Negar aparências e não disfarçar evidências: a circulação de ideias e práticas da habitação popular entre o Brasil e a Argentina nos primeiros anos do século XX

Denying appearances and not disguising evidences: the circulation of ideas and practices of popular housing between Brazil and Argentina in the first years of the 20th century

Philippe Arthur dos Reis 1
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil

Negar aparências e não disfarçar evidências: a circulação de ideias e práticas da habitação popular entre o Brasil e a Argentina nos primeiros anos do século XX

O Social em Questão, vol. 1, núm. 53, pp. 19-38, 2022

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Recepción: 01 Noviembre 2021

Aprobación: 01 Enero 2022

Resumo: A circulação de ideias no campo da habitação foi um fenômeno que ganhou evidência na passagem do século XIX para o XX. Os relatórios médicos e sanitários desempenharam um significativo papel no processo de conhecimento das habitações populares, sobretudo cortiços de cidades que aumentavam sua população. Nesse aspecto, se destaca o papel do vereador de São Paulo, Afonso Celso Garcia da Luz, e suas observações em torno do aumento demográfico e de cortiços de Buenos Aires, análise que serviu de base para aprovação da lei municipal nº 1.098 de 1908, voltada para a construção de casas operárias. A discussão proposta por Celso Garcia também auxilia a compreender o debate dos modelos de cidade implementadas na Europa e que eram tomadas como referência por outros legisladores da Câmara Municipal de São Paulo.

Palavras-chave: Circulação de ideias, Habitação popular, Cortiços, Buenos Aires, São Paulo.

Abstract: The circulation of ideas in the field of housing was a phenomenon that gained evidence in the passage from the 19th to the 20th century. Medical and sanitary reports played a significant role in the process of learning about the observations of housing for poor people, , especially tenements in cities that were increasing their population. In this aspect, the role of São Paulo councilman Afonso Celso Garcia da Luz, and his observations on the population growth and tenements in Buenos Aires, material that served as a basis for the approval of municipal law nº1098 of 1908, on the construction of workers' houses, stands out. The discussion proposed by Celso Garcia also helps to understand the debate on city models implemented in Europe and that were taken as reference by other legislators in the São Paulo City Council.

Keywords: Circulation of ideas, Popular housing, Tenements, Buenos Aires, São Paulo.

Introdução

A circulação de ideias e práticas urbanas foi um fenômeno que acompanhou o desenvolvimento das técnicas de produção, transporte e comunicação nas cidades a partir da segunda metade do século XIX. O tráfego de pessoas que se deslocaram de seus lugares de nascimento para outras cidades, países e mesmo continentes se tornou um fenômeno global, sobretudo por conta do aumento das rotas ferroviárias e de navegação a vapor que exerceram um significativo papel no transporte de indivíduos, objetos, alimentos e outros itens. Não é de se desmerecer que as migrações internas e os grupos que se deslocavam entre países tenham atingido cifras como nunca antes observado na história da modernidade, com milhares de pessoas em busca de novos espaços para sobrevivência, turismo, trabalho, articulação política e econômica, dentre outros fatores que contribuíram para denominar o período como “Era dos Impérios” pelo célebre historiador Eric Hobsbawm (1988). Impérios que não se circunscreviam à simples demarcação territorial, mas de expansão e domínio de ideias e ações comerciais.

São Paulo, assim como outras cidades, experienciou uma notável transformação e aumento dos investimentos público e privado nesse contexto, pois já no final do Oitocentos contava com uma significativa rede ferroviária que a interligava ao interior e litoral paulista, tendo como foco a cidade de Santos. Da mesma forma, é quase unânime a tese de que a iniciativa privada foi a grande responsável pelo financiamento de São Paulo e de outras cidades paulistas nesse tempo (DEAN, 1971; OLIVEIRA, 2005; BUENO, 2018), o que parece concreto, mas não aprofunda as relações traçadas com as diferentes instâncias administrativas do Estado brasileiro e os diálogos com outras cidades, favorecendo lugares comuns como cópia, modelo e inspiração. Nesse caso, a Câmara Municipal de São Paulo, entidade legislativa da cidade representada por seus vereadores, possuiu um papel de destaque nas relações com empresários, entidades e grupos de filantropia locais, produzindo leis e códigos que versaram sobre a construção civil, sobretudo daquela voltada ao campo da habitação popular.

Uma das leis em questão foi a de número 1.098 editada em 08 de julho de 1908, de autoria do vereador Afonso Celso Garcia da Luz2. O vereador, que também era jornalista e advogado, desenvolveu um minucioso projeto de lei que concedia favores à iniciativa privada visando a construção em larga escala de casas e vilas operárias em São Paulo, como uma resposta ao aumento do número de cortiços e ao déficit de habitações salubres. Os artigos da referida lei permitem compreender os dispositivos legais que o poder público visava alcançar com um grupo específico da cidade, os pequenos e médios proprietários vinculados aos setores médios, grupos com distintas profissões e disponibilidade de capital, que exerceu um significativo papel na construção de moradias de aluguel entre diferentes bairros da cidade, como a Móoca (GENNARI, 2005), o Brás (REIS, 2017) e o Pari (BARBOUR, 2021) na região leste; o Bexiga (SCHNECK, 2016) e a Vila Mariana (CARVALHO, 2019) na porção sul; além de Santana (MARCONDES, 2021) na região norte. A análise do processo de urbanização dos bairros citados, permite uma minuciosa compreensão do processo de feitura e do papel que os setores médios e populares tiveram na edificação da cidade, questionando, por exemplo, o lugar comum de que São Paulo se desenvolveu unicamente pela economia cafeeira na passagem do século XIX para o XX. Mesmo para o caso de Buenos Aires, cidade que aqui também é enfocada, se percebe como a literatura tem ressaltado o papel da iniciativa privada na produção habitacional da cidade, seja em cortiços, vilas ou casas independentes (ABOY, 2005; FERRARI, 2018).

Antes da promulgação da “lei das casas operárias”, Celso Garcia enfrentou uma série de resistências entre seus pares da Câmara Municipal, o que exigiu do vereador intensas pesquisas sobre as ações implementadas em prol da habitação popular em diferentes cidades americanas e europeias. Os conflitos permitem inclusive entrever a não homogeneidade da classe política, ideia comumente difundida e propagada sobre a história da Primeira República brasileira, como se todos os agentes partilhassem da mesma esfera de pensamento e articulação.

De 1893, quando da promulgação da lei número 39³, até 1908, com a promulgação da lei número 1.098, as ações da Câmara Municipal de São Paulo em torno da habitação popular podem ser resumidas em três frentes: concessão de favores construtivos a determinados indivíduos; fiscalização de espaços considerados insalubres e a consequente multa ou notificação em prol do melhoramento; isenção de impostos municipais para as casas que fossem construídas fora do perímetro urbano, ação que foi regulamentada pela lei número 498 de 14 de dezembro de 1900, e considerada em 1908 como ineficiente. Desse processo de conhecimento burocrático sobre a habitação popular paulistana, Celso Garcia encarou o debate como uma ação política que devia ser partilhada entre as diferentes instâncias administrativas do poder municipal, estadual e federal, e para tanto, mobilizar as ações desenvolvidas em outras cidades servia não apenas como repertório, mas como base de diálogo por meio de livros médicos e do resultado de pesquisas de amostragem da população.

Ao tomarmos como base os discursos de Celso Garcia que antecederam a promulgação da lei número 1.098 de 1908, debateremos como o vereador mobilizou números e dados sobre os cortiços de Buenos Aires, o que serviu de base para se pensar a experiência urbana de cidades latino-americanas em contraponto à generalizante ideia de referência aos modelos europeus. Celso Garcia expressa assim, aquilo que Alicia Novick denominou como “redes de circulação de ideias” (2009, p. 5), um exemplo claro de como diferentes agentes lidavam com a causa urbana, como um jornalista e advogado ligado aos setores médios e operários da cidade.

Celso Garcia e as conexões de São Paulo e Buenos Aires

A manhã de 29 de julho de 1905 se iniciou como outras na Câmara Municipal de São Paulo, com seus vereadores tratando das ações de melhoramentos4 em algumas vias da cidade, como calçamento e a implantação de redes de energia, água e esgotos antes de encaminharem as solicitações para aprovação do prefeito Antônio Prado5. Após a aprovação das ações pontuais, Afonso Celso Garcia da Luz obteve a palavra e indicou que sua fala haveria de “causar surpresa” aos seus colegas. O vereador se referia à necessidade de a Câmara Municipal debater e encontrar soluções frente ao déficit de moradias salubres existentes em São Paulo, justificando assim que o tema não era exclusivo ao governo federal, mas de responsabilidade conjunta do governo Estadual e municipal. Para ele, São Paulo era “a segunda cidade do Brasil, sendo uma das primeiras da América do Sul, sendo uma das cidades em que a população mais cresce, é de admirar que ainda não houvéssemos tratado com todo o afinco de resolver entre nós o problema das habitações operárias” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1905, p. 113).

A provocação indicava não apenas a necessidade de criação de uma política voltada à habitação popular na cidade, mas de também permitir que sua base eleitoral percebesse sua atuação na Câmara Municipal. Eleito vereador independente em 1905, pois não era filiado ao Partido Republicano Paulista, Celso Garcia tinha como suas bases eleitorais representantes dos setores médios e operários da cidade, localizados sobretudo nos bairros do Brás, Santana, Santa Ifigênia e Barra Funda. Logo, sua atenção à questão habitacional não estava desassociada dos interesses de sua base eleitoral, que enxergava nele uma resposta aos problemas urbanos e sociais da cidade, como a questão habitacional6.

A frase introdutória do seu discurso se vale de um jogo de palavras que ora enaltece o crescimento material e demográfico da cidade, mas também apontava os problemas existentes naquela que já podia ser considerada um ícone sul-americano. São Paulo nesse caso, se igualava à Buenos Aires pela existência de “vastas habitações communs”, conclusão do jornalista portenho Volsak, que “deu à sua descripção um colorido tão carregado, que chegou a comover a grande cidade” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1905, p. 113). Uma ação não muito distinta do discurso adotado por Celso Garcia, no jornal O Commercio de São Paulo, onde era diretor-chefe. Nas páginas do periódico, o jornalista descreveu o interior de cortiços, o estado de ruas e avenidas, as condições de saúde da população mais pobre, além de outros temas que dialogavam com questões do seu público (e)leitor.

Para Celso Garcia, a descrição visual dos ambientes tidos como insalubres e que serviam de moradia para muitos dos pobres e classes operárias, servia como introdução à explanação do tema, baseado em estudos, dados e publicações contemporâneas. Assim, ao citar a comissão encarregada de analisar as causas de mortalidade infantil nomeada pela Intendência de Buenos Aires em 1890, o vereador destacava a necessidade de elaboração de pesquisas locais, à semelhança da ação efetuada em 1893 no bairro de Santa Ifigênia. Celso Garcia endossava que a ação efetuada na cidade portenha foi basilar para a questão da salubridade urbana, tendo em vista que aquela comissão visitou, observou e estudou o tema, chamando a atenção para que a Câmara Municipal de São Paulo adotasse sérias medidas em prol da população mais pobre.

A menção à pesquisa feita em Buenos Aires não é apresentada sozinha, pois Celso Garcia também enfatizou práticas efetuadas na Inglaterra, França, Bélgica, Holanda e Dinamarca. No entanto, o vereador chamou a atenção para o fato de que

no mundo civilizado [e] até na própria República Argentina há dados estatísticos sobre o numero de fabricas e de operários, sobre as suas habitações communs e em separado, sobre o pauperismo e sobre a assistência pública, e quanto a nós, no que diz respeito à nossa capital, não temos dados nenhuns a esse respeito (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1905, p. 114),

Argumento que se analisado com mais afinco, se percebe que a produção de dados sobre a cidade já estava sendo efetuada desde o final do século XIX, mas que careciam de aprofundamentos.

Ao chamar atenção sobre a falta de dados sólidos que respaldassem as ações do poder público, Celso Garcia entendia que isso gerava, inclusive, confusão no uso de terminologias e conceitos entre seus pares da Câmara Municipal, como exemplo a palavra “operários; do mesmo modo que a palavra - pobres. Uns querem que operário seja aquelle que se entrega aos trabalhos physicos, aos trabalhos manuais; outros querem que seja tambem aquelle que se entrega a qualquer trabalho, embora intelectual” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1905, p. 115).

Até fevereiro de 1906, quando volta a discursar em defesa de uma legislação que incidisse sobre a habitação privada em São Paulo, Celso Garcia aprofunda seu discurso, compilando uma série de números, ações e políticas efetuadas em Buenos Aires. Dessa vez, o vereador justifica os motivos que o levaram a se utilizar dos feitos portenhos, visto que seu conhecimento ia além “da leitura de livros acerca da grande miséria que há nos centros populosos da Europa”. Como resposta à aproximação comparativa de São Paulo, deixaria

de citar as grandes cidades, como Londres, Paris, Vienna, Budapeste, todas as cidades, em summa da Europa (...) [por] uma cidade da América do Sul, [que] como a nossa, Buenos Aires é uma cidade nova. Rapido, como o da nossa tem sido o crescimento da sua população. (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22).

Para o vereador paulistano, mobilizar os dados numéricos de Buenos Aires era também uma oportunidade para rebater o lugar comum de sempre referenciar os feitos de cidades europeias, de modo a contribuir em um debate que pensasse questões do desenvolvimento capitalista local, já que tanto São Paulo como a capital argentina eram vistas como centros econômicos em ascensão e evidente o crescimento demográfico de ambas. Logo, o crescimento da população de Buenos Aires que saltou de 177 mil habitantes para 433 mil entre os anos de 1871 e 1877, e atingiu, respectivamente 663 mil e 800 mil pessoas nos anos de 1895 e 1900, são dados que embasam a aproximação com o movimento populacional paulistano7. Como uma noção de causa e efeito, o crescimento demográfico de Buenos Aires foi considerado por Celso Garcia como um dos motivos para o aumento dos chamados conventillos, “habitações da classe pobre na capital argentina” que correspondiam aos cortiços paulistanos. Na cidade argentina o número dessas habitações era de 1.770, abrigando 51.915 pessoas em 1880, número que pula para 1.868 conjuntos e onde passam a residir 64.156 indivíduos no ano de 1883. Quatro anos depois o número de conventillos pulou para 2.835, abrigando pelo menos 116.167 habitantes em Buenos Aires (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22).

Tabela I – A questão demográfica e habitacional em Buenos Aires entre 1869 e 1914

ANOPOPULAÇÃO DA CIDADENÚMERO DE CONVENTILLOSNÚMERO DE HABITAÇÕESPOPULAÇÃO ABRIGADAMENORES DE 12 ANOS
1869177.78720.858
1875230.000*
18801.77024.02351.91517.535
18831.86825.46564.156
1887433.3752.83533.80411.167
1895663.854
1900800.000*
1904950.8912.46282.540138.188
19072.500150.000
19091.231.698
19141.575.814131.742

Perfil do crescimento demográfico de Buenos Aires elaborado com base nas pesquisas de Celso Garcia, acrescido dos dados compilados por Gay Bourdé (traçados) e Henrique Silva (sublinhados). *Números aproximados.

A situação crítica de Buenos Aires, na qual boa parte de suas moradoras e moradores habitavam espaços insalubres, pode ter sido pior do que aquela apontada pelos números aproximados de Celso Garcia. Em sua dissertação de mestrado, Henrique Silva aponta que no ano de 1887, 117.011 pessoas moravam em cortiços, número que aumentou para 120.847 em 1895, e alcançou a cifra de 138.188 no ano de 1904 (SILVA, 2017, p. 61). Ainda assim, os dados levantados pelo vereador paulistano evidenciam como a problemática habitacional de Buenos Aires era exemplar para se pensar as conexões com a cidade de São Paulo, o que servia de base retórica e ilustrativa das dinâmicas de crescimento de ambas as cidades no começo do século XX. Celso Garcia foi o único vereador paulistano entre os anos de 1893 a 1915, a debater o tema da habitação popular por meio de pesquisas que fundamentavam suas falas, além de ensejar um debate público sobre as condições de vida da população pobre e operária da cidade. Como dito anteriormente, seus artigos no jornal O Commercio de S. Paulo evidenciam um autor que articulava sua experiência política junto aos setores médios e populares da cidade, sensibilizando assim a sociedade diante do tema da habitação popular.

Celso Garcia percebia que os dados de Buenos Aires possuíam correspondência com “o mesmo fenômeno que já se tem observado em toda a parte, quer na Europa quer na América”, e o “fenômeno das habitações salubres e baratas aparece em todas as grandes aglomerações humanas, qualquer que seja a parte do mundo civilizado” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22). Logo, ainda que para muitos fosse observado o evidente crescimento populacional de São Paulo, a análise comparativa com Buenos Aires auxiliava a compreender localmente os problemas de cidades que passavam por um rápido processo de urbanização e demanda por espaços de morada.

A mobilização da literatura sanitária não era uma exclusividade de engenheiros e médicos, profissionais que comumente são tidos como legítimos expoentes dos processos de intervenção urbana a partir da segunda metade do século XIX. No caso de Celso Garcia, um advogado de formação, mas que atuou fundamentalmente na área jornalística, o uso da literatura que tratava de análises sobre o urbano não apenas o inteirava das discussões, mas permitia que seu repertório de conhecimentos técnicos sobre a cidade se aprimorasse. Não à toa, quando cita as pesquisas realizadas em Buenos Aires, reconhece a importância das mesmas para minimamente se construir um panorama da condição habitacional nas cidades modernas.

Uma das bases para a construção do repertório discursivo de Celso Garcia foram as pesquisas realizadas pelo médico Samuel Gache, sistematizadas em seu livro Les logements ouvries à Buenos Aires, publicado em 1900. O livro, produzido a partir das observações do profissional que atuou no Hospital Rawson e que foi membro de muitas sociedades médicas e filantrópicas, vai ao encontro de uma conjuntura socioprofissional partilhada por outros médicos, visto que esses são tidos como os primeiros a denunciar a miséria dos alojamentos populares (BOURDÉ, 1973, p. 28).

É com base na leitura do livro de Samuel Gache que Celso Garcia colocou em pauta que o problema da habitação popular não era um problema exclusivo de cidades europeias, e que em São Paulo esse não seria apenas um dado natural do crescimento econômico, mas uma problemática partilhada por espaços que apresentavam também um aumento demográfico massivo. Logo, vincular as pesquisas observadas in loco pelo médico francês no debate público, auxiliava a embasar muito daquilo que havia escrito nas páginas do jornal O Commercio de S. Paulo, e que possuía uma significativa circulação na cidade do começo do século XX. Garcia evocou o escrito de Samuel Agache para ambientar a condição dos conventillos de Buenos Aires, que muito se aproximavam dos cortiços paulistanos, “uma impressão que jamais se apaga, tal é o espetáculo de imundície, de miséria. São quartos sem ar, sem luz, fétidos, cheios de objectos, pratos com restos de comida, panellas, roupa suja, ás vezes, têm gallinhas, papagaios” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22).

A apresentação da problemática dos conventillos portenhos não se reduzia à uma compreensão de serem espaços insalubres, mas para Celso Garcia eram vistos como espaços perigosos “também para a moral, porque há ahi, ás vezes, scenas vergonhosas de libidinagem e lupanar” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22), em uma clara tentativa de estigmatização de alguns dos espaços de prostituição da cidade. Tal compreensão, também atestada na obra de Samuel Gache, e antecipada na obra de outro médico, Guillermo Rawson, em seu Estudio sobre las casas de inquilinato de Buenos Aires, de 1884, serviu de base para que se firmasse uma compreensão generalizante acerca dos espaços de habitação da população pobre, no qual a iniciativa privada seria a investidora central das transformações desses espaços.

E se por um lado há uma evidente ligação entre pobreza e prostituição, o argumento de estigmatização é acrescido pelo surgimento de doenças. Isso se espelha quando o vereador paulistano procurou associar os casos de epidemia de febre amarela que apareceram em Buenos Aires em 1871, e os primeiros casos serem registrados nos bairros ao sul da cidade, terrenos que outrora eram mais baratos e onde a população pobre aos poucos passou a se instalar. Segundo Garcia, “a devastação dessa epidemia, nas classes pobres e mesmo nas classes ricas”, acometeram cerca de 13.000 pessoas naquela cidade (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22).

Ao retomar o Relatorio da Commissão de exame e inspecção das habitações operarias e cortiços no districto de Sta. Ephigenia de 1893, Celso Garcia estabeleceu um paralelo das relações de saúde e pobreza presentes como denominadores dos habitantes dos cortiços e conventillos, mas ressaltou um claro problema do estudo paulistano: o fato da comissão não ter investigado toda a cidade de São Paulo, mas “apenas uma parte insignificante, apenas um recanto em Santa Iphigenia” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1905, p. 23). Sua crítica se estendia ao fato de que o relatório indicava a necessidade de realizar uma ampla intervenção naquele e mesmo em outros bairros paulistanos, visando “melhorar as condiçoes de abastecimento de agua e de exgottos, encetar a drenagem profunda e superficial do sólo, proceder á regularização e limpeza dos terrenos baldios, effetuar o asseio e limpeza das ruas e quintais” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 24). Contudo, acrescia que estas

e outras providencias são por certo necessárias, mas é indispensável, sobretudo, cuidar da unidade urbana, a habitação, não já da habitação privada, mas daquella onde se accumula a classe pobre, a estallagem onde pullula a população operaria, os cortiços, como geralmente se chamam essas construcções acanhadas, insalubres, repulsivas algumas, onde as forças vivas do trabalho se ajuntam em desmedida, instigadas pela necessidade de viver numa quasi promiscuidade que a economia lhes impõe, mas a hygiene repelle (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 23).

No caso acima, a chamada “unidade urbana” seria resolvida pela ação conjunta do poder público e iniciativa privada, combatendo assim os cortiços da cidade. Treze anos separam a pesquisa sistematizada pelo engenheiro negro Theodoro Sampaio no bairro de Santa Ifigênia e a fala de Celso Garcia no plenário da Câmara Municipal de São Paulo. Nesse meio tempo, a idealização da capital paulista pela classe política paulistana permaneceu idílica, sem grandes problemas, o que serviu de motivo de crítica para o vereador apontar tal problemática aos seus pares. Para o vereador, a “chaga oculta” da cidade ainda era existente, e se fazia necessário que os demais edis conhecessem os diferentes programas habitacionais em que a população pobre residia, como o hotel-cortiço, as pequenas casas e sobrados convertidos em quartos de dormir. Garcia resgatou a conclusão efetuada pela comissão de 1893 para estabelecer as conexões de responsabilidade social e de aplicação de capital na construção de moradias salubres, visando

estimular ou criar emprezas que se proponham construir villas operarias nos tempos actuaes, quando a crise financeira está em período agudo, e quando, por outro lado, as epidemias nos ameaçam todos os annos, dizimando a classe operaria, e roubando-nos braços uteis que importamos com sacrifícios (...) (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 24).

Se por um lado o vereador apontou as ambivalências da cidade, em outro se colocou como um defensor da imigração, que corria sérios riscos, tendo em vista que muitos dos novos habitantes da cidade passavam a habitar os cortiços e outros espaços insalubres. Logo, para Celso Garcia havia uma incoerência entre a defesa da imigração, importada “com sacrifícios”, e a não manutenção da mesma na cidade, já que muitos dos que chegavam passavam a morar nos cortiços e em outros espaços insalubres, outro fato também debatido e visto como uma problemática para a cidade argentina.

Celso Garcia esperava que a exemplo do que ocorrera na cidade do país vizinho, de que “depois que espíritos eminentes commoveram a população de Buenos Aires com a descripção das casas populares, logo se providenciou a respeito”, que em São Paulo também se articulasse um movimento, já que havia material (ainda que diminuto) para embasar a crítica à situação habitacional paulistana, como o Relatório de Santa Ifigênia e suas reportagens nas páginas do Commercio de S. Paulo. Para o vereador, “a Camara de S. Paulo, segunda cidade da Republica e uma das primeiras da America do Sul, nada tem feito, apezar de saber, por diligencia que ella própria ordenou, como augmentaram as insalubres habitações collectivas.” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, pp. 24-25).

Ao esboçar um plano ilustrativo e quantitativo da questão habitacional de pobres e operários em Buenos Aires, Celso Garcia também rompia com a frequente associação efetuada por outros vereadores desde pelo menos o ano de 1893. De todas as falas que tratavam diretamente da questão habitacional na cidade de São Paulo, nenhum vereador até então havia encarado o debate como uma questão própria de cidades que cresciam em número de habitantes. Isso se deu com uma provocação que fez aos seus companheiros edis, quando questionou se iam lhe “perguntar: o que temos nós com o que se passa em Buenos Aires?”, o que é acrescido da resposta de que “S. Paulo é [também] uma cidade demasiada prospera, é uma cidade onde os operários têm apparencias de bem estar” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 22). Aparências que se contrapunham à generalizante ideia de cidade europeia, comumente presente no discurso de outros vereadores como medida retórica para minimizar os problemas sociais paulistanos, e que era perceptível já no relatório de Santa Ifigênia, em 1893, quando se evidenciou que essa “face da cidade só foi conhecida [pelo poder público] depois das visitas domiciliarias. Naturalmente, queria dizer que a apparencia de S. Paulo era de cidade salubre, de cidade onde havia um certo bem estar, de cidade onde se desconhecia a miséria” (ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 1906, p. 23). Sendo assim, se contrapor às aparências cristalizadas por um determinado grupo político, e ao mesmo tempo mobilizar um tema de ampla correspondência popular, permitia que a apresentação de evidências numéricas e de pesquisas ganhassem relevo naquela ocasião.

Considerações finais

Os discursos do vereador Afonso Celso Garcia da Luz que antecederam a promulgação da lei número 1.098 em 08 de julho de 1908, permitem enriquecer o debate acerca das ações e paralelos do campo da habitação que o poder público trilhou ao longo do século XX. Enquanto jornalista e advogado ligado aos setores médios e operários de São Paulo, Celso Garcia estabeleceu uma ação conjunta com sua base eleitoral, de modo que com a lei número 1.098 também atendesse à demanda de investimento de pequenos e médios capitais na construção da cidade, atrelado ao problema habitacional ali existente.

Suas falas apontam que a referência à outras cidades, como no caso de Buenos Aires, permitiriam não apenas a mera comparação, mas a base para se pensar alternativas que visassem atender problemas conjuntos, como o aumento de conventillos e cortiços. O exemplo das investigações e publicações sobre a cidade argentina serviram principalmente como elemento retórico ao vereador, para então pensar problemas partilhados em cidades com um evidente crescimento demográfico por conta das imigrações. O uso de dados, números, pesquisas e publicações feitas na capital argentina sobre sua população, os locais de habitação e condição de saúde, serviram ao vereador como elementos de comparação, tendo em vista a ausência dos mesmos dados sobre a capital paulista. Ao mesmo tempo, a mobilização de um tema como o da habitação, e a tentativa de se colocar como o legítimo representante desse tema, estabelece conexão política com seus grupos eleitorais, pequenos e médios proprietários situados em diversos bairros da capital paulista.

Buenos Aires assim como São Paulo, teve na passagem do século XIX para o XX um aumento exponencial de sua população, o que podia ser observado nas demandas por habitação de ambas as cidades. Assim, pensar em alternativas que visassem atrelar o capital de tais pessoas no processo de construção de suas próprias casas foi um dos caminhos encontrados por Celso Garcia para a questão habitacional. Para o vereador, não bastava a referência de ações implementadas em Paris, Berlim ou Chicago, mas se fazia necessário perceber o desenvolvimento de práticas adotadas ao nível local, como em Buenos Aires e a atenção aos que o cortiço podia representar para a salubridade urbana.

Por mais que não apresentasse como a capital argentina resolveu o déficit de habitações salubres, problema também presente em São Paulo, Celso Garcia via que em ambas as cidades não se fazia sentido a simples referência às cidades europeias. Sua crítica, pautada em publicações do campo da saúde e economia, endossava a ideia de criação de uma legislação que permitisse não apenas resolver os problemas urbanos, mas o investimento do capital de pequenos e médios proprietários da cidade. Se para muitos vereadores São Paulo possuía “aparências de uma cidade europeia”, Celso Garcia enxergava que tal discurso não auxiliava o debate acerca da resolução de problemas locais. Seu uso das evidências em contraponto às aparências enriquece o debate da história urbana latino-americana.

Referências

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Notas

1 outorando em História pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), atualmente vinculado à Université de Strasbourg (França), nº ORCID: 0000-0003-0645-1091, e-mail: philippearthur@hotmail.com.
2 Afonso Celso Garcia da Luz nasceu em Batatais, interior do Estado de São Paulo, em 15 de outubro de 1869. Formado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco em 1895, atuou como advogado criminalista e jornalista em diversos periódicos, como O Estado de S. Paulo, O Commercio de S. Paulo e A Platéa. Muitos dos seus artigos tratavam do cotidiano da cidade, como habitação e transporte, quase sempre acompanhados de fotografias dos mais diferentes bairros paulistanos. Sua mobilização independente garantiu uma cadeira na Câmara de Vereadores de São Paulo em 1904, contudo parte da Comissão Eleitoral alegou fraude nas eleições, o que retardou sua posse até o ano seguinte. Como vereador, Celso Garcia tratou dos mesmos temas que geralmente escrevia nas páginas daqueles jornais. Faleceu prematuramente aos 38 anos de idade em São João da Boa Vista, como vítima de pneumonia, no dia 30 de maio de 1908. Sua aderência política naquele tempo da cidade de São Paulo pode ser percebida logo após sua morte, quando diferentes associações operárias manifestaram interesse em rebatizar diferentes logradouros públicos com seu nome, como a então rua dos Imigrantes (atual José Paulino) no bairro do Bom Retiro e a Avenida da Intendência, no bairro do Brás, que saiu vitoriosa na disputa memorial, e mantém até os dias de hoje o nome de Avenida Celso Garcia.
3 A lei número 39 de 24 de maio de 1893 obrigava, a todo interessado que desejasse construir na cidade, a apresentação de memorial descritivo acompanhado de um desenho arquitetônico. A lei visava a fiscalização do que era edificado por meio de uma análise prévia dos técnicos ligados à então Intendência de Polícia e Higiene, que a partir de 1899, seria reorganizada como Diretoria de Obras e Viação, tendo à frente o engenheiro Victor da Silva Freire até o ano de 1929.
4 E aqui tomo como base os múltiplos significados do conceito de melhoramentos pontuado por Stella Bresciani, o qual, para além de ser um lugar comum, serviu “como metáfora aplicada a múltiplas situações portadoras de benefícios à idade e a sua população” (BRESCIANI, 2018, p. 350-351).
5 Até o final do século XIX cabiam às Câmaras Municipais a administração plena das cidades, de modo que a realização de serviços de infraestrutura quase sempre era gerida por funcionários ligados ou contratados por esse poder. Com a Proclamação da República, em 1889, há uma reorganização dos poderes e a autonomia municipal, que culmina em 1898 com a criação do cargo de prefeito. A Câmara de vereadores passa então a exercer unicamente a função legislativa, perdendo assim, o exercício direto da função executiva. Disponível em: https://www.saopaulo.sp.leg.br/institucional/publicacoes/historico-da-camara/ acesso em 10.11.2021.
6 E a partir dessa lógica, vale destacarmos que além de exclusivas a determinados grupos, as eleições da Primeira República também tinham a característica de não serem obrigatórias, fato que colocava à classe política um aprimoramento de suas campanhas e assim mobilizar suas respectivas bases eleitorais, ao contrário da generalizada ideia de manipulação eleitoral daquele período. Tal compreensão, pautada por Cláudia Viscardi e Vitor Figueiredo (2019), nos auxilia a pensar como a questão da habitação foi tratada por diferentes agentes da sociedade civil nas primeiras décadas do século XX, bem como suas efetivas relações com o poder público.
7 De acordo com a Planta Cadastral da Cidade de São Paulo, de 1914, a capital paulista apresentava em 1890, 64.934 habitantes, aumentando três vezes mais na virada do século, em 1900, com um total de 239.890. Quando do ano do debate de Celso Garcia sobre as habitações populares, em 1905, a cidade de São Paulo apresentava 300.569 habitantes, número que alcançou a cifra de 375.324 em 1910, 410.702 em 1912, e 460.261 em 1913.

Notas de autor

1 Doutorando em História pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), atualmente vinculado à Université de Strasbourg (França), nº ORCID: 0000-0003-0645-1091, e-mail: philippearthur@hotmail.com.
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