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Resumo: O artigo parte do entendimento de que os sintomas físicos do envelhecimento vêm adquirindo uma inédita centralidade política, obrigando o Estado a reorientar seus programas de assistência à saúde. O novo debate acerca do desafio social da senescência, centrado no perigo do isolamento, transfere a responsabilidade familiar para instituições públicas especializadas. Objetivou-se discutir uma política pública, voltada para o benefício da saúde da população anciã. Via referências bibliográficas e pesquisa documental, in loco, buscou-se realizar um estudo analítico das atividades públicas de um Centro Mais Vida de Minas Gerais para compreender a aplicação, o funcionamento e os serviços dessa política.
Palavras-chave: Envelhecimento, idoso, política pública, assistência, saúde.
O desafio social da senescência: centralidade da política de assistência à saúde do idoso
Máximo Alessandro Mendes Ottoni1
Antônio Dimas Cardoso2
Resumo
O artigo parte do entendimento de que os sintomas físicos do envelhecimento vêm adquirindo uma inédita centralidade política, obrigando o Estado a reorientar seus programas de assistência à saúde. O novo debate acerca do desafio social da senescência, centrado no perigo do isolamento, transfere a responsabilidade familiar para instituições públicas especializadas. Objetivou-se discutir uma política pública, voltada para o benefício da saúde da população anciã. Via referências bibliográficas e pesquisa documental, in loco, buscou-se realizar um estudo analítico das atividades públicas de um Centro Mais Vida de Minas Gerais para compreender a aplicação, o funcionamento e os serviços dessa política.
Palavras-chave
Envelhecimento; idoso; política pública; assistência; saúde.
The social challenge of senescence: centrality of health care policy for the elderly
Abstract
The article starts from the understanding that the physical symptoms of aging have acquired an unprecedented political centrality, forcing the state to reorient its health care programs. The new debate on the social challenge of senescence, centered on the danger of isolation, shifts family responsibility to specialized public institutions. The objective was to discuss a public policy, aimed at the health benefit of the elderly population. Through bibliographic references and documentary research, in loco, we sought to carry out an analytical study of the public activities of a More Life Center of Minas Gerais to understand the application, operation and services of this policy.
Keywords
Aging; elderly; public policy; health care.
Artigo recebido: novembro de 2018.
Artigo aprovado: janeiro de 2019.
Introdução
O envelhecimento populacional é um fenômeno tido por muitos autores como um dos maiores avanços e desafios da humanidade contemporânea e, nessa fase, devido a fatores degenerativos, que são inerentes ao processo natural de senescência, o ser humano necessita de atenção especial, por parte do poder público. A expectativa de vida relativamente alta dos indivíduos ensejou um sistema de prevenção e tratamento às doenças mais bem organizadas do que nunca, na atualidade, embora ainda esteja distante da realidade da maioria de seus usuários. Com a democratização das sociedades contemporâneas, esse sistema de assistência ao idoso torna-se cada vez mais especializado e setorizado, no que pese à estratégia de universalização das políticas públicas, nos países em desenvolvimento.
No Brasil, num contexto social de persistência da vulnerabilidade, a intervenção do Estado na proteção dos indivíduos, pelo menos institucionalmente, inaugurou uma nova etapa no funcionamento das políticas de assistência e de saúde, resultando em políticas públicas de atendimento focalizado a segmentos sociais específicos, como é o caso dos idosos, que necessitam de um tratamento diferenciado, de acordo com as suas necessidades.
Essa perspectiva de atendimento, “de cuidado” ao idoso, sedimentou-se nas últimas décadas nas redes públicas, em detrimento a um atendimento regular de modo um tanto mecânico e impessoal, tão comum em hospitais superlotados e centros médicos financiados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Tornou-se uma institucionalidade, portanto, politicamente correta, a adesão a um programa orientado conforme as necessidades da pessoa idosa, no curso do “processo civilizador” da sociedade contemporânea (ELIAS, 2001).
Assim, numa perspectiva de atendimento mais centrado na figura do idoso enquanto sujeito singular, O Centro de Referência em Assistência à Saúde do Idoso foi idealizado pelo Ministério da Saúde e implantado no estado de Minas Gerais pelo Programa Mais Vida. No município de Montes Claros, foi instalado o Centro Mais Vida “Eny Faria de Oliveira”, com o objetivo de contribuir para a concretização dessa política focalizada, realizando um atendimento multiprofissional, com exames e equipamentos voltados para a melhoria da saúde do idoso.
Envelhecimento populacional
O envelhecimento populacional é um fenômeno mundial que foi percebido primeiro nos países da Europa Ocidental no final do século XIX, depois nos países considerados desenvolvidos e, nas últimas décadas, foi verificado nos países ditos em desenvolvimento (CARVALHO, 2003).
Uma das definições sobre envelhecimento foi colocada pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), como sendo:
[...] um processo sequencial, individual, acumulativo, irreversível, não patológico, de deterioração de um organismo maduro, próprio a todos os membros de uma espécie de maneira que o tempo torne capaz de fazer frente ao estresse do meio-ambiente e, portanto, aumente sua possibilidade de morte (BRASIL, 2006, p. 08).
Sabe-se que o envelhecimento é um processo natural em que todos os organismos que conseguem chegar à determinada etapa de amadurecimento, irão experimentar (BRASIL, 2006). Seguindo essa premissa, pode-se compreender que todas as espécies viventes, em um determinado período da sua existência, entrarão no processo de envelhecimento, caso consigam atingir determinado estágio da vida. No caso do ser humano, a tentativa de determinar uma idade para o envelhecimento é algo complexo, pois além dos fatores pessoais e culturais, o próprio aumento da esperança de vida coloca em discussão essa tentativa de definir um padrão etário (CAMARANO, 2004).
A senescência envolve, portanto, uma série de situações de vida que poderão ou não contribuir para a longevidade, como o local onde o ser reside; o estilo de vida praticado; a sociedade no qual ele faz parte; as atividades insalubres, dentre outras. Outro fato social é destacado por Norbert Elias, ao apontar que:
O envelhecimento geralmente é acompanhado pelo esgarçamento de laços que ultrapassam o círculo familiar mais estreito [...]. As pessoas quando envelhecem e ficam mais fracas, são mais e mais isoladas da sociedade e, portanto, do círculo da família e dos conhecidos (ELIAS, 2001, p. 85).
Diamond (2014) explana que, em determinadas regiões, onde a expectativa de vida é baixa, uma pessoa com 50 anos é considerada uma anciã. É o caso da Nova Guiné, em que a expectativa de vida é abaixo dos quarenta anos. Seria quase inimaginável um cidadão, desse país, pensar que um homem pudesse ultrapassar os 100 anos de idade, fato que já é realidade em diversos países, especialmente nos considerados desenvolvidos.
No Brasil, a Política Nacional do Idoso, diz que a pessoa idosa são os indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos (BRASIL, 1994). O Estatuto do Idoso regula os direitos das pessoas que possuem 60 anos ou mais (BRASIL, 2003). Camarano (2004) afirma que a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera idosa a pessoa com 60 anos ou mais, para aqueles que residam em países em desenvolvimento, e 65 anos ou mais, para os residentes dos países desenvolvidos.
Porém, mesmo com a definição da OMS sobre a idade para a pessoa ser considerada idosa, Diamond (2014) discorda dessa “definição universal”, pois a questão do envelhecimento irá depender da sociedade em que a pessoa está inserida e também da perspectiva pessoal. Para justificar esse pensamento, o autor faz um relato pessoal:
Na minha adolescência, eu considerava as pessoas de vinte e tantos anos como aparentemente no auge da vida e da sabedoria, pessoas de trinta anos como de meia-idade e qualquer um a partir dos sessenta como velho. Agora que tenho 75 anos, considero meus sessenta anos e o início dos meus setenta como o auge da minha vida, e penso que a velhice talvez comece por volta dos 85 ou 90, dependendo da minha saúde (DIAMOND, 2014, p. 225).
Pode-se verificar que a idade também depende da percepção de uma pessoa em relação à outra. Para um jovem, as pessoas um pouco mais velhas podem parecer alguém com muita experiência. Para um idoso, quem será considerado mais velho são aqueles com idade superior a ele. O fato é que, na perspectiva de Elias, é possível afirmar que:
[...] a identificação com os velhos e com os moribundos compreensivelmente coloca dificuldades especiais para as pessoas de outras faixas etárias. Consciente ou inconscientemente, elas resistem à ideia de seu próprio envelhecimento e morte tanto quanto possível (ELIAS, 2001, p. 80).
Em relação à evolução populacional no Brasil, o Gráfico 1 apresenta o aumento da população idosa em relação às crianças e aos jovens e adultos, de 1940 a 2015, e uma projeção para o ano de 2050. Pode-se perceber uma redução do número de crianças nos períodos citados, certa estabilização da população de jovens e adultos, e um crescimento contínuo da população idosa.
Gráfico 1. Evolução populacional brasileira – 1940 a 2050
Fonte: OBST, 2017, p. 38.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2025, o Brasil contará com 34 milhões de cidadãos com idade igual ou superior a 60 anos. Com isso, o país ocupará a sexta posição mundial em número de idosos (LINDOSO, 2012).
A população idosa no município de Montes Claros (MG)
Breve caracterização do município de Montes Claros
Montes Claros é considerado um município de porte médio e se localiza na bacia do Alto Médio São Francisco, no norte da Mesorregião do estado de Minas Gerais. De acordo com o Atlas Brasil (2013), o município conta com uma área de 3.600,56 km² e apresenta uma densidade demográfica de 100,53 habitantes por km². Com o processo de migração, ocorrido na década de 1970, a cidade expandiu-se em todos os setores. Assim como acontece nos grandes centros, a cidade de Montes Claros experimentou um rápido crescimento do espaço urbano, e passou a conviver com novas questões sociais, como tráfico de drogas, aumento da criminalidade, desemprego, favelização e outros (ROCHA; LEITE, 2014).
O município de Montes Claros se tornou um polo regional do norte de Minas Gerais, ampliando sua influência e atração populacional até o sul da Bahia. A cidade é referência em educação, que atrai um grande contingente estudantil para as suas 88 escolas de ensino fundamental/médio e para os seus diversos cursos pré-vestibulares.
No ensino superior, o município conta com duas universidades que oferecem cursos de graduação e pós-graduação, além de nove faculdades privadas. O setor de saúde é composto por oito hospitais, quinze centros de saúde, e três policlínicas, no qual se destaca os tratamentos complexos (PEREIRA, 2007).
Longevidade no município de Montes Claros
Um dado que chama atenção no município de Montes Claros é o do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)3 que, em 2010, ficou entre 0,700 a 0,799, e é classificado como “alto”. O componente “Longevidade”, que é a esperança de vida ao nascer, foi o item que apresentou a maior pontuação, alcançando 0,868, em 2010. Dessa forma, o “IDH Longevidade” foi considerado “muito alto”, atingindo índices de países considerados desenvolvidos (ATLAS BRASIL, 2013).
Na Tabela 1, percebe-se que o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) na categoria “Longevidade”, de Montes Claros, de Minas Gerais e do Brasil, apresentam um crescimento progressivo nas três décadas avaliadas. Percebe-se também que o município de Montes Claros supera o índice “IDHM Longevidade” do estado e do país, nas três décadas comparadas.
Tabela 1. Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de Montes Claros, Minas Gerais e Brasil
Fonte: Adaptado de Atlas Brasil, 2013.
Na Tabela 2, na esperança de vida ao nascer, novamente o município de Montes Claros, apresenta índices superiores aos do estado de Minas Gerais e aos do Brasil. Nota-se também um crescimento contínuo da esperança de vida ao nascer, de todas as regiões avaliadas, nas décadas de 1990, 2000 e 2010.
Tabela 2. Esperança de vida ao nascer (Montes Claros, Minas Gerais e Brasil)
Fonte: Adaptado de Atlas Brasil, 2013.
Na Tabela 3, outra constatação percebida foi que, quando se compara Montes Claros e Minas Gerais, tanto o número de idosos quanto a porcentagem de idosos com 65 anos ou mais, cresce gradativamente nas décadas de 1990, 2000 e 2010.
Tabela 3. Número de idosos com 65 anos ou mais (Montes Claros e Minas Gerais)
Fonte: Adaptado de Atlas Brasil, 2013.
Segundo o Atlas Brasil (2013), em 2010, o município de Montes Claros comparado aos 5.564 municípios brasileiros existentes no mesmo ano, ocupou a posição de número 238º em relação ao “IDHM Longevidade”. Em relação ao estado de Minas Gerais, dos 852 municípios existentes em 2010, Montes Claros ocupou a posição de número 58º. E dos 852 municípios de Minas Gerais, 653 apresentam o “IDHM Longevidade” considerado “muito alto”, ou seja, entre 0,800 a 1,000.
De acordo com Galantini (2011), o processo de longevidade atualmente em curso no Brasil altera o perfil demográfico e provoca mudanças epidemiológicas, fazendo com que as doenças crônico-degenerativas, ligadas ao envelhecimento, tornem-se mais comuns entre a população. A evolução dessas enfermidades pode causar perda da capacidade funcional, que são as atividades físicas e mentais necessárias ao dia a dia do indivíduo.
Com o aumento da expectativa de vida e das novas mudanças epidemiológicas, houve a necessidade de novos serviços de saúde voltados à população anciã. Nessa perspectiva, foram instituídos pelo Ministério da Saúde os mecanismos para a criação dos Centros de Referência em Assistência ao Idoso, que foram implantados em Minas Gerais, através do Programa Mais Vida.
O Programa Mais Vida
Criação e objetivos do Programa Mais Vida
Por meio da Portaria nº 702, de 12 de abril de 2002, o Ministério da Saúde criou os mecanismos para a organização e implantação de Redes Estaduais de Assistência à Saúde do Idoso, que devem ser integradas por “Hospitais Gerais” e pelos Centros de Referência em Assistência à Saúde do Idoso. O “Hospital Geral” seria aquele que está integrado no SUS e possua condições técnicas, instalações, equipamentos e recursos humanos para o atendimento dos idosos em nível ambulatorial e de internação hospitalar. O Centro de Referência em Assistência à Saúde do Idoso é um hospital que deve ser cadastrado e que possua os mesmos requisitos de assistência à saúde dos idosos, de forma integral, para atendimentos assistenciais, internação hospitalar, ambulatorial especializado, hospital-dia e assistência domiciliar (BRASIL, 2002).
Em Minas Gerais, o Programa Mais Vida foi instituído pela Resolução SES nº 2.603 de 2010, e fez parte de projetos de saúde prioritários do estado de Minas Gerais, buscando oferecer padrões de excelência ao idoso, objetivando agregar anos à vida. E para isso, buscou trabalhar a autonomia e a independência dessa população, em forma de rede integrada, junto à atenção primária e terciária (MINAS GERAIS, 2010).
O Programa Mais Vida tem como objetivo a estruturação da rede de atenção à saúde do idoso, procurando manter, melhorar e/ou reabilitar sua autonomia, seguindo os princípios de equidade, universalidade e integralidade do SUS, e ajudando a aumentar o número de anos vividos do ancião. Para isso, qualifica profissionais da saúde, acolhe e identifica necessidades, para a promoção e prevenção de doenças. Fazem parte da Rede de Atenção à Saúde do Idoso as equipes de Atenção Primária, os Centros Mais Vida, os hospitais, a atenção domiciliar, os centros de especialidades, reabilitação, cuidados paliativos e as instituições de longa permanência (OTTONI, 2012).
No Centro Mais Vida (CMV) o paciente é avaliado por uma equipe multiprofissional, composta por profissionais da medicina, fisioterapia, terapia ocupacional, enfermagem, fonoaudiologia, farmácia, nutrição, psicologia e serviço social. São realizados exames para a observação dos aspectos físicos, psíquicos, sociais e alimentares e, dependendo do laudo médico, acontecerá o encaminhamento do paciente a outros profissionais, com a parceria dos profissionais das Unidades Básicas de Saúde, para a elaboração de um “Plano de cuidado para o idoso”, com vistas a indicar os problemas de saúde do paciente, os profissionais necessários, os tratamentos mais adequados, medicamentos e demais orientações médicas e de assistência social.
Nos Centros Mais Vida são realizados exames de média e alta complexidade e, para exames considerados urgentes, esses são feitos em até 36 horas. Também são disponibilizadas Casas de Apoio para acolhimento do idoso frágil e acompanhante, caso residam a mais de 100 km do município-sede, funcionando como uma extensão dos Centros Mais Vida.
O público alvo do Programa Mais Vida (PSF) são os idosos considerados frágeis. E, para isso, o Programa considera como frágil as pessoas com 80 anos ou mais, ou as que estão acima dos 60 anos e fazem uso de cinco medicamentos díspares por dia, ou que apresentem uma das características, como polipatologias, polifarmácia, imobilidade parcial ou total, incontinência urinária ou fecal, instabilidade postural, incapacidade cognitiva (delirium, depressão ou demência), ou dependência nas atividades básicas de vida diária.
Nos Centros Mais Vida não são atendidas demandas espontâneas, de quem vem diretamente ao Centro. É necessário que o paciente passe pelas unidades básicas, pelos centros de saúde ou pelo Programa Saúde da Família (PSF), para que haja o encaminhamento aos Centros Mais Vida. O foco do PSF não seria a enfermidade em si, mas prioritariamente recuperar a funcionalidade do idoso, para que ele possa reconquistar a sua independência para a execução das atividades cotidianas.
Foram implantados, como projeto piloto, dois Centros Mais Vida no estado de Minas Gerais no ano de 2008. Um no município de Juiz de Fora, na região Sudeste; e outro, no município de Montes Claros, região Norte. Passados dois anos, os centros foram integrados ao contrato único. No município de Juiz de Fora, o Centro Mais Vida recebeu o nome de Centro Intermunicipal de Especialidade em Saúde (CIES). No município de Montes Claros, passou a se chamar Centro de Referência à Saúde do Idoso “Eny Faria de Oliveira”, na qual a Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES) foi a instituição credenciada ao Centro Mais Vida. O terceiro Centro foi instalado em Belo Horizonte e atenderá a população idosa do município e, posteriormente, a região central de Minas Gerais.
De acordo com Galantini (2011), a proposta inicial foi que, até o ano de 2014, fossem construídos 13 (treze) Centros Mais Vida no Estado de Minas Gerais. Cada Centro seria responsável por uma macrorregião do Estado, e atenderia toda a população de idosos existente, que se encaixasse nos padrões solicitados pelo Programa. Porém, até o início de 2018, o estado conta somente com os três Centros Mais Vida que foram criados inicialmente como projeto piloto.
Funcionamento do Programa Mais Vida no município de Montes Claros
Buscou-se realizar um estudo descritivo no Centro de Referência à Saúde do Idoso “Eny Faria de Oliveira”, localizado no município de Montes Claros (MG), com dados in loco sobre o funcionamento do Centro Mais Vida, em 2017, assim como documentos oficiais, disponibilizados online, e trabalhos científicos publicados sobre o Centro Mais Vida.
O CMV de Montes Claros atende os 89 municípios da macrorregião norte do estado de Minas Gerais, num total de 9.287 atendimentos realizados em 2017. Dos municípios atendidos, Montes Claros teve o maior número de atendimentos (5.363), seguidos dos municípios de Coração de Jesus (197), Janaúba (194), Brasília de Minas (183), Francisco Sá (182), e os municípios de Mirabela e Jaíba, ambos com 145 atendimentos. Os municípios que não apresentaram atendimento pelo CMV de Montes Claros foram Berizal, Guanambi, Montes Altos, Ninheira, Nova Porteirinha, Santa Cruz de Salinas, Santa Fé de Minas, Santo Antônio do Retiro, São Francisco de Goiás e Taiobeiras. Curral de Dentro, Miravânia, Rubelita e Urucuia apresentaram 01 pessoa atendida por município. Juvenília, Serranópolis de Minas e São João do Paraíso apresentaram 02 pessoas atendidas por município.
No Centro Mais Vida de Montes Claros, a equipe multiprofissional deve ser composta por profissionais das áreas de medicina, serviço social, enfermagem, farmácia, fisioterapia, fonoaudiologia, geriatria, nutrição, psicologia e da terapia ocupacional, além de coordenação administrativa, assistência administrativa, e pessoal da limpeza e portaria.
Percebe-se que na Tabela 04, em 2017, houve carência de profissionais das áreas de farmácia e terapia ocupacional. O profissional de fonoaudiologia esteve presente somente no mês de janeiro. O profissional de nutrição fez-se presente nos meses de novembro e dezembro, o psicólogo esteve presente nos meses de junho a outubro. Verificou-se também que a maioria de profissionais existentes no CMV de Montes Claros é composta de geriatria ou clínico geral.
Tabela 4, Equipe de Profissionais do CMV Montes Claros – 2017
Fonte: CMV Montes Claros, 2018.
Na Tabela 5, o maior número de idosos frágeis atendidos em primeira consulta no CMV de Montes Claros foi da área da geriatria ou clínica geral (4.298), seguidos da área da fisioterapia (1.874); da área da enfermagem (1.041), e da área de serviço social (590). Na psicologia, foram atendidos 24 pacientes e, na nutrição, 17. As áreas de fonoaudiologia, farmácia e terapia não ocorreram atendimentos.
Tabela 5. Número de idosos frágeis atendidos em primeira consulta no CMV Montes Claros - 2017
Fonte: CMV Montes Claros, 2018.
Examinando de perto, detectou-se uma ordem específica, quando analisados o número de idosos frágeis atendidos em retorno/segunda consulta no CMV de Montes Claros. Percebe-se que somente houve retorno para o médico geriatra ou clínico geral capacitado, em um total de 4.989 atendimentos.
Nos exames de média complexidade, realizados em 100% nos idosos frágeis, foram feitos 21.331 exames, sendo eles: dosagem de creatinina, dosagem de glicose, dosagem de hormônio tireoestimulante (TSH), hemograma completo e pesquisa de sangue nas fezes.
Nos exames de média complexidade, realizados em 50% dos idosos frágeis, foram realizados 50.620 exames, sendo: dosagem de ácido úrico; dosagem de potássio; dosagem de proteínas totais e frações; dosagem de cálcio; dosagem de folato; dosagem de sódio; dosagem de vitamina B12; eletrocardiograma; análise de caracteres físicos, elementos e sedimento da urina; dosagem de colesterol HDL; dosagem de colesterol LDL; dosagem de colesterol total; dosagem de gama-glutamil-transferase (Gama-GT); dosagem de hemoglobina glicosilada; dosagem de cloreto; Dosagem de Transaminase Glutamico-Oxalacetina (TGO); Dosagem de Transaminase Glutamico-Pirúvica (TGP); Dosagem de Triglicerídeos; Pesquisa de Anticorpos Anti-HIV-1 + HIV-2 (ELISA); Teste de VDRL para Diagnóstico da Sifilis; Dosagem de Bilirrubina total e frações.
Nos procedimentos diagnósticos de alta complexidade, foram realizados 6.084 exames de tomografia computadorizada do crânio; ressonância magnética do crânio; e densitometria óssea.
A hospedagem na Casa de apoio do CMV de Montes Claros, disponibilizada àqueles que residem a mais de 100 km do município-sede, recebeu, em 2017, 05 hospedes. O índice de satisfação do usuário na Casa de Apoio nos meses de março, maio, novembro e dezembro ficou em 100%. E o índice de satisfação do usuário do CMV de Montes Claros, ficou em 89%, em 2017 (CMV MONTES CLAROS, 2018).
De fato, os dados empíricos de 2017 são animadores, no que se referem ao atendimento geral do CMV de Montes Claros. No entanto, persiste a carência básica de profissionais especializados em terapia ocupacional – tão ou mais importante que a presença de outros profissionais médicos.
Considerações finais
O Programa Mais Vida vem suprir a ausência de se ter uma política específica, que atenda ao idoso em suas necessidades básicas. Com o Centro Mais Vida “Eny Faria de Oliveira”, implantado no município de Montes Claros (MG), que conta com uma equipe multiprofissional, e com a realização de exames de média e alta complexidade, o Programa Mais Vida auxilia a população idosa a melhorar a sua condição e saúde, bem como a buscar a sua autonomia, para a realização das suas atividades cotidianas. No entanto, persiste um problema básico: o desafio social da senescência.
Percebe-se que no CMV de Montes Claros são atendidos os municípios da macrorregião norte do Estado de Minas Gerais, mas em alguns municípios não houve nenhum atendimento a idosos e, em outros, o número de idosos atendidos foi baixo. Na equipe multiprofissional, percebeu-se a falta de profissionais de determinadas áreas, como farmácia e terapia ocupacional, além de alguns profissionais que estiveram presentes em determinados meses de 2017.
Nos atendimentos realizados pelos profissionais, verificou-se um número maior de consultas com os profissionais da geriatria ou clínica geral, seguidos da fisioterapia e da enfermagem. Houve baixo atendimento na área de psicologia e de nutrição, e nenhum paciente atendido nas áreas de fonoaudiologia, farmácia e terapia. Um dado interessante é que só houve retorno para os profissionais de geriatria ou clínica geral.
Nos exames de média e alta complexidade, verificou-se uma gama de procedimentos que são utilizados, de acordo com as necessidades da população anciã. Mas nas casas de apoio, percebeu-se um baixo número de utilização no ano. Por fim, tanto a Casa de Apoio quanto o CMV receberam índices altos de satisfação.
Seriam necessários novos estudos para analisar diversos fatores do CMV, como a falta de alguns profissionais; o porquê de alguns municípios não enviarem idosos para serem atendidos pelo CMV de Montes Claros, e qual o motivo do número baixo de usuários da Casa de Apoio, para assegurar, de fato, uma política de acolhimento. Também seriam necessários estudos para responder o porquê não foram criados outros Centros Mais Vida nas demais macrorregiões de Minas Gerais. Porém, verifica-se que o Programa Mais Vida é uma política importante para a concretização dos direitos dos idosos, na busca da melhoria da sua saúde e da sua autonomia.
Referências
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