Recepción: 01 Junio 2023
Aprobación: 01 Agosto 2023
Resumo: O presente artigo objetiva apresentar os principais contributos da Tecnologia da Informação (TI) ao trabalho dos assistentes sociais. Partimos do pressuposto que a utilização da Tecnologia da Informação pelo Serviço Social é capaz de promover mudanças substantivas no processamento do trabalho profissional, uma vez que, pode contribuir para fomentar processos de avaliação e de monitoramento, o que consequentemente pode subsidiar o acesso aos direitos sociais por parte dos usuários. Contudo, é indispensável que o uso da Tecnologia da Informação se dê subordinada aos princípios e aos valores profissionais conquistados e construídos historicamente pela categoria profissional.
Palavras-chave: Serviço Social, Tecnologia da Informação, Covid-19, Projeto Ético-Político.
Abstract: This article aims to present the main contributions of Information Technology (IT) to the work of social workers. We start from the budget that the use of information technology by Social Work is capable of promoting substantive changes in the processing of professional work, since it can contribute to foster evaluation and monitoring processes, which consequently can subsidize access to social rightsby users. However, it is essential that the use of Information Technology be subordinated to the principles and professional values conquered and built historically by the professional category.
Keywords: Social Work, Information Technology, Covid-19, Ethical-Political Project.
Introdução
O ano de 2020 foi marcado por profundas mudanças sociais2, das quais, talvez a humanidade nunca se esqueça. Essas transformações ocorreram em função da pandemia da Covid-19, que se trata do vírus Sars-Cov-2, responsável por infecções respiratórias. O coronavírus, como é comumente conhecido, foi notificado, pela primeira vez, pelo governo chinês em 31 de dezembro de 20193, e em pouco tempo se espraiou por todos os continentes4, dado a facilidade da sua proliferação5, por meio de gotículas liberadas especialmente pelo nariz e pela boca.
Devido a sua alta propagação e letalidade, os países, em momentos distintos, seguindo as recomendações da Organização Mundial de Saúde6 (OMS) decretaram o distanciamento social ou o lockdown, a fim de evitarem um colapso no sistema da saúde e para minorar os danos e as perdas físicas. Face a isso, muitos trabalhadores passaram a desenvolver o seu trabalho, a partir das suas casas, segundo Matos (2020), o que perdurou pelos dois anos seguintes.
Com o Serviço Social, que se trata de um tipo de especialização do trabalho coletivo, inserido na divisão social e técnica do trabalho, não foi diferente (IAMAMOTO, 2012). Apesar de grande parte dos profissionais do Serviço Social ter trabalhado na linha de frente no combate à pandemia, dos quais merece destaque os assistentes sociais que atuam na prestação de serviços de saúde e da assistência social, muitos outros também se viram diante do home office e do trabalho remoto (MATOS, 2020). Contudo, aqueles que continuaram trabalhando também passaram a demandar maior utilização da tecnologia da informação, seja por meio das redes sociais, enquanto espaço para informar sobre os atendimentos e reordenamentos, como apontado por Matos (2020) ou para a divulgação de conteúdo, de aulas e de palestras realizados por meio de reuniões on-line, lives, dentre outros mecanismos (VELOSO, 2020).
Diante desse novo cenário de trabalho remoto, é possível notar que a Tecnologia da Informação (TI) assume ainda maior relevância para o exercício profissional do assistente social. No entanto, é importante notar que, desde muito antes, a profissão já fazia o uso deste recurso (VELOSO, 2011a; VELOSO 2011b; SILVA, 2003). Assim, ressalta-se que temos como hipótese de estudo que a tecnologia da informação pode potencializar os processos de trabalho nos quais o Serviço Social se insere, quando articulada ao Projeto Ético-Político da Profissão.
No entanto, apesar da tecnologia da informação se constituir enquanto uma importante mediação para o trabalho do assistente social, podemos evidenciar que poucos são os estudos que versam sobre o tema. E, nesta medida, buscamos no presente estudo ampliar as reflexões sobre o Serviço Social e a Tecnologia da Informação. Para tanto, temos como objetivo refletir sobre a importância do uso da Tecnologia da Informação para a profissão do assistente social.
Didaticamente dividimos o estudo em duas seções. Na primeira delas apresentaremos o conceito de Tecnologia da Informação e abordaremos a sua maior utilização desde fins da década de 1980, atendendo as transformações societárias vivenciadas a partir do processo de reestruturação produtiva. E na segunda seção, abordaremos as potencialidades propiciadas pelo uso da Tecnologia da Informação ao Serviço Social. Contudo, não pretendemos esgotar a complexidade que envolve a relação entre a Tecnologia da Informação e o Serviço Social.
Breves considerações sobre a Tecnologia da Informação
O acesso à Tecnologia da Informação foi amplamente difundido nas últimas décadas. Mas, cabe considerar que, as mudanças propiciadas pelas inovações tecnológicas devem ser apreendidas em consonância com o processo de produção e de reprodução das relações sociais e do desenvolvimento das forças produtivas, pois constitui-se enquanto uma das suas expressões.
Ao ampliarmos os nossos horizontes de análise, foi possível constatar que a década de 1980 foi decisiva para o avanço da utilização das Tecnologias da Informação, por meio do processo de aceleração do seu uso e da formação do chamado paradigma da tecnologia da informação (CASTELSS, 1999).
Esse processo foi ocasionado em função da chamada reestruturação produtiva ou da reestruturação capitalista, por meio da qual se promoveu um avanço exponencial das novas tecnologias, com o objetivo de acelerar o tempo de giro do capital (MANDEL, 1982 e NETTO, 1996). Tal modelo foi adotado como resposta à crise do modelo keynesiano de acumulação que, após três décadas, mostrou o seu exaurimento, sobretudo a partir de 1974, com a crise do petróleo. Essas mudanças no sistema econômico e tecnológico nos inseriram num novo patamar de produção, que é caracterizado por Castells (1999) como o capitalismo informacional. Portanto, a revolução tecnológica atual, que marca a tecnologia da informação,
originou-se e difundiu-se, não por acaso, em um período histórico da reestruturação global do capitalismo, para o qual foi uma ferramenta básica. Portanto, a nova sociedade emergente desse processo de transformação é capitalista e também informacional, embora apresente variação histórica considerável nos diferentes países, conforme sua história, cultura, instituições e relação específica com o capitalismo global e a tecnologia da informação (CASTELLS, 1999, p. 50, com grifos da autora).
As novas Tecnologias da Informação, portanto, foram responsáveis pela integração do mundo em redes globais de instrumentalidade, por meio de computadores e de comunidades virtuais. Tem-se, com a sua utilização, a capacidade “de transformar todas as informações em um sistema comum de informação, processando-as em velocidade e capacidade cada vez maiores e com custo cada vez mais reduzido”, o que foi totalmente profícuo à globalização do capitalismo, conforme observado por Castells (1999, p. 69).
Nesta perspectiva, é indispensável ressaltar no que se constitui a Tecnologia da Informação. Por Tecnologia da Informação, Castells (1999, p. 67) compreende todo “o conjunto convergente de tecnologias em microeletrônica, computação (software e hardware), telecomunicações/radiofusão, e optoeletrônica”. Além de outras tecnologias que também foram propiciadas em fins do século XX, como a nanotecnologia e uma série de inovações tecnológicas que foram asseguradas por meio da linguagem digital, a partir da qual a “informação é gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida” (CASTELLS, 1999, p. 68).
Dessa forma, a Tecnologia da Informação utiliza os conhecimentos e as informações para a geração de novos conhecimentos e de novos dispositivos de processamento e de comunicação da informação, permitindo sempre inovações tecnológicas que correspondam a necessidade do seu uso, em cada contexto do desenvolvimento das forças produtivas. Assim, faz-se mister destacar que
a tecnologia pode ser entendida como expressão do processo de desenvolvimento das forças produtivas da sociedade (sendo a principal delas o trabalho), destacando que, em termos gerais, a tecnologia pode ser compreendida como o estado de desenvolvimento social, explicada pelo conjunto da sociedade (VELOSO, 2011b, p. 74).
Isto é, a tecnologia é um produto do trabalho humano historicamente acumulado, que pode ser compreendida como um instrumento por meio do qual os seres humanos conseguem se relacionar com o mundo, a fim de alcançar determinadas finalidades. Portanto, as tecnologias da informação se constituem sempre em “amplificadores e de extensões da mente humana” (CASTELLS, 1999, p. 69), justamente porque é a partir do trabalho e da intervenção dos homens, que os instrumentos da tecnologia da informação são criados, tais como os computadores, os sistemas de programação e de comunicação, dentre outros.
Dito isto e tendo compreendido que a Tecnologia da Informação tem a sua gênese mais especificamente em contexto de busca pela superação da crise do capital, é possível compreender que a Tecnologia da Informação tem sido utilizada para salvaguardar os interesses do atual padrão de desenvolvimento das relações sociais, isto é, da sociedade capitalista. Logo, a Tecnologia da Informação tem sido difundida para satisfazer os interesses das classes dominantes, em detrimento do interesse da classe trabalhadora. E, deste feita, objetiva-se por meio do seu uso, a ampliação das taxas de extração da mais-valia, a redução dos custos de produção, por meio da substituição do trabalho vivo pelo trabalho morto e a ampliação dos limites de valorização do capital, que, como amplamente sabido, não tem quaisquer limites civilizatórios, como tão bem descreveu Mészáros (1989).
Mas, para além disso, é necessário destacar que, se o objetivo da Tecnologia da Informação é o de processar e o de distribuir informações e dados, as suas potencialidades podem ser utilizadas para distintos interesses, uma vez que, propicia o acesso a informação para todos os sujeitos que compõem a sociedade, conforme observado por Veloso (2011a).
Nesta medida, a Tecnologia da Informação também pode ser utilizada para atender aos interesses alternativos ao capital, isto é, os interesses do conjunto da classe trabalhadora. E assim, ao ser apropriada por esta classe, a Tecnologia da Informação pode contribuir tanto para conservar e para reproduzir os interesses do modo de produção capitalista, quanto para buscar a sua superação. Portanto, é necessário assinalar que a apropriação da Tecnologia da Informação tem também uma tarefa política, por meio da qual é necessária uma fundamentação crítica para a sua utilização. Desse modo, evita-se que seja processada apenas como um mero recurso técnico ou científico, como reproduzido pelo modo de produção capitalista.
Quando o projeto democratizante da sociedade se apropria da Tecnologia da Informação, muitas são as potencialidades que podem emergir, uma vez que, o seu uso propicia o acesso à informação, ao conhecimento e à socialização da informação. Tais potencialidades da Tecnologia da Informação podem ser muito profícuas, para o acompanhamento e para a fiscalização das políticas públicas, para a participação de manifestações e resistências contra a opressão, contra à expropriação dos direitos sociais e trabalhistas e para a organização coletiva dos trabalhadores, por meio da mobilização e da participação popular.
Neste sentido, é necessário que se vislumbre a Tecnologia da Informação como um importante recurso estratégico e fundamental para a organização da classe trabalhadora, na luta anticapitalista, quando utilizado todo o seu potencial não só quantitativo, mas também qualitativo, por meio das análises, das reflexões e das mobilizações que podem ser suscitadas, com base nos dados e nas informações referenciadas a partir dos recursos possibilitados pelos mecanismos tecnológicos. Nesta congruência, Veloso (2011b, p. 68) discorre que
evidencia-se, assim, uma luta pela apropriação e pelo uso da tecnologia, entendendo-a como importante questão política e social. Cabe aos sujeitos comprometidos com práticas democratizantes e emancipadoras buscar caminhos que possam engendrar sua apreensão e aplicação em favor dos interesses da classe trabalhadora. Assim, o que se levanta é justamente a possibilidade de o recurso tecnológico mediar o fortalecimento de princípios favoráveis aos trabalhadores (Veloso, 2011b, p. 68).
É possível apreender que as inovações tecnológicas se constituem enquanto campo de disputa entre os interesses das classes sociais fundamentais, a saber, capitalistas e trabalhadores, dado que inicialmente elas são elaboradas e construídas para atender as proposições do capital, buscando, por exemplo, a redução da mão de obra. Contudo, historicamente as Tecnologias da Informação podem ser apropriadas como recurso ao fortalecimento dos interesses dos trabalhadores, quando não utilizadas de formas mistificadoras, simplificadoras e reducionistas.
Nesta perspectiva, é importante assinalar que a utilização da Tecnologia da Informação é de grande relevância, sobretudo, para atividades de gerenciamento de informações e de dados. Portanto, com o seu uso, é possível que se tenha maior agilidade para acesso às informações e aos dados, bem como a sua melhor apreciação. Ainda oportuniza maior visibilidade e integração de dados que podem ser comparados, em diferentes formas de análise. Além de permitir uma maior flexibilidade e mobilidade para uso das informações, que podem ser acessadas de distintos lugares e até mesmo, por diferentes pessoas ao mesmo tempo, dentre outros aspectos positivos.
Isto posto, compreendemos que a utilização da Tecnologia da Informação é de suma importância para inúmeras profissões que trabalham com dados e informações a todo tempo, uma vez que, pode contribuir para a otimização do trabalho realizado, bem como por permitir a realização da análise crítica e comparativa das informações obtidas. Dentre as profissões, merece destaque, para fins deste estudo, o Serviço Social, que pode utilizar deste instrumento como um potencializador do seu exercício profissional. Assim, na próxima seção buscaremos discorrer sobre a importância da Tecnologia da Informação para os assistentes sociais, considerando os últimos anos que foram atravessados pela pandemia da Covid-19, que exigiu o distanciamento social. Em consequência, o uso de inúmeros recursos tecnológicos e informacionais foi impulsionado.
Tecnologia da Informação e Serviço Social
O Serviço Social é uma profissão que, como todas as outras não está aquém das transformações societárias, que marcaram as últimas décadas do desenvolvimento do modo de produção capitalista (Netto, 1996), que tem como uma de suas determinações o alargamento do uso das tecnologias da informação. Esse processo foi ocasionado, sobretudo com o uso e a popularização do acesso ao computador e a internet, em fins da década de 1990 (CASTELLS, 1999).
A utilização desses equipamentos pode potencializar os processos de trabalho nos quais o Serviço Social está inserido, pois os bancos de dados eletrônicos, os editores de texto, as planilhas e inúmeros outros programas e softwares existentes podem contribuir para a sistematização de dados e de informações sobre os usuários que são atendidos pelos profissionais assistentes sociais e também pelo equipamento em que o profissional atua (SILVA, 2003; VELOSO, 2011a; VELOSO, 2011b).
Especialmente a partir da década de 1990, a administração pública brasileira embebida pela reforma do Estado, e pela ascensão do neoliberalismo no país vem fomentando investimentos em tecnologias informacionais. Um dos primeiros espaços sociocupacionais nos quais está inserido o assistente social a incorporar a Tecnologia da Informação foi a Previdência Social, a partir do DATAPREV. Paulatinamente, outras políticas foram incorporando a Tecnologia da Informação, como o Sistema Único de Saúde (DATASUS) e o Sistema Único de Assistência Social com o Cadastro Único, com o Sistema de Gestão do Programa Bolsa Família e muitos outros, como afirma Santos (2019).
Conforme apontado por Veloso (2011b, p. 118), a utilização da tecnologia da informação pelo Serviço Social deve ser pensada como
mediação, como integrante de um conjunto de instrumentos, teórico-metodológicos, ético-políticos e técnico-instrumentais socialmente construídos que possibilitem à profissão alcançar as finalidades presentes em seu projeto profissional. Trata-se de um recurso que possui um potencial estratégico para seu trabalho profissional (...). Sua importância reside na possibilidade de potencializar, de imprimir uma mudança qualitativa ao trabalho profissional, a partir de seu uso como recurso capaz de propiciar a ampliação das capacidades e habilidades profissionais (Veloso, 2011b, p. 118).
Ressalta-se que a ampliação das habilidades e das capacidades propiciadas pelo uso da Tecnologia da Informação podem fomentar a capacidade e a dimensão investigativa da profissão, a partir de uma aproximação inicial da descrição dos dados, e, que, posteriormente pode ser mais bem trabalhada, com o uso de outros instrumentos, como a entrevista. Em função disso, podemos depreender que a importância do uso da Tecnologia da Informação pode ser imensurável, pois propicia fontes, registros, produção e recuperação de dados e informações, que se apropriadas, permitem ao assistente social tomar “um banho de realidade brasileira, munindo-se de dados, informações e indicadores que possibilitem identificar as expressões particulares da questão social assim como os processos sociais que as reproduzem” (IAMAMOTO, 2015, p. 37-38), visto que, na atualidade, um dos maiores desafios enfrentados pelo Serviço Social é justamente o de
desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano. Enfim, ser um profissional propositivo e não só executivo (IAMAMOTO, 2015, p, 20).
Isto é, a tecnologia da informação pode ser utilizada para que o profissional conheça criticamente a realidade dos seus usuários, para que possa intervir nela. Contudo, é necessário que o profissional olhe para os dados, além de meros número. Assim, a utilização da Tecnologia da Informação pode propiciar também um salto qualitativo, que permite decifrar a realidade e construir propostas e novas modalidades de intervenção e de atendimento, que possam promover mudanças na estrutura das desigualdades sociais que estruturalmente marcam a sociedade brasileira (VELOSO, 2020). Mas é importante observar que tais condicionalidades não dependem unicamente do profissional, pois têm relação direta com a contradição entre capital x trabalho, processo este marcado por inúmeras lutas, que vêm se aprofundando com a celeridade das expropriações dos direitos sociais e trabalhistas no Brasil.
A apropriação e o acúmulo produzido a partir dos dados sistematizados sobre a realidade social pode contribuir também para a elaboração e para a criação de propostas destinadas às políticas sociais, por meio da execução de programas e de projetos que sejam mais condizentes com as demandas da população usuária, do que com as demandas da instituição empregadora7. Por isso a apropriação da Tecnologia da Informação é tão importante para a categoria profissional, pois os assistentes sociais não atuam apenas na execução terminal das políticas sociais, mas muitos são os profissionais que trabalham no planejamento, na elaboração, na formulação, na gestão e na avaliação das políticas sociais, como abordado por Iamamoto (2015) e por Veloso (2011b). Nesta perspectiva, é possível afirmar que
o conhecimento e o uso da TI colocam a possibilidade de lidar com uma grande quantidade de dados, extraindo deles informações preciosas para o trabalho, que, por sua vez, possibilitam a avaliação e a construção de novas propostas de intervenção. Considera-se a capacidade de gerir, controlar e distribuir a informação um aspecto de grande importância para o trabalho, já que, além de subsidiar a tomada de decisões e otimizar a condução dos processos de gestão, pode potencializar o exercício profissional, principalmente no que se refere à sistematização da prática e ao desenvolvimento da postura investigativa inerente ao exercício profissional (VELOSO, 2015b, p. 25).
Outro aspecto importante sobre o uso da Tecnologia da Informação pelo Serviço Social, consiste na possibilidade da otimização do trabalho do assistente social, já que o seu uso, permite, por exemplo, acesso ao prontuário, ao Plano Individual de Atendimento (PIA), dentre outras fontes de informação sobre os usuários, de maneira muito mais rápida e articulada, sem que o profissional passe horas procurando esses documentos nos arquivos da instituição, que por vezes acabam se perdendo em processos de mudanças de prédios que, porventura, ocorrem. Além de ser muito importante também para equipamentos nos quais os profissionais trabalham no sistema de plantão, pois, dessa forma, quando a nova equipe assumir o plantão, as informações e registros serão de mais fácil acesso.
Assim, faz-se mister ressaltar que o uso da Tecnologia da Informação propicia outras mudanças qualitativas ao trabalho do assistente social, uma vez que, pode assegurar a redução da demanda por trabalho mecânico e manual, ao mesmo tempo em que promove um aumento da necessidade do trabalho intelectual, em decorrência das novas possibilidades de ação, de pesquisa e de intervenção que foram facultadas a partir da sistematização realizada, como mencionou Veloso (2011b).
Desta feita, apreende-se que o uso da Tecnologia da Informação, quando articulado as dimensões técnico-operativo, ético-político e teórico-metodológica pode contribuir para o trabalho do assistente social, funcionando como uma mediação, para que se promova uma maior qualidade dos serviços prestados à população usuária. Inclusive, cabe ressaltar que este é um dos pilares da execução do exercício dos profissionais comprometidos com o Projeto Ético-Político do Serviço Social, afinal, trata-se do X8 (décimo) princípio do Código de Ética da profissão.
Outra potencialidade do uso da Tecnologia da Informação pelo Serviço Social consiste no fato de que os profissionais podem contribuir para a socialização do acesso às informações para os usuários, bem como para toda a sociedade, o que também se constitui enquanto um dos deveres9 do assistente social na sua relação com os usuários. Essa socialização pode ser realizada por meio da criação de folders, por meio da exibição e compartilhamento de vídeos e de outros materiais educativos e informativos. Tais ações podem oportunizar o acesso aos direitos sociais conquistados historicamente (VELOSO, 2011a).
Além disso, o assistente social a partir das informações obtidas por meio das pesquisas e dos estudos realizados, otimizados pela tecnologia da informação, podem e devem, segundo o artigo 5º, alínea d, do Código de Ética “devolver as informações colhidas nos estudos e pesquisas aos/às usuários/as, no sentido de que estes possam usá-los para o fortalecimento dos seus interesses” (CFESS, 2012, p. 29). Face a isso, concordamos com Veloso (2011b, p. 122) ao afirmar que
a TI é concebida como uma das formas disponíveis para potencializar e instrumentalizar o trabalho profissional com vistas a avançar na luta pela defesa de direitos, pela ampliação e consolidação da cidadania, e pelo aprofundamento da democracia, demandando, neste sentido, uma utilização marcada pela competência crítica, e não apenas tecnológica (Veloso, 2011b, p. 122).
Ainda nesse sentido, é de suma importância considerar que, o assistente social precisa tentar construir alternativas, para que o uso da Tecnologia da Informação tenha como objetivo a emancipação e a defesa dos direitos sociais. Isto é, que sirva para a satisfação dos interesses dos usuários, caso contrário, contribuirá para que a utilização da tecnologia se torne um instrumento “policialesco”, de controle, de dominação, de opressão e de gerenciamento. Processo esse favorável à lógica capitalista e ultraneoliberal, deliberadamente assumida no trato da “questão social” desde à década de 1990, pois poderá contribuir, por exemplo, para que usuários percam os seus benefícios e não se enquadrem nas condicionalidades de acesso a determinada política (SILVA, 2003).
É lícito ressaltar que as potencialidades da tecnologia da informação por si só não proporcionam automaticamente ganhos para os usuários e para a profissão. Como mencionou Veloso (2011, p. 84):
O aprimoramento do trabalho ou a solução de problemas e dilemas profissionais não será produto exclusivo da incorporação da TI ao trabalho do Serviço Social. A solução será decorrência da capacidade que os profissionais possuírem de definir e alcançar projetos e finalidades; a tecnologia nada mais é do que uma das mediações para alcançá-las (Veloso, 2011, p. 84).
Nesta direção, é importante resgatar que o efeito útil ou o valor de uso da Tecnologia da Informação para o Serviço Social só será possibilitado a partir do seu uso crítico, como uma mediação que pode potencializar e oportunizar uma dinamização do trabalho profissional a partir da sua utilização, somada a outros instrumentos de trabalho do Serviço Social. Caso contrário, incorre-se ao tecnicismo (VELOSO, 2011).
Apesar de todas as potencialidades que o uso da Tecnologia da Informação apresenta para a profissão do assistente social, a sua utilização ainda é embrionária e incipiente, como demonstra Veloso (2011b) e Silva (2003). À vista disso, é necessário ressaltar que, a sua utilização não depende unicamente da boa vontade dos profissionais, mas apresentam outros determinantes insuprimíveis, quais sejam: a importância da formação profissional abarcar a utilização da Tecnologia da Informação; a necessidade que se tenha recursos físicos e materiais ofertados pela instituição empregadora, para que os profissionais possam operacionalizá-los; além, é claro, da própria iniciativa do profissional, para que possa utilizar os recursos ofertados, de forma crítica e concreta, com o objetivo de potencializar e de otimizar o seu trabalho.
Nos últimos dois ou três anos quando vivenciamos um momento atípico, em função da pandemia da Covid-19, foi possível observar que o processo de utilização da Tecnologia da Informação que já estava em curso ganhou maior fôlego, haja vista a necessidade do lockdown e do isolamento social. Deste cenário da Covid-19, inúmeras instituições passaram a utilizar sistemas eletrônicos, para prontuários, para atendimentos e teleatendimentos.
Em decorrência disso, o uso da tecnologia se tornou fundamental. O próprio Conselho Federal de Serviço Social referendou a importância dos prontuários e informações digitais, pois permitem acesso aos profissionais que estão trabalhando remotamente. Alguns atendimentos sociais passaram a se efetivar através do teletrabalho, quando em situações em que o atendimento presencial fora impossibilitado. Com isso, pretendeu-se evitar a descontinuidade dos atendimentos aos usuários, que foram realizados de forma remota, mediados pela Tecnologia da Informação. Entretanto, tais medidas estão sendo realizadas em contexto de excepcionalidade e carecem de debates mais amplos por parte da categoria profissional, segundo o CFESS (2020).
É notório ainda o fato de que a utilização da Tecnologia da Informação imposta nestes nefastos tempos da pandemia da Covid-19 apresenta implicações importantíssimas, pois algumas frações das camadas mais subalternizadas pelo capital em parte são excluídas dos meios digitais. E, com isso, não conseguiram acessar benefícios, como o chamado Auxílio Emergencial do Governo Federal. Bem como enfrentaram dificuldades ou não tiveram acesso ao teleatendimento em outros equipamentos públicos que utilizaram do recurso da Tecnologia da Informação para atendimento. À vista disso, consequentemente não conseguiram ter as suas demandas ouvidas, o que, por sua vez, contribuiu para um cenário de negação de direitos, que entre nós é recorrente, é importante ressaltar.
Isto posto, pode-se aferir o quanto é importante que o Serviço Social se aproprie do debate sobre as Tecnologias da Informação, principalmente diante desse cenário no qual a sua exigência não se dá apenas em função das transformações tecnológicas exigidas pelo capital, mas também porque a partir do contexto da pandemia da Covid-19, o trabalho remoto e o domínio da tecnologia da informação se tornou uma imposição para parte da categoria profissional por meio das instituições empregadoras.
Conclusão
Buscamos no presente estudo assinalar a importância da apropriação da Tecnologia da Informação pelo Serviço Social. E nessa medida, foi possível constatar que, a Tecnologia da Informação se constitui enquanto uma mediação que possui um potencial estratégico para a profissão, pois, permite aos profissionais a otimização do seu trabalho, possibilita a criação e a atualização de bancos de dados com informações dos usuários. Além de oportunizar o cruzamento de dados, a avaliação e o monitoramento das informações dos usuários e dos atendimentos realizados na instituição.
Muitas são as possibilidades e os desafios da apropriação da Tecnologia da Informação para o Serviço Social. Portanto, as suas potencialidades só poderão ser plenamente absorvidas pela profissão, à medida que, o seu uso se dê subordinado aos valores e aos princípios fundamentais para o exercício profissional dos assistentes sociais. Melhor dizendo, em observância com as dimensões teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativos, para que assim, contribua para a ampliação das possibilidades engendradas pela profissão, conferindo prioridade ao atendimento das demandas e dos interesses dos trabalhadores. Para que assim, não se incorra ao risco do aprofundamento da chamada racionalidade instrumental da profissão.
Ao longo do processo investigativo, foi possível evidenciar que há poucas produções que versam sobre o trabalho do assistente social e a Tecnologia da Informação. Portanto, tendo compreendido a importância da utilização deste instrumento pelo Serviço Social, ressaltamos que é de suma importância que a categoria se aproprie do tema, invista em atividades de diálogos, com amplos debates. A partir disso, é necessário também o envolvimento dos profissionais em cursos de formação e de capacitação, para que as potencialidades da tecnologia possam ser apropriadas pela profissão, de forma crítica. Afinal, a Tecnologia da Informação também se trata de um instrumento que pode ser utilizado em perspectiva contra hegemônica, conforme buscamos demonstrar.
Referências
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Notas
Notas de autor