Seção Livre

Seção livre: O Serviço Social no campo socioeducativo: a questão da visibilidade num espaço invisível

Olga Vieira Lima Tavares
(ENSP/FIOCRUZ), Brasil
Aldo Pacheco Ferreira
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil
Maria Helena Barros de Oliveira
DIHS/ENSP/FIOCRUZ, Brasil
Vânia Reis Girianelli
Instituto Nacional do Câncer, Brasil, Brasil
Fernando Salgueiro Passos Telles
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil

Seção livre: O Serviço Social no campo socioeducativo: a questão da visibilidade num espaço invisível

O Social em Questão, vol. 21, núm. 44, pp. 307-334, 2019

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Resumo: Este artigo aborda o estudo sobre o trabalho socioeducativo do assistente social em equipe multidisciplinar, com destaque para a execução de medidas socioeducativas. Trata-se de uma reflexão sobre os adolescentes e seus familiares em unidades de atendimento aos jovens que cometeram algum delito ou ato infracional com abordagem propositiva, tendo como norte a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Palavras-chave: Serviço Social, Trabalho socioeducativo, Medida socioeducativa, Ressocialização, Direitos humanos.

O Serviço Social no campo socioeducativo: a questão da visibilidade num espaço invisível

Olga Vieira Lima Tavares1

Aldo Pacheco Ferreira2

Maria Helena Barros de Oliveira3

Vânia Reis Girianelli4

Fernando Salgueiro Passos Telles5

Resumo

Este artigo aborda o estudo sobre o trabalho socioeducativo do assistente social em equipe multidisciplinar, com destaque para a execução de medidas socioeducativas. Trata-se de uma reflexão sobre os adolescentes e seus familiares em unidades de atendimento aos jovens que cometeram algum delito ou ato infracional com abordagem propositiva, tendo como norte a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Palavras-chave

Serviço Social; Trabalho socioeducativo; Medida socioeducativa; Ressocialização; Direitos humanos.

Social Work in the socio-educational field: the question of visibility in an invisible space

Abstract

This article deals with the study about the socio-educational work of the social worker in a multidisciplinary team, with emphasis on the execution of socio-educational measures. It is a reflection on the adolescents and their families in service units to the young people who committed some infraction or infraction act with propositive approach, having as north the Universal Declaration of Human Rights, the National System of Socio-Educational Services (SINASE) and the Child and Adolescent Statute (ECA).

Keywords

Social Work; Socio-educational work; Socio-educative measure; Ressalization; Human rights.

Artigo recebido: agosto de 2018.

Artigo aprovado: outubro de 2018.

Introdução

A proposta deste estudo é discorrer sobre a práxis socioeducativa do assistente social na condição de integrante de equipe multidisciplinar, desenvolvido com os adolescentes e seus familiares, em unidade de internação por medida socioeducativa.

As reflexões suscitadas neste texto analisam a conjuntura política, econômica e social, bem como a intervenção do assistente social em meio ao cenário de retração dos direitos sociais e de cidadania, postos em prática pela política neoliberal nesta conjuntura.

A contar da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), institui-se o processo de regulamentação da legislação de proteção à infância e à juventude, que alicerça a garantia dos direitos deste segmento ao estabelecer a prioridade absoluta para os mesmos, conforme o artigo 227:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Neste cenário é abolido o Código de Menores, sendo elaborado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com a lei federal 8.069 de 1990 (BRASIL, 1990). Um dos marcos importantes deste estatuto estabelece que crianças e adolescentes estão subordinados à mesma legislação e são entendidos como cidadãos, sujeitos de direitos, que devem ser tratados com prioridade absoluta, independente de classe social.

Contrapondo-se historicamente a um passado de controle e exclusão social6 em relação às crianças e adolescentes7 sustentado na Doutrina da Proteção Integral8, O ECA expressa direitos da população infanto-juvenil brasileira, ao afirmar o valor intrínseco da criança e do adolescente como ser humano, a necessidade de especial respeito a sua condição de pessoa em desenvolvimento, o valor prospectivo da infância e adolescência como portadora de continuidade do seu povo e o reconhecimento da sua situação de vulnerabilidade, o que torna as crianças e adolescentes merecedoras de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado. Este, por sua vez, deve este atuar através de políticas sociais na promoção e, defesa de seus direitos, segundo Volpi (2001):

O ECA promoveu uma ruptura com o arbítrio e o tratamento discricionário aos adolescentes em conflito com a lei; com efeito, além de outros inúmeros benefícios, indica uma mudança fundamental na metodologia de atendimento, estabelecendo a prevalência de um processo socioeducativo, em que a criança e o adolescente sejam respeitados na sua dignidade e subjetividade, e estimulados a desenvolver sua criatividade e capacidades (VOLPI, 2001, p.35).

Nossa a proposta neste estudo foi de um olhar sobre o trabalho socioeducativo desenvolvido pelo assistente social em uma equipe multidisciplinar e voltado para adolescentes e seus familiares ora em unidades de atendimento aos jovens que cometeram delitos ou atos infracionais que o levaram a cumprir pena privativa de liberdade.

Entende-se aqui que tais jovens e suas famílias fazem parte de uma população que parece invisível9 e descartável socialmente para as políticas públicas e para grande parcela da sociedade. Conforme sinaliza Faleiros (2004), a violência é a negação do outro, do outro enquanto sujeito de direitos, sujeito de palavra, sujeito de respeito, sujeito de consideração.

A concepção de cidadania se modifica em virtude do lugar, do tempo, da estrutura social, do momento político, social e econômico, tendo em vista que é uma formulação dinâmica. Estando sujeitas às mudanças ocorridas ao longo do processo histórico. Desta forma, segundo os critérios socioeconômicos e políticos, a concepção de cidadania se expande ou se restringe.

O termo cidadania tem sua gênese no vocábulo “civitas” utilizado em Roma durante a antiguidade, significando a condição política de um indivíduo. Indicando que espécie de direitos a pessoa detém ou exerce sobre as demais. Dallari (1998) conceitua cidadania enquanto expressão do somatório de direitos que possibilita a pessoa a agir efetivamente na vida, no governo do povo ao qual pertence. Denota que o marginalizado socialmente é aquele indivíduo que está aquém da participação social e da perspectiva de poder, estando, portanto numa condição subalterna.

Arendt (1987) compreende que a cidadania se constitui no direito a ter direitos, por conseguinte, gera um espaço público de igualdade entre os indivíduos tornados cidadãos.

O termo cidadania se tornou objeto de estudo em várias áreas do conhecimento cientifico, assumindo, portanto, significados diferenciados de acordo com o contexto em que é empregado, e neste sentido Silva (1999), assim se expressa:

A cidadania é uma das categorias mais usadas pelo Serviço Social na atualidade, apesar da sua ambiguidade que remonta às suas origens. Entretanto, o seu significado, geralmente, não é explicitado sendo desvelado por adjetivações ou pela perspectiva do texto ou do discurso em que é usada (SILVA, 1999, p.59).

As reflexões suscitadas aqui são fundamentais diante do cenário político de retração dos direitos sociais e de cidadania uma vez que o modelo de política neoliberal cada vez mais revela expressões da questão social, como a vulnerabilidade social e retrocessos de direitos historicamente conquistados pelos trabalhadores. Repensar o preconceito acerca do adolescente em conflito com a lei é tarefa de suma importância para profissionais cuja intervenção social é comprometida com a construção de um projeto de sociedade que privilegie o protagonismo juvenil, a autonomia e a emancipação das classes subalternas.

Análise de Conjuntura

Segundo Mészáros (2002) e Antunes (2010; 2015), a partir da década de 1970 é reformulado o papel estatal com rebatimentos no mundo do trabalho e entre o Estado e a Sociedade. As repercussões destas mudanças reverberam no Brasil e, nos países em desenvolvimento. Impondo aos gestores das três esferas de poder, efetivação de “ajustes estruturais” nas políticas das áreas econômicas e sociais, todas estas transformações conformam o processo de reestruturação produtiva (HARVEY, 2015)10 a que se referem os autores supracitados.

O neoliberalismo estava se disseminando e se consolidando por todo o mundo com o lema de um Estado mínimo para as políticas sociais e máximo para o Mercado. Enquanto no solo brasileiro durante o final dos anos 1970, até o final de 1980, houve aumento expressivo do acesso aos direitos de cidadania. Fleury (2004) reporta o sistema de proteção social11 brasileiro durante a década de 1980, num formato mesclado conformando-se num tripé: seguro social, saúde e assistência, com um modelo assistencial voltado para a população sem vínculos trabalhistas formais.

A reestruturação produtiva na década de 1990 transformou todo o planeta, o neoliberalismo econômico e a globalização mundial, levou o Estado brasileiro a fazer cortes no setor social gerando desmantelamento das políticas públicas. Piana (2009), expressa da seguinte forma esta reestruturação produtiva:

Todas essas modificações estendem-se em nível planetário no chamado “mundo” de globalização, que se expressa como nova modalidade de dominação imposta pelo capital por meio da intensificação do intercâmbio mundial de mercadorias, preços, ideias, informações, relações de produção, proporcionando mudanças significativas nas relações humanas (PIANA, 2009, p.28).

Tais mudanças exigem políticas de “ajustes estruturais” nas áreas econômicas, políticas e sociais promovidas pelos estados nacionais, o que implica na deterioração das condições de trabalho e da qualidade de vida.

Iamamoto (2004) afirma que o Estado, quando assume feições neoliberais, se distancia do seu papel de mediador de políticas públicas a fim de cumprir a agenda do capital externo e do empresariado, que parecem frequentemente envoltos por uma atmosfera de conflitos. Neste cenário, o Serviço Social intervém para dar visibilidade a cidadãos cada vez mais invisíveis socialmente. Esta invisibilidade se materializa na ausência de cidadania, de dignidade, de respeito à individualidade, e na concepção de que a pobreza seja responsabilidade individual (SILVA; ANJOS, 2010).

A desconstrução do estigma de delinquente

No Brasil e em especial no Rio de Janeiro há um fenômeno de criminalização da juventude pobre, sendo algo ainda mais perverso quando se trata da juventude negra.

Amorim (2007) aponta como a violência contra a juventude pobre e negra tem se expressado nas políticas de segurança, em que a morte de jovens só tem significado para suas famílias, o que somente reforça a histórica invisibilidade que o grupo tem, quando se trata de ter seus direitos preservados. Na perspectiva da institucionalização e disciplinamento, porém, esses segmentos têm sido invisibilizados. Argumentam as autoras que a ação do Estado como interventor na questão social busca alternativas para lidar com o que não tem solução neste modo de produção: a desigualdade. Recaindo aos segmentos populacionais empobrecidos o confinamento. O Estado ao se omitir do papel de promotor da cidadania, propaga a exclusão social. Ao retrair seu espaço de atuação, cria espécies de “guetos sociais”, onde inexiste o acesso à segurança pública, à justiça, e aos direitos fundamentais12 postulados na CF/1988 (BRASIL, 1988): “Todos são iguais perante a lei...”.

Minayo e Souza (1999), ao abordarem a questão da violência nas comunidades, postulam a dicotomia entre ricos e pobres, sinalizam que os níveis de desigualdade e de iniquidade social geram sensação de injustiça, o que, para elas, culmina em violência, não havendo possibilidade de integrar uma sociedade onde a cisão entre as classes é profunda. A violência ocupou geograficamente espaços onde a falta de segurança13 trouxe a “desordem” (CARDIA; SCHIFFER, 2002). Barros, Moreira e Duarte (2008) admitem que na história da política social brasileira existe um vínculo estreito entre o confinamento, a exclusão e violência. Em relação à política social argumentam as autoras que:

No Brasil, a política social está atrelada a uma política de confinamento e esta, por sua vez, a uma justiça seletiva e excludente. O resultado disso, no cotidiano das ações públicas, se manifesta na impossibilidade de atender efetivamente às demandas da população pobre e no aprimoramento dos mecanismos de controle social, construídos pelo Estado (BARROS; MOREIRA; DUARTE, 2008, p.144).

As ações governamentais brasileiras se apresentam de forma seletiva, excludente, aquém das necessidades da população empobrecida e com alto grau de controle social. Barros, Moreira e Duarte (2008, p.144) pontuam que os jovens oriundos dos segmentos pauperizados são atingidos por ações altamente repressivas e “[...] de extrema visibilidade midiática, quando cometem algum tipo violência, em detrimento das situações das quais são vítimas, pois tais contextos, de forma geral, são naturalizados e banalizados”. É preciso debater sobre as ferramentas de enfrentamento ao genocídio perpetuado contra a juventude negra. As justificativas dessa prática muitas vezes são inseridas em naturalizações e criminalizações em torno do jovem, negro e pobre. As violações de direitos, em função de sua condição socioeconômica e cor de sua pele, são por vezes omitidas. Isso intensifica a produção do medo e reduz a responsabilidade do Estado e da sociedade em garantir os direitos juvenis, preconizados no ECA e no Estatuto da Juventude (PASSETI, 2008; LEMOS, 2009).

Carvalho (2013), ao referir-se ao projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), aponta que em 2008 foi planejada a efetivação deste projeto, tendo em vista a proximidade de grandes eventos no Rio de Janeiro, objetivando minimizar o nível de violência e ocultar a imagem negativa do estado no cenário brasileiro e mundial. Afirma Gonçalves (2011) que a falta de investimento em políticas públicas voltadas para as classes pobres durante décadas favoreceu o acirramento entre classes no Rio de Janeiro. Por conseguinte, atribui, a autora em tela, o aumento da criminalidade nas favelas, ao aumento da exclusão social.

Canavêz (2012) aborda a oposição entre violência/paz a partir da relação civilizados-bárbaros, como forma de se pensar a civilização atual, onde o objetivo de integrar estaria perigosamente atrelado à imposição de um determinado modelo de ordem, de paz e de civilização.

Observando o perfil socioeconômico dos adolescentes e também as afirmativas de Waiselfisz (2004, p.32-34) que entre 1980 até 2002 houve um decréscimo na taxa global de mortalidade, na razão de 633/573 por 100 mil habitantes, no entanto, no mesmo período em relação aos jovens os: “[...] números da mortalidade aumentaram de 128 para 137 por 100.000 habitantes. Entre os óbitos, 93% deles são do sexo masculino e a maioria é composta por negros. No que diz respeito aos óbitos 93% deles são do sexo masculino e a maioria é composta por negros”. Pelo que se pode apreender a partir da interpretação destes dados, bem como pela observação dos noticiários da mídia, a expressões de diferentes formas de violência recaem sobre esta população pobre, negra que sofre ainda com ações truculentas da polícia e de grupos de facções rivais por disputas de espaço no domínio de territórios pelo tráfico, segundo Cunha e Mello (2011). Há uma ação violenta de caráter punitivo que incide contra a juventude pobre.

É necessário que o trabalho socioeducativo ajude a desconstruir estigmas e mitos e também eliminar os preconceitos contra os jovens egressos. Buscar o emponderamento14 deste jovem e da sua respectiva família é imprescindível.

O embate entre a teoria socioeducativa x a teoria da coerção

Considera-se importante ter uma conduta profissional que busca desconstruir o paradigma da sanção e da punição, e permitir que este jovem e sua família possam se expressar e fazer valer seus direitos ao invés de que carregar este estigma do “menor infrator”. Tal estigma está inserido num projeto político que, através da difusão de discursos preconceituosos e desumanos, obtém êxito em intensificar o ódio à classe mais desfavorecida (THEODORO, 2014).

Numa simbiose entre Estado e Sociedade15, forma-se um senso comum de oposição e distanciamento das camadas empobrecidas, ambos cooperando para o status quo criado por este projeto de negação dos oprimidos. Faz-se necessário quebrar o estigma existente na sociedade que segrega o adolescente em conflito com a lei e que o vê e entende apenas sob a ótica de infrator16 e o preconceito que o cerca. Segundo Volpi (2001), tais rótulos são denominações que as elites criam para chamar adolescentes em conflito com a lei de: delinquentes, bandidos, trombadinhas, e mais recentemente, “di menor”, reverter este estigma constitui-se, pois, num embate diário.

A corrente da coerção17 mencionada por Menicucci e Carneiro (2011), que orienta as direções das unidades Socioeducativas a acabam, de um modo geral, com suas características punitivistas, por atingir também o profissional que, no seu exercício, pretende trabalhar numa perspectiva de defesa dos direitos humanos e da busca da ressocialização do jovem. Tais profissionais são estigmatizados e rotulados de “mamãezada”. Para os membros desta “corrente”, esta expressão remete a comportamentos maternais que, por excesso de proteção, acabam por causar mais danos à educação e formação dos filhos do que, necessariamente, auxiliá-los a serem adultos responsáveis civil e legalmente.

As demandas e/ou reinvindicações18 dos trabalhadores com a visão socioeducativa, divergem das demandas institucionais que, de um modo geral se pauta por uma ação mais punitiva e de coerção social. Conforme assinala Vergara (2003):

A demanda institucional difere da demanda profissional porque elas contem propostas diferentes. A demanda profissional prevê a mediação de primeira ordem como categoria essencial da pratica, porque ela trabalha com a complexidade respondendo a determinantes variados, penetrando no tecido social, movendo-se nas várias instâncias das políticas sociais, dos programas sociais, das franjas institucionais ligadas tanto à sociedade civil organizada, quanto ao aparato institucional do Estado (VERGARA, 2003, p.9).

As condições socioeconômicas no atual contexto mundial e brasileiro não são satisfatórias para a classe trabalhadora, ao contrário, vivemos um momento de grandes retrocessos sociais. Mas, o arcabouço nacional legal em vigência traz um considerável avanço progressista, dentre eles destacamos os direitos da infância e adolescência. A CF/1988 em seu artigo 227 (BRASIL, 1988), preceitua que:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Igualmente, o ECA em seus artigos 3º e 4º (BRASIL, 1990), explicita a necessidade de compreender a criança e o adolescente dentro da ótica dos direitos humanos e atribui as responsabilidades conjuntas à família, à comunidade, sociedade e ao Estado em relação aos deveres de suporte aos mesmos.

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 1990).

As Instituições socioeducativas têm uma imprescindível função social, conforme o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) estabeleceu. Aos estabelecimentos de atendimento cabe à função de desempenharem eminentemente públicas e são responsáveis pela instalação e pela manutenção da Unidade, pelos recursos humanos e pelos materiais necessários ao desenvolvimento de programas de atendimento a ressocialização do adolescente, objetivando primordialmente o desenvolvimento de ações socioeducativas sustentadas nos princípios dos direitos humanos, referendando alinhamentos conceituais, estratégicos e operacionais (BRASIL, 2012).

No sistema socioeducativo há uma trajetória extensa da tradição assistencial-repressiva no âmbito do atendimento à criança e ao adolescente. Isto se percebe tanto na estrutura física quanto no discurso que se apropria da força e da coerção para aplicação das medidas.

O trabalho com as famílias na perspectiva socioeducativa

Em relação às famílias dos adolescentes inseridos no sistema socioeducativo, percebemos que tais famílias, quando passam a dar assistência aos seus filhos, recebem o mesmo olhar enviesado que recebem os técnicos de trabalho social que trabalham na perspectiva dos Direitos Humanos. Estas passam a ser compreendidas como famílias desestruturadas que não souberam educar ou repassar limites aos filhos e, portanto, são percebidas como “copartícipes”, de certa forma, dos atos que são imputados aos membros que se “desvirtuaram” ou que delinquiram. Para Faleiros (2011) é preciso entender este jovem a partir de sua história pessoal, do grupo, e de determinados aspectos sociais que o cercam e o impactam.

A consideração do infrator apenas como determinado pela miséria ou pelo desvio deixa de lado as determinações psicológicas, familiares, da história do grupo a que se vincula, e principalmente a articulação das diferentes vinculações em vários ângulos possíveis (FALEIROS, 2011, p.108).

Tal afirmação nos leva a considerar que os direcionamentos a serem dados durante o período a ser trabalhado com esse jovem e com essa família não podem ser feitos tendo como orientação uma imagem pré-concebida e/ou estereotipada dos mesmos. Somente um Estado de Direitos que possibilite o acesso pleno aos direitos sociais, civis e políticos tem o poder de garantir cidadania. Os direitos sociais estão previstos no artigo 6º da CF/1988 (BRASIL, 1988):

São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 1988).

No processo de elaboração do SINASE buscou-se alinhar as diferentes vertentes existentes no interior das práticas institucionais, imprimindo-lhes um caráter que contemplasse, tanto teoricamente quanto na prática cotidiana, a efetivação de uma política que garanta os direitos fundamentais, humanos e sociais, buscando transformar a problemática realidade atual em oportunidade de mudança.

Dessa forma, o SINASE associou as questões relacionadas às políticas públicas voltadas para a infância/adolescência e juventude, com as demais políticas sociais, tais como: Educação básica de qualidade, Trabalho, Saúde, Segurança Pública, dentre outras. Todas as políticas, a partir da intersetorialidade e transversalidade, se complementam, dando suporte à intervenção socioeducativa.

Durante o cumprimento das medidas socioeducativas é primordial a aproximação e acompanhamento dos jovens por parte dos familiares, bem como o apoio da sociedade através de organizações que estejam receptivas a atender as necessidades de aprendizado, de profissionalização, de saúde, de educação, dentre outros (LOPES, 2015). Neste sentido a Convenção sobre Direitos da Criança (UNICEF, 1989), assim se expressa em relação à família na condição de grupo que estrutural da sociedade onde naturalmente se dá o crescimento “[...] e bem-estar de todos os seus membros, e em particular das crianças, deve receber a proteção e assistência necessárias a fim de poder assumir plenamente suas responsabilidades dentro da comunidade”.

Os jovens em instituições socioeducativas precisam de acolhimento, amor, afeto, referências de autoestima e de estímulos para elaborar suas metas para o futuro em sua reinserção familiar e comunitária. Sendo fundamental o apoio governamental, e da sociedade como fortes aliados no fortalecimento do grupo familiar a partir de ações que promovam a qualidade de vida dos jovens e dos seus familiares.

O Serviço Social e o Trabalho Socioeducativo

O Serviço Social enquanto operacionalizador de ações socioeducativas necessita fazer uma reflexão que compreenda a criminalização da juventude empobrecida.

O conceito de Estado Penal que se traduz na hipertrofia do Estado Penal com prejuízo do Estado Social, em momentos de crise do capitalismo neoliberal, maximizando o disciplinamento da classe mais vulnerável, culpabilizando as vítimas por meio do aparato policial e do poder judiciário categorizado por Wacquant (1999), traduz este caráter penal do aparelho estatal: “[...] Estado darwinista que transforma a competição em fetiche e celebra a irresponsabilidade individual (cuja contrapartida é a irresponsabilidade social), recolhendo-se às suas funções soberanas de ‘lei e ordem’, elas mesmas hipertrofiadas”.

Percebe-se, com isto, o distanciamento do acesso destes usuários à cidadania como é proposto constitucionalmente. Neste aspecto, Faleiros (2011) sinaliza sobre a cidadania, que:

A cidadania se fortalece nas relações Estado/Sociedade, nas mediações concretas das políticas sociais que se tornam o campo de intervenção da acessibilidade, apoio e acompanhamento dos usuários. A cidadania se constitui no exercício dos direitos civis, políticos, sociais, ambientais, éticos, que foram construídos historicamente através das leis, normas, costumes, convenções que fazem com que os indivíduos sejam reconhecidos como membros ativos de uma determinada sociedade, podendo exigir dela os seus direitos, ao mesmo tempo em que ela lhe exige determinados deveres comuns. Os deveres do Estado são por sua vez, direitos do cidadão (FALEIROS, 2011, p.61).

Dentro do aspecto legal, tanto o SINASE quanto o ECA dão subsídios para uma ação mais comprometida com os direitos humanos, priorizando o cumprimento de medida em meio aberto. Na prática é preciso efetivação de tais direitos, haja vista a grande quantidade de internos que superlotam as unidades de medida socioeducativa privativas de liberdade – pelo contrário – em alguns momentos, no momento da aplicação destes direitos, o poder judiciário, opta pelo encarceramento.

As instituições socioeducativas por sua vez atuam em geral em péssimas condições de infraestrutura. A sociedade falha pela falta de oportunidades para os jovens em suas comunidades, o que revela parte dos retrocessos no cotidiano do trabalho socioeducativo. O acesso à escola, a cursos de profissionalização, ou mesmo atividades de resgate da cultura local, tais como: oficinas de danças, rap e grafite. Postos de Saúde, CRAS19, CREAS20, creches municipais, igrejas, bem como muitos espaços públicos, ficam comprometidos, pois, para os jovens que vivem em comunidades não há o direito de ir e vir devido às divisões em territórios e facções divididos pelo poder paralelo, representado pelo tráfico de drogas, restringindo a liberdade (OLIVEIRA et al., 2018).

Intervir sob a inspiração do modelo de trabalho socioeducativo pautado no que prescreve a Declaração Universal dos Direitos Humanos tem a potência de gerar oportunidade para o crescimento e desenvolvimento do usuário, reconhecendo-o como alguém inserido em uma realidade permeada por múltiplas determinações sociais, políticas, econômicas, etc. (FALEIROS, 1985).

Segundo esta visão, os jovens e/ou as famílias passam a ser compreendidos para além de “infratores” ou de apenas beneficiários de uma instituição socioeducativa. Esses são percebidos enquanto protagonistas de um processo de intervenção, cujo objetivo é trabalhar para a emancipação social do jovem em questão.

Apesar do momento da apreensão ser conturbado para o jovem e famílias, abre-se a oportunidade para se trabalhar nestas situações conflitantes um caminho de elaboração de projetos de vida com vistas à inclusão social. Cada oportunidade que se abre é importante para que o profissional intervenha em favor do usuário e auxilie no seu empoderamento.

Muitos trabalhadores fundamentados nos princípios coercitivos e no caráter punitivo da medida socioeducativa não buscam investir em projetos que auxiliem na reinserção comunitária e nem dá importância ao caráter pedagógico da medida socioeducativa. Ao contrário, a partir do uso da repressão e da força, acredita que, de alguma forma, a punição expurgará a culpa do interno.

O assistente social, ao atuar na intermediação entre as demandas da população usuária e o acesso aos serviços sociais, coloca-se na linha de intersecção das esferas pública e privada, como um dos agentes pelo qual o Estado intervém no espaço doméstico dos conflitos, presentes no cotidiano das relações sociais. [...] de outro lado, ao desvelar a vida dos indivíduos, pode, em contrapartida, abrir possibilidades para o acesso das famílias a recursos e serviços, além de acumular um conjunto de informações sobre as expressões contemporâneas da questão social pela via do estudo social, considerando que o assistente social atua numa zona de fronteira entre o público e privado (IAMAMOTO, 2009a, p.19).

Numa conjuntura social, política e econômica de acirramento de disputas é preciso que o profissional se posicione a favor da redução das discrepâncias e iniquidades sociais para que mais famílias acessem recursos e serviços que lhe são por direitos acessados via políticas públicas. Há grupos da sociedade que se sentem órfãos de justiça. Não por acaso, estes grupos são compostos de pessoas de classes empobrecidas, negros, mulheres, pessoas LGBTQIA21, pessoas de religiões não cristãs.

A crescente onda de violência urbana exige respostas duras e severas no sentido de socialização dos meios de produção e de subversão da lógica capitalista que culmine no fim da propriedade privada e das diferenças entre as classes sociais. Cada vez mais são demandadas a internação e penalização mais rigorosa para os atos infracionais praticados por jovens em conflito com a lei por segmentos sociais que vem se tornando cada vez mais conservadores, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.

No atual contexto de crise cíclica do modo de produção e reprodução capitalista (MANDEL, 1990). Há na sociedade a sensação de que para o jovem não há punição. Paralelamente a isto no interior das unidades socioeducativas, percebe-se a necessidade do uso da força, do endurecimento do regime de internação e de contenção por parte de alguns profissionais.

Nesse sentido, é importante refletir sobre as ações socioeducativas e/ou educação em saúde não devem pautar-se pelo fornecimento de informações e/ou esclarecimentos que levem a simples adesão do usuário, reforçando a perspectiva de subalternização e controle dos mesmos. Devem ter como intencionalidade a dimensão da libertação na construção de uma nova cultura e enfatizar a participação dos usuários no conhecimento crítico da sua realidade e potencializar os sujeitos para a construção de estratégias coletivas (IAMAMOTO, 2009b).

Adotar a dimensão libertadora e de construção de uma nova cultura de participação dos sujeitos na sociedade pressupõe o estabelecimento de um diálogo com a família e com o adolescente pautado nos direitos humanos, direitos sociais, emancipação e reinserção social e comunitária. Buscar a participação destes jovens e de suas famílias intencionando a reinserção social e familiar é ultrapassar os limites de uma instituição que oprime que massifica o atendimento e o desumaniza quando lhe passam a chamar por um número de prontuário.

Promover a visibilidade social a alguém que na sua comunidade ou núcleo familiar é visto com um problema é desconstruir preconceitos, criar condições concretas para o empoderamento que requer protagonismo. Seguindo esta lógica, Faleiros (2011) descreve a importância deste fortalecimento daqueles que vivem na periferia das trocas e relações sociais significativas e enriquecedoras, tornando-se mais fragilizados.

É preciso enfrentar ainda a própria fragilidade institucional e do profissional que está na ponta da execução das políticas socioeducativas, pois nestas instituições menos investimentos são destinados às políticas sociais.

Vitoriano (2011) aponta que se faz necessário promover articulação de redes de proteção social aos movimentos sociais na medida em que esse fortalecimento implique não só fortalecer o sujeito em relação à lei, mas no questionamento da lei, da distribuição desigual de renda e do poder, na denúncia da desigualdade, articulando-se redes de solidariedade e movimentos sociais.

Em geral, a lógica institucional busca a manutenção do status quo, enquanto que a demanda do profissional coadunado com a visão socioeducativa (entendida neste artigo com aquela que se pauta nos princípios do SINASE, ECA e da Declaração Universal dos Direitos Humanos), pretende romper com práticas limitantes, visando ultrapassar o tecido social, em direção às políticas sociais que movimentam a sociedade civil e que superam os limites da oposição entre classes. Conforme Vergara (2003) expressa que somente através da criação de espaços que acolham os jovens, respeitando-os em suas individualidades e subjetividades, construindo diálogos num processo de escuta, de afirmação do sujeito, do apoio à construção de um projeto de vida, com suporte familiar e comunitário, cremos em um processo pleno de ressocialização que provoque novo modo de inserção do jovem em sociedade.

As instituições socioeducativas gerenciam políticas sociais cada vez mais esvaziadas de materialidade e de sentido que, em sua grande parte, pretendem cumprir metas inatingíveis elaboradas por gestores em seus gabinetes. A cada troca de gestão, novos alvos e metas são definidos. O atendimento socioeducativo como determina o SINASE, tem como base a:

Prevalência da ação socioeducativa sobre os aspectos meramente sancionatórios. As medidas socioeducativas possuem em sua concepção básica uma natureza sancionatória, vez que responsabilizam judicialmente os adolescentes, estabelecendo restrições legais e, sobretudo, uma natureza sociopedagógica, haja vista que sua execução está condicionada à garantia de direitos e ao desenvolvimento de ações educativas que visem à formação da cidadania. Dessa forma, a sua operacionalização inscreve-se na perspectiva ético-pedagógica (BRASIL, 2012).

No cotidiano institucional os espaços de trabalho encontram-se cada vez mais empobrecidos, com poucos recursos materiais. Neste aspecto, intervir em favor dos que estão em situação de extrema vulnerabilidade social é até contraditório, pois em algumas instituições, as condições do trabalho socioeducativo são precárias, como pontua Yazbek (2001), em relação ao que acontece com as políticas públicas na América Latina. Existe, portanto, um desafio em relação ao trabalho do assistente social na área socioeducativa que precisa levar em conta as limitações impostas pela conjuntura econômica, social e política, bem como os entraves que existem no cotidiano socioinstitucional em relação às duas correntes conflitantes que, ora busca a punição, ora a ressocialização, e às questões ligadas ao aparelhamento da rede pública que, em geral, são deficientes como reflexo do pouco investimento do Estado nesta área.

Para que um trabalho socioeducativo traga resultados é preciso ter em seu eixo principal conduta pautada pelo Código de Ética, pelo compromisso com as dimensões ético-políticas e teórico-metodológicas do Serviço Social e com a visão de que é possível construir um caminho para a ressocialização do adolescente a partir do Plano Individual de Atendimento (PIA)22, em conjunto com a família e com o suporte da comunidade na qual se inserem.

A relação que se estabelece com seus usuários precisa ser mediatizada pela intervenção que se pauta na desconstrução da submissão de uma classe a outra. Somente a partir de uma opção política em favor da classe trabalhadora pode-se intervir para romper com a dominação e manutenção do poder hegemônico.

De acordo com o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS, 2011), as intervenções do trabalhador social estão definidas nestes moldes:

O (a) trabalhador social ou assistente social atua no âmbito das relações entre os sujeitos sociais e, entre eles, o Estado. Desenvolve um conjunto de ações de caráter socioeducativo que incidem na reprodução material e social da vida, com indivíduos, grupos, famílias, comunidades e movimentos sociais numa perspectiva de transformação social. [...] Os princípios de defesa dos direitos humanos e, da justiça social são elementos fundamentais para o trabalho social, para que esse trabalho se realize com vistas a combater a desigualdade social e as situações de violência, de opressão, de pobreza, de fome e de desemprego (CFESS, 2011, p.746).

Para além destas ações é preciso trabalhar os vínculos afetivos, bem como o reingresso as redes de suporte ao ensino profissionalizante, a construção de um projeto de emancipação com o jovem requer que a sociedade e o Estado estejam abertos para descontruir à visão hegemônica que estigmatiza e condena de antemão os trabalhadores que procuram sobreviver em comunidades, e os jovens que cometeram delitos, atos infracionais ou crimes.

Na intervenção dos trabalhadores da área socioeducativa inseridos nas equipes multidisciplinares não há espaço para o discurso meritocrático. É imprescindível o estudo aprofundado dos determinantes sociais que estão associados à prática da transgressão, fortalecer projetos sociais que estejam voltados para a transformação social, auxiliando a reinserção familiar e comunitária dos jovens, propondo a participação popular, buscando a autodeterminação dos sujeitos.

Considerações finais

Este artigo procurou apresentar reflexões sobre o trabalho do assistente social da área socioeducativa, entendendo que esse é um espaço de trabalho que necessita de reflexões que auxiliem a efetivar na prática o que sinaliza o SINASE e o ECA. É importante que os projetos de intervenção se pautem pelo engajamento-político e compromisso com os sujeitos em situação de vulnerabilidade social, invisibilizados pela omissão do Estado. Construindo espaços e discutindo com os jovens e familiares planos individualizados para a reinserção social dos mesmos. Compreendendo os adolescentes enquanto pessoas que possuem direitos e projetos únicos de vida, percebendo-os para além dos delitos ou atos ilegais praticados, opondo-se a estigmatizá-los. Emponderando-os e, também, atuando junto às famílias, à comunidade e à sociedade, buscando reduzir a criminalização desta parcela da população, subsidiando ações e projetos que auxiliem na reformulação das trajetórias de vida, percebendo seu lugar dentro do contexto comunitário e social.

O trabalho socioeducativo, quando bem planejado e quando respaldado por políticas inclusivas, tem um grande potencial de mudança e de mobilização social, que pode provocar um movimento que estabeleça novas redes, novas interfaces e pode acima de tudo favorecer o empoderamento e o protagonismo juvenil.

Infelizmente estamos longe das propostas do SINASE e do ECA, mas é preciso permanecer refletindo sobre esta prática e apontar o que já se tem procurado fazer, somando forças com outros trabalhadores, para que a partir de muitas reflexões sobre esta prática se possa contribuir para reformulações neste espaço de trabalho.

Referências

AMORIM, P. K. Neoliberalismo e criminalização da pobreza. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007.

ANTUNES, R. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 2015.

ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2010.

ARENDT, H. Homens em tempos sombrios. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

BARROS, N. V.; MOREIRA, C. A.; DUARTE, K. M. Juventude e Criminalização da Pobreza. Revista de Educação, Cascavel/PR, v. 3, n. 5, p. 141-148, 2008.

BECK, U. Liberdade ou capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Unesp, 2003.

BRASIL. Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, Departamento da Criança e do Adolescente. Lei Federal 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. Brasília-DF, 1990.

______. Constituição da República Federativa do Brasil, 1998. Brasília-DF, 1998.

______. Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012. Institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Diário Oficial da União, Brasília. Brasília-DF, 2012.

CANAVÊZ, F. As UPPs para além do dilema entre violência e paz. Revista Epos, Rio de Janeiro, v. 3, n. 1, 2012.

CARDIA, N.; SCHIFFER, S. Violência e desigualdade social. Revista Ciência e Cultura, São Paulo, v. 54, n. 1, p. 25-31, 2002.

CARVALHO, M.B. A política de pacificação de favelas e as contradições para a produção de uma cidade. O Social em Questão, Rio de Janeiro, ano XVI, n. 29, p. 283-308, 2013.

CFESS - CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. A definição de trabalho social da FITS: Por que revisar? Serviço Social & Sociedade, São Paulo, n. 108, 2011.

CUNHA, N. V.; MELLO, M. A .S. Novos conflitos na cidade: a UPP e o processo de urbanização na favela. DILEMAS – Revista de Estudos de Conflitos e Controle Social, Rio de Janeiro, v. 4, n. 3, p.371-401, 2011.

DALLARI, D. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998.

GONÇALVES, K. P. O efeito UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora do Rio de Janeiro) nas representações sociais de violência e de favela: o Rio possível. Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n. 5, p. 182-197, 2011.

FALEIROS, V. P. Serviço Social nas instituições: Hegemonia e prática. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, ano VI, n. 17, 1985.

______. Impunidade e Inimputabilidade. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, ano 24, n. 77, 2004.

______. O que é política social. São Paulo: Brasiliense, 2006.

______. Estratégias em Serviço Social. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2011.

FLEURY, S. Políticas sociais e poder local. Revista de Administração Municipal, Rio de Janeiro, ano 49, p. 39-48, 2004.

HARVEY, D. A condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 2015.

______. O serviço social na cena contemporânea. In: CFESS; ABEPSS (Org.). Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília, 2009a.

______. Os espaços sócio-ocupacionais do assistente social. In: CFESS; ABEPSS (Org.). Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília, 2009b.

LEMOS, F. C. S. O Estatuto da Criança e do Adolescente em discursos autoritários. Fractal: Revista de Psicologia, Niterói/RJ, v. 21, n. 1, p. 137-150, 2009.

LOPES, E. R. C. L. A inserção familiar no sistema socioeducativo de privação de liberdade e restrição de liberdade no Estado do Rio de Janeiro. Diversidade, Violência e Direitos Humanos. Rio de Janeiro: DEGASE, 2015.

MANDEL, E. A crise do capital: os fatos e sua interpretação marxista. São Paulo: Ed. Ensaios, 1990.

MENICUCCI, C. G.; CARNEIRO, C. B. L. Entre monstros e vítimas: a coerção e a socialização no sistema socioeducativo de Minas Gerais. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, n. 107, 2011.

MÉSZÁROS, I. Para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2002.

MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R. É possível prevenir a violência? Reflexões a partir do campo da saúde pública. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.4, n.1, p. 7-23, 1999.

OLIVEIRA, M. H. B. O; VIANNA, M. B; TELES, N.; MACHADO, F. R. S; FERREIRA, A. P.; TELLES, F. S. P.; SOUTO, L. R. F. Direitos humanos e saúde: 70 anos após a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Reciis, Rio de Janeiro, v. 12, n. 4, p. 370-374, out./dez. 2018.

PASSETI, E. Crianças carentes e políticas públicas. In: DEL PRIORE, M. (Org.). História das Crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008.

PIANA, M. C. A construção do perfil do assistente social no cenário educacional. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009.

SILVA, J. A. Acesso à justiça e cidadania. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 216, p. 9-23, abr./jun. 1999.

SILVA, A. M. C.; ANJOS, V. Barra (para) bacana: a criminalização da pobreza na gestão da segurança pública carioca. Revista Epos, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, 2010.

THEODORO, M. Relações raciais, racismo e políticas públicas no Brasil contemporâneo. Revista de Estudos & Pesquisas sobre as Américas, Brasília, v. 8, n. 1, p. 205-219, 2014.

VITORIANO, I. S. A ação da rede socioassistencial: quais as possibilidades desta efetivar-se? Anais... Jornada Internacional de Políticas públicas - JOINPP. São Luís/MA, 2011.

VOLPI, M. Sem liberdade, sem direitos: a experiência de privação de liberdade na percepção dos adolescentes em conflito com a lei. São Paulo: Cortez, 2001.

WACQUANT, L. As Prisões da Miséria. Paris: Raisons d'Agir, 1999.

WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência IV: os jovens do Brasil. Brasília: Unesco, 2004.

YAZBEK, M. C. Pobreza e exclusão social: expressões da questão social no Brasil. Temporalis, Brasília, v. 2, n. 3, 2001.

HMTL gerado a partir de XML JATS4R por