, acesso aos serviços públicos etc.), ambientais (residência em áreas de risco, com barreiras geográficas), dentre outras, comprometem sua capacidade de antecipação, de re- sistência e de reestabelecimento do impacto.

Contribuindo nessa discussão, Gilbert (1998) concebe que as diver- sas abordagens sobre o conceito de desastre poderiam ser agrupa- das em três principais paradigmas: o primeiro, moldado no contexto americano da Guerra Fria, toma o desastre como replicação de um modelo de guerra; o segundo, trata o desastre como expressão social da vulnerabilidade; e o terceiro, entende o desastre como um estado de incertezas geradas pelas próprias instituições.

Para fins desse estudo destaca-se o primeiro paradigma, pois é ele que – ainda que esteja em revisão nos EUA e nos demais países desenvolvidos desde os anos de 1980 –, vem orientando as ações de defesa civil no Brasil, encontrando-se fortemente presente no dis- curso e nas práticas estatais brasileiras sobre os desastres, nomean- do-os como naturais (VALENCIO, 2014; SIENA, 2012). Vale observar que, ao naturalizar os desastres, evitam-se questionamentos mais amplos sobre o processo sócio-histórico, através do qual se desen- rola a dinâmica socioespacial. Tal processo está no cerne dos danos e prejuízos a certas comunidades.

O conceito de desastre adotado pelo Sistema Nacional de Prote- ção e Defesa Civil (SINPDEC) brasileiro e que orienta o planejamento de suas ações de prevenção, previsão e respostas a esse fenômeno concebe desastre como: “resultados de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um ecossistema vulnerável causan- do danos humanos, materiais ou ambientais e consequentes prejuízos econômicos e sociais” (BRASIL, 2010).

Faz-se importante ainda observar que a organização da Defesa Ci- vil impõe um caráter interorganizacional em sua atuação, na medida em que prevê em sua estrutura a participação de várias organizações oriundas de níveis e de áreas diferenciadas, dentre elas as FFAA. Res- salta-se que essas últimas, pautadas em suas atribuições legais, têm sido chamadas a cooperar com a Defesa Civil nas situações de desas- tres, quando as capacidades civis são ultrapassadas.

Os desafios advindos desse cenário colocam às FFAA a necessidade de uma competência de coordenação de esforços colaborativos com as outras organizações, pois o incremento de tal capacidade contribuirá para maior eficiência da resposta ao acontecimento. Haja vista que, conforme demonstrado por Araújo (2013), experiências vivenciadas em desastres naturais indicam que a melhoria na prestação de socorro às vítimas ocor- rerá por meio de maior cooperação e coordenação entre as diferentes or- ganizações e indivíduos participantes da resposta a calamidades públicas.

Coordenação interorganizacional – uma aproximação com o debate conceitual

As relações interorganizacionais ou interagências não se apresen- tam como novidade das últimas décadas. Afinal, há tempos, ainda que através de interações simples, desarticuladas e por vezes desproposi- tais, as organizações estabelecem relações para compartilhar conhe- cimento, atingir objetivos em conjunto, obter recursos materiais e ima- teriais, de maneira cooperativa ou de modo competitivo e conflitivo.

Assim, percebem-se rotineiramente diferentes fenômenos inte- rorganizacionais ocorrendo entre empresas privadas, públicas, or- ganizações não governamentais, entidades voluntárias, organizações multilaterais etc. Entretanto, as relações interorganizacionais ou inte- ragências, tratadas nesse estudo, encontram-se diretamente vincu- ladas ao objetivo de institucionalização dessas trocas e articulações entre diferentes agências, no âmbito da gestão pública brasileira, com vistas à consecução de propósitos comuns.

O fenômeno interorganizacional como objeto de estudo de diversos campos disciplinares de conhecimento (economia, sociologia, adminis- tração, política, dentre outros) ocorreu, notadamente, a partir da segun- da metade do Século XX (ARAÚJO, 2013). Importa destacar que a divul- gação do termo interagência e sua consequente expressão “cooperação interagência” é bem recente no Brasil. Logo, o uso desse termo não é da linguagem comum dos brasileiros, tampouco é usual sua utilização no meio acadêmico. Sua popularização no mundo se intensificou, sobre- tudo, depois da década de 1980, quando passou a ser utilizada de um modo maior nos EUA e Reino Unido (SOUZA e GARCIA, 2014).

Neste trabalho as expressões interorganizacional e interagência (ter- mo utilizado pelas FFAA brasileiras) serão consideradas com significado similar. Consequentemente, as relações interagências e interorganiza- cionais serão tratadas como expressão de um mesmo fenômeno.

Para Raza (2012), os entendimentos acerca da cooperação intera- gência na esfera governamental encontram-se relacionados a dois significados: um abstrato, vinculado a princípios genéricos, relaciona- dos a mecanismos e instrumentos para assegurar eficiência, eficácia e efetividade na gestão pública. Tal concepção é expressa no âmbito do discurso. E outro significado prático, por meio do qual esses discur- sos se materializam em decisões concretas de cooperação. Segundo o autor, a emergência de uma coordenação interagência somente se justifica pela necessidade da formação de um agrupamento de atores (agências) com a finalidade de atingirem objetivos comuns, os quais não possam ser alcançados individualmente.

Nesta linha de pensamento, Souza e Garcia (2014) entendem que um trabalho conjunto, demandante da participação de duas ou mais organizações, implicará necessariamente no estabelecimento de relacionamentos entre essas últimas, os quais constituem re- lações interorganizacionais. Complementando esse debate, Moy- nihan (2005) esclarece que o trabalho interagência acontece quan- do mais de uma instituição atuam juntas, num esforço colaborativo,

sob a orientação de um plano formal, que torne possível seu em- prego tanto em nível estratégico como tático.

Esses aportes teóricos se fazem presentes na doutrina das FFAA. Tal aspecto pode ser identificado no conceito de operações interagências, adotado pelo manual MD33-M-12, que versa sobre essa questão. Se- gundo o manual, as operações interagências constituem na:

Interação das Forças Armadas com outras agências, com a fina- lidade de conciliar interesses e coordenar esforços para a con- secução de objetivos ou propósitos convergentes, que atendam ao bem comum, evitando a duplicidade de ações, a dispersão de recursos e a divergência de soluções com eficiência, eficácia, efetividade e menores custos (BRASIL, 2012, p 14-46).

Logo, para as FFAA, a materialização do ambiente interagência ocorre por meio de sua interação com outros órgãos e agências, sejam elas estatais ou não. Frequentemente, as operações desencadeadas nesses ambientes possuem como principais características a multi- funcionalidade, a complexidade e a interdependência (BRASIL, 2013).

O conceito estruturante de toda relação interagência é o de cola- boração. Observa-se, porém, o uso deste conceito de modo indis- tinto com o de cooperação e coordenação. Conquanto os três con- ceitos estejam inter-relacionados, os mesmos, segundo Raza (2012), possuem diferenciações. A cooperação interagências caracteriza-se por relacionamentos institucionais menos formais. Já a coordenação, a despeito de demandar arranjos organizacionais mais elaborados à consecução de um propósito, busca garantir que as atividades de uma agência considerem aquelas das demais envolvidas. Para o autor, a colaboração interagências se expressa como uma síntese das funções de cooperação e coordenação na dinâmica entre agências.

Destaca-se que é esse também o entendimento de colabora- ção presente na doutrina militar, especificamente no manual EB- 20-MC-10.201, que trata das “Operações em ambientes interagên-

cias”. O documento conceitua a colaboração interagências como uma “síntese da cooperação e coordenação na dinâmica de interação en- tre as agências, colocando a primeira como condição para segunda” (BRASIL, 2013, p 3-8).

Em artigo publicado na Military Review, Davis Jr. (2010) destaca que no ambiente interagência, face à cultura organizacional de cada órgão, o envolvimento e o compromisso deste último apresentam-se em níveis diferenciados. Para o autor, diferentemente das FFAA, a cultura intera- gências não opera segundo uma forte hierarquia, haja vista não existir em tais relações uma única cadeia de comando. Nas operações em am- bientes interagências, o comandante militar não pode comandar todos os atores atuantes no cenário. Dessa forma, deve-se buscar a colabo- ração com vistas a se construir o consenso para alcançar essa unidade de esforços. Tal aspecto, segundo Davis Jr., resulta em efeitos positivos. Essa conclusão vê-se também refletida em uma das passagens da obra “What is a disaster?” (2005), referência no debate internacional sobre o tema desastre. Nessa produção, Enrico Quarantelli sinaliza a importância do trabalho conjunto e da colaboração entre as diversas organizações envolvidas nas respostas aos desastres. Para o autor, desastre é uma crise que exige foco no processo coletivo de planeja- mento. Segundo Quarantelli, não se trata, pois, de gestores produzirem planos escritos, veiculá-los como uma panaceia, formalizando inten- ções públicas com o bem-estar dos grupos vulneráveis, mas promo- verem efetivamente interações e relacionamentos que permitam tro- cas de conhecimento, treinamentos conjuntos e capacidade ampliada de avaliação, de apoio mútuo, bem como se comprometendo com a

atualização/socialização constante das informações.

O relacionamento da Equipe de Assistência Social da Marinha com outras agências no desastre de Nova Friburgo

O estado do Rio de Janeiro, em janeiro de 2011 na região serrana, foi palco de um dos maiores deslizamentos de terra da história do Brasil. O

desastre foi considerado como o décimo pior deslizamento do mundo na última década. A tragédia impôs graves danos à infraestrutura, à econo- mia e à geografia da região afetada. Estima-se que essa ocorrência tenha atingido 20 municípios da região, afetando 90 mil pessoas, das quais 30 mil ficaram desabrigadas ou desalojadas e 916 foram vítimas fatais (BAN- DEIRA et al., 2011). Tal tragédia impôs ao poder público a responsabilidade em responder as suas consequências quanto as suas causas.

A combinação de chuvas fortes com condições geológicas especí- ficas da região foi fator determinante para o desastre: enxurradas de lama, pedras, árvores e detritos vieram abaixo, arrastando tudo pelo caminho. Atenta-se que nessa rota havia dezenas de imóveis, desde favelas a casas de alto padrão e hotéis. As chuvas também ocasiona- ram cheias das nascentes dos rios, no alto das montanhas; o que levou as enchentes dos rios e a inundações das cidades.

Dessa forma, ruas foram cobertas por um mar de lama, com a con- sequente destruição de casas, empilhamentos de carros e muitos óbi- tos. Ademais, a queda de pontes em rodovias deixou cidades isoladas, aspecto que agravou a situação de moradores, os quais já não conta- vam com serviços essenciais básicos como água potável, luz e comu- nicações de qualquer tipo.

Nesse contexto, diante do cenário de calamidade apresentado, as FFAA, baseadas no arcabouço legal para emprego em fenômenos des- sa natureza., responderam à solicitação do Governo do estado do Rio de Janeiro e desencadearam a Operação Serrana; passando, então, a cooperar com a Defesa Civil no apoio à população vitimada. De um modo geral, essa cooperação consistiu no apoio aos órgãos de Defesa Civil dos municípios afetados, na execução de tarefas logísticas.

A atuação da MB nesta operação concentrou-se na Região de Nova Friburgo. Ressalta-se que foi Nova Friburgo a cidade com maior nú- mero de vítimas na tragédia, seguida por Teresópolis, Petrópolis, Su- midouro, São José do Vale do Rio Preto e Bom Jardim. Nesta pers- pectiva, a MB ativou um Grupamento Operativo de Fuzileiros Navais,

composto pela Unidade Médica Expedicionária e por componentes de comando, segurança e apoio. O Grupamento para a tarefa de apoio de saúde instalou um Hospital de Campanha em Nova Friburgo. Tam- bém foram empregados dois helicópteros da Força Aeronaval em mis- sões de transporte de pessoal e material, apoio de resgate às vítimas e distribuição de suprimentos. Outra ação realizada foi à ativação de um posto de atendimento do Serviço de Assistência Social da Marinha dentro do Sanatório Naval de Nova Friburgo, destinado ao atendimen- to do pessoal da Marinha residente naquela cidade (ARAÚJO, 2013).

O estudo de Araújo (2013) indica ainda que, além do governo do estado, as agências com que as FFAA se relacionaram na Operação Serrana, demandando coordenação visando a esforços colaborativos foram: as prefeituras das cidades atingidas, a Defesa Civil do estado do Rio de Janeiro, a Força Nacional de Segurança, o Corpo de Bombeiros Militar e as polícias Civil e Militar do estado do Rio de Janeiro, além de algumas Organizações Não Governamentais (ONGs).

A MB logo após o desastre de Nova Friburgo, visando prestar uma maior assistência ao seu pessoal, determinou que disponibilizasse, em caráter emergencial, todos os serviços da assistência social institucio- nal, o que passou a ocorrer a partir de 14 de janeiro de 2011. Afinal, a fúria das águas não fez distinção de segmento social na composição dos grupos severamente afetados pelo desastre e atingiu pessoas da família naval residentes na região. Os atendimentos, no âmbito da as- sistência social, estiveram restritos ao pessoal militar e servidores ci- vis da ativa e reserva, bem como a seus dependentes e pensionistas, não sendo estendidos à população local. O atendimento a essa última foi realizado no Hospital de Campanha (HCamp) da MB, instalado no estacionamento da Prefeitura de Nova Friburgo (centro da cidade), o qual funcionou 24 horas para atendimento ampliado à população civil. O apoio social foi realizado em um posto de atendimento, montado nas dependências do Sanatório Naval de Nova Friburgo (SNNF), local onde foram disponibilizados todos os programas de assistência social

da MB. A execução dos serviços prestados ocorreu por meio da in- tervenção técnica da EAS composta por 03 assistentes sociais e uma bacharela em direito.

Os primeiros atendimentos da equipe focaram-se na prestação de assistência emergencial, com vistas ao acolhimento de famílias e de providenciar alojamento provisório. Realizou-se ainda o levantamento dos militares residentes nas áreas em risco ou que estavam isoladas, conforme exposto no depoimento a seguir:

A nossa equipe realizou o levantamento das famílias navais atingidas pelo desastre e suas reais necessidades de assistência [...]. Para apoiar essas famílias, foram concedidas cestas bási- cas, leites especiais, fraldas infantis e geriátricas, materiais de limpeza, materiais de higiene pessoal etc. As famílias que se encontravam nas áreas de riscos e que não tinham a possibili- dade de abrigar-se em casa de parentes, foram disponibiliza- dos alojamentos no Sanatório Naval. (E4).

Nota-se, ainda, que após a situação de emergência, “a equipe pas- sou a realizar o monitoramento das famílias alojadas em residências de familiares e amigos [...] em situação de vulnerabilidade, em decor- rência de perdas materiais extensas” (BRASIL, 2011, p. 2-3), conforme exposto no relatório da DASM à Diretoria Geral do Pessoal da Marinha (DGPM) sobre o apoio social à família naval em Nova Friburgo.

A instalação do posto de atendimento social no SNNF facilitou o acesso dos usuários aos serviços prestados, tendo em vista que essa Organização Militar (OM) possui uma expressiva representatividade na cidade de Nova Friburgo, funcionando como unidade de apoio à família. O SNNF também se constituiu como unidade de referência na recepção e distribuição de donativos oriundos de doação da socieda- de civil, pois a OM, na ocasião do pós-impacto do desastre, “apesar de não se apresentar como ponto de doação, foi reconhecido pela popu- lação local como ponto seguro de apoio e distribuição igualitária” (E5).

A tarefa de organização e distribuição de donativos demandou da EAS da MB um relacionamento com organizações locais da sociedade civil, notadamente, com instituições religiosas, conforme exposto nos depoimentos abaixo:

O SNNF é uma referência na cidade. Muitos buscavam a insti- tuição para oferecer donativos e algumas ONGs entraram em contato para que pudéssemos apoiar com estrutura de acesso (aeronaves e caminhões). Como recebemos muitos donativos, organizamos kits para doações e estabelecemos prioridade de doação para crianças abrigadas em escolas e igrejas, com apoio das associações, ONG de apoio às crianças órfãs. (E3).

O sanatório recebeu alguns donativos [...] do meio civil para se- rem repassados para a população. Paralelamente a execução das funções que fomos designados, apoiamos o sanatório no acolhimento, identificação das necessidades e na distribuição desses donativos. (E4).

O relatório sobre o apoio social à família naval em Nova Friburgo (BRASIL, 2011) indica que o contato da EAS com órgãos da munici- palidade, como as Secretarias municipais de Saúde e de Assistência Social, contribuiu para a divulgação dos serviços prestados pela as- sistência social da MB à família naval local, na medida em que essas instituições também se incumbiram de repassar informações acerca do apoio assistencial oferecido pela MB ao seu pessoal afetado pelo desastre. Acrescenta-se a esse aspecto que as orientações presta- das pela Secretaria municipal de Assistência Social à EAS quanto aos abrigos disponibilizados, documentação civil, liberação dos atesta- dos de óbito e cadastro para aluguel social foram fundamentais nos encaminhamentos prestados pela EAS junto aos seus usuários. Por- tanto, em situações adversas como os desastres, as quais envolvem perda de recursos físicos, materiais e simbólicos, torna-se neces- sária uma estrutura eficiente de informações, capaz de orientar os diversos sujeitos sociais envolvidos com a questão.

O relato que se segue indica as relações estabelecidas entre a EAS

da MB com as Secretarias municipais de Assistência Social e de Saúde:

A articulação entre a Secretaria Municipal de Assistência So- cial e a Secretaria Municipal de Saúde de Nova Friburgo, por serem os órgãos responsáveis por assistir à população local, de forma contínua, foram essenciais para referenciar os usu- ários, num momento de restruturação e readaptação dos ser- viços de assistência. (E1).

A análise do depoimento permite identificar relacionamentos in- formais estabelecidos entre a EAS e as demais agências envolvidas nas respostas ao desastre. Pois, ainda que a EAS tenha interagido e executado um trabalho conjunto de distribuição de donativos com entidades religiosas e acessado órgãos municipais, essas relações ocorreram de modo espontâneo, não institucionalizado e sem a orientação de um planejamento comum.

Logo, tomando a contribuição de Raza (2012, p. 7) que caracteriza a co- operação interagência “por um menor formalismo nos relacionamentos institucionais”, pode-se dizer que o relacionamento interagência realizado pela da EAS da MB na Operação Serrana ficou no âmbito da cooperação. É possível ainda afirmar, à luz do manual EB20-MC-10.201, que o nível de colaboração ocorrida entre a EAS junto às demais organizações foi o nível mais baixo, de minimização de conflitos, no qual os planejamentos entre os setores envolvidos são feitos em separado, ocorrendo reuniões ape- nas para se evitar interferência mútua. De um modo geral, os profissionais da EAS da MB não identificaram problemas no relacionamento com as organizações que estabeleceram relações.

Não houve problema de relacionamento [...], pessoas e empre- sas buscaram o Sanatório Naval para realizar doações, diaria- mente recebíamos roupas, água e alimentos das fábricas. Como havia aeronaves disponíveis organizamos esquemas de doação aos locais de mais difícil acesso. (E2).

Acredita-se que essa percepção advém do tipo de trabalho que re- alizaram em conjunto com essas organizações, pois, conforme já dis- cutido nesse estudo, em situação de ajuda humanitária à população atingida por calamidade pública, os meios militares mostram-se fun- damentais à satisfação de suas necessidades básicas. No caso da situ- ação em tela, a cooperação ocorrida entre a EAS e as demais agências tinha o objetivo comum de fazer com que os donativos fossem reco- lhidos e destinados a quem de fato necessitava, de modo célere. Para isso, o emprego da EAS, tanto na organização como no transporte dos donativos, foi um aspecto importante ao êxito do trabalho.

O equipamento militar foi fundamental para que famílias não passem fome ou sede, pois foi através de aeronaves e cami- nhões que tivemos acesso às áreas mais afetadas. Participar de uma operação tão nobre foi enriquecedor pessoalmente e pro- fissionalmente. (E3).

Mormente a grande maioria dos profissionais tenha avaliado como positivo o relacionamento interorganizacional, eles também identifica- ram algumas dificuldades que se apresentaram na ocasião:

As dificuldades encontradas estavam diretamente ligadas à situ- ação de calamidade em que a cidade se encontrava. Não tiveram dificuldades em compartilhar informações e fornecer dados, no entanto, estes eram escassos e incompletos. (E5).

As dificuldades não foram nas relações, mas na sistematização e organização das ações. [...]. Como organizar, o que fazer, ações básicas da intervenção não estavam dadas, todas foram cons- truídas durante o processo. (E4).

Acredita-se que o próprio ambiente de incerteza presente nas situ- ações de desastres, caraterizadas pela imprevisibilidade dos aconteci- mentos, pelas rápidas mudanças e pela necessidade de urgência nas ações pode fornecer elementos à compreensão dessas dificuldades.

Os aprendizados elencados pelos profissionais, em termo de re- lacionamentos interorganizacionais, advindo da sua participação em Nova Friburgo, encontram-se em sintonia com os resultados dos tra- balhos que tomam esse tema como objeto de análise. Pois, as con- clusões desses estudos reforçam a importância da cooperação e da coordenação entre as diversas organizações nas respostas aos desas- tres, notadamente, na melhoria da prestação de socorro às vítimas. Tais aspectos foram apontados nas percepções dos profissionais:

A articulação dos diversos órgãos públicos e instituições priva- das é um fator primordial para garantir o apoio e a proteção às vítimas decorrentes das situações de calamidade pública e de emergência. Os relacionamentos institucionais permitem a inte- gração dos diversos saberes, os quais tendem a contribuir para o enfrentamento das situações emergentes na sua totalidade e de uma forma mais eficaz e eficiente. (E4).

É fundamental que exista um projeto/plano de ação básico para essas situações. (E1).

O último depoimento anuncia a necessidade do planejamento de medidas para enfrentamento dos desastres. É importante que esse planejamento contemple medidas preventivas, as quais passam ne- cessariamente pela determinação da vulnerabilidade de determinada região e, sobretudo, pela identificação do nível de exposição excessivo a riscos no qual se encontram parcelas inteiras da população de uma área geográfica específica, notadamente os mais pobres. Para tanto, é fundamental uma gestão de risco e de desastres que planeje e utilize políticas públicas para prevenção e respostas a esses fenômenos.

Acredita-se que FFAA continuarão a assumir presença marcante nas respostas aos desastres, dada à tendência de maior incidência desses fenômenos e ao fato significante de que elas proveem uma logística

e outras capacidades que podem ser desdobradas mais rapidamente que as de outras Organizações. Nesta perspectiva, no possível cená- rio de desastres, os diversos profissionais militares continuarão a ser chamados a intervir, dentre esses aqueles que atuam no âmbito da assistência social, os quais devem estar capacitados para operar em cooperação em ambiente interagências, visando um melhor enfrenta- mento dos desafios colocados por essas situações.

Considerações finais

Esse trabalho teve como objetivo analisar o relacionamento ocor- rido entre a EAS da MB e as principais agências envolvidas nas res- postas ao desastre em Nova Friburgo. Em relação ao conceito de desastre, o estudo se apoio na teoria dos desastres, vinculada ao campo disciplinar sociológico e que trata a questão como um tipo específico de problema social. Viu-se que essa teoria rompe com a concepção dos desastres como eventos naturais (teoria dos ha- zards) e os coloca enquanto produção do ambiente social, político e econômico. Segundo os autores alinhados a essa teoria, o nível de vulnerabilidade vivenciado por certos grupamentos sociais está no cerne da compreensão desses fenômenos.

Discutiu-se também que a frequência, a intensidade e os impactos gerados pela ocorrência desses fenômenos no Brasil vêm demandan- do o emprego das FFAA. Esse cenário vem colocando às FFAA o desa- fio de comporem entidades interorganizacionais, complementando as capacidades de outras organizações.

Destacou-se neste estudo que o fenômeno interorganizacional não é algo novo, uma vez que, desde a existência da humanidade pessoas e instituições interrelacionam-se. Ressaltou-se, todavia, que a produ- ção de pesquisas voltadas à análise dessas relações, ainda é algo pou- co explorado no Brasil, notadamente abordagens vinculadas a estudos na área econômica, política e social. Logo, a necessidade de se incen- tivar a produção de pesquisas nesse campo de investigação científica.

Buscou-se no trabalho dialogar com a literatura e com a doutrina militar que versa sobre essas relações, para, a partir dessas referên- cias, melhor entender o relacionamento ocorrido entre a EAS da MB com agências envolvidas nas respostas ao desastre em Nova Fribur- go. Viu-se que, a exemplo do que acontece na maioria das operações humanitárias, os meios militares usados visaram garantir, prioritaria- mente, à satisfação de necessidades básicas da população vitimada: alimentos; água potável; assistência em saúde; reestabelecimento de comunicações e energia; busca e resgate, dentre outras.

Frisa-se que a intenção inicial da MB, ao deslocar essa equipe para Nova Friburgo, não era prestar assistência social a população civil afe- tada pela tragédia. Mas sim, atender a família naval da área vitimada pelo desastre. Entretanto, dada a magnitude da catástrofe e a confian- ça depositada pela sociedade local na MB, esses profissionais pas- saram a estabelecer relações com organizações civis, principalmente entidades religiosas e alguns órgãos da municipalidade. Tais relações foram realizadas com o objetivo principal de executar um trabalho co- laborativo, visando à organização e à distribuição de donativos, não somente para o pessoal da MB, mas para todos os afetados.

Os resultados do estudo indicaram também que ocorreu o nível mais elementar de colaboração interagência entre a EAS da MB e essas organizações: a minimização dos conflitos. Pois, os vetores envolvidos nesse trabalho de distribuição de donativos planejaram suas ações com independência, reunindo-se somente para ajustar procedimen- tos, com vistas à redução de interferências mútuas.

No que se refere às dificuldades encontradas pela EAS em tais rela- cionamentos, o estudo identificou que estavam vinculadas ao ambien- te de incerteza que permeia os desastres, bem como a ausência de um planejamento prévio no município para lidar com essas situações.

No tocante ao aprendizado, em termos de relacionamento inte- rorganizacional, o estudo identificou que a participação dos pro- fissionais nesse tipo de operação contribuiu à ampliação do seu

entendimento acerca da importância da construção de redes, do compartilhamento de boas práticas entre as organizações, da ar- ticulação de diferentes conhecimentos para que somem e se mul- tipliquem aqueles já existentes para enfrentamento dos desastres. Acredita-se que tal aprendizado, se incorporado à prática desses profissionais e multiplicado, contribuirá para uma melhor prepara- ção e atuação dessas equipes em ocasiões futuras.

Afinal, há de se considerar que, apesar de serem eventos que pro- duzem uma ruptura da vida social, os desastres não estão fora do controle humano. Pois na maioria de suas ocasiões, eles ocorrem em áreas geográficas determinadas e têm um agravamento dos seus im- pactos em grupos sociais específicos. Logo, a experiência adquirida de desastres anteriores pode fornecer contributos à formulação de um planejamento prévio ao enfrentamento desses eventos.

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Notas

1 Doutora em Serviço Social pela UFRJ (2015) e mestre em Serviço Social pela PU- C-Rio (2003). Graduada em Serviço Social pela UECE. Assistente social militar da Marinha do Brasil e professora da Universidade Veiga de Almeida em cursos de Graduação. nº ORCID: 0000-0001-7533-4636. E-mail: nadiaxmoreira@yahoo. com.br.
2 O amparo legal para emprego das FFAA em desastres encontra-se na lei com- plementar nº 97, de 09 de junho de 1999, alterada pela Lei Complementar nº 117, de 02 de setembro de 2004, e pela Lei Complementar nº 136, de 25 de agosto de 2010, que determina às Forças Armadas cooperar com a defesa civil, na forma determinada pelo Presidente da República.
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