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Robert Cox e a Hegemonia Mundial: uma abordagem gramsciana?
Robert Cox and Global Hegemony: a Gramscian approach?
O Social em Questão, vol. 1, núm. 62, pp. 285-304, 2025
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro



Recepción: 01 Julio 2023

Aprobación: 01 Mayo 2024

Resumo: Em sua trajetória intelectual, Robert W. Cox refletiu acerca do papel dos organismos internacionais para a compreensão da dinâmica do sistema internacional. Para isso, o autor canadense lançou mão de conceitos gramscianos e apontou que a hegemonia mundial tem, simultaneamente, uma estrutura social, uma econômica e uma política; ademais, países como Brasil estão perifericamente inseridos nesse arranjo. Além de examinar a intepretação singular de Cox da concepção gramsciana de hegemonia, pretende-se perceber o quanto a ausência de uma vontade coletiva nacional-popular no Brasil é parte essencial (e estrutural) do processo de manutenção da sua condição periférica.

Palavras-chave: Antonio Gramsci, Robert Cox, Hegemonia, Vontade Coletiva Nacional-Popular.

Abstract: In his intellectual career, Robert W. Cox reflected on the role of international organizations in understanding the dynamics of the international system. For this, the Canadian author accessed Gramscian concepts and pointed out that global hegemony has, simultaneously, a social, an economic and a political structure; moreover, countries like Brazil are peripherally inserted in this arrangement. In addition to examining Cox’s singular interpretation of Gramsci’s conception of hegemony, the aim is to realize how much the absence of a collective national-popular will in Brazil is an essential (and structural) part of the process of maintaining its peripheral condition.

Keywords: Antonio Gramsci, Robert Cox, Hegemony, Collective National-Popular Will.

Introdução

Devido à sua atuação na Organização Internacional do Trabalho (OIT), parte da produção acadêmica de Robert W. Cox reflete a preocupação com o papel dos organismos internacionais. Editado principalmente nas décadas de 1970 e 1980, reivindicou particularmente o filósofo italiano Antonio Gramsci para conseguir o seu objetivo de fazer uma revisão da teoria hegemônica3 nas relações internacionais. Não se considerando propriamente um estudioso de Gramsci, Cox utilizou as categorias gramscianas para entender o campo das relações internacionais.

Tal movimento que propõe estender o pensamento gramsciano ao estudo das relações internacionais e da economia política internacional é relativamente recente e envolveu poucos estudos ambiciosos no sentido de definir as origens, o desenvolvimento e a dinâmica da economia política global em curso.

Contrapondo-se às formulações realista e liberal, bem como assumindo a impossibilidade de se fazer uma ciência neutra, Cox acusa ambas as correntes de reforçarem o papel dos Estados Unidos como potência hegemônica. O autor canadense aborda conceitos gramscianos como Estado, sociedade civil, guerra de movimento e guerra de posição, revolução passiva, transformismo entre outros, com destaque para o conceito de hegemonia, para o entendimento dos organismos internacionais.

Para a construção de um “bloco contra-hegemônico”4, é indispensável que países periféricos – como o Brasil – deixem de emular os modelos hegemônicos predominantes, uma vez que estes potencializam o status quo. Enfim, embora com apropriações limitadas da obra gramsciana, permanece em Cox uma perspectiva inovadora em relação às abordagens internacionalistas tradicionais.

A partir das análises de Gramsci sobre o conceito de revolução passiva, se compreende as relações que se estabelecem entre a formação dos Estados nacionais e o sistema internacional. Aponta-se, ainda, para a relação entre este sistema e o modo de produção capitalista. Para Gramsci, a inserção dos países no sistema capitalista ocorre de maneira desigual. Junto às grandes potências econômicas, formam-se países economicamente frágeis e subordinados: são as periferias do sistema, são os países dependentes. As distintas revoluções passivas nacionais devem ser analisadas como variantes determinadas pelas condições de um sistema político internacional específico a partir de uma conjuntura específica do capitalismo mundial.

Para o autor canadense, os sistemas hegemônicos nacionais só podem ser compreendidos em relação aos sistemas hegemônicos internacionais. “Uma hegemonia mundial é, em seus primórdios, uma expansão para o exterior da hegemonia interna (nacional) estabelecida por uma classe social dominante” (COX, 2007, p. 118). Os cadernos carcerários, no entanto, evidenciam não apenas uma simples separação entre o nacional e o internacional, Gramsci se propõe a analisar o nexo orgânico que os vincula. Ou seja, “existe um laço vital que liga permanentemente os pares conceituais de modo a compor um fio condutor unitário de sua existência. Assim, é impossível caracterizar o nacional sem se referir ao internacional, e vice-versa” (AMUSQUIVAR, 2021, p. 187-188).

Neste sentido, o objetivo essencial deste artigo é ratificar que, ao não conseguir estabelecer historicamente uma “vontade coletiva nacional-popular”, o Brasil perde a condição de se consolidar de forma autônoma em âmbito internacional.

Sociedade Civil e Relações Internacionais

Nota-se a falta de uma posição expressiva para o marxismo no debate teórico das relações internacionais. Neste campo, tem-se as contribuições dos autores alinhados à teoria crítica. Uma delas, sob uma clara influência gramsciana, é a ampliação do conceito de Estado. Nas palavras de Cox:

[A] visão da hegemonia levou Gramsci a ampliar sua definição e Estado. Quando o aparato administrativo, executivo e coercitivo do governo estava de fato sujeito à hegemonia da classe dirigente de uma formação social inteira, não fazia sentido limitar a definição de Estado àqueles elementos do governo. Para fazer sentido, a noção de Estado também teria de incluir as bases da estrutura política da sociedade civil. Gramsci pensava nessas bases em termos históricos concretos – a Igreja, o sistema educacional, a imprensa, todas as instituições que ajudavam a criar nas pessoas certos tipos de comportamento e expectativas coerentes com a ordem social hegemônica (COX, 2007, p. 104).

Com a maior abrangência do conceito de Estado pela teoria crítica, desenvolve-se também a sociedade civil como agente importante, antes desconsiderada nas formulações de relações internacionais. Em virtude das mais diversas concepções que o conceito de sociedade civil recebe hoje, faremos um breve retorno a ele antes de prosseguir propriamente nos debates da área, lançando mão das contribuições de Liguori (2006).

Foi Gramsci o teórico capaz de captar precisamente a dimensão fundamental das relações de poder numa sociedade capitalista desenvolvida e avançada. Aquilo que o filósofo sardo se refere inicialmente como “trama privada” e mais adiante chamará de “aparelhos privados de hegemonia”, de “sociedade civil”. Ao mesmo tempo, porém, que superava de maneira ousada as características originais do conceito, atualizava, de forma singular diversos dos seus significados, evidenciando os embates por meio dos quais se construiu historicamente a concepção de sociedade civil.

No Oriente, o Estado era tudo, a sociedade civil era primitiva e gelatinosa; no Ocidente, havia entre o Estado e a sociedade civil uma relação apropriada e, ao oscilar o Estado, podia-se imediatamente reconhecer uma robusta estrutura da sociedade civil. O Estado era apenas uma trincheira avançada, por trás da qual se situava uma robusta cadeia de fortalezas e casamatas; em medida diversa de Estado para Estado, é claro, mas exatamente isto exigia um acurado reconhecimento de caráter nacional (GRAMSCI, 2000, p. 262).

A filosofia política gramsciana empreenderá um desenvolvimento novo e abrangente a partir dos conceitos básicos de Marx, Engels e Lenin, mas não se pode esquecer que toda a sua obra se filia a essa tradição revolucionária. Ainda que não seja fundador, Gramsci é quem mais aprofundou a filosofia da práxis5. Em sua concepção não há realidade “objetiva” sem que venha acompanhada pela atividade consciente dos homens, não há uma economia que não seja compreensível dentro de um “mercado determinado”.

Não há isolamento da sociedade civil com relação ao mundo da produção. A sociedade civil é o momento organizativo a mediar as relações de produção e a ordenação do Estado, produzindo organização e convencimento. Por meio de sua imbricação estatal, a sociedade civil é o local da formulação e da reflexão, da consolidação dos projetos sociais, bem como das vontades coletivas.

Na tradição materialista, o Estado é posterior, secundário ou subordinado à sociedade civil, tanto em seus elementos culturais quanto nos elementos materiais. No entanto, a essa leitura (que é a inversa do idealismo), o marxismo soma a abordagem dialética e não mecanicista, que tem por meta se opor à dicotomia entre a esfera pública e privada, socioeconômico e político, sociedade civil e Estado, capturando o movimento de suas relações, e demonstrando que o poder (e a política) são intermediações entre esses momentos. Por isso, fala-se em “Estado integral”, sem uma separação rígida entre economia, política e sociedade. Nas palavras do próprio Gramsci:

[...] por ‘Estado’ deve-se entender, além do aparelho de governo, também o aparelho ‘privado’ de hegemonia ou sociedade civil. Deve-se notar que, desta crítica ao ‘Estado’ que não intervém, que está a reboque dos acontecimentos etc., nasce a corrente ideológica ditatorial de direita com seu fortalecimento do Executivo (GRAMSCI, 2000, p. 254-255).

Estamos sempre no terreno da identificação de Estado e Governo, identificação que é, precisamente, uma representação da forma corporativo-econômica, isto é, da confusão entre sociedade civil e sociedade política, uma vez que se deve notar que, na noção geral de Estado entram elementos que devem ser remetidos à noção de sociedade civil (no sentido, seria possível dizer, de que Estado = sociedade política + sociedade civil, isto é, hegemonia couraçada de coerção) (GRAMSCI, 2000, p. 244).

É por isso que Gramsci faz inúmeras referências em seus Cadernos do Cárcere sobre a “unidade orgânica” entre Estado e sociedade civil. Se há uma distinção entre ambos, esta é de natureza meramente metodológica, mas nunca orgânica6. Assim como o conceito de Estado é amplificado, também é o conceito de política. Para Liguori, “Gramsci redefiniu o conceito de Estado, mas também ampliou o conceito de política. Separar sociedade do Estado, da política e da economia, sociedade e política, em qualquer direção que se deseje proceder, está fora da esteira do seu pensamento” (LIGUORI, 2006, p. 7).

A política externa dos países continua submetida aos constrangimentos externos ou estruturais, mas os constrangimentos impostos internamente também são de igual relevância. É uma via de mão dupla entre agente e estrutura, num processo dialético. Segundo abordagens realistas, os interesses dos Estados são determinantes nas relações internacionais. A isso Cox acrescenta que sim, são relevantes, contudo, esses interesses mudam segundo a época e o bloco histórico7 que hegemoniza o poder de cada Estado. Neste sentido, é fundamental extrair do pensamento gramsciano o quanto a noção de supremacia se aprimorou nas sociedades capitalistas avançadas:

[...] A supremacia de um grupo social se manifesta de dois modos, como ‘domínio’ e como ‘direção intelectual e moral’. Um grupo social domina os grupos adversários, que visa a ‘liquidar’ ou a submeter inclusive com a força armada, e dirige os grupos afins e aliados. Um grupo social pode e, aliás, deve ser dirigente já antes de conquistar o poder governamental (esta é uma das condições principais para a própria conquista do poder); depois, quando exerce o poder e mesmo se o mantém fortemente nas mãos, torna-se dominante, mas deve continuar a ser também ‘dirigente’. (GRAMSCI, 2002, p. 62-63).

Embora Cox entenda que “Gramsci não tenha diretamente muito a dizer sobre relações internacionais” (COX, 2007, p. 101), à medida que o filósofo sardo buscava compor sua definição de “nacional”, as relações internacionais também apareciam em seus escritos carcerários. De acordo com Érika Amusquivar:

Apesar dos estudos contemporâneos, sobretudo no campo das relações internacionais, a respeito do ponto de partida do pensamento gramsciano – nacional ou internacional – a questão é que os temas apresentados nos Cadernos do Cárcere merecem uma leitura filológica. A ‘divisão fronteiriça’ para Gramsci não estava assentada propriamente na fronteira geográfica, mas do desenvolvimento histórico desigual e combinado. O autor sardo compreende que o componente nacional ou internacional não está condicionado somente aos limites do Estado-nação, mas ao seu desenvolvimento histórico. Gramsci não está, portanto, introduzindo em seus estudos uma contraposição entre nacional e internacional, destacando uma complementariedade, isto é, um nexo entre nacional e internacional, um vínculo indissociável ao passo que o autor sardo compreende que os problemas internacionais estão vinculados aos nacionais e vice-versa (AMUSQUIVAR, 2021, p. 179).

Referindo-se às relações internacionais, Gramsci compreende os nexos orgânicos entre as concepções de nacional-internacional como sendo um dos pilares de seu pensamento. A partir dessas perspectivas apontadas nos Cadernos do Cárcere, Cox acaba por recorrer de maneira limitada à tradução do conceito gramsciano de hegemonia. Apesar de o autor canadense se afastar da interpretação de hegemonia como sinônimo de uma relação exclusivamente entre os Estados ou até mesmo de um imperialismo (COX, 2007, p. 115), ele adota o termo “domínio”. Assim, “Cox ao adaptar o conceito gramsciano ao plano internacional – utiliza o termo hegemonia mundial – se refere a uma expansão para o exterior da hegemonia interna (nacional) estabelecida por uma classe dominante” (AMUSQUIVAR, 2021, p. 186). Seguindo esse entendimento:

A hegemonia no plano internacional não é apenas uma ordem entre Estados. É uma ordem no interior de uma economia mundial com um modo de produção dominante que penetra todos os países e se vincula a outros modos de produção subordinados. É também um complexo de relações sociais internacionais que une as classes sociais de diversos países. A hegemonia mundial pode ser definida como uma estrutura social, uma estrutura econômica e uma estrutura política, e não pode ser apenas uma dessas estruturas: tem de ser todas as três ao mesmo tempo. Além disso, a hegemonia mundial se expressa em normas, instituições e mecanismos universais que estabelecem regras gerais de comportamento para os Estados e para as forças da sociedade civil que atuam além das fronteiras nacionais – regras que apoiam o modo de produção dominante (COX, 2007, p. 118-119).

Novamente, em Gramsci, não há uma mera separação entre o nacional e o internacional; muito ao contrário, em algumas passagens de seus manuscritos carcerários, o filósofo sardo analisa o vínculo orgânico entre nacional-internacional. Assim, quando Cox afirma que “no modelo hegemônico mundial, a hegemonia é mais intensa e coerente no centro e tem muito mais contradições na periferia” (Ibidem, p. 118) parece se afastar do nexo nacional-internacional, bem como do rigor metodológico e filológico exigidos pelos estudos gramscianos.

Guerra de Movimento, Guerra de Posição e Revolução Passiva

Cox faz um resgate de três conceitos desenvolvidos por Gramsci que serão úteis para pensar uma nova hegemonia em nível internacional, assim como seu contexto histórico que consagra os Estados Unidos como potência e o desenvolvimento de diversas organizações internacionais.

Gramsci escreve a maioria da sua obra no cárcere fascista e, neste contexto, redige comentários sobre uma das maiores polêmicas que o antecedeu entre Lenin e Rosa de Luxemburgo, acerca de qual seria a estratégia revolucionária mais acertada. Para enfrentar esse debate, mais uma vez busca-se respostas na sociedade civil e na diferença da sua relação com o Estado na Rússia e na Europa Ocidental (especialmente Alemanha). Nas palavras, respectivamente, de Gramsci e de Cox:

A guerra de posição exige enormes sacrifícios de massas imensas de população; por isto, é necessária uma concentração inaudita da hegemonia e, portanto, uma forma de governo mais ‘intervencionista’, que mais abertamente tome a ofensiva contra os opositores e organize permanentemente a ‘impossibilidade’ de desagregação interna: controles de todo tipo, políticos, administrativos etc., reforço das ‘posições’ hegemônicas do grupo dominante etc. Tudo isto indica que se entrou numa fase culminante da situação político-histórica, porque na política a ‘guerra de posição’, uma vez vencida, é definitivamente decidida. Ou seja, na política subsiste a guerra de movimento enquanto se trata de conquistar posições não decisivas e, portanto, não se podem mobilizar todos os recursos de hegemonia e do Estado; mas quando, por uma razão ou por outra, estas posições perderam seu valor e só aquelas decisivas têm importância, então se passa à guerra de assédio, sob pressão, difícil, em que se exigem qualidades excepcionais de paciência e espírito inventivo. Na política o assédio é recíproco, apesar de todas as aparências, e só o fato de que o dominante deve ostentar todos os seus recursos demonstra o cálculo que ele faz do adversário (GRAMSCI, 2000, p. 255-256) [grifos nossos].

[...] Gramsci dizia que a guerra de movimento não poderia ser efetiva contra os Estados-sociedades hegemônicos da Europa Ocidental. A estratégia alternativa é a guerra de posição, que lentamente constrói os fundamentos dos alicerces sociais de um novo Estado. Na Europa Ocidental, a luta tinha de ser vencida no seio da sociedade civil, antes que um assalto ao Estado pudesse ter êxito. Um ataque prematuro ao Estado, por meio de uma guerra de movimento, só revelaria a fraqueza da oposição e levaria à reimposição do domínio burguês, à medida que as instituições da sociedade civil reafirmassem seu controle (COX, 2007, p. 107) [grifos nossos]

Interessante ressaltar que Cox está atento não apenas ao que já tinha se passado, mas também ao que ocorreu a partir das pós-formulações gramscianas, como o desenvolvimento da social-democracia na Europa.

O terceiro conceito desenvolvido por Gramsci é o de “revolução sem revolução”, mais conhecido como revolução passiva. Inspirado pela experiência italiana, em algumas sociedades as velhas e as novas forças sociais não conseguiram constituir um bloco histórico consistente para impor completamente sua hegemonia, numa dialética de revolução-restauração. Citando Cox: “nessas sociedades, a nova burguesia industrial não chegou à hegemonia. O impasse resultante com as classes sociais tradicionalmente dominantes criou as condições para a ‘revolução passiva’: a introdução e mudanças que não envolveram nenhuma sublevação de forças populares” (Ibidem, p. 108).

Para entender a ausência das forças populares nas mudanças que ocorrem numa situação de revolução passiva, Cox usará conceitos gramscianos buscados em Maquiavel. Para o autor canadense, “Gramsci retirou de Maquiavel a imagem do poder como um centauro, metade homem, metade animal, uma combinação necessária de consentimento e coerção. Enquanto o aspecto consensual do poder está em primeiro plano, a hegemonia prevalece. A coerção está sempre latente, mas só é aplicada em casos marginais, anômalos” (Ibidem, p. 105). Na literatura marxista clássica, os conceitos utilizados seriam conflito ou luta, e não coerção e coesão; assim como se fala em classes sociais, e não forças sociais.

Mais importante, porém, que entender a aplicação dos conceitos, é capturar a concepção do autor. A construção da hegemonia vai além da violência física, precisando de mais do que isso para se legitimar. Ela tem a capacidade inclusive de fazer com que as forças populares defendam interesses divergentes dos seus, mas adequados a seus opressores, como no caso do fascismo na Itália. Esse fenômeno Cox mantém a nomenclatura gramsciana de transformismo, pertinente aos países de Terceiro Mundo em processo de industrialização.

O transformismo trabalhava para cooptar líderes potenciais de grupos sociais subalternos. Por extensão, o transformismo pode servir de estratégia de assimilação e domesticação de ideias potencialmente perigosas, ajustando-as às políticas da coalizão dominante e pode dessa forma, obstruir a formação de uma oposição organizada, com base na classe, ao poder social e político estabelecido (COX, 2007, p. 109).

Antes de seguir na análise das relações internacionais, Cox abordou ainda um conceito gramsciano que contribuiu bastante para as suas formulações: o de intelectual orgânico, além de esmiuçar o papel do partido. Para a conformação de um bloco histórico, seria necessária uma campanha que influenciasse os mais amplos setores da sociedade civil segundo a leitura e as formulações revolucionárias, protagonizada pelos intelectuais orgânicos da classe transformadora. Sua função, como já mencionamos, é de “criar e sustentar as imagens mentais, tecnologias e organizações que mantêm coesos os membros de uma classe e de um bloco histórico ao redor de uma identidade comum” (Ibidem, p. 112). Essa identidade comum corroborava tanto a construção de instituições quanto de ideologias.

Hegemonia, Organismos Internacionais e Relações Internacionais

O conceito gramsciano de hegemonia é um dos mais utilizados, seja nas relações internacionais, seja na ciência política. Ao mesmo tempo, é a categoria que mais interpretações controversas recebeu, a ponto de gerar inclusive leituras de tendências diferentes, como as inspiradas em Lenin ou em Norberto Bobbio. A autora Anna Di Biagio (2010) explora essa temática, e denuncia a tentativa de Bobbio de separar Lenin e Gramsci ressaltando suas diferenças, de modo que apenas o segundo seria o teórico da hegemonia, pois apenas o filósofo sardo teria abordado as temáticas relativas à cultura. Acredita-se que Cox busque suas raízes numa leitura de Gramsci análoga à feita por Di Biagio, que faz um resgate histórico de como o conceito – embora não sendo central na obra leniniana – já estava presente enquanto raiz da reflexão gramsciana.

Em primeiro lugar, deve-se destacar que o uso do conceito de hegemonia, uma vez destinado exclusivamente às exigências de luta contra o ‘economicismo’, contém em si elementos suscetíveis de favorecer uma acepção do termo que tendia a privilegiar o domínio sobre a influência, a enfatizar, por isso, ‘o aspecto coercitivo em relação ao persuasivo, a força em relação à direção, a submissão em relação ao consenso’. [...] Na verdade, o momento da direção cultural esteve presente em Lenin, e não só a partir da introdução da NEP, toda vez que ele considerava realisticamente as dimensões não só econômicas do atraso russo, que se reapresentaram sob formas ainda mais graves depois da revolução (DI BIAGIO, 2010, p. 112).

Em Lenin, o conceito de hegemonia tendia a privilegiar o “domínio” sobre a “influência”, ou seja, o aspecto coercitivo em relação ao persuasivo. Daí a expressão “hegemonia do proletariado” ceder lugar a “predomínio do proletariado”, que se baseava num peculiar primado ético-político, a ele conferido pela ação educadora da sua vanguarda (o partido) sobre o restante da massa atrasada da população russa ainda submetida ao imobilismo asiático. Isto posto, é justamente a centralidade da ascendência cultural que reside o ponto de partida para o afastamento de Gramsci da proposição leniniana, assegurando um legado de concepção do poder baseado no consenso e não no exercício da força/coerção.

Aspecto relevante, ainda, na construção do conceito de hegemonia foi seu caráter extremamente prático. Foi formulado mediante a construção de um Estado soviético na teorização leniniana e a partir da experiência de uma revolução fracassada na Itália. Portanto, tinha um caráter instrumental, para se entender e incidir sobre a realidade. Uma crítica importante que aparecerá na formulação gramsciana do conceito de hegemonia pós-revolução será à estatolatria. Ainda que compreensível num primeiro momento, a centralização de tudo no Estado e a ausência de empenho na construção de uma hegemonia na sociedade civil certamente trariam problemas à consolidação revolucionária.

A correta análise das relações de força indica que os fenômenos parciais da vida política e social, ao serem remetidos à totalidade, podem sugerir estratégias e táticas, tanto para manter a ordem vigente como para fortalecer a construção de uma nova hegemonia. Enquanto totalidade, a noção gramsciana de hegemonia significa a unificação da estrutura em superestrutura, da atividade de produção e de cultura, do particular econômico e do universal político. Não se trata de uma universalidade ideológica, mas antes concreta, pois os interesses particulares passam a articular-se com os interesses universais. Nesta linha de pensamento, compreender a concepção hegemônica como sendo somente a subordinação de uma classe em relação à outra é, no mínimo, insuficiente e impreciso. A preocupação essencial de Gramsci é com a transformação de uma visão de mundo, com a elevação das condições de vida das classes subalternas e com a sua inclusão no cenário histórico, excluídas que sempre foram dos processos histórico-sociais. Neste sentido, para o filósofo sardo, hegemonia e democracia operam em sinergia ao enfocarem os mesmos objetivos:

Entre os muitos significados de democracia, parece-me que o mais realista e concreto se possa deduzir em conexão com o conceito de hegemonia. No sistema hegemônico, existe democracia entre o grupo dirigente e os grupos dirigidos na medida em que o desenvolvimento da economia e, por conseguinte, a legislação que expressa este desenvolvimento favorecem a passagem molecular dos grupos dirigidos para o grupo dirigente (GRAMSCI, 2000, p. 287).

Hegemonia é, pois, por um lado, vontade coletiva e, por outro, autogoverno; e esse último se alcança por meio de um trabalho “de baixo” que incorpora o singular ao coletivo e que, nesse processo, não mantém os grupos subalternos no plano inferior, contudo os eleva, torna-os mais capazes de dominar as situações, confere-lhes uma maior universalidade, o que significa, no entendimento gramsciano, a realização efetiva de uma “reforma intelectual e moral”.

Para a teoria crítica, as mudanças básicas em nível de poder internacional têm relação com modificações nas relações sociais domésticas dos países. Em outras palavras, assim como a tradição realista, se reconhece o Estado como a entidade básica das relações internacionais, pois é dentro do Estado que ocorrem as disputas e se estabelece a hegemonia do projeto de uma força social sobre as demais. No entanto, a teoria crítica vai além dos realistas em algumas questões. A primeira delas, já abordada aqui, é a concepção integral de Estado que inclui a própria base da sociedade civil. Nas palavras de Cox, “essa visão deixa de lado a concepção estreita ou superficial de Estado que o reduz, por exemplo, à burocracia da política externa ou às suas capacidades militares” (COX, 2007, p. 114).

A segunda questão é a percepção de que a entrada dos Estados no ambiente internacional é feita de forma diferenciada, perspectiva valorizada no Brasil pelos principais expoentes da chamada Teoria da Dependência, como Ruy Mauro Marini, André Gunder Frank, Theotônio dos Santos e Vânia Bambirra. Basicamente, segundo este modelo interpretativo, as relações internacionais são concebidas como uma vinculação de dominação e desigualdade entre Estados, divididos em centrais (desenvolvidos e imperialistas) e periféricos (subdesenvolvidos e explorados).

Cabe ressaltar, também, que, a partir da década de 1960, o paradigma do realismo político começou a ceder lugar para o novo modelo da dependência. Este surge na América Latina e nos demais países subdesenvolvidos e se alicerça exatamente na Teoria da Dependência, que possui por base a adaptação das ideias marxistas à realidade dos países terceiro-mundistas. Para tal perspectiva analítica, as relações entre os Estados no cenário internacional são pautadas em ditames de interações de natureza assimétrica, cujo funcionamento expressa a evolução do sistema capitalista e seu poder econômico.

Nesta direção, Gramsci aponta que:

No nível exclusivo da política externa, as grandes potências têm uma liberdade relativa de determinar suas políticas externas em resposta a interesses nacionais; as potências menores têm menos autonomia. [...] A vida econômica das nações subordinadas é invadida pela vida econômica de nações poderosas, e a ela se entrelaça, processo que se complica ainda mais pela existência de regiões estruturalmente diferentes no interior dos países, regiões essas que têm tipos distintos de relações com as forças externas (GRAMSCI apud COX, 2007, p. 114).

A linha de um Estado hegemônico (isto é, de uma grande potência) não oscila, já que ele mesmo determina a vontade dos outros e não é determinado por essa, já que a linha política baseia-se no que há de permanente, e não de casual e imediato, bem como nos próprios interesses e naqueles das outras forças que concorrem de modo decisivo para formar um sistema e um equilíbrio (GRAMSCI, 2000, p. 86).

Muitas são as análises acerca da crise e da derrocada de poder dos Estados Unidos, assim como da ascensão da China. Quando se fala em crise, mais uma vez é interessante retomar a interpretação de Cox do conceito gramsciano de hegemonia. O autor canadense propõe ciclos de hegemonia mundial. O primeiro deles seria o período da hegemonia inglesa que durou até 1875. Neste, doutrinas econômicas que reforçavam o domínio da Inglaterra, eram apresentadas como universais, a exemplo do livre-comércio e do padrão ouro. A coerção vinha combinada com a doutrina econômica para os descontentes. De 1875 a 1945, Cox identifica um período não hegemônico, que compreendeu a queda do predomínio inglês e as duas guerras mundiais. Seu construto ideológico também teria mudado, com a substituição do livre-comércio pelo protecionismo e a fragmentação econômica em blocos internacionais.

Em 1945, Cox identifica a ascensão de uma segunda potência hegemônica até 1965, os Estados Unidos. Suas formulações vinham mais adaptadas ao novo momento econômico, mais complexo e integrado. No início da década de 1970, tornou-se evidente que a hegemonia dos Estados Unidos já não estava funcionando inteiramente bem e, por conseguinte, muitas iniciativas se estruturaram para enfrentá-la, tanto por parte de Estados como por parte dos blocos internacionais. Uma ferramenta fundamental no sentido da manutenção hegemônica são os organismos internacionais como a Organização Mundial de Comércio (OMC) e a Organização das Nações Unidas (ONU).

Para Cox, esses instrumentos internacionais desempenham inúmeros papéis, especialmente ideológico, para reforçar a hegemonia estadunidense. Ele enumera cinco deles: “(1) corporifica as regras que facilitam a expansão das ordens mundiais hegemônicas; 2) é, ela própria, produto da ordem mundial hegemônica; 3) legitima ideologicamente as normas da ordem mundial; 4) coopta as elites dos países periféricos; e 5) absorve ideias contra-hegemônicas” (COX, 2007, p. 119). Ou, em outra de suas formulações: “[As instituições internacionais] ajudam a definir diretrizes políticas para os Estados e a legitimar certas instituições e práticas no plano nacional, refletindo orientações favoráveis às forças sociais e econômicas dominantes” (Ibidem, p. 120).

Ademais, vemos uma inovação da hegemonia dos Estados Unidos frente à inglesa. Para além da ocupação física dos territórios, optou-se por criar níveis jurídicos para a construção da hegemonia, tornando sua manutenção menos violenta e custosa do ponto de vista político e financeiro. A maioria das organizações mundiais teve sua criação patrocinada política e financeiramente pelos Estados Unidos. Elas difundiram a formulação de que a democracia liberal norte-americana é o melhor método para a condução de um Estado, independentemente de sua história e constituição social. Essa construção ideológica serviu, inclusive, para justificar guerras. Quando se cria o consenso de que estar sob a liderança estadunidense é o melhor para todos, em especial para os liderados, se criou e se reforçou, claro, uma hegemonia.

O quarto ponto sistematizado por Cox diz respeito às elites dos países periféricos, como o Brasil. Mais uma vez, Cox lança mão do conceito gramsciano de transformismo. Assim como no âmbito doméstico, países inteiros podem sofrer com o transformismo do ponto de vista internacional, ao transfigurar ideias potencialmente contra-hegemônicas em pensamentos coerentes com a doutrina vigente. A partir da leitura do Cox, podemos inferir:

[...] Mesmo que [países periféricos] controlassem [as instituições internacionais], não conseguiriam nada com isso. Essas superestruturas não estão adequadamente vinculadas a nenhuma base política popular. Estão vinculadas às classes nacionais hegemônicas dos países centrais e, com a intermediação dessas classes, têm uma base mais ampla nesses países. Nas periferias, estão associadas apenas à revolução passiva (COX, 2007, p. 121).

[...] hegemonias desse tipo foram fundadas por Estados poderosos que passaram por uma revolução social e econômica completa. A revolução não só modifica as estruturas econômicas e políticas internas do Estado em questão, como também libera energias que se expandem além das fronteiras do Estado. [...] As instituições econômicas e sociais, a cultura e a tecnologia associadas a essa hegemonia nacional tornam-se modelos a serem imitados no exterior. Essa hegemonia expansiva é imposta aos países mais periféricos como uma revolução passiva (COX, 2007, p. 118).

Enfim, enquanto não houver no Brasil a construção orgânica de uma unidade nacional-popular, não haverá possibilidade de superação da sua própria condição periférica e muito menos a expectativa de uma consolidação autônoma no plano internacional.

Considerações Finais

Nas suas análises, Cox afirmará que a hegemonia mundial tem, simultaneamente, uma estrutura social, uma econômica e uma política. Os países periféricos conseguem incorporar alguns aspectos econômicos e culturais do núcleo hegemônico, no entanto têm dificuldades para adotar o seu modelo político. Ao abordar o viés do nacional e do internacional como categorias distintas – demarcadas pela divisão fronteiriça – o autor canadense afasta-se do entendimento de Gramsci o qual compreende que o nexo nacional-internacional é “construído organicamente a partir de diretrizes históricas e políticas” (AMUSQUIVAR, 2021, p. 188).

Embora Cox entenda que “Gramsci não tenha diretamente muito a dizer sobre relações internacionais” (COX, 2007, p. 101) o autor canadense lançou mão prioritariamente do léxico gramsciano ao buscar uma compreensão mais abrangente do sistema internacional. Aparecem conceitos como Estado, sociedade civil, guerra de movimento/guerra de posição, revolução passiva, transformismo entre outros, com destaque especial para a concepção de hegemonia. No entanto, a tradução de Gramsci proposta por Cox às relações internacionais, separando de maneira binária o nacional e o internacional, compromete a organicidade dos pares conceituais gramscianos apresentada ao longo dos Cadernos do Cárcere.

Uma inserção soberana do Brasil no contexto internacional passa necessariamente pela constituição de um bloco histórico nacional-popular, que confronte a estrutura hegemônica. Ou, se há insatisfação com o posicionamento brasileiro em nível internacional, “a tarefa de mudar a ordem mundial começa com o longo e trabalhoso esforço de construir novos blocos históricos dentro das fronteiras nacionais” (COX, 2007, p. 123). Revolucionárias ou não, as contribuições de Cox continuam necessárias para o fortalecimento da teoria crítica no âmbito das relações internacionais.

Referências

AMUSQUIVAR, Érika L. Sobre o 'Internacional' em Gramsci: uma crítica a Robert Cox. Revista Práxis e Hegemonia Popular, Marília, SP, v. 6, n. 9, dez/2021, p. 175-190.

COX, Robert. Social Forces, States and World Orders: beyond international relations theory. In: KEOHANE, Robert (ed.). Neorealism and its critics. New York: Columbia University Press, 1986. p. 204-254.

COX, Robert. Gramsci, Hegemonia e Relações Internacionais: um ensaio sobre o método. In: GILL, Stephen (org.). Gramsci, materialismo histórico e relações internacionais. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007. p. 101-123.

DI BIAGIO, Anna. Hegemonia leninista, hegemonia gramsciana. In: AGGIO, Alberto; HENRIQUES, Luiz Sérgio e VACCA, Giuseppe (orgs.). Gramsci no seu tempo. Brasília: Fundação Astrojildo Pereira e Rio de Janeiro: Contraponto, 2010. p. 87-114.

GARCIA, Ana Saggioro. A Introdução de Gramsci nas Relações Internacionais: aspectos metodológicos. Revista Acadêmica de Relações Internacionais (RARI). Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), v. 1, n. 3, jul/2013, p. 110-120.

GOMES, Victor Leandro C. Estado e Sociedade Civil: entendendo a atualidade da política gramsciana. In: REBUÁ, Eduardo (org.). Gramsci nos trópicos: estudos gramscianos a partir de olhares latino-americanos. Rio de Janeiro: Multifoco, 2014. p. 156-176.

GOMES, Victor Leandro C. Por Que Os Homens Não Se Rebelam? Aquiescência e política em Antonio Gramsci. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2015.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere – Volume 3: Maquiavel. Notas sobre o Estado e a política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere – Volume 1: Introdução ao Estudo da Filosofia. A Filosofia de Benedetto Croce. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere – Volume 5: o Risorgimento e notas sobre a história da Itália. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

LIGUORI, Guido. Estado e Sociedade Civil: de Marx a Gramsci. Novos Rumos, São Paulo, ano 21, n. 46, p. 4-10, 2006.

PANSARDI, Marcos Vinícius. Uma teoria da hegemonia mundial: Gramsci como teórico das relações internacionais. Revista Crítica Marxista, n. 39, São Paulo, p. 77-93, 2014.

Notas

1 Professor de Teoria Política no Departamento de Estudos Estratégicos e Relações Internacionais (DEI), vinculado ao Instituto de Estudos Estratégicos (INEST) da Universidade Federal Fluminense (UFF). Coordenador do Laboratório de Estudos em Política Internacional (LEPIN/UFF) e pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Filosofia, Política e Educação (NuFiPE/UFF). Orcid nº0000-0001-6446-1840. E-mail: victorlcgomes@gmail.com
2 Pesquisadora do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social e do Grupo de Estudos em Defesa e Segurança Internacional (GEDES - UNESP). Bolsista FAPESP de pós-doutorado em Ciência Política na Unicamp. Doutora em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP – UNICAMP – PUC-SP). Orcid nº 0000-0003-0110-4840. E-mail: anapenido@gmail.com.
3 Hegemonia é, sabidamente, um conceito muito importante no pensamento gramsciano. Um movimento hegemônico é um processo social de direção intelectual e moral; de construção de consenso e de um novo bloco histórico. Um grupo social pode e, a rigor, já deve exercer a “liderança” hegemônica antes mesmo da conquista efetiva do poder. Gramsci estendeu a noção de hegemonia a partir de sua aplicação original numa revolução burguesa contra uma ordem feudal para os mecanismos de dominação da burguesia sobre a classe operária numa sociedade capitalista avançada (GOMES, 2014, p. 156-157).
4 Cabe ressaltar que, para tratar de uma nova hegemonia das classes subalternas, Cox utiliza termos como “contra-hegemonia” ou “bloco contra-hegemônico”, os quais nunca apareceram nos cadernos carcerários de Gramsci.
5 O termo filosofia da práxis não é um expediente linguístico, mas uma concepção que Gramsci assimila como unidade entre teoria e prática. Esta unidade serve para o filósofo sardo delinear uma série de conceitos científicos capazes de interpretar o mundo que lhe era contemporâneo (GOMES, 2014, p. 165).
6 Gramsci, claramente, afirma que “a distinção entre sociedade política e sociedade civil [...] é uma distinção metodológica [e não] uma distinção orgânica. [...] Dado que sociedade civil e Estado se identificam na realidade dos fatos”. (GRAMSCI, 2000, p. 47).
7 O conceito de bloco histórico se refere à questão teórica central do marxismo: a relação entre estrutura e superestrutura, entre teoria e prática, entre forças materiais e ideologia. Gramsci rejeita toda visão determinista e mecanicista desta relação. Não existe uma estrutura que mova de modo unilateral o mundo superestrutural das ideias, não há uma simples conexão de causa e efeito, mas um conjunto de relações e reações recíprocas, que devem ser estudadas em seu concreto desenvolvimento histórico (GOMES, 2015, p. 72). Nas palavras do filósofo sardo: “A estrutura e as superestruturas formam um ‘bloco histórico’, isto é, o conjunto complexo e contraditório das superestruturas é o reflexo do conjunto das relações sociais de produção”. (GRAMSCI, 2001, p. 250).

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