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Eu vim de lá pequenininho: noções pluriversais da historicidade das infâncias e adolescências no Brasil
Tarcísio Conceição Oliveira; Rebeca Ribeiro da Silva
Tarcísio Conceição Oliveira; Rebeca Ribeiro da Silva
Eu vim de lá pequenininho: noções pluriversais da historicidade das infâncias e adolescências no Brasil
“I came from there a small child”: pluriversal notions about the historicity of childhoods and adolescences in Brazil
O Social em Questão, vol. 26, núm. 56, pp. 135-158, 2023
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
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Resumo: O presente artigo, por meio dos acúmulos e pesquisas decorrentes do espaço da graduação e pós-graduação, visa debater sobre infância e adolescência – com enfoque na primeira noção – a partir de um resgate sócio-histórico brasileiro, dos processos de colonização e escravização, estruturantes e fundantes ao modo de produção capitalista. Afora isso, evidencia-se as contribuições da literatura afro-brasileira e aspectos da filosofia africana, como: a pluriversalidade. Nessa costura, pretendemos apresentar possibilidades de ampliarmos o diálogo referente a temática, realizando reflexões e análises.

Palavras-chave: Infância, Adolescência, Escravização, Capitalismo, Pluriversalidade.

Abstract: This article is based on research resulting from undergraduate and graduate production and seeks to analyze the concepts of childhood and adolescence in view of the Brazilian socio-historical past of colonization and enslavement that contributed to structure the country´s capitalist mode of production. The article also highlights the contributions of Afro-Brazilian literature and African philosophy such as pluriversality. The study intends to present possibilities to increase dialogue, reflections and analyses.

Keywords: Childhood, Adolescence, Enslavement, Capitalism, Pluriversality.

Carátula del artículo

Eu vim de lá pequenininho: noções pluriversais da historicidade das infâncias e adolescências no Brasil

“I came from there a small child”: pluriversal notions about the historicity of childhoods and adolescences in Brazil

Tarcísio Conceição Oliveira1
UERJ, Brasil
Rebeca Ribeiro da Silva2
PUC-Rio, Brasil
O Social em Questão, vol. 26, núm. 56, pp. 135-158, 2023
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Recepción: 01 Diciembre 2022

Aprobación: 01 Enero 2023

Introdução

Discutir a realidade de crianças e adolescentes no Brasil é um movimento necessário para a efetivação dos direitos dessa população, especialmente após o golpe de 20163, em que se aprofundam os retrocessos e ataques aos direitos sociais. Realizar tal movimento, a partir de uma perspectiva decolonial, é igualmente importante para romper com uma história contada a partir do ponto de vista das classes opressoras.

Para contribuir com a perspectiva apresentada acima, este trabalho será dividido em dois eixos centrais. Primeiramente, buscaremos demonstrar, dadas as características étnico-raciais dessa produção, como se desenvolveram as relações sociais entre o Estado, as classes dominantes e as crianças e adolescentes que ocupavam o Brasil desde a invasão portuguesa até as primeiras décadas do século XX. Referências literárias como as obras de Conceição Evaristo e Carolina Maria de Jesus serão importantes instrumentos para a concretização desse estudo. O percurso descrito é fundamental para demonstrar as bases que estruturam as concepções da sociedade brasileira em torno das infâncias e adolescências, demarcando os diferentes lugares oriundos desses sujeitos, bem como a desigualdade de condições entre as infâncias mediante suas pertenças raciais e de gênero.

Por esse motivo, consideramos falar em infâncias no plural, partindo da compreensão de que no Brasil existem cenários muito diversos que não tornam impossível pensar em uma concepção única de infância. Posteriormente, o artigo dialogará com o conceito de pluriversalidade (RAMOSE, 2011), proveniente da filosofia africana, objetivando visibilizar concepções apagadas pela colonização.

Buscamos com as linhas deste trabalho, contribuir com o compromisso coletivo e emancipatório da construção de uma sociedade mais justa para crianças e adolescentes, na qual direitos sejam respeitados considerando as multiplicidades do ser e existir desses sujeitos. Apesar dos avanços alcançados nas últimas décadas, ainda há o que se superar no que diz respeito a romper com uma noção universalizante, eurocentrada e, por conseguinte, colonial acerca das infâncias.

Denúncias sobre um país marcado pela violência contra a infância a partir de uma perspectiva decolonial5

A voz de minha bisavó

ecoou criança

nos porões do navio.

ecoou lamentos

de uma infância perdida

(Conceição Evaristo)

Bitita era o apelido de Carolina Maria de Jesus ao longo da infância e adolescência. Carolina só descobriu o verdadeiro nome aos sete anos de idade em uma breve passagem pela escola, e, inicialmente, não gostou dele. Essa memória, assim como outras do mesmo período da vida de Carolina Maria de Jesus são registradas na obra Diário de Bitita (2014). Na edição que conhecemos , a autora nascida em 1914, começa o livro resgatando memórias da infância e adolescência na cidade de Sacramento, interior de Minas Gerais, ponto de partida dos difíceis caminhos percorridos para chegar em São Paulo, onde viveu o resto de sua vida.

Começar este artigo trazendo Bitita é uma escolha política, pensada para dialogar com uma autora tão importante para análises da realidade brasileira, comprometidas com a transformação social. Em Diário de Bitita, Carolina demonstra de forma autoral e dolorosa o que era ser uma menina negra, e pobre, no Brasil de meados do século XX, poucos anos após a abolição jurídico formal do regime escravista.

O esforço de Carolina em denunciar através de sua obra memorialística as condições desumanas a que esse projeto de Brasil expôs a população afro-brasileira – também presentes em outras obras da literatura nacional, como as de Conceição Evaristo, deve ser considerada como uma narrativa transgressora mediante a ordem vigente.

Neste percurso, no livro Olhos d’Água (2016), Conceição nos apresenta a figura de Lumbiá, um menino que apesar da condição de criança, precisava trabalhar junto aos familiares no mercado informal e vivia os dias a pensar em diferentes estratégias para vender novas mercadorias, na tentativa de garantir a sua sobrevivência.

A escolha de trazê-la aqui se justifica porque mesmo que a história de Lumbiá não apresente um rosto específico, ela conta um pouco sobre o cotidiano de milhares de crianças brasileiras. O que de fato sabemos é que Lumbiá era um menino que não tinha muito tempo para ser criança, porque assim como os amigos e irmã, precisava trabalhar para complementar a renda familiar. Esta obra, bem como a de Carolina, apresenta similaridades com a realidade de homens, mulheres, jovens, meninos e meninas negras do Brasil, permeada por violências que ainda são impostas à população negra brasileira.

As experiências apresentadas pelas autoras são parte de um projeto de Brasil gestado para ser assim. Simas (2016) destaca que este é o Brasil que deu certo, um país que não foi pensado para Carolinas, Lumbiás e seus semelhantes, um projeto que estruturou suas bases na subalternização de pessoas – povos originários, mulheres, crianças e adolescentes negras e, o conjunto da classe trabalhadora.

O nosso movimento enquanto sujeitos comprometidos com a defesa dos direitos das crianças e adolescentes e com uma sociedade livre de qualquer tipo de discriminação, exploração e dominação, deverá se guiar em direção à transformação dessa ordem, para que possamos seguir e “fazer o Brasil dar errado”, parafraseando Simas (2016).

Infâncias no Brasil: panorama histórico

A invasão portuguesa já representava um processo violento para os povos originários, que habitavam o território – o qual posteriormente foi denominado Brasil – muito antes que se pensasse na colonização como forma de desenvolver o capitalismo. A chegada e instalação dos colonizadores impôs sequências de agressões contra esses povos, as quais foram operadas das mais distintas formas. Começando pela violação da terra que é sagrada e tem um papel central na reprodução do seu modo de vida, ou seja, não possui caráter de mercadoria - passível de ser valorada e explorada até o fim e exaustão dos recursos. Entendendo, assim, a colonização como precedente para a constituição do capitalismo, esse era realmente só o começo. Muito ainda viria depois com o extermínio de grupos inteiros pelas novas doenças e vírus trazidos de além-mar ou os genocídios diretamente praticados, promoção de guerras internas, escravização e outras violações que o homem branco impôs a essas populações visando alcançar o objetivo principal: subjugar esses sujeitos ao domínio e cultura eurocêntricos.

A Companhia dos Jesuítas pode ser identificada como uma instituição responsável por operacionalizar essas violações. Com o intuito maior de enquadrar as terras nativas nos padrões civilizatórios da colônia, conforme demonstra Mary Del Priore (1996), os jesuítas buscavam introduzir novos símbolos e instituições que representassem essa sociedade, além de priorizarem a evangelização de almas indígenas, que, segundo aquela lógica, estariam recebendo a salvação (PRIORE, 1996). Lendo de outra forma, o que se tentava operacionalizar, na verdade, era um verdadeiro embranquecimento da então colônia, o que resultaria no apagamento dos povos indígenas, seus costumes, saberes, tradições, cultura e religião.

Ora, se esse era o tratamento determinante imposto àquelas populações, ao voltarmos os olhares para a situação das crianças indígenas nesse cenário, não se pode perder de vista que se tratava de um período na história do mundo em que novos estudos e concepções sobre o lugar da criança na sociedade tomavam forma. Naquele período estava se consolidando as ideias em torno da concepção de criança mística e da criança como imitação de Jesus (PRIORE, 1996). Esses conceitos religiosos, remetidos à pureza em torno da figura infantil, representavam também que os esforços em torno da “salvação” dessa criança seriam ainda maiores. Leia-se: os esforços para colonizar a criança indígena.

Neste sentido, a autora define a infância segundo a visão colonizadora da seguinte forma:

A infância é percebida como momento oportuno para a catequese porque também é momento de unção, iluminação e revelação. Mais além, é o momento visceral de renúncia, da cultura autóctone das crianças indígenas, uma vez que certas práticas e valores ainda não se tinham sedimentado (PRIORE, 1996, p. 15).

O que se pode perceber é que toda a atenção em torno da infância era parte de um projeto que buscava operacionalizar a partir da catequese, a dominação do colonizador sobre a vida daqueles sujeitos, aproveitando para isso do momento de seu desenvolvimento – a infância – marcado pela vulnerabilidade e pela necessidade de cuidados. Com a catequese buscava-se introduzir os modos de vida e comportamento brancos, europeus e cristãos como padrões a serem seguidos em troca da salvação, o que implicava na total renúncia da identidade, das origens, dos semelhantes e de tudo que conheciam até então. Uma violência à qual deram o nome de “salvação”.

Priore (1996) aponta ainda que essa forma de colonizar era instrumentalizada através da violência física aos pequenos indígenas durante todo o processo. Na medida que essas crianças cresciam, tornando-se adolescentes, passavam a representar um risco ao modelo de dominação e colonização, pois muitos deles conseguiam romper com as amarras impostas durante a catequese e retornar ao seu povo.

Se as crianças e adolescentes indígenas foram vítimas da violência do colonizador, não se poderia esperar menos no que tange às crianças e adolescentes negras. Isso porque a violência e violação de corpos era condição sine qua non7 da colonização, esta última não existe nem se mantém sem as primeiras. Quando falamos na população infanto-juvenil afro-diaspórica, vítimas desse regime, enquadram-se tanto aquelas que foram sequestradas do Continente Africano e trazidas nos navios tumbeiros quanto aquelas filhas de africanos escravizados já nascidas aqui.

As crianças trazidas nos navios passavam por sucessivas violações antes que chegassem ao Brasil e quando chegavam, dadas as condições as quais foram submetidas durante todo este processo: sequestradas, retiradas da convivência no seio familiar e comunitário, de seus países e de seu continente, afastadas de todas as referências que conheciam, essas crianças se depararam com uma nova realidade regida pela violência e pelo horror, em que lhes davam novos nomes, lhes obrigavam a falar outro idioma, demonizavam sua cultura e religião, abusavam de seus corpos, os desumanizavam e, sobretudo, eram preparadas para trabalharem incansavelmente durante toda a vida, sob a constante ameaça de serem infligidos mais castigos físicos, para assegurar que estivessem certos de que a vida valia menos do que o modo de produção capitalista – que se instalava naquele momento a partir da colonização.

Sobre a criança escravizada, Mattoso (1996) demonstra que eram divididas em duas faixas etárias para considerar a capacidade produtiva: a primeira que incluía aquelas dos 0 aos 7 anos e, a segunda, as crianças de 7 a 8 anos em diante. A segunda categoria já era considerada apta ao trabalho, interrompendo precocemente suas infâncias e tornando-as parte da força de trabalho.

Esses sujeitos tiveram negada a possibilidade de pertencer e construir laços com as suas próprias famílias, pelo menos dentro dos moldes do que se chamaria “família nuclear”. Em seu estudo intitulado “O filho da Escrava”, que incluía uma pesquisa sobre crianças com menos de 12 anos sem filiação, Mattoso (1996) aponta que entre os anos de 1860 e 1888, aproximadamente 41,2% das crianças escravizadas não tinha no registro o nome de nenhum dos genitores. A autora levanta a hipótese que essa circunstância seja resultante de mulheres negras alforriadas, vendidas ou mortas.

A ausência de figuras maternas e/ou paternas em muitos momentos impôs a essas crianças a impossibilidade de construir vínculos sólidos e relações de afeto que poderiam se dar no interior da família. Em contraposição a essa lógica, e regime, através dos quais buscava-se retirar todos os traços de humanidade da população escravizada – sem excluir as crianças ascendentes desta população – havia a resistência desses sujeitos, que de acordo com Slenes (2011), buscavam estratégias de constituir família e novos laços de parentesco mesmo no interior das senzalas, laços esses que poderiam ser sanguíneos ou não.

Ela expressava um mundo mais amplo que os escravos criaram a partir de suas “esperanças e recordações”; ou melhor, ela era apenas uma das instâncias culturais importantes que contribuíram, nas regiões de plantation do Sudeste para a formação de uma identidade nas senzalas, conscientemente antagônica à dos senhores e compartilhada por uma grande parte dos cativos (SLENES, 2011, p. 59).

Embora a população negra que ocupava as senzalas, incluindo-se neste contingente as crianças negras, possivelmente já tivessem sofrido a violência de terem sido afastadas de familiares, havia um movimento de resistência dos próprios escravizados para manter viva a sua identidade e coletividade.

Além das violências acima descritas, outras estratégias para alongar a duração do regime escravocrata afetaram direta, e negativamente, as crianças negras no período que antecedeu a abolição, como a Lei do Ventre Livre. Promulgada pela Princesa Isabel em 1871, a lei determinava que estariam livres os filhos das mulheres escravizadas nascidos a partir de então, sob a condição de que fossem criados e mantidos pelo senhor de sua mãe até a idade de 8 anos. Nesta fase, o senhor poderia escolher manter os seus serviços até os 21 anos para que pagasse pelas despesas geradas, ou poderia entregá-lo ao Estado, recebendo uma indenização. Na possibilidade de o senhor de escravos entregar essa criança ao Estado, esse também ficaria responsável por seus cuidados até os 21 anos, no qual o trabalho permaneceria na mesma perspectiva de “pagamento” dos gastos para a manutenção da vida dos ex-escravizados (LIMA; VENÂNCIO, 1996).

As práticas decorrentes da Lei do Ventre Livre sugeriam, na verdade, um aperfeiçoamento das técnicas de exploração impostas à população negra. Corroborando com a tese de que a infância negra se encerrava entre os 7 e 8 anos de idade, a norma não colaborava para que esses meninos e meninas negras fossem vistos no lugar de sujeitos, pelo contrário, situados à margem da sociedade, eram compreendidos como mera força de trabalho, sendo considerados mais um gasto para o senhor, ou para o Estado, que deveriam ser compensados através da exploração do trabalho infantil. Aliás, o bem-estar do senhor de escravos e o seu contentamento pareciam ser as principais preocupações. A necessidade de garantir-lhes indenizações e manter o trabalho forçado, quando não havia sequer uma medida voltada ao bem-estar daquelas crianças, são indicativos de que o texto legal/jurídico não tinha o objetivo de superar a estrutura das relações sociais da sociedade escravista, ao contrário, tal lógica trazia como subtexto a reatualização da dinâmica colonial.

Lima e Venâncio (1996) demonstram que em decorrência da Lei de 1871 houve um aumento significativo no número de crianças abandonadas, o que poderia se dar diretamente pelo desinteresse dos senhores em manter aquelas crianças, mas também pela possibilidade de alugar suas mães como “amas de leite”8. O abandono de bebês e crianças já era uma questão que se estendia desde o século XVII no Rio de Janeiro, segundo demonstram os autores. Na tentativa de oferecer uma solução a esse problema, a coroa portuguesa decide importar um método já muito comum em seu país de origem e em outros lugares da Europa: a roda de expostos. Os bebês denominados “enjeitados” eram recebidos na Casa de Expostos, a qual funcionava na Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro9.

Esse sistema funcionava de maneira muito irregular, em primeiro lugar porque o número de crianças que sobreviviam nos primeiros três meses em que permaneciam na Casa da Roda10 era baixo, assim, as sobreviventes eram enviadas às cuidadoras – mulheres escolhidas pela Santa Casa – responsáveis pelas crianças até os sete anos. Posteriormente seriam enviadas ao Recolhimento das Órfãs, se fossem meninas, ou, ao Arsenal da Marinha, no caso dos meninos, onde trabalhariam por mais sete anos para custear os gastos com manutenção da vida – comida e teto – e depois, aos 14, poderiam trabalhar como trabalhadores livres. Além disso, existem registros também que no caso de as crianças entregues serem negras ou pardas, a Santa Casa registrava um falso óbito, no intuito de vendê-las como escravas (LIMA; VENÂNCIO, 1996).

Os autores apontam também um outro resultado dessa dinâmica de exposição de bebês e crianças nas Rodas e Casas de Expostos. Uma alternativa à inserção das meninas no Recolhimento das Órfãs e dos meninos no Arsenal da Marinha, era a colocação desses sujeitos em famílias adotivas. No entanto, ocorre que com as transformações que vinham acontecendo, muitos integrantes da sociedade já não podiam mais manter escravos e por isso optavam por adotar crianças, na maioria das vezes reproduzindo atribuições de trabalho escravo e, jamais as igualando aos seus filhos biológicos em questões de tratamento e herança.

Sobre isso, Carolina Maria de Jesus (2014) traz observações muito importantes em Diário de Bitita que podem testemunhar o que vem sendo discutido até aqui. Além dos episódios em que Bitita ainda criança e/ou adolescente acabou trabalhando sem remuneração digna, ou em troca de teto e comida, ela conta também sobre o esposo de sua mãe que foi uma criança enjeitada e, segundo seus relatos, casou-se para sair da tutela:

Foi seu tutor o senhor Miguel Alvim. Uma das famílias ricas, das que criavam os enjeitados para tratar dos porcos, galinhas, varrer a casa, arrumar, fazer a cozinha e fazer compras. Era proibido ter escravos, então eles pegavam uns negrinhos para cria-los. Um infeliz que ia crescer sem instrução.

Quando o senhor Osório Pereira casou-se com a minha mãe, o tutor deu-lhe só quinhentos mil-réis. Não deu-lhe um lote de terra para ele construir sua casinha. Deu-lhe umas calças usadas. E uns pares de sapatos tão grandes que o esposo de minha mãe deveria cortar os sapatos ao meio ou duplicar os seus pés (JESUS, 2014, p. 70-71).

O que se pode notar mais uma vez é ausência total de amparo ao público infanto-juvenil, negro e pobre, sendo as Rodas e Casas de Expostos instituições e instrumentos criados apenas com o intuito de manter a ordem social vigente e a estrutura de família branca nuclear e burguesa. Assim como as crianças indígenas e as escravizadas, as crianças expostas não eram vistas como sujeitos, merecedoras de uma vida digna. A negação da possibilidade de construir qualquer tipo de vínculo é mais uma vez aqui, um elemento que demarca o não-lugar daqueles meninos e meninas perante a sociedade, onde poderiam ser apenas e exclusivamente força de trabalho. A primeira infância era só um caminho para tal.

Estes eventos, além de demonstrarem a ineficiência da Lei do Ventre Livre, revelam também o quanto o ideal de dominação estruturado na sociedade escravocrata ficou profundamente marcado no imaginário da branquitude11, especialmente porque lhe oferecia benefícios. Marcas essas que ignoravam qualquer fator etário e que deixavam inúmeras cicatrizes na população negra, as quais foram extrapoladas após a abolição da escravatura.

Tais configurações de recolhimento de crianças expostas, especialmente dos meninos, demonstram o quanto o Estado brasileiro e as instituições operacionalizadas por seus agentes, se certificaram de fazer o possível para que não houvesse nenhum outro lugar para a criança negra que não fosse na escravidão e, para a criança pobre que não fosse a submissão ao trabalho infantil. De todo modo, o que ficava evidente era a suspensão dessas infâncias ainda muito cedo.

Moura (1996) destaca que antes mesmo da emergência dos conflitos sociais relativos ao trabalho nas indústrias no século XX, a exploração da mão de obra infantil já era uma questão. Isso porque dadas as condições de extrema pobreza as quais os operários estavam inseridos, se viam obrigados a incluir seus filhos como geradores de renda, objetivando diminuir os impactos causados pelos baixos salários e ausência de políticas sociais. A força de trabalho dessas crianças tinha um custo menor, o que era uma vantagem para o empresariado, já que aumentava os lucros.

As legislações que regulamentavam a proteção ao trabalho de crianças e adolescentes, e o Código de Menores, só seriam implantadas anos depois. O que na prática não significaram mudanças efetivas, que de fato amparassem ou resguardassem aquelas crianças da exploração do trabalho não remunerado e da ausência de cuidados, e proteção, por parte da sociedade e do Estado. A sociedade da época – que guarda algumas semelhanças com a atual – não as enxergava como seres munidos de potencialidades, não os viam para além de sua condição de classe, raça e gênero, as quais eram entendidas como fatores limitantes dentro do modelo de civilização do capital e, sobretudo, eram consideradas características ameaçadoras.

Infâncias e adolescências a partir de referenciais pluriversais: uma reflexão necessária

Com relação ao que expomos até aqui, é importante destacar que todo o percurso acima evidencia uma análise crítica à noção universal de infância e adolescência, sustentada por um modelo de sociedade que se ergueu através da colonização e escravização. Portanto, é nesse contexto de desumanização que encontramos as estratégias de resistência, algumas evidenciadas acima, mas para além disto, encontramos também pensamentos, noções e ideias que rompem com esse viés universalizante em relação à infância e adolescência.

O que estamos apontando é a necessidade de embasarmos as nossas formulações e ações sobre esse debate em referenciais teóricos denominados aqui como pluriversais. Ora, mas o que seria pluriversal? Mogobe Ramose12 cunhou o pensamento e ideia da pluriversalidade, afirmando o seguinte:

Considerando que “universal” pode ser lido como uma composição do latim unius (um) e versus (alternativa de...), fica claro que o universal, como um e o mesmo, contradiz a ideia de contraste ou alternativa inerente à palavra versus. A contradição ressalta o um, para a exclusão total do outro lado. Este parece ser o sentido dominante do universal, mesmo em nosso tempo. Mas, a contradição é repulsiva para a lógica. Uma das maneiras de resolver essa contradição é introduzir o conceito de pluriversalidade (RAMOSE, 2011, p. 10).

Neste sentido, entendermos as infâncias e adolescências como pluriversais é fundamental nas reflexões e proposições que serão feitas. Noguera (2014), ao refletir sobre a pluriversalidade, traz as seguintes contribuições:

O conceito de pluriversal não se opõe ao de universal; distante da lógica dicotômica – “ou isso ou aquilo” –, a pluriversalidade nos convida a pensar usando a tática da inclusão – “isso e aquilo” (NOGUERA, 2014, p. 33/34).

O sentido de “isso e aquilo”, empregado neste artigo, corresponde a forma de ser e estar no mundo enquanto criança e adolescente, plural e permeada por questões de raça, gênero, territorialidade, classe, sexualidade, condição física e múltiplos outros atravessamentos que, de maneira singular, impulsionam a vivência e experiência desses sujeitos. Porém, na sociedade que estamos inseridos, o que torna a forma de ser e estar no mundo nesta faixa etária, de maneira múltipla, acaba sendo um impeditivo a ser combatido e repelido.

Este apontamento é necessário quando entendemos a maneira como a infância e adolescência será experimentada no Brasil, por exemplo. Falarmos enquanto diáspora torna-se fundamental para tecermos novos pensamentos e formulações, quanto para dialogarmos com os que estão postos, rumo a uma ordem social que de fato contemple essa multiplicidade. A diáspora13 é um aspecto decisivo e ajuda-nos a romper com as propagações universalizantes. Dela advém também a possibilidade de se pensar novas formas de ser e estar no mundo enquanto criança e adolescente – e como povos afro-diaspóricos. A diáspora alarga a perspectiva pluriversal defendida aqui, pois a compreende como elemento importante para as novas ideias que serão tecidas. Em outras palavras, “a diáspora africana é, portanto, parte integrante da história da filosofia africana” (RAMOSE, 2011, p. 13).

Quando localizamos a diáspora brasileira, em concordância com a reflexão proposta neste momento do artigo, afirmamos serem referências pluriversais às ideias, pensamentos, e teorias de autores e autoras do Continente Africano, como de autores e autoras afro-brasileiros, as quais (re)afirmam mais uma vez a sua localização geopolítica na construção de suas análises e produção de conhecimentos. É neste direcionamento que teceremos as próximas reflexões sobre este debate.

Experenciar a infância e adolescência na realidade brasileira exige não perdermos de vista o processo de colonização e escravização, tampouco as movimentações contestatórias em relação a esse sistema que era consolidado por intermédio do esfacelamento de povos africanos e indígenas escravizados. Uma das referências que potencializam tal análise são as bonecas Abayomi14, que significa “encontro precioso” em Iorubá – uma das maiores etnias do Continente Africano, tendo sua população habitando parte da Nigéria, Benin, Togo e Costa do Marfim. Com o exemplo da Abayomi é possível elucidarmos uma tradição importantíssima para os povos africanos, também notada em nossa diáspora, nos terreiros de candomblé e umbanda, nas rodas de samba, jongo e capoeira, como nas histórias contadas pelos nossos ancestrais, avós e avôs, nossos Griots: a oralidade.

A boneca Abayomi, feita apenas com nós e retalhos rasgados das roupas, não possui demarcação de olho, nariz ou boca – expressando a multiplicidade de etnias e povos do Continente Africano (GELEDÉS, 2015); por outro lado, simbolizam uma forma de ligação com a sua ancestralidade, e em muitos casos, eram utilizadas como reconhecimento de filhos e filhas ao reencontrarem os seus semelhantes, especialmente nos quilombos – espaços nítidos de resistência, coletividade e comunidade15.

Tendo como base a oralitura – sistematização da “escrita oral” (NOGUERA, 2019), no início da proposta deste artigo evidenciamos as literaturas afro-brasileiras por meio de Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo, as quais expressam uma forma de oralitura. Em outras palavras, ambas as autoras dispõem de uma literatura não distanciada da realidade social e ao mesmo tempo, comprometida com a denúncia das opressões orquestradas por essa sociedade e Estado. Uma literatura que apresenta um compromisso social e político. Nessa linha de pensamento, Njeri (2019) apresenta:

A literatura é uma das formadoras do imaginário social sendo, portanto, necessário pensar no papel que desempenha também como formadora de identidade, cultura e sua via refletora da sociedade, seu bem cultural [...] A literatura, arma ferocíssima da realidade aguda, anda de mãos dadas com a ontologia e a epistemologia, sendo, portanto, imprescindível um olhar que não se atenha apenas no estético-literário, mas que também consiga ver na tessitura textual caminhos de movimento e emancipação (NJERI, 2019, p. 11/13).

As movimentações realizadas até o momento dizem respeito à necessidade de produção de novas literaturas, conhecimentos e cosmovisões do que é ser criança e adolescente, do que é viver esse momento da vida que por si só apresenta concretude e completude16. É um momento único, plural, múltiplo, pluriversal e coletivo, vivido de maneira singular por cada sujeito. A possibilidade de pensarmos tal discussão através de outros referenciais é significativo a partir do momento em que observamos algumas questões nos documentos comumente utilizados: o Estatuto da Criança e do Adolescente17 e as determinações da Convenção sobre os Direitos da Criança18.

No preâmbulo do segundo documento, é importante salientarmos a forma como a família é entendida, enfatizada “como grupo fundamental da sociedade e ambiente natural”, assim como no primeiro documento em que, no Capítulo III, na seção II, a qual diz respeito a “família natural”, afirma: “entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes” – acrescido nas linhas seguintes, pelo parágrafo único, com relação ao entendimento de família extensa.

Ressaltamos a partir desses levantamentos as noções, mais uma vez, universalizantes que giram em torno da infância e adolescência, neste caso: a família. Obviamente, o espaço de discussão e construção destes documentos evidenciam a presença de movimentos sociais diversos, por meio dos conselhos, por exemplo (Conselhos de Direitos e Conselhos Tutelares). Porém, cabe frisarmos que, após localizarmos geográfica e politicamente a nossa condição diaspórica, a concepção de família nuclear, burguesa e embranquecedora não nos cabe.

Não nos cabe por conta de ser limitante à forma pluriversal de ser criança e adolescente, como também um modelo universal de família. Os povos Bantu, que tiveram uma contribuição significativa em todo o Continente Africano, mais especificamente na África Subsaariana, devido ao seu processo de expansão (FOURSHEY; GONZALES; SAIDI, 2019), nos apresentam toda uma complexidade que extrapola a noção nuclear de família, e de ser e estar no mundo, já que a heterarquia – um modelo horizontal de relação e constituição/construção de rede – baseava a forma como o pertencimento desses indivíduos era realizado nessa sociedade: um pertencimento que dizia respeito as linhas – matrilhagens e patrilinhagens – como também aos clãs e outras formas de organização desses povos.

O que estamos afirmando é que, para ser e estar, enquanto criança e adolescente no mundo, é necessário um movimento coletivo, uma comunidade que sustente tal feito – comunidade essa que extrapola, mais uma vez aqui enfatizando, a noção de família nuclear universalizante e limitadora - a partir do momento em que resgatamos os processos sócio-históricos brasileiros, como, por exemplo, a invasão portuguesa e toda a aniquilação praticada nesse território, já que a própria noção de família nuclear burguesa é uma referência criada para manter o funcionamento do modo de produção capitalista e ao mesmo tempo, sua imposição constituía uma das formas de aniquilação.

Frente a esse cenário, tem-se do outro lado os referenciais e iniciativas propostas nas linhas deste artigo, as quais se mostram contrárias a essa noção. Um caminho para exercer o entendimento proposto aqui, presente nos próprios documentos citados anteriormente, no que se referia aos limites, é o papel da comunidade e o compromisso social e político. Entretanto, para realizarmos esse deslocamento, é essencial fundamentarmos que os referenciais os quais encabeçarão esse esforço são pluriversais, ou seja compreendem a comunidade alinhada à coletividade.

Njeri (2019) mais uma vez, ao apresentar a experiência do Ndezi, destaca a importância do Kindezi e do próprio Ndezi, ajudando-nos na linha de raciocínio do papel da comunidade:

Kindezi, a arte de cuidar de crianças, é uma arte antiga entre os africanos, em geral, e os Bantu, em particular. É basicamente a arte de tocar, cuidar e proteger a vida da criança e do ambiente, Kinzungidila, em que o desenvolvimento multidimensional da criança ocorre. A palavra “Kindezi”, um termo da língua “Kikôngo”, deriva do verbo raíz Ieia, que significa desfrutar de tomar e dar cuidados especiais. Cuidar de crianças – Ieia, ou seja, dar cuidados especiais - é, antes de tudo, uma forma de transferir padrões sociais para os membros mais jovens da comunidade. E, em segundo lugar, é a orientação da criança para a vida que compreende orientações muito bem determinadas de acordo com as normas e valores comunitários [...] Ndezi, aquele que pratica a arte da Kindezi, o cuidador de crianças, não é para ser confundido com uma doula, uma ama. Em primeiro lugar, Ndezi, lida não apenas com bebês, mas com crianças e com o cuidado que deve ser dado a elas (Njeri, 2019, p. 13/14 apud Ani, 2018, s/p).

Deste modo, o trecho acima mais uma vez reitera que as noções universalizantes e limitadoras, ancoradas num modo de vida europeu e branco, não comportam a multiplicidade de se viver, ser e estar no mundo enquanto criança e adolescente, no Brasil, no Continente Africano, em comunidades quilombolas, ribeirinhas, favelas, dos povos indígenas e ciganos, assentados e todas as outras formas e expressões de sociabilidade que se opõem as dinâmicas do sistema capitalista.

Portanto, caminhando para as considerações finais que não pretendem ser conclusivas, e sim propositivas, pensarmos e produzirmos sobre infância e adolescência, ancorados em referenciais pluriversais e essencialmente decoloniais, é irmos contra os genocídios e extermínios (NASCIMENTO, 2017) que dia após dia se reatualizam acometendo diretamente a juventude negra, pobre e indígena. Destacamos o que Lélia Gonzalez (2018) afirmava em relação a democracia e a cidadania, de como a construção dessas foram abruptamente atravessadas pelo racismo e demais sistemas de opressão, impedindo assim a sua realização plena. Logo, não é possível termos um processo de “redemocratização” efetivo sem consideramos a centralidade desses aspectos na nossa formação social e histórica. Ampliamos o apontamento da autora, para a discussão que propomos neste material, ou seja, para uma justa redemocratização é necessário fugir à noção universalizante de infância e adolescência.

Considerações finais

É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança

(Provérbio Africano)

O percurso realizado neste artigo evidencia o quão urgente deve ser a discussão acerca da infância e adolescência, por meio de produções teóricas que nos direcionam a construir outros modelos possíveis. Essa construção, apresentada de maneira teórica nas linhas acima, deve ser ampliada para outras esferas e âmbitos da vida, tais como: espaços deliberativos, movimentos sociais, universidades – produções de conhecimento e afins.

Para isto, por meio de um olhar pluriversal sobre as infâncias e adolescências, debatemos de maneira crítica a partir do resgate sócio-histórico no Brasil colonial e pós-abolição. Neste movimento, as contribuições literárias de Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo evidenciam e reiteram o movimento decolonial e pluriversal deste arranjo – movimentos que possuem suas particularidades, mas não são dicotômicos e/ou hierarquizantes. São movimentos que dialogam entre si, partindo de uma noção anticapitalista e não eurocêntrica.

Portanto, é possível observamos que esta discussão abre possibilidades, atravessam questões como: a literatura, a sociabilidade capitalista, os processos sócio-históricos brasileiros, a filosofia africana e as políticas sociais, entre outros, evidenciando, mais uma vez, a urgência dessa temática.

Material suplementario
Referências
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BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990
EVARISTO, Conceição. Lumbiá. In:EVARISTO, Conceição. Olhos d’água. Rio de Janeiro: Pallas, 2016. 116 p. cap. 11, p. 69-73.
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FOURSHEY, Catherine Cymone; GONZALES, Rhonda M.; SAIDI, Chiristine. África Bantu: De 3500 a.C. até o presente. Petrópolis, RJ: Vozes, 2019.
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LIMA, Lana Lage da Gama; VENÂNCIO, Renato Pinto. Abandono de Crianças Negras no Rio de Janeiro. In: PRIORE, Mary Del. (org.) História da Criança no Brasil. 4. ed. São Paulo: Contexto, 1996. 176 p. cap. 4, p. 61-75.
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UNICEF. Convenção sobre os Direitos da Criança
Notas
Notas
1 Mestrando em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Orcid nº 0000-0002-5105-3730. E-mail: tarcisio_jj2013@outlook.com.
2 Mestranda em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Orcid nº 0000-0003-4577-386X. Email: rebecaribeiro@id.uff.br.
3 Compreendemos como golpe 2016 toda a movimentação orquestrada, a partir de interpretações das quais não compactuamos em relação a Constituição de 1988 e demais leis, com a finalidade de retirar uma presidenta democraticamente eleita pela população brasileira. Tal discussão apresenta ainda nos dias atuais divergências, porém, como posicionamento político, nomeamos essa movimentação de “golpe”, entendendo também que os processos que culminaram neste momento são antecedentes ao ano de 2016. Para maiores aprofundamentos acerca desta discussão, ver em: JINKINGS, I.; DORIA, k.; CLETO, M. Por que gritamos golpe? Para entender o impeachment e a crise política. São Paulo: Boitempo, 2016.
4 Apesar do estudo tratar de um período em que ainda não existia a categoria criança e adolescente, sendo esse público referenciado como menores, para esta análise será considerada a forma estabelecida pelo ECA – crianças e adolescentes; infância e juventude enquanto sujeitos. Considerando a importância dessa conquista histórica para esse público e buscando contribuir com o movimento que se faz cada vez mais urgente e necessário: romper com todos os estereótipos e preconceitos em torno da população infanto-juvenil, ainda presentes na sociedade e disseminados pelo senso comum.
5 Neste artigo a decolonialidade é eixo central da análise, estando presente em todos os momentos das próximas linhas a partir de uma pesquisa que tem compromisso com as produções e narrativas não eurocêntricas. Está presente no movimento constante que busca garantir – dentro dos limites postos pela realidade – o protagonismo dos povos historicamente oprimidos no instante em que se dedica a falar sobre esses. Compreendemos tal debate como sinônimo de ação, neste caso, uma ação teórica.
6 Destaca-se aqui que a edição a qual temos acesso do Diário de Bitita é uma das traduções do livro publicado em francês - o qual já não era uma versão original, pois foi traduzida dos manuscritos originais com o objetivo de agradar ao público francês. Os manuscritos originais foram entregues por Carolina para publicação à Clélia Pisa e Maryvonne Lapouge, com o título original de “Um Brasil para Brasileiros”. Ver mais em: Entrevista com Clélia Pisa (FERNANDEZ, 2014).
7 Termo originado no latim, que diz respeito a uma condição “sem a qual não pode acontecer”. Nesses termos, objetivamos tratar do caráter estruturalmente violento das relações sociais no capitalismo.
8 Há que se considerar que o cuidado e proteção maternais oferecido por essas mulheres às crianças brancas foi fundamental para o desenvolvimento desses sujeitos. Entretanto, essa relação não era de subserviência como a literatura dominante pretende demonstrar. Durante o exercício das tarefas domésticas, incluindo a educação dos filhos (biológicos ou das senhoras brancas), por exemplo, as mulheres negras garantiam a valorização e transmissão da cultura e valores afro-brasileiros, produzindo o que Lélia Gonzalez denominou como pretuguês, que seria a fala da língua portuguesa de forma africanizada (GONZALEZ, 2018).
9 O estudo de Lima e Venâncio (1996) diz respeito aos eventos ocorridos no Rio de Janeiro, porém cabe ressaltar que essas eram práticas comuns nas outras instituições de mesmo nome espalhadas pelo Brasil.
10 Era o mesmo lugar em que estava localizado o dispositivo da roda e funcionava como uma espécie de abrigo provisório, onde os bebês que eram abandonados na roda ficavam de um a dois meses. Tratava-se de um ambiente em condições insalubres, cujo índice de mortalidade era bastante elevado (LIMA; VENÂNCIO, 1996).
11 Demarcamos aqui o uso do termo branquitude para definir o grupo racial branco, que no interior de sociedades estruturadas no racismo, como a brasileira, foram colocados em um lugar de suposta superioridade e referência de universalidade. Os sujeitos brancos que se percebem como padrão a ser seguido, não se veem como um grupo racialmente definido e dotado de privilégios, tampouco identificam a participação que exercem na manutenção das desigualdades raciais, tornando-as um “problema do negro”. A pesquisa de Maria Aparecida Bento demonstra a forma como essas relações se organizam, ver em: Branqueamento e branquitude no Brasil (2019).
12 Mogobe Bertrand Ramose é um filósofo da África do Sul, um dos principais pensadores a popularizar a filosofia africana, e especificamente a Filosofia do Ubuntu internacionalmente. Ramose é professor de filosofia na Universidade da África do Sul em Pretória.
13 Diáspora é uma “palavra de origem grega que significa ‘dispersão’. Designando, de início, principalmente o movimento espontâneo dos judeus pelo mundo, hoje aplica-se também à desagregação que, compulsoriamente, por força do tráfico de escravos, espalhou negros africanos por todos os continentes [...] O termo “diáspora” serve também para designar, por extensão de sentido, os descendentes de africanos nas Américas e na Europa e o rico patrimônio cultural que construíram” (LOPES, 2004, p. 451).
14 Mais informações disponíveis em: Acesso em 22 out. 2022.
15 As histórias em torno das bonecas Abayomi são muitas, neste caso, após a participação de uma oficina sobre tal temática, a ligação das bonecas aos reencontros em quilombos foi pontuada. Consideramos interessante trazer isso no sentido de reforçar a presença e potência da oralidade na construção da identidade negra, como na sua manutenção e resgate.
16 No artigo compreende-se infância e adolescência como uma fase da vida que apresenta dinâmicas singulares e deve ser vivida em toda a sua complexidade. Ou seja, trata-se de um período concreto, e não um momento transitório e inferior em relação à vida adulta.
17 Disponível na integra em: Acesso em 22 de out. de 2022.
18 Disponível na integra em: Acesso em 22 de out. de 2022.
Notas de autor
1 Mestrando em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Orcid nº 0000-0002-5105-3730. E-mail: tarcisio_jj2013@outlook.com.
2 Mestranda em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio. Orcid nº 0000-0003-4577-386X. Email: rebecaribeiro@id.uff.br.
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