Complexo Habitacional Cajazeiras: discursos, conflitos e resistências no contexto urbano de Salvador-BA
Cajazeiras Housing Complex: speeches, conflicts and resistance in the urban context of Salvador-BA
Complexo Habitacional Cajazeiras: discursos, conflitos e resistências no contexto urbano de Salvador-BA
O Social em Questão, vol. 1, núm. 53, pp. 179-200, 2022
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Recepción: 01 Noviembre 2021
Aprobación: 01 Enero 2022
Resumo: Nesse texto abordamos a conjuntura de contradição, em que o Projeto Urbanístico Integrado Cajazeira foi pensado durante o final da década de 1970. Analisaremos os discursos presentes no livro Grande Salvador: posse e uso da terra apresentado pelo BNH por meio da CEDURB e como a obra justificava a necessidade de intervenção estatal no contexto urbano da capital baiana. Além disso, observaremos como os textos publicados no Jornal A Tarde construíam narrativas sobre a cidade e as populações pobres que sustentavam a necessidade de medidas de disciplina e ordenamento comparando-as com trechos de narrativas de pessoas que participaram do processo de ocupação espontânea no bairro de Cajazeiras. Por meio desses fragmentos sobre o passado, vamos analisar o contexto de disputas de memórias que possibilitou a reapropriação desse espaço pelos seus moradores.
Palavras-chave: Cajazeiras, Memória, História das cidades.
Abstract: This work aims to approach the contradictory scenario in which Cajazeira Integrated Urban Project was conceived during the late 1970s. Thus, narratives from the book Grande Salvador: posse e uso da terra, presented by the National Habitation Bank (BNH) through the Urban Development Company of the State of Bahia (CEDURB), will be analyzed. The purpose is to identify how the work justified the need for state intervention in the urban context of the capital of Bahia. In addition, texts published in A Tarde newspaper will be observed to identify how narratives about the city and the low-income population were created to sustain the need for discipline and order measures. They will be compared with excerpts from narratives of people who participated in the process of spontaneous occupation in the neighborhood of Cajazeiras. Therefore, through these past fragments, the context of memory disputes that enabled the reappropriation of that territory by its residents will be analyzed.
Keywords: Cajazeiras, Memory, History of cities.
Introdução
Situado na região do Miolo da cidade de Salvador-BA, “o complexo Habitacional Cajazeiras é constituído dos bairros Cajazeiras II, III, IV, V, VI, VII, VIII, X e XI, as Fazendas Grande I, II, III e IV, Águas Claras e Boca da Mata”. Sua criação data de 20 de outubro de 1975, quando através do decreto 24.922, o Governo do Estado da Bahia desapropriou as fazendas União, Cajazeiras, Jaguaripe de Cima ou Fazenda Grande e Chácara Nogueira (SILVA, 2019, p. 55, 61). Entretanto, somente em 1978 o Plano Urbanístico Integrado Cajazeira foi oficializado, quando foram apresentados pela Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia – CEDURB planos de sistemas habitacionais considerados integrados ao desenvolvimento urbano (ALMEIDA, 2005, p. 15).
O projeto apresentava a construção de um complexo de sete bairros em uma área de 16 milhões de metros quadrados, pensada para contribuir com a consolidação dos bairros adjacentes, dos recém implantados Centro Industrial de Aratu (CIA) e Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC) e atrair a população urbana, a partir do estabelecimento de centros habitacionais dotados de infraestrutura e serviços públicos, que seriam capazes de organizar e ordenar o crescimento da cidade do Salvador, inibindo as ocupações espontâneas (ALMEIDA, 2005, p. 69, 101). Afirmava-se que a infraestrutura do complexo iria extrapolar “a sua própria área de influência”2.
Antes da inauguração dos seus primeiros conjuntos em 1982, Cajazeiras já era reconhecida como exemplo de bairro formal, mas sua ocupação veio junto com o processo de reapropriação e logo os moradores começaram a modificar o modelo estatal. Nesse contexto, as ocupações espontâneas se expandiram no bairro, desafiando os discursos oficiais, visto que o seu período de implantação coincide com o crescimento do número de “invasões”, refutando o seu objetivo principal e configurando um conflito entre a cidade legalmente projetada e a cidade apropriada, a propriedade privada e a habitação como direito social (ALMEIDA, 2005, p. 78, 83, 89).
O desenvolvimento do bairro reflete as contradições das políticas públicas brasileiras, demonstrando a incapacidade do Estado em suprir as demandas urbanas (ALMEIDA, 2005, p. 48). Todo o processo de constituição de Cajazeiras foi marcado por conflitos e resistências. Consequentemente, uma das principais características dos habitantes do bairro é a sua “intensa mobilização política a favor de políticas públicas que assegurem a seus moradores qualidade de vida e inclusão na cidade”3. Por esse motivo, apesar da precariedade nas condições de habitação e serviços, sua estrutura física atual é resultado das lutas promovidas pelas organizações sociais do bairro.
Para tanto, compreendemos que estudar as urbes sem levar em consideração um enfoque nas políticas que submetem as pessoas a projetos que apoiam determinadas representações estéticas sobre a experiência urbana, coloca em risco a compreensão da complexidade que formam esses espaços. Preservando a visão de modernização como algo sempre positivo e atrelado aos valores de progresso, privando o lugar da reflexão histórica na análise desses processos (CARPINTERÓ; CERASOLI, 2009, p. 92). Logo, torna-se necessário apreender os significados que um determinado tempo tem na memória e na História, e isso demanda o reconhecimento dos valores, hábitos, modos de vida, culturas, representações, que compõe a vida das comunidade humanas.
Diante disso, partiremos de uma visão que percebe a cidade como território, espaço apropriado por pessoas e, portanto, como um lugar de memória. Afinal, “os lugares de memória de uma cidade são também lugares de história. História e memória são, ambas, narrativas do passado que presentificam uma ausência, reconfigurando uma temporalidade escoada” (PESAVENTO, 2007, p. 2). Logo, a partir da visão que pensa a cidade como um texto, iremos analisar algumas memórias referentes ao processo de constituição deste Complexo Habitacional, por meio das narrativas presentes nos documentos oficiais, recortes de jornais e entrevistas. Através destes pequenos fragmentos sobre o passado, vamos explorar alguns dos discursos que inventaram esta localidade como espaço e aqueles que o transformaram em um território.
Analisaremos como as disputas em torno do campo da memória foram tecidas, enfatizando o caráter legitimador do Estado e seus apoiadores que se movimentavam no sentido de promover a institucionalização de uma cidade conectada aos ideais de ordem e progresso. Por consequência disto, as práticas que não concordavam com tal ponto de vista eram consideradas subversivas e degradantes ao ambiente urbano, sendo colocadas nas margens do silenciamento. Entretanto, apesar de todos os movimentos feitos neste sentido, algumas destas reminiscências periféricas emergem e saem do esquecimento, com isso reivindicações em torno da memória oficial vem à tona, colocando sua aceitação e credibilidade em risco (POLLAK, 1989, p. 9).
“Disciplinar” a cidade para evitar “que ela se desumanize”4
Um dia após a cidade de Salvador completar 429 anos de fundação, o Jornal A Tarde noticiava “grandes núcleos: a solução viável para áreas superpopulosas” em que informava sobre a apresentação de Herbert Drummond Frank, então diretor-presidente da Companhia Estadual de Desenvolvimento Urbano – CEDURB, no Simpósio sobre Barateamento da Construção Habitacional que ocorrera desde o dia 26 daquele ano na capital baiana. Foi justamente nesse evento de relevância nacional, atraindo especialistas de outros Estados e sendo noticiado em alguns periódicos de outras regiões do país5, que a CEDURB por meio do financiamento do Banco Nacional da Habitação – BNH, lançou o livro A grande Salvador: posse e uso da terra, uma das fontes utilizadas na nossa análise.
Coordenado por Cydelmo Teixeira, o livro começa chamando atenção já pela capa com uma foto imponente de Tomé de Souza. Já no prefácio escrito pelo supracitado diretor-presidente da CEDURB podemos perceber a intencionalidade da obra que visava problematizar as questões inerentes à “implementação dos programas governamentais” voltados à questão urbanística, por meio de uma análise histórica que justificasse a configuração da Região Metropolitana de Salvador (RMS) naquele momento, partindo da “experiência atípica e singular do sistema de capitanias” até a “‘explosão’ urbano-industrial de tempos mais recentes”. Logo, toda essa análise era considerada essencial, visto que menosprezar esse percurso vinha conduzindo “alguns planos a resultados desastrosos” até então (BAHIA, 1978).
É importante ressaltarmos que a atuação do BNH não foi voltada somente para o financiamento de obras ligadas à habitação e infraestrutura urbana, privilegiando também a elaboração de projetos, planos e estudos que ofereciam base a legislações (MARICATO, 1987, p. 33). Diante disso, toda historicidade construída durante a obra culmina justamente naquilo que seria a solução para os problemas que iniciaram em 29 de março de 1549 – data em que a cidade fora fundada pelo personagem que aparece na capa do livro –, os denominados Projetos Urbanísticos Integrados, entre eles o Cajazeira. Podemos afirmar que foram estabelecidos quatro pilares para a construção desse projeto: ocupação, habitação, integração e urbanização6.
Naquele momento, dos 343 km² que compunha o município de Salvador, apenas 30% estavam efetivamente ocupados. Diante disso, verificava-se que “os restantes 70% de seu território constituíam um vazio demográfico, em que se [registravam] esporádicas manifestações do processo de ocupação espontânea”, também intituladas “invasões”7. Além disso, outros obstáculos para a “ocupação ordenada” dessa área, seriam a “desenfreada especulação imobiliária” e a prática da “terra de engorda”, fatores que tornavam a construção de programas habitacionais dedicados às camadas mais pobres da população “absurdamente” caras em seu custo final (BAHIA, 1978). O texto construído voltava-se para a constituição daquilo que seria a maneira ideal de ocupação da cidade, salientando a necessidade de imposição da ordem durante esse processo8.
A partir dessa lógica ordenadora do espaço, Cajazeira seria dedicada principalmente às “habitações populares”, ou seja, às populações com renda entre 1 e 5 salários mínimos. Logo, a partir da construção desse projeto seriam estabelecidas “naturalmente as necessidades de infraestrutura e equipamentos urbanos, como suporte e condição imediata de viabilização para a moradia”. Além disso, esse seria o método com maior custo-benefício, já que possibilitaria a implantação de serviços básicos em áreas mais extensas, tornando o seu custo mais barato (BAHIA, 1978). Percebemos aqui o modo de fazer “paternalista e pontual” adotado pelo poder público (MARICATO, 1987, p. 55), já que nos meios de difusão da informação, veiculava-se um discurso de “trabalho no presente com a visão no futuro”, destacando a necessidade de evitar problemas para a cidade dali a 20 anos9.
Esse bairro seria uma das regiões com “características naturais” das cidades de porte médio, atraindo novos moradores e a oferta de serviços. Enfatizava-se a ideia de que era necessário o desenvolvimento de uma infraestrutura urbana que iria integrar essa região a outras da cidade. Por se tratar de uma área em que já existiam alguns bairros como Águas Claras, Valéria, Palestina, Sete de Abril, Castelo Branco e Pau da Lima, foi considerada uma das condições “rigorosamente obedecida” a “manutenção das populações já existentes, resultantes de ocupação espontânea” que seriam “beneficiadas com os melhoramentos introduzidos” pela “intervenção governamental” (BAHIA, 1978). Portanto, afirmava-se o objetivo de combater o déficit habitacional por meio da integração dessas populações, sem expulsá-las das terras ocupadas10.
Percebemos a mudança de posicionamento do Estado em relação às ocupações espontâneas, visto que a política de remoção11 desses assentamentos no início da década de 70 ampliaram os conflitos pela posse da terra (MARICATO, 1987, p. 57). Logo, a habitação deixou de ser o eixo central da problemática urbana e passou a ser encarada “como uma consequência lógica e natural do desenvolvimento urbano”, por isso adotou-se uma postura voltada para a ordenação do uso do solo. Toda essa estrutura visava a organização da cidade a partir de um viés modernizador, em que as projeções feitas pelo Estado atenderiam às demandas de todos os setores da urbe, valorizando as qualidades turísticas, impulsionando a recente industrialização e civilizando os citadinos12.
Conforme Milton Santos (2004, p. 227), quando o papel de satisfazer as necessidades coletivas é institucionalizado por meio da organização ou reorganização espacial urbana, ao mesmo tempo em que são definidas pelo Estado onde devem ser feitos os investimentos, são constituídas vantagens e desvantagens a determinadas regiões e às pessoas que ali habitam. Diante disso, torna-se imprescindível pensarmos sobre os discursos que estavam presentes nos projetos e como esses eram ratificados pelos textos jornalísticos13. Neles, evidenciava-se a necessidade de se traçar um “caminho certo” que deveria ser trilhado “para que a cidade [pudesse] respirar”, no qual seria necessária “disciplinar” o crescimento da cidade e os corpos que circulavam nesse ambiente.
“O jeito é enfrentá-la, com decisão e coragem, antes que seja tarde!”15
É importante observarmos nos textos publicados no periódico baiano a constituição de um discurso vinculado ao momento político da época, o Regime Civil-Militar instituído por um Golpe de Estado em 1964. Logo, percebemos que tais narrativas são selecionadas, organizadas e distribuídas com o intuito de conferir quem são os perigosos e, ao mesmo tempo, aqueles que detém o poder – e o dever – de dominar essas pessoas, que no cotidiano desvirtuavam os princípios daqueles que comandavam a nação naquele momento (FOUCAULT, 2012, p. 8, 9).
Afirmava-se que os chamados Projetos Urbanísticos Integrados revelavam “a sensibilidade do Governo Roberto Santos, no trato do problema habitacional das populações de baixa renda”, o governador ressaltava a necessidade de criar “verdadeiras cidades” para suprimir “as condições subumanas de habitação”16. Percebe-se um esforço no sentido de comprovar “que o Estado ainda [dispunha] de forças para intervir no processo de urbanização, orientando-o e disciplinando-o”17, culminando no “alívio das pressões sobre os serviços públicos da Cidade propriamente dita” que deveria ser zelada, aformoseada, protegida em sua riqueza material e patrimônio cultural18.
Os debates giravam em torno da inquisição de como as pessoas faveladas deveriam ser vistas: como prestadoras de serviço “às populações de maior renda”. Além disso, debatia-se também sobre de que modo as ocupações informais poderiam impactar nas questões estéticas da cidade, evidenciando, inclusive, a perda da memória e patrimônio cultural, visto que Salvador já era um dos principais polos turísticos do país naquele momento. Observamos aqui a necessidade dos setores letrados da sociedade soteropolitana em determinar aquilo que os subalternizados faziam para além das atividades laborais, traduzindo, portanto, um projeto político de determinação daquilo que o ambiente urbano deveria pronunciar em sua dinâmica (MARICATO, 1987, p. 19)19.
As políticas públicas instituídas pelo Governo Militar eram colocadas em dúvida, por conta da ocorrência de um suposto “desvirtuamento da política habitacional”20 que apesar de ter “possibilitado a construção de milhares de habitações em todo o País”21, fez desses “conjuntos residenciais com unidades comercializadas a preços bastante elevados inacessíveis mesmo à classe média”22. As narrativas veiculadas pela imprensa demonstram que “apesar do esforço de chegar às camadas mais pobres da população, bastante propagandeado pelo BNH, ele não logrou sequer atenuar o intenso processo de favelização e de queda na qualidade habitacional que foi flagrante nas grandes cidades brasileiras” (MARICATO, 1987, p. 55).
No entanto, percebe-se certa passividade na contestação dessas políticas pelos meios letrados, que atestavam a incapacidade do regime vigente na gestão do dinheiro público, uma vez que os recursos utilizados tinham sua origem no bolso das populações mais pobres por meio do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e da poupança popular23. Isso posto, verificamos que “os números e empreendimentos apresentados podem ser considerados positivos em si mesmos, mas nunca se relacionados ao oceano da demanda habitacional popular no Brasil” (MARICATO, 1987, p. 55-56).
Partimos da compreensão de que o nosso cotidiano é inventado por meio da relação entre produtores e consumidores, em que ficam observadas às camadas sociais dominadas apenas o papel de consumir, sem deixarem suas marcas ou modificações àquilo que é imposto pelos estratos sociais dominantes (CERTEAU, 1998). Portanto, “conceitos de cidade, de sua estrutura e de suas funções, de problemas urbanos, de eficácia, de desenvolvimento, de qualidade de vida e, principalmente, do que seja felicidade para os cidadãos” são criados pelos tecnocratas, que se utilizam dessas estratégias, com o objetivo de manipular, produzir e impor suas vontades, para controlar os que lhe aparentam ameaçadores (KOHLSDORF, 1996, p. 1).
São raras as vezes em que as ideias dos executores e criadores dos planejamentos urbanos são explícitas para os citadinos, que acabam sendo compelidos a se adaptarem a essa ordenação (KOHLSDORF, 1996, p. 1). Nessa situação, tudo aquilo que é produzido pelas camadas subalternizadas, por meio das táticas, é considerado “vulgar” ou “degradante”, visto que são golpes aquilo que lhes é imposto pelo poder institucionalizado, astúcias que reapropriam as ordens e as transformam por meio das práticas cotidianas, aproveitando-se das fraquezas e falhas das estruturas de poder de forma silenciosa (CERTEAU, 1998).
A discussão referente à ocupação e ao uso do solo já não era mais uma novidade, entretanto a falta de uma legislação que ordenasse esse processo gerava críticas24. Enquanto isso, a imprensa publicava constantemente sobre “as verdadeiras comunidade clandestinas” criadas por pessoas que vinham à “Salvador à procura de melhores condições de vida” e que habitavam em “promíscuas moradias”25. Segundo esses, eram nessas localidades que moravam a miséria, a doença e a fome, já que a política habitacional não estava conseguindo resolver a situação que as pessoas mais pobres enfrentavam26.
O fato de uma parte significativa da população que compunha os fluxos migratórios daquele período originarem-se das cidades do interior da Bahia e de outros estados do Nordeste27 justificava a construção de discursos sobre as populações periféricas vinculados ao atraso28. Essas comunidades corresponderiam ao país rural que o Brasil fora até a década de 194029, a antítese da modernidade e civilidade pregada pela política desenvolvimentista daquele momento. Em artigo de opinião publicado no Jornal A Tarde, Neomar Cidade afirma que a presença dessas pessoas no contexto urbano “nos leva a imaginar festivos bois, vacas, cabras, porcos, etc., pastando no Terreiro de Jesus ou no Campo Grande, o que chega a ser um pesadelo...”30.
As “invasões cabulosas”31 eram uma constante no cotidiano da capital baiana desde o final da década de 1940. Ainda assim, ao Governo Militar cabia a missão de resolver esse “problema insolúvel” - nas palavras do então presidente do BNH, Maurício Schulmann - em agosto de 1977, num evento comemorativo realizado aqui32. A inflação aparecia como um dos fatores que dificultavam ainda mais a árdua tarefa, pois além de encarecer o custo da construção de habitações populares influenciava os “constantes casos de invasões e despejos coletivos”33.
O contraponto entre aqueles que “realmente” precisavam ocupar aqueles terrenos para construírem seus lares e “a especulação dos ‘espertos’” figurava na grande maioria dos textos que narravam os diversos casos de ocupação observados no final da década de 1970 na Grande Salvador. Percebe-se que esse recurso na construção das narrativas jornalísticas funcionava como uma maneira de legitimar a necessidade da ação policial nesses locais, como força necessária para que a cidade fosse ocupada “não de modo anárquico assim como é feita nas invasões, mas de modo racional e ordenado, respeitadas as conveniências de ordem urbanística, higiênica, sanitária, de modo que surjam bairros e não aglomerados de favelas”34.
Com riqueza de detalhes, as matérias traziam as falas desses “flagelados” que se proliferavam em várias regiões da cidade, construindo seus barracos “até mesmo em lugares nobres”35. Logo, percebemos que não havia uma interdição às falas dessas pessoas, “mas uma separação e uma rejeição” que, de acordo com Foucault (2012, p. 10), revela também um processo de exclusão.
Os conflitos registrados diariamente pela imprensa contribuíram para transformá-la em lugar privilegiado de difusão da informação, consagrando-se a “ideia de que o jornal cumpre a nobre função de informar ao leitor o que se passou, respeitando rigorosamente a ‘verdade dos fatos’”. Diante disso, apesar dos jornais apresentarem múltiplas possibilidades de abordagem histórica presentes no contexto urbano, é importante levar em consideração suas ligações e interesses políticos com a finalidade de compreender que existem interesses por trás daquilo que é publicado ou não (LUCA, 2010, p. 137, 138, 140). Consideramos necessário evidenciar outras narrativas, para além daquelas que observamos até aqui, para isso analisaremos trechos de três entrevistas sobre algumas das ocupações informais que ocorreram no Complexo Habitacional Cajazeiras.
“Escondi a madeira na mata e em uma noite construi em taipa”
Ao observar Salvador, pode-se concluir que nas periferias estão grande parte da população que compõe essa cidade, porém a memória popular em relação à capital baiana está muito mais ligada aos aspectos turísticos do que às particularidades dos bairros que a compõe. A partir das considerações do sociólogo Michael Pollak (1989) é possível afirmar que há um terreno de disputa intenso, em que a memória da população é colocada em esquecimento em relação a uma memória institucionalizada, reafirmada a todo o tempo nos nomes de avenidas, ruas, praças, bairros, monumentos, entre outros. Nesse contexto, Cajazeiras “foi construída de modo a não permitir outra leitura da história dos negros, senão a da subserviência, da inferioridade e da não-memória” (BARBOSA, 2009, p. 26)36.
A memória coletiva se sustenta por meio de um conjunto de indivíduos que se lembram enquanto membros de um grupo. Dessas lembranças que se apoiam umas nas outras, cada indivíduo se recorda com uma intensidade diferente. Logo, podemos afirmar que a memória coletiva é formada por várias memórias individuais, que são influenciadas tanto pelo local que o indivíduo ocupa quanto pelas relações que esse mantém com outros meios. Mesmo nossas recordações mais pessoais, são produzidas a partir das nossas relações com os ambientes comunitários. Diante disso, as transformações que ocorrem nos meios coletivos afetam diretamente a nossa memória individual (HALBWACHS, 1990, p. 51).
A vida nas cidades produz “pontos de ancoragem da memória”, que são os lugares em que vivemos nossas experiências cotidianas, locais conhecidos ou até mesmo espaços que existiram em outro tempo e que chegam ao nosso conhecimento por meio da narração dos mais antigos. Todos esses espaços cheios de significados, formam um imaginário sobre a cidade. Cada habitante escolhe as suas referências para se situar no tempo e espaço urbano, processo esse que como vimos, também é feito coletivamente, formando os lugares de memória (PESAVENTO, 2007, p. 1).
Assim como os barracos das “invasões” eram veiculados pelos meios de comunicação como um fator que degradava a cidade, visto que é perceptível uma distinção entre o que seria considerável uma habitação, podemos perceber nos discursos da população que ocupava terrenos vazios como uma luta para além do simples fato de conquistar o direito de ter um “lugar para botar a cabeça”37 como é apresentado em algumas matérias jornalísticas. No entanto, torna-se necessário um cuidado para não romantizarmos essa que era uma situação calamitosa, como demonstra o relato de um Líder Comunitário do bairro, em entrevista cedida a Tânia Almeida (2005, p. 94): “meu barraco era tão pequeno que eu dormia com os pés para fora”.
No entanto, chama atenção as estratégias empreendidas por essas pessoas em batalhas contra o poder público, que utilizava sua força policial para garantir a ordem numa época em que segurança era uma palavra frequentemente afirmada. Acreditava-se que o Estado tinha o dever de “restaurar a ordem ferida, mesmo à custa da violência”38. Ao contrário do que se veiculava nesses meios, a grande maioria dessas pessoas que estavam interessadas “tão somente em criar balbúrdia e estabelecer violência por parte dos menos avisados”39 tinha na ocupação a última alternativa de ter um abrigo, muitas dessas sem condições de arcar com os custos básicos da vida urbana.
Uma outra entrevista de um Líder Comunitário, publicada por Almeida (2005, p. 95) em sua dissertação é capaz de nos trazer um panorama mais amplo em relação a esse contexto:
[...] Eu morava em Campinas de Pirajá, pagava aluguel. Quando vim para cá, trouxe mais quatro comigo, todos moravam de aluguel [...]. Eu fazia o barraco de papelão, a URBIS vinha e tirava. A URBIS vinha na frente e a polícia atrás [...]. Escondi a madeira na mata e em uma noite construir em taipa [...]. São 18 anos de luta.
Torna-se necessário evidenciarmos essas práticas que rompem a vigilância do poder estatal, que reapropriam o espaço e constituem novos lugares de memória. De acordo com Pierre Nora (1993, p. 13), lugares de memórias são como restos que resistem aos processos de esquecimento construídos por um tempo em que se valoriza aquilo que representa o novo, o jovem ou o futuro em detrimento daquilo que representa o velho, o antigo ou o passado. São lugares que guardam aquilo que é estabelecido, construído, decretado, mantido pelos costumes, como um texto escrito há muito tempo que foi encontrado por acaso no fundo de uma gaveta.
Esses lugares fluidos levam com eles lembranças e referências, visto que as transformações causadas pela modernização nas cidades podem destruir lugares em que se prendiam as lembranças dos seus moradores (D’ALÉSSIO, 1998, p. 273), como se uma parede ruída ou um jardim cimentado levasse um pedaço de cada pessoa. Entretanto, a tristeza causada por essas mudanças não modifica o curso da história, já que alguns destes lugares resistem e até mesmo são traços de um passado no presente. Eclea Bosi nos indaga: “Podem arrasar as casas, mudar o curso das ruas; as pedras mudam de lugar, mas como destruir os vínculos com que os homens [e mulheres] se ligavam a elas?” (BOSI, 1994, p. 451, 452)
Outro morador de Cajazeiras que participou dos processos de ocupação espontânea afirmou
[...] fui um dos primeiros moradores [...]. Morava em São Marcos de aluguel. As pessoas que moravam em risco, eu trouxe para cá. [...]. Tinha um filho de nove meses. Comprei 30m de plástico preto [...]. Minha mulher cozinhava no mato e a gente se escondia da URBIS (ALMEIDA, 2005, p. 95).
É justamente, no processo de constituição desses lugares que estão todo o significado que têm para essas pessoas, nas suas folhas de zinco, plástico, palha, papelão ou taipa que nos protegiam da chuva. Nas estacas de madeira que serviam de estrutura e alicerce daquilo que já era considerado um lar. No trabalho comunitário para estabelecer condições mínimas de habitabilidade, instalando esgotos, água encanada, construindo escadas e caminhos nas encostas, tudo isso com dinheiro do próprio bolso. Nas trocas de palavras, alimentos, afetos, risadas e, também, lágrimas. No cotidiano, na convivência, na luta que pode ser percebida nas casas que hoje constituem essa localidade.
Apesar de serem veiculados constantemente pelas matérias jornalísticas alguns fragmentos daquilo que era dito pelos “invasores”, a memória popular possibilita perceber o patrimônio histórico não somente como um vestígio do passado, mas como uma ferramenta importante para a observação dos conflitos da sociedade atual, dado que essas narrativas se encontram em um ambiente de disputa cotidiana. Dentro desse contexto, é fundamental saber ouvir as variadas experiências, representações e visões de mundo que se constituem nas diversas relações sociais, estabelecendo a identidade de uma comunidade e, por conseguinte, um sentimento de pertencimento entre os seus agentes.
Considerações finais
Neste texto evidenciamos apenas o processo de disputas em torno das problemáticas relacionadas a apropriação e uso do solo urbano, porém pensamos ser essencial referenciarmos as várias resistências que constituem o território atual de Cajazeiras. Elas estão nos processos de luta dos moradores em busca de melhores condições de habitabilidade40, na constituição do comércio formal e informal41, na luta dos povos de terreiro pela manutenção e tombamento da Pedra de Xangô42, nos movimentos sociais43, no Quilombo Educacional que possibilita o acesso de jovens periféricos à Universidade44, nos Sambas de Roda45, entre outras manifestações populares.
Todas essas manifestações de resistência que observamos até aqui não são por acaso, elas refletem movimentos, astúcias e reapropriações de tempos antigos. Os caminhos trilhados por nós hoje foram abertos há muito tempo e independem do reconhecimento daqueles que detém as ferramentas de poder e que acreditam possuir o direito de julgar aquilo que é certo ou errado. Esses caminhos estão sendo pensados e repensados todos os dias por cada um de nós, até mesmo aqueles que conscientemente nunca pensaram sobre a trilha. Estamos aqui só para dar continuidade aquilo que já está encaminhado (REIS; GOMES, 2012).
De acordo com Alistair Thomson (2000), o contexto de integração social em que os sujeitos estão inseridos, proporciona a oportunidade de verificar as variadas visões de mundo e experiências que geralmente não são registradas pela história oficial. Portanto, pensar as periferias da capital soteropolitana somente pelo viés das memórias apresentadas pelos projetos urbanísticos e veículos de difusão da informação demonstram-se insuficientes para analisar o contexto em que as pessoas que habitam esse espaço estão inseridas. Como já observamos, havia uma preocupação dos meios letrados em relação à perda do patrimônio cultural, temia-se que a cidade deixasse de referenciar aqueles que supostamente construíram a urbe.
Por conseguinte, se essas pessoas - em sua maioria negra, pobre e feminina – são tão perigosas ao ponto de serem ameaçadoras à memória e ao patrimônio cultural institucionalizados, ao ouvirmos as pessoas marginalizadas temos a possibilidade de observar as construções humanas sob outras perspectivas. Além disso, conseguimos retirar seus discursos do isolamento, levá-los ao conhecimento de outras pessoas e comunidades e, consequentemente, despedaçar as “verdades” cristalizadas pelas narrativas oficiais.
Referências
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Notas
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