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“Reforma” da política de assistência social no município do Rio de Janeiro: em questão a análise da atuação dos CRASs e CREASs
Robson Roberto Silva
Robson Roberto Silva
“Reforma” da política de assistência social no município do Rio de Janeiro: em questão a análise da atuação dos CRASs e CREASs
“Reform” of social welfare policy in the municipality of Rio de Janeiro: concerned the analysis of the performance of CRASs and CREASs
O Social em Questão, vol. 16, núm. 30, pp. 299-326, 2013
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
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Resumo: Este trabalho consubstancia os resultados de uma pesquisa qualitativa que procurou ana- lisar a atuação dos CRASs e CREASs no município do Rio de Janeiro. Mas, para tanto, apresenta, em um primeiro momento, um estudo sobre a “reforma” da política de assis- tência social nessa esfera local de governo, que buscou adequar-se aos preceitos previs- tos pela atual política nacional dessa área social. Posteriormente, o trabalho destaca uma analise da atuação desses centros de referência de assistência social, tomando com base os segmentos-populacionais, as necessidades e as estratégias sócio-assistenciais, assim como as relações existentes com os setores de gestão, com as políticas intersetoriais e com o conselho municipal de assistência social.

Palavras-chave:ReformaReforma,Política de assistência socialPolítica de assistência social,Centros de referência de assistência socialCentros de referência de assistência social,município do Rio de Janeiromunicípio do Rio de Janeiro.

Abstract: This work embodies the results of a qualitative study that sought to analyze the per- formance of CRASs and CREASs in the municipality of Rio de Janeiro. But to do so, presents, at first, a study on the “reform” of social welfare policy in this sphere of local government, which sought to adapt itself to the precepts laid down by current national policy in this social area. Subsequently, the paper highlights an analysis of the performance of these reference centers for social assistance, taking with population-based segments, needs and strategies social assistance, as well as existing relationships with management sectors, with intersectoral policies and with the city council social care.

Keywords: Reform, Social assistance policy, Reference centers for social assistance, The municipality of Rio de Janeiro.

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“Reforma” da política de assistência social no município do Rio de Janeiro: em questão a análise da atuação dos CRASs e CREASs

“Reform” of social welfare policy in the municipality of Rio de Janeiro: concerned the analysis of the performance of CRASs and CREASs

Robson Roberto Silva1
UFF, Brasil
O Social em Questão, vol. 16, núm. 30, pp. 299-326, 2013
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Recepção: 01 Junho 2013

Aprovação: 01 Agosto 2013

Introdução

Este trabalho apresenta alguns resultados da pesquisa qualitativa realizada no segundo semestre de 2010 e que deu origem à monografia — Política Nacional de Assistência Social no Século XXI: Uma Análise da Atuação dos Centros de Referência de Assistência Social no Município do Rio de Janeiro — do curso de especialização em Serviço Social, Direitos Sociais e Competências Profissionais, promovido pela Universidade de Brasília (UNB), pelo Conselho Federal de Ser- viço Social (CFESS) e pela Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS).

A política de assistência social, desde o início da formação industrial e urbana do Brasil, isto é, nas duas últimas décadas da primeira metade do século XX, pro- curou intervir nas expressões da chamada “questão social”, que não foram com- preendidas e enfrentadas pelo Estado brasileiro nas suas formas mais totalizantes, mas sim “numa ótica de individualização que transfigura os problemas sociais em problemas pessoais (privados)” (NETTO, 2001, p. 36).

Nesse período da história do país, tal política foi sendo implementada pelo Estado marginalmente, ou seja, sem tanta importância, quando comparada com as demais políticas sociais, que seguiam a lógica de seguro social. Isso pode ser explicado em parte pela perspectiva liberal adotada por essa “sociedade política” e que respaldava a existência de uma série de iniciativas no campo da filantropia e da caridade. Iamamoto e Carvalho (2001, p. 176) destacam que o Estado brasileiro, principalmente o governo de São Paulo, buscou “subordinar a seu programa de ação as iniciativas particulares – dividindo áreas de atuação e subvenciando as instituições coordenadas pela Igreja”. Essa estratégia, se por um lado, reforçou as iniciativas filantrópicas e de caridade, por outro lado, criava já uma simbiose entre o público e o privado em matéria de assistência social. Embora na década de 1940, para atender muito mais as exigências do capital do que dos trabalhadores, o governo nacional tenha criado algumas instituições sociais e assistenciais, como a Legião Brasileira de Assistência (LBA), estas implementavam suas atividades sem tanta racionalidade e, por essa razão, estavam mais próximas “da caridade privada que da proteção social pública” (BOSCHETTI 2006, p. 35)

Após o meado do século XX, no regime autoritário-burocrático, o Estado brasileiro começou a realizar um conjunto de reformas, que excluiu os traba- lhadores do processo de decisão política e que resultou no desenvolvimento das políticas de seguro social, ainda caracterizadas pela centralização político- -administrativa. Porém, nas últimas décadas desse século, já em um período marcado pela redemocratização do país, realizaram-se outras reformas, que contaram com a participação popular e que culminaram com a criação da Constituição Federal de 1988.

Esta Carta Magna representou uma mudança legal da proteção social, tendo em vista que, ao incluir a política de previdência social, a de saúde e a de assis- tência social como partes da seguridade social, ampliou a noção de direitos so- ciais como parte da condição de cidadania, até então restritos à lógica de seguro social. Porém, para Fleury (1999), esses preceitos constitucionais deveriam, não só, atravessar uma longa trajetória legal, iniciando-se com a promulgação da legislação ordinária e das constituições estaduais e municipais, mas, também, serem transformados em práticas institucionais, pois já se observavam resistências por parte das forças conservadoras que habitavam o Poder Executivo e Legislativo.

A exemplo, as leis orgânicas das políticas de seguridade social, que deveriam ser aprovadas num prazo máximo de seis meses, como determina a Constituição, não ocorreram como se previa. Particularmente, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) — resultado da organização e mobilização de setores progressistas da sociedade — apenas foi promulgada em 1993. Entretanto, nesse período, o país já vivenciava a utilização, por parte do Estado, das estratégias neoliberais, que produziram uma verdadeira contrarreforma das políticas de seguridade so- cial, em benefício das necessidades do capital (BEHRING, 1993); e também os primeiros passos do regime de produção —denominado por Harvey (1994) de “acumulação flexível”—, que aumentou o desemprego, intensificou a flexibiliza- ção, a precarização do trabalho e contribui para desmobilização e desorganização política da classe trabalhadora.

Na primeira década do século XXI, percebe-se que o país aprofundou essas contradições sociais, econômicas e políticas, que, de um modo geral, se expressam pelas mudanças no mundo do trabalho, que agravaram a situação de pobreza e de desigualdade social, e, também, pelas contrarreformas das políticas sociais, em especial da política de assistência social, que vem adquirindo certa centralidade no sistema de seguridade social, a partir da implementação de programas de renda mínima, que vêm ganhando autonomia e existência própria, desarticulada e des- vinculada desse sistema de proteção social como um todo (Cf. LAVINAS, 2004).

Alguns intelectuais, como Pastorini e Galízia (2006) e Rodrigues (2008), têm chamado atenção para esse processo em curso no Brasil e nos demais países da América Latina, que denominam de assistencialização da proteção social. Mota (2008) aponta que tal processo conduz a assistência social bra- sileira a um mito social. Isto é, a uma política que, unicamente, atenderia as distintas necessidades sociais dos trabalhadores, produzidas em decorrência da “acumulação por espoliação”2.

Com a aprovação em 2004 da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), que traz as bases de organização do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) — cujo modelo de gestão segue as diretrizes constitucionais da descentralização político-administrativa e da participação da sociedade no controle das ações governamentais, que também estão previstas pela LOAS — o governo federal prioriza o investimento em programas de renda mínima, como o Bolsa Família (criado em 2003). Mas, em contrapartida, o montante de recursos financeiros que são repassados fundo a fundo para os serviços sócio-assistenciais é significativamente menor. Estudos realizados por Boschetti e Salvador (2006) destacam essa tendência:

as principais orientações dos programas e ações planejadas no PPA do atual go- verno: fortalecimento de benefícios de transferência de renda como BPC e Bolsa Família; apenas manutenção de ações protetivas e sócio-educativas, com cresci- mento pífio de recursos que não alcançam mais de 5% dos recursos do FNAS [...]. Este Quadro indica, assim, aumento dos recursos repassados pelo governo federal em forma de transferência de renda diretamente aos beneficiários e ma- nutenção ou pífio crescimento dos recursos destinados a ações que devem ser coletivamente executadas pelos CRAS na modalidade de proteção básica e/ou especial conforme a PNAS e a NOB (BOSCHETTI e SALVADOR, 2006, p. 50).

Diante desse contexto, o presente trabalho procura analisar os avanços e os desafios da PNAS (2004), tomando como referência a atuação dos Centros de Referência de Assistência Social do município do Rio de Janeiro (RJ), que são “unidades” públicas de atendimentos que compõem o SUAS. Essa análise, orientada pela teoria social crítica, fundamentada pela tradição marxista, tornou-se possível a partir da utilização da pesquisa documental e bibliográfica, que permitiu compreender, em um primeiro momento, a “reforma” na área da assistência social que este município (um dos pioneiros na implantação do SUAS) realizou para se adequar aos preceitos previstos nesta atual políti- ca nacional. As entrevistas semi-estruturadas também foram um dos instru- mentos adotados nessa pesquisa, que propiciaram analisar, já em um segundo momento, o “trabalho” desenvolvido pelos equipamentos de assistência social nessa localidade. Foram realizadas entrevistas dessa natureza com um assis- tente social, que atende diretamente a população usuária, de cada um dos sete Centros de Referencia da Assistência Social (CRASs) e dos quatro Cen- tros de Referência Especializado da Assistência Social (CREAS). Essa amostra de 11 equipamentos, de um universo aproximadamente de 47 CRASs e 14 CREASs no município, se deu de forma aleatória. Porém, buscou-se garantir uma representatividade de todas as áreas do território. Portanto, foram en- trevistados profissionais que atuam nesses centros nas Zonas Oeste, Norte, incluindo Leopoldina, Zona Sul e também Centro do RJ. Os dados coletados foram organizados nos seguintes eixos de análise: (i) Segmento Populacional e Demandas Sócio-assistenciais; (ii) Estratégias Sócio-assistenciais; (iii) Rela- ção com os Setores de Gestão; (iv) Relação com as Políticas Intersetoriais; e (v) Articulação com o Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) – e são apresentados após um estudo da reestruturação da Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS) do RJ.

Análise da Atuação dos CRASs e CREASs no Município do Rio de Janeiro

Os Centros de Referência de Assistência Social (tanto os CRASs quanto os CREASs), ao se configurarem como um espaço de viabilização de serviços e di- reitos sociais; de articulação intersetorial; e de mobilização e participação popular, podem evitar e/ou enfrentar duas tendências conservadoras presentes nessa política social. De acordo com o CFESS (2009):

A primeira é de restringir a atuação aos atendimentos emergenciais a indivíduos, grupos ou famílias, o que pode caracterizar os CRAS e a atuação profissional como um “grande plantão de emergências”, ou um serviço cartorial de registro e controle das famílias para acessos a benefícios de transferência de renda. A segunda é de estabelecer uma relação entre o público e o privado, onde o poder público transforma-se em mero repassador de recursos para as organizações, que assumem a execução direta dos serviços sócio-assistenciais. Esse tipo de relação in- corre no risco de transformar o(a) profissional em um(a) mero(a) fiscalizador(a) das ações realizadas pelas ONGs e esvazia sua potencialidade de formulador(a) e gestor(a) público(a) da política de Assistência Social ( p. 22-23).

Essas considerações do CFESS são importantes insumos para a análise da atua- ção dos CRASs e CREASs no município do RJ, que levou em consideração, como se pode observar a seguir, os segmentos populacionais, as necessidades e as estra- tégias sócio-assistenciais apresentadas pelos usuários, as relações existentes entre esses centros com os setores de gestão da SMAS, com as políticas intersetoriais e com o conselho municipal dessa área social.

Segmento Populacional e Necessidades Sócio-assistenciais nos CRASs e CREASs

A PNAS (2004) destaca, sobretudo, que as famílias brasileiras, em situação de “vulnerabilidade” e “risco” social, devem ser consideradas como público alvo das atividades sócio-assistenciais desenvolvidas pelos CRASs e CREASs. A literatura especializada vem apontando que essa é uma tendência não só dos países de capitalismo periférico, como o Brasil, mas, também, de muitos dos países de capitalismo central, principalmente no período marcado pela “crise” dos Estados de Bem-Estar Social, que tem início nos anos 1970. Mioto (2008), ao utilizar o estudo de Esping-Andersen, aponta que essa tendência é conceituada como “familismo”, que está relacionada ao fato da política pública considerar, e até mesmo insistir, que as “unidades familiares devem assumir a principal responsabilidade pelo bem-estar de seus membros” (p. 134) e não o Estado. Porém, embora o Brasil não tenha conquistado um Estado de Bem-Estar Social, tal como os dos países de capitalismo avançado, desde os anos 1990, em um contexto de hegemonia neoliberal, o sistema de proteção social brasileiro, assim como dos demais países latino-americanos, vem sendo conduzido, significativamente, a partir da utilização do familismo. No caso da “política de assistência social assume-se a matricialidade sócio-familiar inicialmente como princípio e, posteriormente, como diretriz do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)” (MIOTO, 2008, p. 144).

Neste sentido, de acordo com as informações coletadas nos CRASs e CREASs, o principal segmento da população do município do Rio de Janeiro que demanda atendimentos sociais nesses equipamentos são famílias. Muitas dessas famílias são classificadas pelos entrevistados como monoparentais, ou seja, “unidades domés- ticas em que as pessoas vivem sem cônjuge, com um ou vários filhos com menos de 25 anos e solteiros” (VITALE, 2002, p. 45). São “Famílias, mas as famílias que a gente atende têm muitas crianças. Famílias com baixa renda e geralmente famílias monoparentais” (Entrevistado 02).

Essas famílias possuem uma série de necessidades sociais, que deveriam ser enfrentadas a partir da interseção de um conjunto de políticas sociais públicas. Entretanto, devido às fragilidades e à inexistência dessas medidas sociais no mu- nicípio em questão, identificou-se a utilização do “familismo”, principalmente em se tratando da política de assistência social, que vem se resumindo aos programas de renda mínima. Esse fato tem penalizado ainda mais as famílias em situação de pobreza da região, uma vez que para permanecerem nesses programas precisam assumir algumas responsabilidades, conhecidas como condicionalidades na área da saúde, educação e também da própria assistência social. A área é muito carente de política social, muito carente, muito carente! (Entrevistado 02).

As pessoas realmente são de extrema pobreza, são pessoas oriundas de comuni- dades com mínimas condições de subsistência. Existe uma procura de programas, projetos sociais e ações, que viabilizem a isenção de taxas. Essas pessoas vêm muito por causa do Bolsa Família (Entrevistado 05).

Todavia, embora os atendimentos nos CRASs e CREASs sejam destinados, sobretudo, às famílias, os participantes da pesquisa mencionaram que esses equipamentos, muitas das vezes, atendem crianças, adolescentes, mulheres e idosos, mas sem desconsiderar, na análise sócio-econômica, os núcleos familiares que esses usuários estão inseridos. Nesses atendimentos, as necessidades sociais apresentadas pela população usuária são inúmeras e expressam diferentes níveis de complexidade. No caso dos atendimentos prestados pelos CRASs, os entrevistados apontaram que as necessidades sócio-assistenciais estão relacionadas à renda mínima das famílias. Já no que se referem aos CREASs, tais necessidades correspondem, na concepção dos sujeitos da pes- quisa, à violência doméstica, à dependência química, principalmente a depen- dência do Crack pelos adolescentes, ao desemprego; aos conflitos familiares e de comunidades, ocasionados pela criminalidade, que contribuem para ex- pulsão de muitas famílias e indivíduos dos seus territórios.

Em termo de atendimento o carro chefe hoje seria a dependência química, a entrada do Crack vem afetando todos os perfis, a questão do desemprego também que está afetando muitas famílias que estamos atendendo. Conflito em comunida- de, que em geral expulsão essas famílias ou membros dessas famílias, gerando o desemprego, a falta da casa e muitas vezes motivando a ida para as ruas, isso tem sido um complicador (Entrevistado 09).

Essas distintas necessidades sócio-assistenciais são expressões da “questão social”. Iamamoto (2001), ao analisar as principais mudanças no mundo do trabalho, alude que os profissionais de Serviço Social, que se inserem em di- ferentes espaços sócio-ocupacionais, portanto, não só os da assistência social, “trabalham com a questão social nas suas mais variadas expressões quotidia- nas, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde, na assistência social pública, etc” (p. 28). Contudo, a PNAS (2004) adotou as categorias “vulnerabilidade” e “risco” social para se referir aos segmentos populacionais, às necessidades sócio-assistenciais e, conseqüentemente, para direcionar às estratégias que devem ser implemen- tadas pelos CRASs e CREASs. Essa utilização, vale dizer, tende a contribuir para uma não compreensão substantiva do conteúdo concreto dessas catego- rias, que estão situadas no “âmbito das relações de trabalho, entendias como expressão das relações de forças entre classes ou segmentos de classe que se confrontam” (GUERRA, 2005, p. 135). Em outras palavras, o emprego dessas categorias, sem uma melhor qualificação substancial do que elas sig- nificam, pode contribuir para uma despolitização das relações sociais que se estabelecem na sociedade brasileira e que se expressam no interior dos diferentes espaços sócio-ocupacionais.

Estratégias Sócio-assistenciais desenvolvidas nos CRASs e CREASs

Este eixo busca, por sua vez, identificar as principais estratégias sócio-as- sistenciais, isto é, os principais benefícios, programas, projetos ou serviços de- senvolvidos por esses centros no município do Rio de Janeiro. Especificamente, procura analisar os principais avanços e os limites dessas estratégias. Com base nas informações coletadas, foi possível identificar a centralidade que o Progra- ma Bolsa Família (PBF) está assumindo dentre as estratégias sócio-assistenciais implementadas pelos CRASs. Esta centralidade pode levar o SUAS a se consti- tuir em uma rede mínima de proteção social, muito diferenciada da dimensão da “proteção social não contributiva concernente à assistência social como política de seguridade social” (SPOSATI, 2006, p. 112). Embora os entrevistados tenham mencionado, secundariamente, outros programas federais, como, por exemplo: o Projovem Urbano; Projovem Adolescente; Programa Minha Casa, Minha Vida; Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI); e o Passe Livre Interesta- dual, nenhum dos entrevistados, que trabalham nos CRASs, mencionou sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que, segundo a PNAS (2004) faz parte do nível de proteção social básica e deve ser implementado articuladamente com os demais programas e serviços previstos pelo SUAS. O dado indica que esse primeiro e único mínimo social constitucional, que busca garantir um salário mí- nimo a determinados segmentos da população brasileira que não têm condições de provê-la de forma própria, ainda é visto como um direito atrelado significativamente à lógica da Previdência Social, estando muito distante de ser concebido operacionalmente pela política de assistência social.

Em relação aos benéficos, programas, projetos e serviços sócio-assistenciais dos CRASs, que são próprios do município do Rio de Janeiro, os entrevistados mencionaram: o Banco Carioca de Bolsa de Estudo; os grupos de convivência para idosos e para Adolescentes; o trabalho com famílias; e o Passe Livre para idosos e pessoas com deficiência. Entretanto, pôde-se perceber nos discursos desses sujeitos nenhuma referência às estratégias sócio-assistenciais do governo estadual, o que confirma que o “papel dos estados está claramente subsumido e secunda- rizado no SUAS” (CARVALHO, 2006, p. 127). No que se refere aos avanços e limites dessas estratégias implementados pelos CRASs, o destaque maior foi dado ao Programa Bolsa Família (PBF). Segundo os participantes, os avanços deste Pro- grama estão relacionados ao fato de promover o acesso a muitas famílias e indi- víduos, que estão excluídos da riqueza socialmente produzida. O “Bolsa Família vem sendo um grande avanço, porque nós tivemos um maior contato com a miserabilidade que fica oculta com a sociedade. [...] nos fez conhecer para além dos muros das comunidades” (Entrevistado 05). Entretanto, embora este Programa de renda mínima tenha aproximado esses profissionais da população em situação de pobreza e de extrema pobreza, vale a pena enfatizar, que existe uma tendência da política social, que ao se preocupar com os dados quantificados e mensurados, torna a política para “os pobres, não para a pobreza” (VIANNA, 2009, p. 29).

Neste sentido, mesmo que alguns dos entrevistados tenham sinalizado que um dos avanços do PBF está relacionado com o aumento do poder de compra da população beneficiária, isso não significa que programas dessa natureza se pro- põem a combater a pobreza. Pelo contrário, estudos realizados por Silva (2007) apontam que o Estado, ao aumentar seu gasto assistencial com programas de renda mínima, em detrimentos das políticas sociais permanentes e universais, está corrigindo, sobretudo, falhas de mercado, uma vez que, na sociedade brasileira, uma grande parcela da população encontra-se fora do mercado formal de trabalho ou inserida precariamente. Além disso, apesar dos participantes destacarem que por meio das condicionalidades deste Programa, seus beneficiários têm tido acesso aos direitos e serviços sociais, Fonseca (2006) alerta que programas dessa natureza não vêm se configurando como porta de entrada para os níveis mais complexos de atenção social.

A respeito dos limites das estratégias sócio-assistenciais desenvolvidas pelos CRASs, os entrevistados destacaram a infraestrutura precária dos equipamentos e também o número reduzido de técnicos, sobretudo de administrativos, frente ao grande quantitativo de famílias, que demandam atendimentos principalmente para o PBF. Um dos sujeitos da pesquisa relatou que esses limites dificultam um acompanhamento substantivo dessas famílias. Em suas palavras, pôde-se identifi- car que acorre um acompanhamento de cadastros e não de famílias.

O grande quantitativo de atendimentos é um deles. [...] Então para você adminis- trar isso, às vezes, eu digo assim, você não acompanha famílias, você acompanha cadastros. Eu acho também que a questão do equipamento também é bastante precária, pode ver pela própria infraestrutura dele (Entrevistado 01).

Essa lógica produtivista no campo da assistência social pode ser explicada pela expansão da racionalidade formal-abstrata “posta no processo de trabalho na or- dem burguesa: a mercantilização das relações sociais, a coisificação dos homens – para todas as esferas da vida humana” (GUERRA, 2000, p. 14).

Alguns CRASs, mesmo a PNAS (2004) destacando que esses equipamentos devem se constituir enquanto unidades públicas estatais, vêm sendo implementa- dos como se fossem setores ou departamentos no interior de outros equipamen- tos, como, por exemplo, escolas, centros integrados de políticas sociais, centros de inclusão social, etc. Tal questão traz dificuldades físicas, como, por exemplo, redução de espaço, e também para construção da identidade tanto dos CRASs quanto dos CREASs, principalmente por parte da população usuária, que, muitas das vezes, não é bem recepcionada pelos agentes comunitários que trabalham nesses equipamentos, tendo em vista que estão insatisfeitos com suas condições objetivas de trabalho. Entretanto, todos os entrevistados dos CRASs menciona- ram que a SMAS do Rio de Janeiro, nesse caso a Subsecretaria de Proteção Social Básica, vem investindo um pouco mais nesses equipamentos. Esse investimento está muito atrelado à centralidade dos programas federais, sobretudo no que tange ao PBF. Isto é, as melhorias relatadas pelos participantes, em termos de infraestrutura desses equipamentos, estão sendo realizadas, principalmente por- que o PBF exige — para dar conta de uma série de normas, decretos e portarias, criadas no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) — uma engenharia social, que se pode afirmar, nunca antes foi vista na área da assistência social brasileira.

A gestão tem trazido melhoria para o equipamento, embora o trabalho tenha aumentado. Quando eu cheguei aqui, nós só tínhamos um computador com o sistema do Cadastro único, agora nós temos quatro computadores com o sistema. Nós não tínhamos Internet nenhuma (Entrevistado 02).

Contudo, esse padrão de investimento traz sérias conseqüências para o traba- lho realizado pelos CREASs no município. A PNAS (2004) aponta que esses equi- pamentos, situados no nível de proteção social de média complexidade, devem atender as famílias em situações de violações de direitos e cujos vínculos estão frágeis, mas ainda não foram rompidos. Mas, as dificuldades são inúmeras, elas remetem em grande medida à questão da infraestrutura desses centros especializados, como aponta os sujeitos da pesquisa.

Os limites concretos do nosso atendimento aqui, eu vou começar do básico, a estrutura física, material a gente não tem, as nossas condições são mínimas, temos que dividir espaço com um abrigo (Entrevistado 08).

Essa parte da infra-estrutura é muito complicada, o investimento da infra-estru- tura é muito pequeno ainda, hoje a gente não tem como acessar a Internet. A verba está sendo maior agora para os CRASs e não para os CREASs, impulsionada pelo Bolsa Família. Tudo que é feito no Bolsa Família, no Sistema do Cadastro Único, se re- cebe uma verba para isso. Atualmente, os CRASs estão recebendo mais investimento do que os CREASs (Entrevistado 07, grifos nossos).

Levando em consideração essas condições objetivas de trabalho, que os entrevistados mencionaram, as seguintes estratégias sócio-assistenciais vêm sendo imple- mentadas: os Programas Família Acolhedora, Medidas Sócio-educativas em Meio Aberto, de Volta a Terra Natal; PETI, Penas Alternativas; os Serviços de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual (SECABEXS); os atendimentos aos adolescentes usuários de Crack; as abordagens a população em situação de rua; e articulação com a rede social. Em relação aos avanços dessas estratégias realizadas pelos CREASs, o destaque foi dado ao Programa de Medidas Sócio-educativas em Meio Aberto. De acordo com as informações coletadas, embora este Programa seja uma estratégia que só recentemente vem sendo implementada pelos CREASs no município do Rio, uma vez que tal Programa estava ligado à área da Justiça, foi possível constatar que vem ocorrendo um atendimento mais humanizado aos adolescentes em conflito com a lei, junto com sua família e em seu território de origem.

Relação dos CRASs e CREASs com os Setores de Gestão da SMAS do RJ

Com este eixo procurou analisar os avanços e os limites da relação dos CRASs e CREASs com os setores de gestão da política de assistência social do município do Rio de Janeiro. Isto é, a relação desses equipamentos com a Subsecretaria de Proteção Social Básica, com a Subsecretaria de Proteção Social Especial, com a Gerência de Monitoramento e Avaliação, e com as Coordena- dorias de Assistência Social (CASs).

Neste sentido, segundo os relatos dos entrevistados que atuam nos CRASs, o principal avanço diz respeito a uma maior aproximação com os setores de ges- tão da SMAS do RJ, sobretudo com a Subsecretaria de Proteção Social Básica. Tal aproximação, de um modo geral, para a maioria dos participantes da pes- quisa, vem ocorrendo a partir dos recursos que estão sendo destinados a esses equipamentos, como, por exemplo, telefones e Internet. Porém, alguns sujeitos informaram também que a nova gestão da Subsecretaria de Proteção Social Básica tem feito reuniões e visitas aos CRASs. Além disso, relataram que com essa atual gestão, os CRASs, como prevê a PNAS (2004), estão apenas assumindo as res- ponsabilidades dos serviços, projetos, programas e benefícios ligados à proteção social básica. Na gestão anterior, mencionaram que implementavam também as estratégias sócio-assistenciais dos CREASs. Em termos de avanços das relações entre os CREASs e os setores de gestão da SMAS do RJ, os participantes não conseguiram identificar avanços. Um dos entrevistados enfatizou que não existe essa aproximação com os CREASs, uma vez que não existem reuniões instituídas, formalizadas pelos setores de gestão. “Eu não vejo uma sistemática de reuniões tanto com a Secretaria quanto com a CAS, eu vejo reuniões pontuais em cima de situações que devem ser resolvidas. Eu vejo que, por programas, de um modo geral, eu não vejo reuniões instituídas” (Entrevistado 07).

Além desse limite, outra dificuldade apresentada pelos profissionais que atu- am nos CRASs e também por aqueles que atuam nos CREASs diz respeito ao esvaziamento das CASs. Estas Coordenadorias, embora não estejam previstas na PNAS (2004), portanto, referem-se a uma particularidade político-institucional da assistência social no município do Rio, foram criadas com a finalidade de pro- piciar uma maior articulação entre os CRASs e CREASs nessa localidade. Contu- do, as informações coletadas indicam que as CASs têm perdido essa função articuladora. São muitos os conflitos entre a Subsecretaria de Proteção Social Básica e a Subsecretaria de Proteção Social Especial. Uma boa parte deles é ocasionada pelo padrão de investimento concentrado no Bolsa Família. A gestão da proteção social básica tem desconsiderado o papel das CASs, sua comunicação tem sido diretamente com os CRASs. Assim, estas Coordenadorias vêm se dirigindo prin- cipalmente aos CREASs, como o entrevistado menciona:

Dentro do próprio SUAS não se prevê a figura da CAS. Então, observamos muitas vezes, que isso é transitório e estão remodelando algo novo, que vem por aí. Então, direcionada a proteção básica, a CAS já tem atuado menos, ela está mais voltada para proteção especial no momento. O contato maior do CRAS vem sendo diretamente com a secretaria (Entrevistado 01).

Essa questão traz dificuldades para a integralidade das estratégias sócio--assistenciais, que vêm sendo implementadas pelo SUAS no município. Outro limite apresentado pelos entrevistados dos CRASs e, principalmente dos CREASs, está relacionado à determinação, por parte do gestor da pasta, da atuação desses profissionais não mais por programas. Ou seja, a SMAS do Rio de Janeiro vem determinando que os profissionais que trabalham nesses equipamentos, não sejam mais especialistas, mas sim generalistas. Porém, esta Secretaria não vem ampliando os seus cursos de capacitação técnico-profissional. Iamamoto (2001), ao analisar as implicações do regime de “acumulação flexível”, discute sobre o trabalhador polivalente, ou seja, aquele profissional que é chamado a exercer várias funções, várias atividades, no mesmo tempo de trabalho, porém sem alteração salarial. A análise dessa autora permite compreender essa preca- rização do trabalho nos equipamentos de assistência social do município. Em uma passagem da sua obra, ela reforça que o trabalhador deixou “de ser um trabalhador ‘especializado’ — e também o assistente social — sendo solicitado a exercer múltiplas tarefas, até então não necessariamente envolvidas em suas tradicionais atribuições” (IAMAMOTO, 2001, p. 32).

ASs, está relacionado à determinação, por parte do gestor da pasta, da atuação desses profissionais não mais por programas. Ou seja, a SMAS do Rio de Janeiro vem determinando que os profissionais que trabalham nesses equipamentos, não sejam mais especialistas, mas sim generalistas. Porém, esta Secretaria não vem ampliando os seus cursos de capacitação técnico-profissional. Iamamoto (2001), ao analisar as implicações do regime de “acumulação flexível”, discute sobre o trabalhador polivalente, ou seja, aquele profissional que é chamado a exercer várias funções, várias atividades, no mesmo tempo de trabalho, porém sem alteração salarial. A análise dessa autora permite compreender essa preca- rização do trabalho nos equipamentos de assistência social do município. Em uma passagem da sua obra, ela reforça que o trabalhador deixou “de ser um trabalhador ‘especializado’ — e também o assistente social — sendo solicitado a exercer múltiplas tarefas, até então não necessariamente envolvidas em suas tradicionais atribuições” (IAMAMOTO, 2001, p. 32).

Relação dos CRASs e CREASs com as Políticas Intersetoriais do Município do RJ

Através deste eixo buscou-se analisar os avanços e os limites da relação dos CRASs e CREASs com as políticas intersetorias e também com as chamadas Organizações Não Governamentais (ONGs) do Município do Rio de Janeiro. Em relação aos avanços da relação entre os CRASs com as demais políticas interseto- riais da região, alguns entrevistados apontaram que essas relações têm avançado, em alguns aspectos, principalmente a partir da implementação do PBF, que exige o acompanhamento das condicionalidades na área da saúde, da educação e da as- sistência social. Além disso, alguns participantes que atuam no CRAS e outros que atuam no CREAS informaram que outro avanço está relacionado às reuniões de rede, que são consideradas espaços importantes de troca e que contribuem para um atendimento integral a população usuária. Contudo, tais reuniões não acon- tecem em todos os territórios nos quais se localizam esses equipamentos. Alguns determinantes de ordem político-institucional, econômicos e cívicos têm contri- buído para essa prática, mas ainda é nula a participação da população usuária, sendo essas reuniões espaços que envolvem apenas os representantes de instituições e organizações públicas e privadas. A criação dessas reuniões, principalmente pelos profissionais desses equipamentos, pode ser analisada através do estudo realizado por Pereira (2004), que aponta que a política de assistência social por natureza é “genuinamente complexa, abrangente, interdisciplinar e intersetorial expressa no adjetivo (social) que a qualifica” (p. 59). Por essa razão, essa autora alude que a assistência social é a que mais se propõe a estabelecer interfaces e vínculos com as demais políticas, sem correr o risco de descaracterizar ou de se dissolver no interior das mesmas.

Entretanto, todos os participantes da pesquisa mencionaram que a rede social tem fragilidades que trazem limites para atuação desses centros no município do Rio. Destacaram o número restrito de instituições e organizações sociais e conseqüentemente as dificuldades para atender as necessidades essenciais da grande parcela empobrecida da população. “Os limites estão também relacio- nados com a rede. A própria rede é cheia de buraco, é uma rede que tem pouca parte tecida. [...] Muitas das vezes até tem o serviço, mas a gente não consegue a inclusão” (Entrevistado 07). Nas grandes comunidades situadas na Zona Norte, Zona Sul e Zona Oeste, os entrevistados mencionaram que, embora exista um grande número das chamadas Organizações Não Governamentais (ONGs), nelas se praticam a sobreposição de clientelas e serviços; e apesar do Estado promover parcerias com essas organizações da sociedade civil; por meio dessa estratégia não tem sido possível atender de forma plena as demandas encami- nhadas pelos equipamentos públicos de assistência social. Essas organizações possuem, na sua grande maioria, fragilidades financeiras, técnicas e políticas. “Nessa região, tem muitas ONGs, agora a minha preocupação também é com relação à sobreposição de ações, aquela coisa de todo mundo ficar com ativi- dades de capoeira” (Entrevistado 04).E “As ONGS aqui da região elas ainda denotam uma certa desarticulação” (Entrevistado 01).

Com essa parceria que o Governo Federal fez com essas ONGs, houve uma procura muito grande dos beneficiários [...], mas as ONGs não conseguiram abraçar essa demanda, o que aconteceu é que muitos se inscreveram, mas não foram chamados (Entrevistado 02).

Montaño (2005), ao analisar essas parcerias entre o Estado e as instituições ou organizações, que fazem parte do chamado “terceiro setor”, alude que essas parcerias dizem respeito às estratégias reforçadas pelos governos neoliberais. De acordo com o autor, o “Estado, dirigido pelos governos neoliberais, se afasta par- cialmente da intervenção social, porém é subsidiador e promotor do processo ideológico, legal e financeiro de ‘transferência’ da ação social para o terceiro setor” (MONTAñO, 2005, p.235). Entretanto, embora esses limites estejam pre- sentes no campo da atuação dos CRASs e CREASs, não existe um estreitamento das relações entre esses equipamentos com as instâncias de controle democrático que pudesse enfrentar de forma efetiva esse quadro político-institucional.

Articulação dos CRASs e CREASs com o Conselho Municipal de Assistência Social do RJ

Este último eixo procurou analisar as relações dos CRASs e CREASs com o Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) do Rio de Janeiro. A Ideia desse eixo é a de identificar possíveis avanços e limites dessas relações. Isso porque a literatura apresenta que esses espaços de controle social têm fragilidades políticas e institucionais (BEHRING e BOSCHETTI, 2006) que dificultam a deliberação e a fiscalização da política de assistência social. Porém, muitos autores e órgãos que representam os profissionais que trabalham nos CRASs e CREASs, como, por exemplo, o CFESS (2009), vêm sinalizando a importân- cia de assegurar a participação dos distintos profissionais e usuários, ligados a esses equipamentos, nessas instâncias de controle social, para a construção do SUAS. Entretanto, as falas dos entrevistados não demonstram uma gran- de aproximação com esses espaços públicos. Na verdade, diante das condições objetivas de trabalho desses profissionais, é praticamente nula a relação desses equipamentos com o CMAS do Rio. Existe apenas uma proximidade meramen- te burocrática, que diz respeito à fiscalização, que alguns profissionais desses equipamentos realizam nas instituições e organizações da sociedade civil, que estão inscritas ou querem se inscrever neste conselho gestor. “Não tem relação alguma com o Conselho, o que eu vejo é que quando eles precisam fiscalizar alguma instituição da área que está inscrita no Conselho, a gente recebe alguns processos para gente fazer visitar” (Entrevistado 02).

Apenas o entrevistado 01 informou que procura participar, sistematicamente, das reuniões dos conselhos, principalmente das assembléias do CMAS do Rio de Janeiro. Porém, esse quadro reduzido, de participação dos profissionais e dos usu- ários dos CRASs e CREASs, caso seja alterado pode fazer uma grande diferença na construção do SUAS no município. Isso porque se considera que “as forças ver- dadeiramente democráticas, no nível local e nacional, dentro ou fora do Estado, podem fazer uma real diferença” (WOOD, 2003, p. 49).

Considerações Finais

De um modo geral, pôde-se constatar por meio dessa pesquisa que apesar da quase nula participação de profissionais e usuários da assistência social no CMAS, o município do Rio de Janeiro, do ponto de vista institucional, vem estruturando a assistência social nos moldes da PNAS (2004). Entretanto, em matéria de estratégias sócio-assistenciais implementadas, identificou-se que o único direito assistencial, o BPC, ainda tem sido considerado um beneficio sem tanta correspondência com essa área social. O principal programa implemen- tado pelos CRASs é o Bolsa Família, que não faz parte do desenho operacional da PNAS (2004). Por esse motivo, este Programa tem conduzido à relação dos CRASs com outras políticas sociais. Mas essa relação tem sido conflituosa, tendo em vista que outros equipamentos sociais (escolas e unidades de saúde) consideram tal Programa muito mais uma estratégia de responsabilidade da assistência social. Além disso, embora o Bolsa Família tenha propiciado uma maior articulação dos CRASs com a gestão da proteção social básica, a lógica de investimento concentrado neste Programa tem contribuindo para o esvazia- mento de espaços institucionais (as CASs), que buscavam integrar as estraté- gias desenvolvidas no âmbito do SUAS no município. Diante dessa política que prioriza este Programa, os CREASs vêm tendo muitas dificuldades de atuação, e não contam com apoio por parte do Governo do Estado.

Material suplementar
Referências
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Notas
Notas
1 Assistente Social e Mestre em Política Social pela UFF; Especialista em Serviço Social, Direitos Sociais e Competências Profissionais pela UNB; e Doutorando em Serviço Social pela UFRJ, E-mail: robs_robert@hotmail.com .
2 De acordo com Harvey, é possível compreender a acumulação por espoliação, a partir das seguintes questões: a administração e a manipulação de crises pelo complexo Tesouro dos Es- tados Unidos – Wall Street – FMI; a privatização e mercadificação; a financialização e as redis- tribuições via Estado, que buscam resolver o problema da sobreacumulação quando liberam “um conjunto de ativos (incluindo força de trabalho) a custo muito baixo (e, em alguns casos, zero). O capital sobreacumulado pode apossar-se desses ativos e dar-lhes imediatamente um uso lucrativo” (HARVEY, 2008, p.124).
3 No meado de 2010, a SMAS transferiu mais alguns assistentes sociais que trabalhavam na po- lítica de saúde para a política de assistência social. Porém, nesse mesmo período, este órgão deslocou todos os assistentes sociais que trabalhavam na Rede de Proteção ao Educando (RPE) para a política de educação.
4 A gestão plena é um nível em que o município tem a gestão local das ações de Assistência Social, sejam elas financiadas pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), mediante repasse fundo a fundo, ou que cheguem diretamente aos usuários, ou, ainda, as que sejam provenientes de isenção de tributos, em razão do Certificado de Entidades Beneficentes de Assistência Social (CEBAS).
5 Neste Núcleo de Proteção Básica encontra-se a Rede de Proteção ao Educando (RPE), que foi criada em 2007. A RPE é um projeto macrofuncional entre a SMAS e a Secretaria Municipal de Educação, que busca atender aos alunos das escolas municipais e seus familiares. Atuam na RPE em torno de 169 servidores, sendo 112 assistentes sociais e 57 psicólogos, que estão lotados nos CRASs e nos Pólos de Atendimento Extra Escolar (Cf. SMAS, 2007).
Autor notes
1 Assistente Social e Mestre em Política Social pela UFF; Especialista em Serviço Social, Direitos Sociais e Competências Profissionais pela UNB; e Doutorando em Serviço Social pela UFRJ, E-mail: robs_robert@hotmail.com .
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