Resumo: O presente artigo tem como objetivo propor reflexões teóricas acerca do processo de criminalização das juventudes pobres e o consequente processo de encarceramento dessa população, no Brasil e na Argentina. É preciso considerar que esse debate está atravessado por contradições que emanam da (des) proteção social, da fragilidade das políticas públicas, do desmonte da socioeducação e da maneira perversa de controle e reprodução das desigualdades sociais engendradas no sistema capitalista. Temos, portanto, um tempo presente marcado pelo avanço e fortalecimento do Estado Penal, em detrimento da proteção social e dos direitos das juventudes.
Palavras-chave:JuventudeJuventude,CriminalidadeCriminalidade,(Des) Proteção Social(Des) Proteção Social,Estado PenalEstado Penal.
Artigos
Avanço penal e criminalidade: o percurso punitivo das juventudes pobres no Brasil e na Argentina
Avanço penal e criminalidade: o percurso punitivo das juventudes pobres no Brasil e na Argentina
Bruna Carolina Bonalume1
Adriana Giaqueto Jacinto2
Mauro Luciano Testa3
Resumo
O presente artigo tem como objetivo propor reflexões teóricas acerca do processo de criminalização das juventudes pobres e o consequente processo de encarceramento dessa população, no Brasil e na Argentina. É preciso considerar que esse debate está atravessado por contradições que emanam da (des) proteção social, da fragilidade das políticas públicas, do desmonte da socioeducação e da maneira perversa de controle e reprodução das desigualdades sociais engendradas no sistema capitalista. Temos, portanto, um tempo presente marcado pelo avanço e fortalecimento do Estado Penal, em detrimento da proteção social e dos direitos das juventudes.
Palavras chave
Juventude; Criminalidade; (Des) Proteção Social; Estado Penal.
Criminal advancement and crime: the punitive path of poor youth in Brazil and Argentina
Abstract
This article aims to propose theoretical reflections about the process of criminalization of the poor youth and the consequent process of imprisonment of this population in Brazil and Argentina. It is necessary to consider that this debate is crossed by contradictions emanating from the lack of social protection, the fragility of public policies, the dismantling of socio-education and the perverse ways of control and reproduction of the social inequalities engendered in the capitalist system. We have, therefore, a moment in time characterized by the advancement and strengthening of the Criminal State, to the detriment of social protection and the rights of youth
Keywords
Youth; Crime; (De) Social Protection, Criminal State.
Artigo recebido em junho de 2019.
Artigo aceito em setembro de 2019.
Introdução
O presente artigo é fruto de uma parceria interinstitucional que reúne pesquisadores do Brasil, Argentina, Estados Unidos e Reino Unido, que vêm se debruçando nos estudos sobre a criminalidade juvenil, bem como o sistema de proteção social em cada país envolvido e seus respectivos sistemas socioeducativos.
Essa parceria foi construída a partir da participação de uma doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social no Programa SCALA da Associação Universitária de Montevidéu, que tem como objetivo promover a cooperação e integração das Universidades que o compõem, bem como a internacionalização do ensino superior, através da promoção da mobilidade de alunos regulares de mestrado e doutorado.
A referida mobilidade ocorreu na Universidade Nacional de Rosário (UNR), Argentina. Ao longo desse período, através das atividades acadêmicas desenvolvidas e do intenso processo de estudos houve a aproximação com pesquisadores que vêm discutindo a condição de vida de adolescentes e jovens que cometem atos infracionais em um cenário internacional, o impacto das políticas públicas e a maneira como a violência e a violação de direitos, atravessam a vida desses sujeitos sociais. O processo de internacionalização acadêmica resultou na formação do referido grupo de pesquisadores que propõe essa reflexão teórica.
Nesse artigo, propõe-se um debate sobre o processo de criminalização das juventudes4 pobres e o consequente processo de encarceramento dessa população, no Brasil e na Argentina. Essa discussão assenta-se na perspectiva do desenfreado avanço do Estado Penal em ambos os países, que alinhado ao projeto neoliberal, conservador e de cunho repressivo, fortalece o fetiche da proteção integral sobre as juventudes, ao passo que silencia as contradições que emanam da (des) proteção social, da fragilidade das políticas públicas e da maneira perversa de controle e reprodução das desigualdades sociais engendradas no sistema capitalista.
Como desdobramento dos argumentos desenvolvidos neste trabalho, destacamos o fato de vivermos em uma sociedade que instrumentaliza a violência, a punição e o controle social da pobreza e sua reprodução social, o que evidentemente impacta na condição de vida de adolescentes e jovens, sobretudo daqueles considerados infratores. Nesse contexto, serão apresentados dados da política de encarceramento juvenil, bem como das expressões da violência vivenciada por essa população diante do processo de acumulação capitalista e do compromisso assumido pelo Estado em apoiar em projetos societários que nada condizem com as ações de proteção integral e efetivação de direitos.
Criminalização e controle social sobre as juventudes: papel do Estado ou política de classe?
Para situar o debate em torno da criminalização e controle sobre as juventudes, torna-se necessário lançarmos um olhar para as marcas deixadas por um passado não tão distante, reconhecendo que essas atravessam um processo sócio histórico e resultam em um legado de mecanismos e estratégias punitivas, coercitivas e de criminalização da infância, adolescência e juventudes, eminentemente, pobres, revelando-se como um perverso contexto de violação de direitos desses sujeitos sociais.
Assim, é válido destacar que há uma linha tênue entre o discurso da proteção e da punição, o que se manifesta nas contradições de um arcabouço normativo consolidado no bojo de uma sociedade de classes, portanto, essa proteção se traveste de coerção e integra a formulação de um projeto societário, destinado a determinados grupos sociais.
Evidentemente, não podemos ignorar toda a trajetória histórica de luta e resistência e intensa mobilização social ocorrida, sobretudo nas décadas de 1980 e 90 em ambos os países em defesa dos direitos da infância, adolescência e juventude. Alinhada às normativas internacionais, Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores – Regras de Beijing (1985), Convenção Internacional das Nações Unidas sobre os direitos da criança e do adolescente (1989), as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil – Diretrizes de RIAD (1990), as Regras das Nações Unidas para a Proteção de Menores Privados de Liberdade (1990), a Resolução do Conselho da Europa sobre Delinquência juvenil e transformação social (1978) e a Recomendação n° R (87) 20 do Comitê de Ministros do Conselho da Europa sobre as reações sociais frente à delinquência juvenil, buscou a superação do paradigma do modelo tutelar para a doutrina da proteção integral.
Esse movimento resultou no Brasil na promulgação do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), Lei 8069 no ano de 1990 e posteriormente na Argentina na Ley Nacional 26.061 de Protección Integral de los Derechos de Niñas, Niños y Adolescentes em 2005, porém ainda não é possível afirmarmos que a lógica de proteção integral e efetivação de direitos está consolidada, já que os vestígios do passado ainda estão intimamente ligados à lógica sancionatória do tempo presente.
Há em curso a direção social de um projeto societário que se alimenta de propostas políticas alicerçadas no controle e na repressão, o que nos coloca em estado de alerta, pois o que está em xeque são os direitos sociais, sobretudo do contingente populacional mais vulnerabilizado, e aqui estão incluídas as juventudes, claramente não todas, mas aquelas que vivem as mais perversas faces da pobreza.
Na Argentina o marco normativo existente em relação à Justiça Juvenil é o “Régimen Penal de la Minoridad ley N°22278”. Esse estabelece que a idade para a responsabilidade penal seja de 16 anos. Contudo, tramita um novo projeto de lei cuja finalidade é baixar essa faixa etária para os 15 anos, em um claro movimento ostensivo de vários setores da sociedade, inclusive midiático. Segundo a UNICEF (2017, p. 66) “la edad de punibilidad y la frecuencia con la que los adolescentes cometen delitos son temas habitualmente tratados en los medios de comunicación y en los debates políticos. Muchos de esos tratamientos se basan en información incorrecta y enfatizan de modo sensacionalista casos aislados”.
No Brasil a situação é ainda mais assustadora, à medida que o ECA estabelece que serão inimputáveis adolescentes e jovens com 18 anos incompletos, também assegura que a responsabilidade penal inicie aos 12 anos completos. Isso implica afirmar que a partir dessa idade, um\uma adolescente poderá cumprir medidas socioeducativas em meio aberto e, também, fechado. Ainda assim, cresce e se intensifica no país, o debate em torno da redução da maioridade penal para 16 anos, forjado no discurso falacioso de não haver punição e responsabilização de adolescentes e jovens que cometem atos infracionais, associados ainda à falsa ideia de segurança e de um projeto de paz nacional, o que justificaria o ostensivo avanço da ampliação indiscriminada da intervenção penal. As campanhas para a redução da maioridade tomam conta das noticiais nacionais, as situações de violência com o envolvimento de adolescentes e jovens recebem ampla visibilidade ao passo que o juvenicídio experimenta o silêncio intencional e o descaso das políticas públicas.
O termo juvenicídio foi cunhado por Valenzuela (2015) para designar o fenômeno da mortalidade juvenil por meio dos homicídios especialmente em países de desenvolvimento capitalista tardio e periférico. Para o autor, o juvenicídio possui vários componentes que “perpassam o mero registro de jovens assassinados. O juvenicídio explica algo mais significativo, pois se refere a processos de precarização, vulnerabilidade, estigmatização, criminalização e morte. (p. 11)", tendo como eixo central a estratificação social baseada em relações de subalternização.
O fato é que a lógica conversadora do tempo presente alinha seus discursos em torno dos interesses de classe, em um articulado mecanismo ideológico de controle sobre as juventudes pobres. Nesse dissemina-se a ideia desses sujeitos como perigosos, portanto justificam-se as operações violentas realizadas pelos aparelhos de segurança pública do Estado como resposta ao crime, as mortes das juventudes parecem não importar ao passo que contraditoriamente cresce e se intensifica o desejo de punir.
Para Guemureman (2017, p. 34) imputabilidade e punibilidade são termos frequentemente utilizados como sinônimos, contudo destaca o autor que, juridicamente, são terminologias diferentes. Por imputabilidade se entende:
a) susceptibilidad de reprochabilidad de un hecho delictivo a un supuesto autor; b) capacidad de discernimiento; o c) capacidad de comprensión y orientación de las acciones con arreglo a fines”. Já a puntabilidade é “potestado facultad del Estado de fijar la edad a partir de la cual los sujetos son pasibles de recibir sanciones en carácter de reproche a las acciones disvaliosas. (GUEMUREMAN 2017, p. 36)
Trata-se, portanto, de uma política de Estado. A Convenção Internacional dos Direitos da Criança (1989) definiu em seu art. 40, inciso 3, que os Estados deverão promover, entre outras ações, o estabelecimento de uma idade mínima para a responsabilidade penal. Há de se entender, todavia, que no bojo de uma sociedade capitalista, intimamente vinculada ao projeto neoliberal que se alastra pelos países, é estabelecido um campo de disputas ideológicas e tensões entre classes, o que consequentemente atravessa a lógica da proteção e da punição. Assim, a instauração do poder do Estado torna-se eminentemente necessária para a representação dos interesses das classes dominantes.
Nesse contexto, Zaffaroni e Batista (2006, p. 43-44) essa lógica punitiva e seletiva do Estado é reconhecida pela Criminologia como “processo de criminalização”, que de forma não aleatória resulta em aparatos legais que irão constituir o chamado Estado Penal. Para os autores esse processo se desenvolve em duas etapas denominadas de primaria e secundária, respectivamente:
Criminalização primária é o ato e efeito de sancionar uma lei penal material que incrimina ou permite a punição de certas pessoas. Trata-se de um ato formal fundamentalmente programático: o deve ser apenado é um programa que deve ser cumprido por agências diferentes daquelas que o formulam. Em geral, são agencias políticas que exercem a criminalização primária, ao passo que o programa por elas estabelecido deve ser realizado por agências de criminalização secundária (policiais, promotores, advogados, juízes, agentes penitenciários). Enquanto a criminologia primária é uma declaração que, em geral se refere a condutas e atos, a criminalização secundária é a ação punitiva exercida por pessoas concretas. (ZAFFARONI e BATISTA 2006, 43-44)
Assim sendo, podemos considerar que a materialidade do processo de criminalização se manifesta, sobretudo, no âmbito secundário, à medida que são as agências que compõem essa segunda dimensão que, em um evidente recorte de classe social, legitima as pessoas a serem criminalizadas e aquelas que serão socialmente protegidas. Assim, destacam os autores que não casualmente essa seletividade está impregnada de estereótipos definidos por um grupo dominante o que resulta na categorização da imagem de sujeitos ‘delinquentes’, dotada de componentes étnicos, etários e de classe social.
Nessa mesma perspectiva Wacquant (2008), destaca que essa política de criminalização da pobreza e gestão da miséria é gerenciada pela lógica do Estado Penal, sendo esse definido pelo autor: “[...] o surgimento do Estado Penal é o resultado de uma política de penalização da miséria, que responde ao crescimento da insegurança salarial e ao aprofundamento do gueto como mecanismo de controle de uma população duplamente marginalizada no duplo plano material e simbólico”. (p.466).
Ainda segundo o autor, esse gerenciamento se dá em duas modalidades. O primeiro componente do Estado Penal refere-se à transformação das políticas sociais em instrumentos de controle e vigilância, sobretudo da população pobre e considerada como perigosa. O segundo componente é o encarceramento ou a repressão ofensiva sobre essa mesma população, que atinge prioritariamente negros e jovens moradores da periferia. Wacquant (2001, p. 31) aponta que a força desse segundo componente tem como traço característico o avanço neoliberal, que envolve a visível diminuição do orçamento das políticas sociais em detrimento do crescente orçamento das políticas penais/criminais. E ainda, a ampliação do número de prisões privadas como nicho lucrativo e as estatísticas de jovens apreendidos bem como os atos cometidos, que revelam que na atualidade há um aumento de jovens cumprindo medidas de privação de liberdade por atos menos graves.
Há esse debate torna-se importante incorporar o que Wacquant (2008) chamou de prisão social, ou seja, aquela que decorre do confinamento da população pobre na periferia, ou na perspectiva do autor no gueto. Para Wacquant,
(...) o gueto é um modo de ‘prisão social’, enquanto a prisão funciona à maneira de um ‘gueto judiciário’. Todos os dois têm por missão confinar uma população estigmatizada de maneira a neutralizar a ameaça material e/ou simbólica que ela faz pesar sobre a sociedade da qual foi extirpada. (WACQUANT, 2003, p. 108).
Assim, podemos considerar que o gueto e a prisão compartilham da mesma lógica comum de seletividade, segregação social e racial, confinamento. Nesse sentido, o Estado revela sem estranheza o seu caráter penal, como parte integrante de um projeto de classes, como destaca Wacquant “o estado penal, insidioso, expansivo e caro, não é um desvio do neoliberalismo, mas [sim] um de seus ingredientes constitutivos” (WACQUANT, 2012, p. 33)
Entre grades e algemas: um retrato das juventudes pobres e encarceradas no Brasil e na Argentina
A realidade das juventudes na América Latina nos revela uma face pungente da questão social. A pobreza, a exploração do trabalho, o desemprego, a aridez diante das precárias condições de vida denunciam uma sociedade demarcada pelas desigualdades sociais, nos moldes da expansão capitalista.
De acordo com os dados do Panorama Social da América Latina de 2017, nos anos de 2015 e 2016, os níveis de pobreza e pobreza extrema aumentaram, após mais de uma década de redução na maioria dos países, como pode ser observado no gráfico abaixo:
Gráfico 1. Dados referentes à pobreza na América Latina no período de 2014 a 2016
Fonte: Elaborado pelos autores com base nos dados disponíveis pelo CEPAL, 2018.
Os dados revelam que o número de pessoas pobres na América Latina saltou de 168 milhões no ano de 2014 para 186 milhões no ano de 2016. Já a pobreza extrema, que no ano de 2014 atingia 8,2%, passou para 10% em 2016. (CEPAL, 2018, p. 85)
Em relação à população infanto-juvenil, o Panorama Social destacou que a incidência da pobreza e da extrema pobreza é mais elevada entre meninos e meninas, adolescentes, jovens, mulheres e a população que mora em áreas rurais. Em 2016, a pobreza afetava 46,7% das crianças e adolescentes entre 0 e 14 anos e a extrema pobreza, 17%. No caso dos jovens de 15 a 29 anos esses números eram de 31,1% e 9,5%, respectivamente.
Esse mesmo documento destaca que a desigualdade é uma característica histórica e estrutural das sociedades latino-americanas e caribenhas, que foi mantida e reproduzida mesmo em períodos de crescimento econômico. Isso parece coerente com o tipo de capitalismo periférico dependente, característico segundo Marini (2000), de uma economia exportadora e voltada ao mercado externo, que pode prescindir do consumo individual dos seus trabalhadores, tornando possível a maior exploração da força de trabalho, ou seja, a superexploração. Para o autor, essas condições (dependência e superexploração), favorecem o aumento das desigualdades social e antagonismos, acirrando ainda mais os conflitos de classe.
Para Florestan Fernandes (2005, p. 323) na América Latina esse capitalismo dependente e periférico “tende a introduzir maiores desequilíbrios econômicos na base dos antagonismos de classes e controles políticos mais rígidos sobre seus efeitos”. Assim, segundo o autor, nesse “capitalismo difícil”, a questão social tende a se intensificar e se complexificar, colocando em risco vários segmentos da classe trabalhadora, incluindo também as juventudes.
Na Argentina, segundo dados da UNICEF (2017), os níveis de pobreza atingem de forma significativa a população adolescente e jovem, de forma geral 1 em cada 2 adolescentes. Na região do sul do país a pobreza atinge 1 em cada 3 adolescentes, 1 em cada 2 na NEA e 4 em Cuyo e Centro. A desigualdade também se manifesta no acesso a proteção social. Segundo o relatório, embora o Programa Social “Asignación Universal por Hijo”5, atinja um milhão de adolescentes entre 12 e 17 anos, após os 13 anos os níveis de cobertura tendem a diminuir e isso se acentua ainda mais entre aqueles que estão com 16 e 17 anos, o que expõe esse contingente populacional há maiores possibilidades de riscos sociais e econômicos.
Esse mesmo relatório aponta para uma situação preocupante em relação às condições de trabalho e educação das juventudes. Segundo consta, um em cada seis adolescentes entre 14 e 15 anos trabalham e um a cada três entre os 16 e 17 anos. Contudo, o relatório aponta que essa inserção tem contribuído com o abandono escolar. Além disso, 16,3% dos adolescentes e jovens que trabalham estão inseridos em postos que não atendem aos parâmetros fixados pela legislação argentina. Por essa razão, muitos acabam tendo as jornadas laborais ampliadas, 6,1% realizam trabalho noturno, mesmo sendo proibido pela lei.
No âmbito educacional segundo a UNICEF (2017), cerca de 500 mil adolescentes e jovens estão fora da escola e menos da metade daqueles que ingressam na escola secundária completam o ciclo educacional. Outro aspecto observado em relação à evasão é a taxa de repetência que, segundo o estudo, ocorre, sobretudo, entre a população mais pobre. Dentre as principais causas do abandono 14% são atribuídas à necessidade de ingresso no mercado de trabalho, 8,8% decorrem das dificuldades econômicas para custear o trajeto da casa para a escola e 11% devido à gravidez na adolescência ou da necessidade de cuidar de irmãos mais novos. (UNICEF, 2017)
A realidade brasileira caminha na mesma direção. Segundo dados da UNICEF (2018), em 2015, 6,5% da população de crianças e adolescentes, ou seja, 2.802.259 estavam fora da escola. Além disso, o estudo revela que de cada três crianças e adolescentes que não frequentam a escola, quase dois são negros. Cerca de 2.529.750 crianças brasileiras eram trabalhadores infantis. A grande maioria desses trabalhadores (83%) está na faixa etária de 10 a 17 anos.
Esse mesmo documento aponta que 23% da população de crianças e adolescentes no Brasil sofrem privações de seus direitos fundamentais. Além disso, 18 milhões de crianças e adolescentes no Brasil vivem em famílias com renda insuficiente, e quase seis milhões vivem em famílias cuja renda não compra uma cesta básica de alimentos. Outro dado alarmante revela o perverso recorte étnico racial que atravessa as condições de vida dessa população, as crianças e adolescentes negros têm maior probabilidade de serem pobres do que crianças e adolescentes brancos.
Segundo o estudo, foram observadas reduções importantes referentes às privações monetárias ao longo dos últimos dez anos: de 55% da população de crianças e adolescentes, em 2005, caiu para 34%, em 2015. A pobreza extrema também caiu de 20% para 11%. Todavia o estudo conclui que embora aparentemente o progresso tenha sido contínuo ao longo do período analisado, foi observado também que a partir de 2013 houve uma reversão da tendência, com um leve aumento entre esse ano e 2015. Para a UNICEF (2018, p.140), “certamente, trata-se de um aumento leve (cerca dos dois pontos percentuais), mas é possível afirmar que a pobreza monetária deixou de baixar como ocorria e a pobreza extrema alcançou em 2015 o nível a que tinha chegado em 2011”. Por fim, dentre as conclusões do estudo, destacamos:
Embora considerando as fortes limitações que enfrenta qualquer tentativa de medição como a que foi realizada nesta pesquisa, é possível determinar que aproximadamente 50% da população de crianças e adolescentes do país têm seus direitos violados de uma maneira ou outra; e que 19% registram ao menos uma violação definida aqui como extrema. Um dos aspectos mais destacados do estudo é a desigualdade por cor: crianças e adolescentes negros registram uma taxa de pobreza ou violação de direitos de 58%, em comparação com 38% dos brancos; e uma taxa de pobreza extrema de 24%, em comparação com 13% dos brancos. (UNICEF, 2018, p. 151)
Os dados descritos situam a juventude brasileira e a argentina nas fronteiras da subalternidade, evidentemente é preciso considerar que há peculiaridades em cada país, já que estamos diante de cenários políticos, econômicos, sociais e culturais que ora se assemelham e ora divergem, tendo em vista o próprio processo sócio histórico dessas nacionalidades. Contudo, no cerne desse debate nos deparamos com um elemento comum, as juventudes pobres e como essas experimentam os mais perversos impactos da violação de direitos e da (des) proteção social.
A resposta do Estado a essa complexa situação mostra-se frágil à medida que se consolida a partir de políticas compensatórias, seletivas e fragmentadas, as quais, alicerçadas nas bases do discurso conservador que se alastra no tempo presente, permitem ainda que o compromisso com os ideais neoliberais seja fortalecido e propagado.
É preciso compreender que as desigualdades sociais, consolidadas no modelo vigente de sociedade, são resultado da riqueza socialmente produzida e acessada por poucos, bem como do processo de concentração do poder. A pobreza se alastra ao passo que aumenta a distância entre ricos e pobres, o que não se trata de uma mera coincidência. Para Netto (2007, p. 142) esse movimento do “desenvolvimento capitalista, é necessário e irredutivelmente, produção exponenciada de riqueza e produção reiterada da pobreza”
Portanto, assistimos atônitos o crescente e desenfreado processo de violação de direitos das juventudes, que ancorado nas estruturas básicas do sistema capitalista legitimam a penalização da miséria e o consequente avanço do Estado Penal em detrimento do Estado Social, ao passo que se institui uma verdadeira “ditadura sobre os pobres” (WACQUANT, 2001, p.10)
É sobre essas juventudes pobres que recai o braço forte do Estado. Segundo Iturralde (2012) a população penitenciária da América Latina tem um perfil predominante de jovens do sexo masculino, com baixos níveis de educação e inserção no mercado de trabalho, vivem nas periferias e são presos por crimes, em sua maioria, de menor gravidade. Nesse sentido Wacquant (2012, p. 12) destaca que esse avanço penal “é uma resposta política não à ascensão da insegurança criminal, mas à difusa insegurança social moldada pela fragmentação do trabalho assalariado e pela reestruturação da hierarquia étnica”.
Segundo Sozzo (2018) nas últimas duas décadas um aumento extraordinário nas taxas de encarceramento na América Latina, conforme pode ser observado na figura abaixo:
FIGURA 1- Aumento da taxa de encarceramento na América Latina
Fonte: SOZZO (2018, p.17)
Segundo autor, de modo geral todos os países sul-americanos apresentaram taxas de encarceramento superior a 150 presos por 100 mil habitantes. O Brasil ocupa topo do ranking, pois registrou a maior taxa de encarceramento. Segundo o autor no ano de 1992 a taxa de encarceramento era de 74 presos para 100 mil habitantes, porém essa saltou para 300\100 mil habitantes no ano de 2013, o que representa um crescimento de 117%.
Autores como Sozzo (2018, p. 18) e Iturralde (2012), avaliam que esse panorama punitivo está associado “à ascensão do neoliberalismo como um projeto político transnacional desde os anos 1970, produzido em diferentes momentos nos distintos contextos nacionais, tanto no marco de regimes políticos autoritários como democráticos, com variações em sua força e seus efeitos”.
Esse projeto político impulsionado através das fronteiras nacionais – conectadas “casual e funcionalmente” – por uma elite complexa, composta por atores distintos, promove segundo Iturralde (2012) uma tripla transformação do Estado diante das mutações da economia capitalista e dos altos níveis de insegurança social, que geram: a eliminação da intervenção estatal na economia, enxugamento das políticas públicas e expansão do seu aparato penal. (ITURRALDE, 2012: p. 181).
Em relação à população de adolescentes e jovens no Brasil e na Argentina a mesma lógica e percurso punitivo são presentes. A recente publicação da Defensoría del Pueblo de la Provincia de Santa Fe – Argentina (2018) em parceria com a UNIFEC, destacou a preocupação com a aplicação das medidas de privação da liberdade da juventude nos países latino-americanos. Segundo o documento,
Sobre la privación de libertad, que atraviesa de modo excluyente la lógica del funcionamiento de los sistemas penales juveniles en Iberoamérica, preocupa que la misma se constituya aparentemente como regla general y no como la excepción en los procesos penales contra las y los adolescentes infractores, como refleja el elevado número de niños y adolescentes, especialmente en situación de vulnerabilidad y de quienes se registra un tránsito extenso por los sistemas de protección previo a su ingreso al penal juvenil. Esto queda reflejado en lo que el CRC expresa a través de la Observación General N° 10 y Observaciones Finales realizadas a los países (DEFENSORIA DEL PUEBLO DE SANTA FÉ, 2018, p.34).
Isso pressupõe reconhecer que a natureza excepcional da medida de privação da liberdade é um dos princípios mais indicados no que diz respeito à garantia de direitos dos adolescentes e jovens em conflito com a lei. No entanto, os dados levantados no estudo mostraram uma tendência preocupante segundo o relatório da Defensoria, a imposição progressiva de sanções ou medidas mais duras contra infrações cometidas por adolescentes e jovens.
No Brasil, segundo dados do Levantamento Anual do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) (BRASIL, 2018), referente ao ano de 2015, revela que a medida socioeducativa de internação, que deveria ser aplicada em caráter de exceção, representa mais de 68% dentre todas as medidas aplicadas no Brasil e no conjunto de uma série histórica, tem visível crescimento. No ano de 2010 a medida foi aplicada a 12.041 adolescentes\jovens, já no de 2015 esse número saltou para 18.381.
Na Argentina a internação foi aplicada em 22,3% dos casos, segundo o último levantamento realizado pela Secretaria “Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia” e pela UNIFEC (2015). Todavia, é contraditório observar que esse mesmo levantamento revela que o número de Instituições com privação da liberdade é visivelmente superior àquelas sem a restrição da liberdade, como pode ser visto no quadro abaixo:
Quadro 1- Quantidade de Dispositivos por tipo
Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da Secretaria “Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia” e pela UNICEF (2015).
Em outro levantamento realizado pela Defensoría de Niñas, Niños y Adolescentes de la Provincia de Santa Fe e UNICEF Argentina (2015), é possível observar um aumento na aplicação da medida de privação da liberdade em relação à medida em meio aberto, conforme aponta o gráfico 2, o que revela a tendência do percurso punitivo das juventudes.
Grafico 2. Jovens com privação de liberdade e medida em meio aberto 2010-2014
Fonte: Elaborado a partir dos dados Defensoría de Niñas, Niños y Adolescentes de la Provincia de Santa Fe e UNICEF (2015)
Brasil e Argentina guardam entre si elementos comuns quando se pensa no perfil das juventudes encarceradas. Em relação à questão de gênero, há predominância de jovens do sexo masculino (96%) no Brasil e (90%) na Argentina. A faixa etária concentra-se entre 16 e 17 anos com (57%) no BRASIL, 2018 e (90%) na Argentina. Cabe aqui destacar que no Brasil a responsabilidade penal se inicia aos 12 anos completos, portanto, há uma variação maior na questão etária, já que na Argentina essa idade foi fixada entre os 16 e 18 anos. Quando analisamos o perfil étnico-racial, não encontramos nenhum dado oficial na Argentina, todavia no Brasil, 55% dos adolescentes\ jovens que cumprem medida de internação são negros, o que não se trata de uma mera coincidência, já que o Brasil historicamente carrega um corte de raça e classe que está intimamente relacionado à sua herança escravocrata. (BRASIL, 2018; Secretaria Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia y UNICEF, 2015).
Quanto à tipificação do ato infracional, no Brasil 46% são análogos ao roubo, 24% análogo ao tráfico de drogas e 10% (2.788) análogo ao homicídio. Na Argentina 65% dos jovens adentram no sistema por crimes contra a propriedade. Em ambos os países os crimes hediondos, sobretudo contra a vida, são praticados em menor quantidade, embora a mídia geralmente amplie a magnitude dessas práticas.
Sobre essa questão, Zaffaroni (2012, p 307) definiu como criminologia midiática:
A criminologia midiática cria a realidade de um mundo de pessoas decentes frente a uma massa de criminosos, identificada através de estereótipos que configuram um eles separado do resto da sociedade, por ser um conjunto de diferentes e maus. O eles da criminologia midiática incomodam, impedem de dormir com as portas e janelas abertas, perturbam as férias, ameaçam as crianças, sujam por todos os lados e por isso devem ser separados da sociedade, para deixar-nos viver tranquilos, sem medos, para resolver todos os nossos problemas. Para tanto, é necessário que a polícia nos proteja de suas ciladas perversas, sem qualquer obstáculo nem limite, porque nós somos limpos, puros e imaculados.
Desse modo, o aparelho midiático, em sua ideologia burguesa, contribui com o fetiche da estigmatização e criminalização das juventudes, ao passo que favorece a disseminação no imaginário social da ideia de sujeito perigoso, a quem não cabe a proteção integral e sim a dura mão do Estado.
Violência e (des) proteção social: a quem estamos tentando enganar?
A (des) proteção social e a violação de direitos atingem as juventudes dentro e fora dos regimes de privação da liberdade, portanto, soma-se ainda ao percurso punitivo desse contingente populacional, a violência institucional. Segundo a UNICEF (2017), entre os anos de 2011 e 2015, 207 jovens encarcerados com menos de 18 anos foram vítimas de maus tratos e tortura nos Centros de Detenção da Província de Buenos Aires.
No Brasil, em 2014, foram registradas 48 mortes de adolescentes em unidades de internação para cumprimento de medida socioeducativa, o que representa uma média de quatro óbitos por mês, o dobro se comparado ao ano de 2013. Foram identificadas as seguintes causas para as mortes: conflito generalizado, conflito interpessoal, doença crônica, suicídio, morte natural súbita e a categoria outros. Destaca-se que a categoria “outros” foi apontada em 46% dos casos de óbitos, o que pode indicar uma dificuldade do Sistema em registrar essas informações e pouca atuação dos órgãos de fiscalização, monitoramento e controle social. (BRASIL, 2018).
Como poderia ser traduzida esta categoria “outros”? O que ela informa? Não é no mínimo estranho que a quase metade das mortes no sistema socioeducativo brasileiro não tenha sido esclarecido? Pane no sistema ou um silêncio conveniente?
Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Sou da Paz (2018, p.7), um quarto da amostra representativa dos jovens entrevistados ofereceu depoimentos espontâneos e consistentes de agressões físicas por parte de servidores da Fundação CASA, “expondo a necessidade de assegurar um processo de capacitação e treinamento contínuo dos profissionais, orientado pelo projeto pedagógico do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e garantir a apuração célere e aprofundada de denúncias de abusos”
Fora das grades e longe das algemas, a morte e violência contra as juventudes no Brasil e na Argentina parecem não causar qualquer estranhamento. Na província de Rosário na Argentina, segundo Testa (2014) a violência policial é constantemente denunciada por jovens ao ingressarem no Centro Especializado de Responsabilidad Penal de Rosário sendo esse um dispositivo responsável pela execução da medida de internação na província de Santa Fé. Segundo o autor no ano de 2011, 206 jovens apresentaram denúncias sobre a violência sofrida nas ruas por policiais. Em 2012, esse número saltou para 75 denúncias.
Em um levantamento realizado pelo CIMJPP6 no período de fevereiro de 2010 a abril de 2014, 45 jovens que cumpriram a medida de privação da liberdade no Centro Especializado de Responsabilida Penal foram mortos por causas violentas ao deixarem o Instituto. Acredita-se, segundo o levantamento, que esses números podem ser ainda maiores, devido à dificuldade de conseguir acesso aos dados da polícia.
As mortes decorrentes, seja da violência institucional ou policial, podem ser inseridas no que Zaffaroni (2010, p.22) chamou de “masacre por goteo”:
[...] las muertes anunciadas del poder punitivo: muertes por ejecuciones sin proceso, por la criminalidad organizada (que siempre opera con corrupción y complicidad de estamentos del propio poder punitivo) (…) por maltrato, indiferencia o motines carcelarios, por mortalidad y morbilidad carcelaria, (…) por omisiones de las fuerzas de seguridad, por deficiencias del servicio de seguridad, por contradicciones incentivadas entre los segmentos carenciados, etc.
A expressão “masacre por goteo” utilizada por Zaffaroni expressa que tanto a tortura policial como a ação ou omissão do Estado frente às mortes dessa juventude revelam o fetiche da proteção integral e da responsabilidade penal juvenil. Assim, cabe-nos um questionamento: A quem interessa assegurar a proteção e os direitos sociais do jovem pobre, negro e morador da periferia?
No Brasil, a realidade é muito semelhante. Segundo dados do Instituto Sou da Paz (2018), nove entre 10 adolescentes da amostra representativa narraram episódios de agressões físicas cometidas por policiais militares, sobretudo durante abordagens e apreensões. Também foram corriqueiros os relatos de humilhações perpetradas por policiais.
Pedro, 18 anos, por exemplo, relatou que teve o braço e a perna queimados por policiais em razão das suas tatuagens de palhaço. Um adolescente afirmou ter perdido a conta “de quantos manos já morreu”, referindo-se a amigos mortos por policiais. A frequência da violência policial foi sintetizada pelo comentário de Carlos, 18 anos: “é normalidade apanhar quando vai preso [ . . .] os policiais são assim mesmo. (INSTITUTO SOU DA PAZ, 2018, p.30)
Dados publicados pela Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo revelam ainda que no de 2017, 49,34% das vítimas de mortes decorrentes de intervenção policial tinham entre 18 a 25 anos e 16% tinham até 17 anos. (SÃO PAULO, 2018)
Segundo dados do Atlas da Violência (2018), dentre 85 países analisados pelo IPEA, o Brasil ocupa o terceiro lugar na lista de nações com as maiores taxa homicídios de adolescentes de 15 a 19 anos. Com o índice de 54,9 homicídios para cada 100 mil pessoas nessa faixa etária, o país é superado apenas por México e El Salvador. A Argentina ocupa o 16º lugar e, embora apresente um panorama melhor que o Brasil, enfrenta cotidianamente desafios na prevenção da violência e na proteção das juventudes, além das disparidades nos diferentes territórios, como é o caso de Rosário, que registrou em 2018 uma taxa de 15 mortes para cada 100.000 habitantes, ou seja, o triplo da média nacional que é de 5,2 para cada 100.000 habitantes.
Ainda de acordo com o Atlas da Violência (2018) em 2016 33.590 jovens brasileiros foram assassinados sendo 94,6% do sexo masculino. Esse número representa um aumento de 7,4% em relação ao ano anterior. Se em 2015 pequena redução fora registrada em relação a 2014 (-3,6%), em 2016 voltamos a ter crescimento do número de jovens mortos violentamente. (BRASIL, 2018)
Os dados traduzem o desprezo pela vida das juventudes, sobretudo pobres, periféricas, negras e revelam a perversidade da violação dos direitos dessa população, produzida e reproduzida em um modelo de sociedade que se sustenta pela órbita do capitalismo vigente em detrimento da ampliação de políticas públicas realmente capazes de assegurar um modelo de proteção social integral.
Considerações finais
Ao analisarmos o cenário brasileiro e argentino, nos deparamos com um lugar comum ocupado pelas juventudes pobres, o da (des) proteção social, da segregação, da seletividade e da punição, em um tempo presente marcado pelo avanço desenfreado do pensamento conservador, valorização dos ideais neoliberais e de projetos societários que nos colocam frente à barbárie.
É nesse contexto que vai se legitimando o caminho punitivo das juventudes pobres, o lugar da proteção social vai sendo ocupado pelo fetiche dos discursos de ódio, que dão amplo apoio à política de encarceramento e à violenta ação estatal, que tem protagonizado um juvenicídio histórico e perverso, como nunca visto antes.
Essa realidade traduz a urgência de enfrentarmos coletivamente a ideologia ditada pela órbita capitalista. Mais do que nunca é necessário avaliar a direção social do projeto societário frente a essa onda conservadora e reacionária que vem se avolumando na América Latina e consequentemente no Brasil e na Argentina. É preciso incluir um olhar cauteloso a partir dos direitos humanos de crianças, adolescentes e jovens, visando fortalecer o processo de luta, resistência e defesa de direitos, sobretudo desse segmento populacional tão vulnerabilizado.