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Educação em saúde com o adolescente que vive com HIV/aids: diálogos sobre sexualidade
Graciela Dutra Sehnem; Jaqueline Arboit
Graciela Dutra Sehnem; Jaqueline Arboit
Educação em saúde com o adolescente que vive com HIV/aids: diálogos sobre sexualidade
O Social em Questão, vol. 23, núm. 46, pp. 233-256, 2020
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
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Resumo: Este estudo objetivou analisar as implicações da abordagem da sexualidade para a educação em saúde na perspectiva de adolescentes que vivem com HIV/aids e profissionais da saúde. Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada em um Serviço de Atendimento Especializado, com quinze adolescentes que vivem com HIV/aids e nove profissionais de saúde. Para a coleta de dados foram utilizadas a entrevista semiestruturada e o grupo focal. Os acessos dos adolescentes ao serviço de saúde são limitados e estiveram centrados em queixas clínicas. Contudo, revelou-se a necessidade da construção de espaços acolhedores, da inclusão da família e do compartilhamento de saberes.

Palavras-chave:SexualidadeSexualidade,AdolescênciaAdolescência,Síndrome da Imunodeficiência AdquiridaSíndrome da Imunodeficiência Adquirida,Educação em SaúdeEducação em Saúde,EnfermagemEnfermagem.

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Artigos

Educação em saúde com o adolescente que vive com HIV/aids: diálogos sobre sexualidade

Graciela Dutra Sehnem
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Brasil
Jaqueline Arboit
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Brasil
O Social em Questão, vol. 23, núm. 46, pp. 233-256, 2020
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Educação em saúde com o adolescente que vive com HIV/aids: diálogos sobre sexualidade

Graciela Dutra Sehnem1

Jaqueline Arboit 2

Resumo

Este estudo objetivou analisar as implicações da abordagem da sexualidade para a educação em saúde na perspectiva de adolescentes que vivem com HIV/aids e profissionais da saúde. Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada em um Serviço de Atendimento Especializado, com quinze adolescentes que vivem com HIV/aids e nove profissionais de saúde. Para a coleta de dados foram utilizadas a entrevista semiestruturada e o grupo focal. Os acessos dos adolescentes ao serviço de saúde são limitados e estiveram centrados em queixas clínicas. Contudo, revelou-se a necessidade da construção de espaços acolhedores, da inclusão da família e do compartilhamento de saberes.

Palavras-chave

Sexualidade; Adolescência; Síndrome da Imunodeficiência Adquirida; Educação em Saúde; Enfermagem.

Health education with adolescents living with HIV / AIDS: dialogues about sexuality

Abstract

This study aimed to analyze the implications of the sexuality approaching of health education on a perspective of adolescents who live with HIV / AIDS and healthcare professionals. This is a qualitative research that was made in a Specialized Care Service, with fifteen adolescents living with HIV / AIDS and nine healthcare professionals. For data collection, were used the semi-structured interview and a focus group. Adolescents’ access to health services are restricted and were focused on clinical complainings. However, was revealed the necessity for the construction of welcoming spaces, the family inclusion and the sharing of knowledge.

Keywords

Sexuality; Adolescent; Acquired Immunodeficiency Syndrome; Health Education; Nursing.

Artigo recebido em julho de 2019.

Artigo aceito em setembro de 2019.

Introdução

Estimativas do Joint United, Programa das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS), apontam que o número de pessoas vivendo com HIV/AIDS mundialmente é crescente. Em 2005 havia cerca de 31,8 milhões de pessoas, passando para 33,3 milhões em 2010 e chegando a 36,7 milhões em 2015 (UNAIDS, 2016). No contexto brasileiro, em relação à faixa etária dos 10 aos 19 anos, período que define a adolescência de acordo o Ministério da Saúde, foram notificados no período de 1980 a 2018, um total de 22.416 casos de adolescentes vivendo com HIV/aids (BRASIL, 2018). Estes dados permitem inferir que os adolescentes representam uma parcela importante no cenário da infecção pelo HIV.

Nessa condição de cronicidade, o adolescente vivencia uma complexidade de questões como a adesão à terapia antirretroviral, o silêncio e a revelação do diagnóstico, a orfandade e a sexualidade (SEHNEM et al., 2018). Quanto à sexualidade, algumas implicações relativas à soropositividade são experienciadas por adolescentes que vivem com HIV/aids, sobretudo, relacionadas ao medo da revelação do diagnóstico ao parceiro ou parceira, ao estigma e preconceito manifestados pela sociedade, às questões reprodutivas, à alteração da imagem corporal, ao desejo de constituir família e aos planos futuros (SEHNEM et al., 2018; MADIBA; MOKGATLE, 2016).

A sexualidade passa a ser, por vezes, limitada, de modo a controlar os riscos da vida sexual. As aspirações e necessidades do adolescente que vive com HIV/aids tendem a ser restringidas, por eles mesmos ou por pessoas com que convive, se comparadas com aquelas de outros adolescentes de sua idade (SEHNEM et al., 2018). Mesmo em condições sociais produtoras de alto grau de vulnerabilidade, os adolescentes serão sempre, em alguma medida, sujeitos de sua sexualidade, não cabendo, portanto, buscar mecanismos para controlá-la (FERRAZ, 2015).

Mediante a expansão do HIV, impõe-se a busca por estratégias de informação e orientação direcionadas à pessoa vivendo com HIV, assim como aos profissionais que as acompanham no cotidiano dos serviços de saúde. Para intermediar as ações em saúde, pode-se contar com as tecnologias educacionais como estratégia de educação em saúde no contexto local (BRASIL et al., 2018).

O conceito de educação em saúde está vinculado aos conceitos de educação e de saúde. Pode ser entendido, tradicionalmente, como uma mera transmissão de informações em saúde, com o uso de tecnologias avançadas ou não, cujas críticas têm evidenciado sua limitação para responder a complexidade envolvida no processo educativo. Já as concepções críticas e participativas, entendem a educação em saúde como possibilidade para alcançar a saúde, sendo considerada como práticas pedagógicas de caráter participativo e emancipatório (SALCI et al., 2013). Para tanto, a educação em saúde emancipatória trata-se de uma importante ferramenta da promoção em saúde (SALCI et al., 2013).

Assim, longe de se centrar na transmissão de informação e nos efeitos comportamentais, a educação em saúde a ser realizada com esses adolescentes precisa amparar-se no modelo crítico, participativo e emancipador, focalizado na interação e no desenvolvimento de uma consciência coletiva (FEIO; OLIVEIRA, 2015). Essa abordagem de educação em saúde é fortemente influenciada pelo modelo dialógico de Freire, que possui como ponto de partida o sujeito e sua realidade e está centrado no desenvolvimento da consciência crítica das pessoas (FREIRE, 2013).

A educação em saúde está intimamente relacionada ao conceito ampliado de saúde (REZENDE; MORAIS; CASTRO E CASTRO, 2016). Sob esta perspectiva, atualmente, considera-se que o modelo mais aceito para explicar a situação de saúde dos indivíduos, famílias e comunidade pressupõe a saúde como resultante das condições de vida e trabalho destes atores ou grupos. Nesta direção, a saúde é determinada por determinantes sociais da saúde que abrangem "fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais" (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007, p. 78). Tal definição está em consonância com o Artigo 3º da Lei 8080/90, segundo o qual a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, dentre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais (BRASIL, 1990).

Diante do exposto, considera-se que para atuar sob os determinantes e condicionantes no contexto do Sistema Único de Saúde, faz-se necessário que as abordagens de educação em saúde estejam alicerçadas em práticas profissionais respeitosas e dialógicas, que promovam o empoderamento dos sujeitos para uma efetiva realização no processo de cuidar de si (SALCI et al., 2013). Todavia, é fundamental que as ações educativas junto aos adolescentes ocorram de manei¬ra contínua, com conteúdo e metodologias diversificadas, que respeitem as características locais e regionais, bem como tenham formas de avaliar a efetividade das suas aplicabilidades (VIEIRO et al., 2015).

No que se relaciona à sexualidade de adolescentes que vivem com HIV/aids, realizou-se uma busca na literatura nacional e internacional, a qual identificou que as produções disponíveis tratavam, especialmente, de questões como a revelação do diagnóstico ao parceiro, os comportamentos sexuais e a qualidade de vida. Diante disso, evidencia-se que estudos voltados a educação em saúde no campo da sexualidade com tais adolescentes são incipientes, justificando a necessidade de maiores investimentos em pesquisas na temática.

A partir da problemática exposta, o estudo teve como questão norteadora: Quais as implicações da abordagem da sexualidade para a educação em saúde na perspectiva de adolescentes que vivem com HIV/aids e profissionais da saúde? Visando respondê-la, objetivou-se analisar as implicações da abordagem da sexualidade para a educação em saúde na perspectiva de adolescentes que vivem com HIV/aids e profissionais da saúde.

Método

Estudo descritivo de abordagem qualitativa, derivado de uma tese, cujo cenário foi o Serviço de Assistência Especializada (SAE) de um município do estado do Rio Grande do Sul, Brasil, no ano de 2014. Participaram 15 adolescentes vivendo com HIV/aids em acompanhamento neste serviço e nove profissionais de saúde que atuavam nele.

Para os adolescentes foram definidos como critérios de inclusão: viver com HIV/aids, independente da via de aquisição do vírus; estar ou não em uso de antirretrovirais; ter idade entre 10 e 19 anos; e estar realizando acompanhamento no SAE. E, como critério de exclusão: desconhecer seu diagnóstico. Esta última informação foi obtida junto aos familiares ou responsáveis legais pelos adolescentes.

Quanto aos critérios de inclusão dos profissionais da saúde, estes foram: ser profissional da saúde, estar lotado no SAE e realizar como parte de seu trabalho o acompanhamento de adolescentes que vivem com HIV/aids nesse serviço. O critério de exclusão foi estar afastado do trabalho por férias ou licença de qualquer natureza.

Para a captação dos adolescentes, contou-se com o auxílio dos profissionais da saúde do SAE, os quais propiciaram o primeiro contato entre os adolescentes, suas famílias e a pesquisadora, informando sobre o estudo e solicitando a autorização para que a pesquisadora contatasse eles. Para aproximação e sensibilização empregaram-se jogos educativos interativos e um curso de maquiagem.

O número de participantes da pesquisa esteve embasado nos pressupostos da abordagem qualitativa, na qual o pesquisador deve preocupar-se menos com a generalização dos fenômenos e mais com o seu aprofundamento e a sua intensidade em um grupo social (MINAYO, 2017). Deste modo, o encerramento da coleta de dados foi determinado quando foi compreendida a lógica interna do objeto de estudo (MINAYO, 2017).

Para a coleta de dados junto aos adolescentes foi empregada a técnica da entrevista semiestruturada. Para tanto, foi elaborado um roteiro de entrevista dividido em duas partes: a primeira relacionada aos dados sociodemográficos dos adolescentes contendo questões fechadas e, a segunda parte, composta por questões abertas referentes às experiências dos adolescentes acerca da sexualidade e as implicações para a educação em saúde.

Anteriormente a realização da entrevista, os adolescentes que possuíam mais de 18 anos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Os menores de 18 anos assinaram o Termo de Assentimento e seus pais ou responsáveis legais assinaram o TCLE. A coleta foi realizada, majoritariamente, no SAE (13 adolescentes), seguida do domicílio (dois adolescentes), segundo a preferência destes. Em ambos locais foi garantida a privacidade dos adolescentes. As entrevistas foram audiogravadas, tendo duração média de 90 minutos cada.

A coleta de dados com os profissionais da saúde ocorreu por meio da técnica de grupo focal a qual encontra ressonância em estudos que se propõem a investigar um tema em profundidade por meio de uma abordagem coletiva, oportunizando momentos de interação e debates em um grupo específico (DALL’AGNOL et al., 2012). Foram desenvolvidas duas sessões grupais com duração aproximada de 120 minutos cada. Em cada sessão os participantes foram os mesmos. Destaca-se que antes do início da primeira sessão grupal, os profissionais assinaram o TCLE.

A análise do material empírico oriundo das sessões de grupo focal e entrevistas semiestruturadas fundamentou-se na proposta operativa de Minayo (2014), caracterizada por dois níveis operacionais. Anteriormente, ao início da análise o material foi transcrito na íntegra em programa editor de textos. Após, deu-se início ao primeiro nível - exploratório. Na sequência, percorreu-se o segundo nível operacional - interpretativo, que se dividiu em duas fases: a ordenação e a classificação dos dados. Da análise emergiram as categorias temáticas.

O estudo seguiu as normas da Resolução nº 466/2012, foi apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob parecer número 295.045 e CAAE 15126813.4.0000.5347. Para a garantia do anonimato dos participantes, os adolescentes foram identificados pelo código “A” (A1, A2, ... A15) e os profissionais pelo código “P” (P1, P2, ... P9).

Resultados e Discussão

Do total de adolescentes, 10 eram do sexo feminino e 5 do sexo masculino. Todos foram infectados por transmissão vertical do HIV e estavam em uso de antirretrovirais. Quanto à idade, os adolescentes encontravam-se na faixa etária dos 11 aos 19 anos. No que tange à escolaridade, 12 adolescentes possuíam o ensino fundamental incompleto; e três tinham o ensino médio incompleto.

Em relação aos profissionais da saúde, estes eram: médico, assistente social, enfermeiro, psicólogo, biólogo e técnico de enfermagem. Quanto ao sexo, oito eram do sexo feminino e um do sexo masculino. A idade variou entre 25 e 55 anos. O tempo de formação variou entre três anos e 24 anos, e apenas três profissionais apresentavam tempo de formação inferior a cinco anos. O tempo de experiência profissional variou entre 18 meses e 24 anos. O tempo de atuação no SAE variou de três meses a 17 anos. Entre os profissionais de nível superior, seis possuíam especialização lato sensu e um possuía mestrado.

Os adolescentes estão soltos e invisíveis aqui no serviço: a (in)visibilidade da educação em saúde no serviço de saúde

Quanto à educação em saúde com adolescentes que vivem com HIV/aids, os interlocutores, adolescentes e profissionais, afirmaram que esta é mantida na invisibilidade do cuidado. Desse modo, o tema da sexualidade acaba não sendo tratado com os adolescentes, o que revela uma negação dessa dimensão da vida deles.

“Nunca conversei com ninguém daqui [SAE] sobre isso [sexualidade], a primeira vez é contigo. Com a médica eu não iria querer conversar, tenho vergonha. (A5)

Eu nunca vou no posto [SAE], é sempre a vó que vai buscar a medicação. Não é por vergonha, não gosto mesmo. Eu vou só quando tem que fazer os exames. Nunca conversei com ninguém de lá. Não vou chegar e falar das minhas coisas, o doutor que tem que conversar comigo.” (A10)

“Eu não venho aqui [SAE], quem pega meu medicamento é as pessoas lá da casa [instituição onde reside o adolescente]. Elas que marcam as minhas consultas e os meus exames. Nunca ninguém conversou sobre isso [sexualidade] comigo aqui.” (A4)

Na mesma direção, os profissionais da saúde também reconheceram esta invisibilidade. Concordaram que existem limites em suas próprias atuações e, também, na atuação da equipe, o que os impossibilitava de acolher os adolescentes e suas demandas.

“Temos muita dificuldade na questão do atendimento ao adolescente. Os adolescentes estão soltos dentro da rede. Nós estamos perdidos no acompanhamento desse adolescente. Ele entrou na adolescência e a gente não se deu conta. Às vezes, mesmo estando aqui todos os dias, quando vem aquele adolescente com uma carga de problemas, me pergunto: o que eu estava fazendo que não consegui ajudar de outra forma?” (P1)

“Por incrível que pareça, a gente acaba tendo aquele olhar: Nossa! o fulaninho está com essa idade, já está desse tamanho, e a gente não se deu conta que ele cresceu. O serviço não acompanhou esse adolescente.” (P4)

“O que chama atenção é que alguns deles [adolescentes] nunca vieram aqui no serviço. É sempre a mãe, a vó ou alguém que vem buscar a medicação. Os adolescentes estão soltos e invisíveis aqui no serviço e na rede de saúde.” (P2)

Os interlocutores revelaram que as práticas educativas voltadas à saúde do adolescente que vive com esta condição crônica não eram valorizadas no serviço de saúde, considerando a insuficiência ou, talvez, a inexistência de interações entre eles. Logo, constata-se que a sexualidade, de fato, não era assunto tratado com os adolescentes, que necessita de um olhar atentivo e urgente de todos aqueles envolvidos com o processo de cuidar.

Estudo cujo objetivo foi explorar os significados atribuídos pelos jovens ao fenômeno de viver a adolescência com o HIV apontou que, entre as intervenções desejadas, os adolescentes consideraram como positivas as orientações, esclarecimentos e informações ofertadas pelos profissionais dos serviços (GALANO et al., 2016).

Sobre os serviços de saúde, geralmente, não há a abertura de espaços apropriados às necessidades de saúde dos adolescentes, especialmente, aquelas do campo da sexualidade. Acredita-se que a baixa procura do adolescente ao serviço de saúde pode advir da pouca oferta de ações direcionadas a esses, o que configura um desafio para a prática do cuidado integral. Também, é provável que esses adolescentes não levem ao serviço de saúde suas dúvidas e preocupações no campo da sexualidade devido ao medo do preconceito e da discriminação que podem sofrer.

Com relação a tais dificuldades enfrentadas, o Ministério da Saúde propôs diretrizes e princípios para a organização dos serviços de saúde para o cuidado integral aos adolescentes. Desse modo, recomenda-se que na organização da atenção à saúde desse grupo precisam ser considerados aspectos como a adequação dos serviços de saúde às necessidades específicas dos adolescentes, o respeito às características socioeconômicas e culturais da comunidade e a participação ativa dos adolescentes no planejamento, desenvolvimento, divulgação e avaliação das ações (BRASIL, 2017).

Em outros estudos, os serviços de saúde também não aparecem como um lugar importante para os adolescentes encontrarem informações confiáveis sobre sexualidade, demonstrando sua pouca frequência nesses espaços (SEHNEM et al., 2018; ANHAS; CASTRO-SILVA, 2017). Em contrapartida, pesquisa realizada por Mesquita e Torres (2013), com os profissionais da saúde do SAE de Porto Alegre-RS, revelou a existência de uma prática de cuidado que considera não somente o adolescente, mas também sua família e cuidadores.

Alguns adolescentes relataram acessos limitados ao SAE, o que se observa quando anunciaram irem até este serviço apenas para buscar os medicamentos antirretrovirais, fazer exames e realizar consultas, centradas particularmente nos profissionais médicos.

“Eu venho uma vez por mês, para ganhar meus remédios e marcar uma consulta por causa da gravidez. Sempre quando eu venho aqui não tem ninguém para conversar, só pego os remédios e vou embora.” (A2)

“Venho pegar medicação, mas é mais a vó e os meus tios que pegam. Aqui é só entrega de remédio. Não converso com ninguém porque tenho medo que contem as minhas coisas para a vó, não tenho confiança em ninguém.” (A1)

“É sempre eu que venho pegar os remédios. Venho marcar os exames e ir no doutor. Não falo muito com eles [profissionais da saúde].” (A15)

Percebe-se que os profissionais e gestores do serviço ainda necessitam despertar para essa população e sua problemática, tendo em vista a focalização apenas nas questões clínicas espontaneamente demandadas. É importante considerar que isso leva a um processo de homogeneização e simplificação da saúde adolescente. Ademais, a falta de acolhimento não permite a construção de vínculos sólidos entre adolescentes e profissionais e, consequentemente, não há como estabelecer confiança.

As queixas clínicas são questões pontuais das necessidades de saúde e desconsiderar ou considerar timidamente as demais questões advém de uma abordagem que privilegia o componente biológico e favorece a medicalização, os exames e os encaminhamentos. A particularização de projetos de cuidado, conforme o modo de ser físico, mental, cultural e social de cada sujeito, e a identificação de necessidades e finalidades que vão além do clinicamente definido nos serviços de saúde precisam ser ampliadas para aspectos relativos à sociabilidade, escola, trabalho, lazer, sexualidade, reprodução, entre outros (AYRES et al., 2012; NETO et al., 2015).

A respeito desta questão, Ayres et al. (2012) apontam que as necessidades desse grupo são traduzidas, no cotidiano do serviço, pela busca de preservativos, de pílulas anticoncepcionais e de teste de gravidez. Mas, reiteram que, ao ouvirem os adolescentes, estes demonstraram que há demandas potenciais e diversas, antes mesmo de se traduzirem em questões de saúde reprodutiva.

A partir deste contexto, cabe refletir acerca dos resultados da investigação de Silva et al. (2014), na qual os adolescentes referiram que a experiência da sexualidade traduz as potencialidades do próprio existir conquanto seja colocada no campo das descobertas, experimentações e vivência de uma liberdade, além de servir de aporte para a construção da capacidade de tomada de decisões, de escolhas e de responsabilidades, exercida de forma singular e com a urgência própria dos adolescentes.

No entanto, ressalta-se que, se os profissionais da saúde mantiverem um ideário de sexualidade ligada a tais questões, dificilmente será possível a elaboração de uma agenda positiva que entenda os adolescentes como sujeitos de direitos. Assim, o seguinte questionamento é desafiante: Os adolescentes, nos serviços de saúde, possuem seus direitos relacionados à sexualidade assegurados? Para tanto, a educação em saúde com esse público precisa alicerçar-se em uma perspectiva focada no estímulo à emancipação das escolhas, na promoção da autonomia, no exercício de direitos e da cidadania desses sujeitos.

Os profissionais da saúde reconheceram a necessidade de um olhar diferenciado às necessidades destes adolescentes que vivem com HIV/aids. Para tanto, discutiram que a visibilidade pode se dar a partir de um espaço efetivamente acolhedor, de estarem sensíveis às questões que perpassam o adolescer, como a sexualidade, de estabelecerem vínculos sólidos com os adolescentes e de reverem conceitos e preconceitos no cuidado.

“A gente precisa abrir um espaço para que o adolescente se sinta acolhido. Nessa fase, falar sobre sexualidade já é muito difícil com os pais, com os avós é mais complicado ainda. É dessa forma que a gente vai conseguir aproximar esses adolescentes do serviço. Temos que estar muito sensíveis em relação ao atendimento deles. Precisamos fazer esse resgate, ter essa aproximação e esses momentos de troca com eles, isso é de extrema importância.” (P1)

“Eu concordo e acho que o mais difícil é o acolhimento dentro de uma visão humanizada. A maior dificuldade é desfazer o preconceito e conseguir acolher, aí os senhores poderão escutar alguma coisinha deles. Eles falam à medida que vão estabelecendo vínculos. Então, quanto mais a gente puder acolher e formar um vínculo, melhor, para que a gente possa ajudar em questões da prática da vida deles, como as dúvidas que eles têm sobre a sexualidade.” (P2)

Pode-se verificar que os profissionais se deram conta de que é preciso acolher, cuidar e orientar esses sujeitos. Conquanto, cabe ressaltar, que a abertura de espaços para a discussão com os adolescentes requer uma postura de sensibilidade e de corresponsabilização dos profissionais para com esses sujeitos.

Nessa mirada, na opinião de Ayres et al. (2012), a construção de espaços acolhedores e eficazes para esse público ainda requer estudos, atenção e interesse por parte dos profissionais e gerentes dos serviços de saúde. Esses autores ressaltam, por conseguinte, caminhos para a construção e fortalecimento da atenção integral à saúde de adolescentes, como o aprimoramento de espaços de escuta atenta e livre de preconceitos; exercício ativo da inter e transdisciplinaridade, com discussão de projetos de cuidado; o estabelecimento de vínculos entre usuários e profissionais que assegurem o sigilo profissional e espaços acolhedores; e trabalho em grupo com metodologias problematizadoras.

Além disso, os profissionais discutiram que um dos caminhos para a visibilidade da educação em saúde com os adolescentes é a inclusão da família. Assim, consideraram interessante a constituição de um grupo de pais e cuidadores para discutir as necessidades dos adolescentes, sendo a sexualidade uma questão oportuna para ser trabalhada.

“A gente precisa inserir a família deste adolescente no serviço, isso é superimportante, contanto que se veja até onde cada um consegue chegar. Quem sabe possamos fazer um grupo com os cuidadores, ver o que eles têm para dizer, as dúvidas deles.” (P2)

“Lembram que já tivemos um grupo de convivência com os pais? Poderíamos retomar o grupo.” (P7)

“Tivemos uma experiência no SPE [Projeto Saúde e Prevenção nas Escolas] com grupos de pais e eles colocaram a mudança que teve dentro de casa e a questão da fala da saúde ali naquele contexto. Isso colabora em todos os sentidos, até para entender o que é estar vivenciando a adolescência com o HIV/aids, a sexualidade, todos esses questionamentos que os adolescentes têm e que, muitas vezes, os pais ou os responsáveis não estão preparados para abordar.” (P1)

Acredita-se que esse hiato entre a família e o serviço de saúde pode interferir no modo como os adolescentes e seus familiares lidam com as experiências relativas à sexualidade. É necessário que os profissionais da saúde dispensem investimentos na direção de acolher os familiares e delimitem espaços para incorporá-los no cuidado em saúde.

A esse respeito, o Ministério da Saúde enfatiza que a produção de saúde para os adolescentes não se faz sem que os serviços de saúde abram canais de comunicação com outros setores e com as famílias desses sujeitos (BRASIL, 2017). Para tanto, os serviços podem propiciar a troca de experiências entre familiares e cuidadores por meio de atividades grupais, nas quais eles sejam estimulados a lidar com a sexualidade como parte integrante da vida, contudo é fundamental que haja respeito às crenças e valores de cada família (BRASIL, 2017).

Outro caminho apontado pelos profissionais para a visibilidade da educação em saúde com os adolescentes perpassa a integração da equipe multiprofissional para o compartilhamento das experiências e projetos de cuidado.

“A troca entre a equipe é muito importante. A gente não consegue parar para poder discutir essas questões, para fazer estudos de caso, discutir qual é a visão de cada profissional em relação aquele usuário. É importante ter um trabalho integrado de toda a equipe, para a gente poder ajudar um ao outro.” (P1)

“A gente tem que ter esse trabalho mais vezes, de ter essas paradas, de poder conversar, de fazer trocas entre equipe, de fazer estudos de caso, para ver de que forma a gente pode ajudar os adolescentes. Isso é importante porque um fortalece o outro. Eu vou montar uns estudos de caso sobre os adolescentes e trazer para a gente discutir.” (P3)

A partir dos relatos dos profissionais observa-se que há pouca discussão no serviço sobre projetos de cuidado que integrem os diversos saberes e ações dos profissionais, entretanto a reflexão oriunda do grupo focal pode ter auxiliado a despertarem para a importância do diálogo e de encontros entre a equipe multiprofissional e para a composição de saberes interdisciplinares na produção do cuidado aos adolescentes.

Para tanto, requer a corresponsabilidade da equipe, a começar por processos de gestão que favoreçam o trabalho multiprofissional, priorizando o trabalho em equipe orientado para mudanças no cotidiano do serviço e melhoria na qualidade do cuidado. Estudo realizado por Ayres et al. (2012) evidenciou na equipe de saúde um caráter de justaposição de saberes e não de construção compartilhada, além de ser marcado pela tendência ao monopólio e centralização de competências, o que caracteriza a falta de espaços efetivos de comunicação entre os profissionais.

Algumas coisas a gente sabe e outras não, aprendemos juntos: dizeres e fazeres dos profissionais acerca da educação em saúde com adolescentes

Os profissionais da saúde expressaram concepções que apontam para a educação em saúde como espaço dialógico de interação entre sujeitos sociais, no qual a construção do saber em saúde se dá de maneira compartilhada.

“O que mais me incomoda é a forma como alguns profissionais tratam os usuários e isso implica na educação em saúde. Além de não tratar, destratam. Às vezes, vejo os profissionais xingando as adolescentes porque estão grávidas, dizendo: “Poxa, mas tu não te cuidou?”. Para fazer educação em saúde tu tens que entender que não podes imprimir a tua concepção e os teus valores ao usuário.” (P2)

“Na educação em saúde o paciente tem que ter noção de cidadania, até porque, se for mal tratado, conseguirá colocar que não concorda com isso. Ele não pode ficar numa posição passiva. Temos que ter a consciência que algumas coisas a gente sabe e outras não, aprendemos juntos.” (P3)

“Os profissionais da saúde têm que ter a consciência da importância da educação em saúde. Quando a gente fala com o público adolescente é necessário empoderar eles, para que realmente busquem, acessem e tenham conhecimento em relação à sua saúde.” (P1)

A abordagem referida nesta discussão, ao menos no plano dos dizeres dos profissionais, parece condizente com o modelo dialógico de educação em saúde, o qual propõe a superação da ênfase transmissiva do conhecimento com vistas a um reposicionamento do educador e do educando numa relação mais horizontal (FREIRE, 2013). Segundo Freire (2019), a relação dialógica é aquela em que há o encontro, a troca. Nessa mirada, a definição dos temas acerca da sexualidade a serem trabalhados nos espaços educativos não podem ser uma imposição dos profissionais da saúde, mas o resultado de um processo coletivo de problematização da realidade vivida pelos adolescentes.

O modelo dialógico possui como ponto de partida o sujeito e sua realidade e está centrado no desenvolvimento da consciência crítica das pessoas (FREIRE, 2011). Busca, também, promover a emancipação dos sujeitos, que está relacionada à superação das situações de opressão a que estão submetidos e, consequentemente, à transformação de suas realidades (FREIRE, 2013).

Apesar das concepções apresentadas acerca da educação em saúde, os profissionais, no plano dos fazeres, têm buscado sujeitar os adolescentes à culpa por uma possível infecção dos seus parceiros sexuais por meio de um discurso arraigado na importância do sexo seguro. Culpa e responsabilidade e, até mesmo, crime foram termos utilizados pelos profissionais para abordar a necessidade de os adolescentes reduzirem as possibilidades de transmitirem o vírus do HIV aos parceiros e parceiras sexuais.

“Tem que orientar, para os adolescentes que têm aids, que sejam conscientes do que estão fazendo. Eles têm que ter um cuidado maior, porque têm que ter o cuidado com o outro, se colocar no lugar do outro, ter a consciência de pensar se gostou do que aconteceu consigo. Tem que questionar: ‘Tu gostaria que ele também se contaminasse? Se alguém fez isso contigo, tu vai fazer igual com o outro?’.” (P6)

“Tem que orientar a não serem promíscuos. Aconselho os adolescentes a usarem o preservativo e a contarem o diagnóstico, até porque tem uma súmula do Supremo Tribunal que é crime a pessoa contaminar a outra, propositalmente. Eles têm que ser orientados, nem que sejam obrigados a ficarem uns 45 minutos só ouvindo, por mais que eles não falem nada, alguma coisa irão assimilar das informações que a gente passar.” (P7)

A partir dessa discussão parece haver um contraponto entre os dizeres e os fazeres, haja vista que suas concepções acerca de como a educação em saúde pode ser realizada com os adolescentes que vivem com HIV/aids está consideravelmente distante do que, de fato, realizam em suas práticas de cuidado. As informações que emergiram da discussão sugerem uma prática de educação em saúde como um conjunto de ações de prevenção, verticalizadas e com pouco espaço para a escuta. Na perspectiva destes profissionais, o foco das ações de educação em saúde são os padrões comportamentais ou estilos de vida dos sujeitos, os quais devem corresponder a padrões previamente definidos como saudáveis para si e para o outro, segundo a lógica biomédica.

Tais cenas se inscrevem no interior de práticas tradicionais de saúde, nas quais as relações de poder-saber estão fixadas e definidas por meio da verticalidade das relações, da centralidade do discurso médico, da assimetria entre profissionais e sujeitos, da desconsideração de sentimentos, desejos, inquietações e questionamentos destes últimos, da mera transmissão de informações e da prescrição de modos de fazer considerados como “certos” pelos profissionais (FEIO; OLIVEIRA, 2015).

Há que se considerar que, no âmbito da saúde, ainda é muito forte a noção de cuidado como um processo em que os sujeitos devam seguir recomendações e mudar comportamentos. No campo do HIV/aids, principalmente, no que perpassa a prevenção, é bastante comum a prerrogativa de que o sujeito precisa “assumir a sua parte” no cuidado com o outro (CALAZANS, PINHEIRO, AYRES, 2018). Cabe ressaltar que este discurso de educação em saúde imputado aos adolescentes sobre a necessidade de eles contribuírem para a redução da infecção pelo vírus do HIV aloca esses sujeitos em um lugar de culpa.

Outra questão interessante para a análise é o potencial de transmissão de informações das estratégias de educação em saúde tradicionais, que buscam ensinar o que os profissionais consideram a maneira correta de prevenir doenças ou conviver com aquelas que o indivíduo já possui. Sobre essa questão, Freire (2019) considera que não é possível respeito aos sujeitos se não forem levadas em consideração as condições em que eles vêm existindo, se não se reconhecer a importância dos conhecimentos de experiência feitos. A concepção de educação na qual o profissional faz comunicados e depósitos, que os sujeitos recebem passivamente, é denominada por Freire (2013) como bancária. Nesta distorcida visão de educação, segundo o autor, não há espaço para a criatividade, para o pensar autêntico e para o saber, desse modo, tanto menos os sujeitos desenvolvem a consciência crítica que resultaria na transformação de sua realidade. Essa prática de educação, conforme argumenta Freire (2013), é estabelecida numa relação de opressão, na qual os opressores proíbem os oprimidos que sejam sujeitos de sua busca, alienando-os de suas decisões.

A partir de tais reflexões, com vistas a uma educação em saúde dialógica e problematizadora, alguns questionamentos se fazem pertinentes: O que um espaço de educação em saúde ensina, tanto para o profissional quanto para o adolescente, quando as experiências e os saberes deste último são desconsiderados pelos primeiros, que objetivam a prescrição de modos “certos” de fazer? Como, no cotidiano dos serviços de saúde, podem ser tecidas outras práticas educativas que não se modelem no silenciamento, na passividade e na transmissão de informações aos adolescentes?

Os profissionais discutiram, ainda, que a educação em saúde não é um processo neutro, pois pode ser influenciada pelos valores sociais e culturais tanto de quem cuida quanto de quem é cuidado.

“Todos têm suas crenças e seus valores, tu não consegues simplesmente desvincular isso no momento que fala da sexualidade. Isso é muito forte e eu acabo imprimindo em todas as minhas falas.” (P1)

“Realmente é muito forte a questão cultural, a gente não se dá conta quantas vezes pode ter orientado conforme o nosso olhar. Essas coisas vêm da cultura.” (P2)

Conforme a discussão, ensinar e aprender são processos de educação realizados por sujeitos imersos em uma cultura e, para tanto, suas formas de apreensão sobre determinadas situações são necessariamente atravessadas por códigos inscritos nessa construção cultural. Nessa direção, é possível dizer que tudo o que se ensina, aprende e faz está ancorado em saberes e práticas parciais e provisórias, que resultam de disputas travadas em diversos âmbitos do social e da cultura (FEIO; OLIVEIRA, 2015). Tais práticas, justamente por isso, podem ser (re)vistas, questionadas e modificadas pelos sujeitos.

A respeito desses apontamentos, Freire (2019) argumenta que é impossível a neutralidade da educação, pois para que essa fosse neutra era preciso que não houvesse discordância nenhuma entre as pessoas com relação aos modos de vida individual e social e aos seus valores. Para esse autor, a posição do educador precisa ser a de respeito à pessoa que queira mudar ou que se recuse, contudo, não pode negar ou esconder a sua postura, embora haja o direito dos educandos em rejeitá-la.

Considerações Finais

A educação em saúde voltada para adolescentes que vivem com HIV/aids ainda é mantida na invisibilidade do cuidado, ao menos no contexto em que o estudo foi realizado. Nesse espaço, revelou-se a insuficiência e, por vezes, a inexistência de interações entre os profissionais da saúde e os adolescentes. A insuficiência está relacionada aos acessos limitados dos adolescentes ao serviço de saúde, que estiveram centrados em queixas clínicas. Contudo, as discussões oriundas nos grupos focais foram propulsoras para a reflexão acerca da necessidade de migrar para a visibilidade da educação em saúde, o que pode se dar a partir da construção de espaços acolhedores, da inclusão da família e do compartilhamento de projetos de cuidado entre a equipe multiprofissional.

Ademais, revelou-se que há um distanciamento significativo entre os dizeres e os fazeres dos profissionais em relação à educação em saúde, considerando que as concepções acerca de como ela pode ser realizada com os adolescentes que vivem com HIV/aids esteve consideravelmente distante do que realmente acontece nas práticas de cuidado, as quais mostraram-se sustentadas no modelo tradicional de educação, que trata de educar sujeitos que devem se responsabilizar pelas suas escolhas e pela saúde do outro.

Promover a saúde dos adolescentes implica em desenvolver estratégias para sua autonomização, numa perspectiva dialógica que considere seu contexto de vida, as possibilidades e limites existentes e o desejo deles, sem o que se torna inviável interagir. Para esse alcance as ações educativas devem estar alicerçadas na complementaridade de saberes, o que requer que adolescentes e profissionais se reconheçam e atuem como sujeitos nessas ações.

As limitações da pesquisa estão relacionadas à difícil abordagem da temática, considerada delicada, uma vez que discuti-la pode possibilitar a emersão de sentimentos como a vergonha e o constrangimento. E, também, ao fato de a coleta de dados haver sido desenvolvida há cinco anos. Contudo, a publicação destes dados permanece relevante por se tratar de uma temática ainda insipiente nas produções científicas das áreas das ciências da saúde e das ciências sociais, haja vista que as publicações, em sua maioria, têm se voltado para questões de cunho biológico, como a utilização de métodos contraceptivos e a gravidez não planejada, nas quais a sexualidade fica restrita a um olhar reducionista. Além disso, ainda não se vê a consolidação de práticas educativas de cunho dialógico com esse público.

Como implicação para futuras pesquisas, tem-se a possibilidade de desenvolver estudos de cunho interventivo em serviços especializados e não especializados, buscando fomentar a educação em saúde de adolescentes com HIV/aids, especialmente em relação a sua sexualidade.

Material suplementar
Referências
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