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A redução de estereótipos e atitudes negativas entre gerações - o contributo da educação intergeracional

The reduction of stereotypes and negative attitudes between generations – the contribution of intergenerational education to its reduction

La reducción de estereotipos y actitudes negativas entre las generaciones - la contribución da educación intergeneracional

Susana Villas-Boas
Universidade de Coimbra, Portugal
Natália Ramos
Universidade Aberta de Lisboa, Portugal
João Amado
Universidade de Coimbra, Portugal
Albertina Oliveira
Universidade de Coimbra, Portugal
Inmaculada Montero
Universidade de Granada , España

A redução de estereótipos e atitudes negativas entre gerações - o contributo da educação intergeracional

Laplage em Revista, vol. 3, núm. 3, pp. 206-220, 2017

Universidade Federal de São Carlos

Atribuição não comercial internacional. Direitos de compartilhar igual e dar crédito aos autores e periódico.

Recepção: 06 Julho 2017

Aprovação: 10 Agosto 2017

Resumo: O presente artigo apresenta a educação intergeracional como meio para a redução de estereótipos e atitudes negativas tendo como base a idade e as relações entre as gerações. Começa por se apresentar uma investigação qualitativa realizada por entrevista e aplicada a 20 pessoas de diferentes idades da freguesia do Bonfim da cidade do Porto. Teve como principais resultados: a constatação de que o contato entre as diferentes gerações é muito reduzido; a existência de mais estereótipos negativos do que positivos em relação à geração dos adultos idosos e dos jovens, e que estes estereótipos conjuntamente com diferentes perspetivas e valores de jovens e adultos idosos resultam em atitudes negativas de uma geração em relação à outra. Depois de interpretar e discutir os resultados, o texto termina com a apresentação da exemplificação de como utilizar estes resultados no que considerámos ser uma forma adequada de desenvolver processos pedagógicos intergeracionais.

Palavras-chave: Educação intergeracional Estereótipos. Preconceitos. Valores..

Abstract: This article presents the intergenerational education to reduce stereotypes and negative attitudes based on age and relationships among generations. After the theoretical contextualization, the results of a qualitative research carried out through interviews applied to 20 people of different ages of the parish of Bonfim from Porto are presented. The main obtained results are: the contact among the different generations is very low; there are more negative stereotypes than positive ones in relation to the generation of older adults and young people, and that these stereotypes, in addition to the different perspectives that young and older adults have about values, result in negative attitudes of a generation toward the other. After interpreting and discussing the results, the article ends with an illustration of how to use these results in what we consider one of the best ways to develop intergenerational education processes.

Keywords: Intergenerational education Stereotypes. Prejudice. Values..

Resumen: Este artículo presenta la educación intergeneracional como recurso para la reducción de estereotipos y actitudes negativas sobre la base de la edad y las relaciones entre generaciones. Comienza presendo una Laplage em Revista (Sorocaba), vol.3, n.3, set.-dez. 2017, p.206-220 ISSN:2446-6220 . • 207 A redução de estereótipos e atitudes negativas entre gerações... investigación cualitativa realizada mediante entrevistas aplicadas a 20 personas de diferentes edades del barrio de Bonfim, de la ciudad de Oporto. Obteniendo como principales resultados: la constatación de que el contacto entre las diferentes generaciones es muy reducida; que existen más estereotipos negativos que positivos en relación a la generación de los adultos mayores y los jóvenes, y que estos estereotipos unidos a las diferentes perspectivas y valores que jóvenes y adultos mayores desembocan en actitudes negativas de una generación hacia la otra. Después de interpretar y discutir los resultados, el texto concluye con una propuesta sobre cómo utilizar estos resultados en lo que se considera ser una forma adecuada de desarrollar procesos pedagógicos intergeneracional.

Palabras clave: Educación integeneracional Estereotipos. Prejuicios. Valores..

Introdução

As pessoas, hoje, vivem mais tempo e com maior qualidade de vida; pela primeira vez na história da humanidade coexistem no mesmo espaço temporal cinco a seis gerações (crianças, jovens, adultos jovens, adultos de meia-idade, adultos idosos, adultos de idade muito avançada). Porém esta coexistência não se traduz num maior contato e diálogo entre pessoas de diferentes gerações, pelo contrário, as gerações estão cada vez mais separadas. As razões que levam a esta separação são múltiplas: as mudanças da estrutura familiar, as mudanças dos papéis sociais e de género, as mudanças na economia e no trabalho, o avanço tecnológico, as políticas e respostas sociais direcionadas a grupos-alvo, a educação formal e não-formal que utiliza como critério de frequência a idade, entre outras. Estes fatores dificultam a organização de espaços físicos, compartilhados e propícios à interação e solidariedade entre as gerações mais novas e as gerações mais velhas.

Uma das principais consequências da separação e falta de contato entre indivíduos de diferentes gerações é o facto de, nessas circunstâncias, eles não poderem construir um conhecimento mútuo e pessoal assente sobre a experiência e saberes geracionais. Dado que todo o ser humano necessita de produzir conhecimento sobre o que o rodeia, a fim de interpretar os sinais e situações do dia-a-dia, sabemos que, na ausência de uma elaboração pessoal deste conhecimento, os indivíduos armazenam cognitivamente a representação que a sociedade tem das diferentes gerações.

Trata-se de uma imagem, geralmente construída com base em estereótipos - representações cognitivas, positivas ou negativas, de membros que pertencem a um grupo particular (HARWOOD, 2007) - que não reproduzem a realidade (BLANCO & PINAZO, 2016), e que resultam em atitudes negativas e de discriminação, nomeadamente em relação à idade, o que Butler (1980) denomina de idadismo, muito particularmente em relação às gerações dos adultos idosos, comparativamente com as gerações mais jovens (WERNICK & MANASTER, 1984; KITE & JONHSON, 1988). Muito particularmente, as pessoas idosas, sobretudo as mulheres, são confrontadas com crenças negativas, estereótipos, preconceitos e práticas de discriminação, as quais contribuem para diminuir o seu bem-estar, reduzir as oportunidades sociais e aumentar as situações de isolamento e marginalização (SANTANA et al, 2012).

Deste modo os estereótipos são, simultaneamente, causa e efeito da separação das gerações, gerando um sistema cíclico que é urgente quebrar, nas sociedades contemporâneas cada vez mais envelhecidas. Para o efeito, torna-se necessário oferecer oportunidades de contato e de solidariedade intergeracional para que os indivíduos, de uma mesma e determinada geração, alterem e mudem sentimentos, crenças e comportamentos em relação às outras gerações e se ajudem, se cuidem e aprendam mutuamente no contexto familiar ou em outros contextos (RAMOS, 2005, 2008, 2013; TEATER, 2016).

A teoria de contato intergrupo de Allport (1954) sugere que a convivência com membros de um grupo externo, em circunstâncias apropriadas, melhora atitudes intergrupais e reduz o preconceito. Contudo, Allport parte da observação de que o mero contato intergrupal não é suficiente para atingir estes objetivos, e indica um conjunto de condições-chave para que ele seja eficaz: existir igualdade entre todos os membros, possuírem objetivos comuns, cooperarem para atingir esses objetivos e, finalmente, que as iniciativas tenham apoio de instituições e autoridades. A estas condições, Pettigrew (1998, apud BOUSFIELD; HUTCHINSON, 2010, p.454); acrescentou uma outra: um contexto favorável à criação de amizades entre os grupos. Os Programas Intergeracionais (PI) reúnem as condições da teoria pioneira do contato intergrupal de Allport (1954) mais a condição proposta por Pettigrew, em 1998. Com efeito, estes programas, na 1st ICIP Internacional Conference (Keele University, Reino Unido), em 2002, foram definidos como:

[...] um sistema, uma abordagem e uma prática em que todas as gerações, independentemente da idade, etnia, localização e estatuto socioeconómico, se unem no processo de gerar, promover e utilizar ideias, conhecimentos, habilidades, atitudes e valores de forma interativa, com o objetivo de fomentar a melhoria pessoal e o desenvolvimento da comunidade. (HATTON-YEO, 2002, p. 19, tradução nossa).

As investigações confirmam que os PI têm resultados positivos na redução de estereótipos (MACCALUMM et. al., 2010; PARK, 2015), na melhor perceção do outro (GRANVILLE, 2002) e na criação de atitudes mais positivas de uma geração em relação às outras (MACCALLUM et. al., 2010; MASSI et. al., 2016; PARK, 2015). Todavia, revelam também que existem PI que produzem resultados opostos, ou seja, uma valorização negativa do outro grupo etário (BUTTS, 2007; MONTEPARE; ZEBROWITZ, 2002).

Pelo que, vários autores asseveram, na linha do pensamento de Allport, que o mero contato não é suficiente para a mudança de estereótipos e atitudes negativas (HAYES, 2003; CARPENTER; DICKINSON, 2011; TEATER, 2016; TEATER; CHNODY, 2017), e que é necessário criar um contato com qualidade. Por outras palavras, é mais importante um contato de qualidade do que um contato em quantidade (BOUFIELD; HUTCHISON, 2010; TEATER, 2016). O que não significa que não tenha de ter continuidade no tempo; pelo contrário, essa parece ser mais uma das condições indispensáveis para o sucesso do programa (TEATER; CHONDY, 2017), bem como a existência de uma planificação e de uma implementação cuidada e adequada (BUTTS, 2007; HAYES, 2003).

Nesta base, cremos que a educação intergeracional, implementada quer através dos PI, quer enquanto método pedagógico na educação formal e não formal, se constitui como o enfoque a adotar para a redução de estereótipos e atitudes negativas de umas gerações em relação às outras. E entendemos a educação intergeracional como um processo pedagógico que cria oportunidades para o debate e a reflexão das diferentes gerações, numa dinâmica de participação, cooperação, interação, intercâmbio e de diálogo desenvolvido numa relação igualitária, de tolerância, de enriquecimento e de respeito mútuo. A educação intergeracional apela ao que as diferentes gerações têm em comum, sem desconsiderar as diferenças e particularidades, e usa, como principal ferramenta, os sentimentos, as emoções, as interpretações e as experiências das pessoas que participam no processo.

Portanto, advogamos que a educação intergeracional, para ser bem-sucedida na redução dos estereótipos e das atitudes negativas entre as diferentes gerações da população submetida ao processo, tem de iniciar-se com a identificação e consciencialização dos estereótipos e atitudes negativas das pessoas (cultura local) e de assentar na desconstrução dos mesmos. Esse pressuposto está presente nos alicerces do projeto que relatamos neste artigo e cujos objetivos foram: i) identificar qual o contato entre as diferentes gerações pertencentes à comunidade da freguesia do Bonfim da cidade do Porto, Portugal; ii) verificar o modo como as diferentes gerações avaliam as relações entre os idosos adultos e os jovens; iii) reconhecer as atitudes e comportamentos dos adultos idosos para com os jovens e vice-versa; iv) identificar os estereótipos de umas gerações em relação às outras; v) descrever o que é conhecido pela comunidade acerca das atividades dos jovens e dos adultos idosos.

Consideramos que estas informações são essenciais para planear, organizar e implementar tarefas e atividades educativas que desafiem e rompam com estereótipos, preconceitos e atitudes negativas de umas gerações em relação às outras. De seguida expomos as linhas gerais deste projeto (metodologia, recolha e análise e discussão dos dados), bem como uma breve conclusão fundada na experiência da investigação desenvolvida.

Metodologia

Participantes

Nesta investigação participaram 20 residentes da freguesia do Bonfim da cidade do Porto: 9 homens e 11 mulheres, com 15 e mais anos de idade. Distribuídos por quatro grupos etários: Jovens dos 15 aos 24 anos (2F, 3M, média de idade 19,4 anos); adultos jovens, dos 25 aos 44 anos (3F, 2M, média de idade 34,2 anos); adultos de meia-idade, dos 45 aos 64 anos (3F, 2M, média de idade 55 anos) e adultos idosos, dos 65 aos 88 anos (3M, 2M, média de idade 76,2 anos).

Instrumento

A investigação assentou basicamente numa entrevista, de guião semi-estruturado e redigido em 3 versões adaptadas aos grupos etários dos participantes. Apresentamos, como exemplo, as questões centrais colocadas aos adultos idosos, e a que acresciam algumas perguntas de recurso e aferição (seguimos o modelo de AMADO; FERREIRA, 2014, p. 216):

1) Contacta com pessoas jovens no seu dia-a-dia? Quem?

2) Qual a sua opinião acerca dos jovens de hoje? E o que fazem no seu dia-a-dia?

3) O que pensa acerca da relação dos jovens com os adultos idosos?

As mesmas questões, depois de realizadas os devidos ajustes, foram colocadas aos participantes dos outros grupos etários.

Procedimento

Recolha de dados: As entrevistas foram realizadas entre junho e setembro de 2016. Trata-se de uma amostra não probabilística, as pessoas foram selecionadas utilizando a técnica designada por bola de neve. Inicialmente selecionaram-se quatro pessoas, uma de cada geração, e estas convidaram novos participantes da sua rede de amigos e conhecidos a participar. As entrevistas foram realizadas nas habitações dos indivíduos, em associações e em dois centros de dia. Os entrevistados foram informados sobre os objetivos da investigação, da problemática e da pertinência da mesma, assim como dos aspetos éticos e deontológicos a ter em conta na realização da entrevista.

Análise de dados: As entrevistas foram sujeitas a uma análise de conteúdo de caráter estrutural, mantendo-se a um nível taxionómico e, portanto, sem preocupações pela operacionalização de variáveis, dado tratar-se de um número muito reduzido de unidades de investigação com total impossibilidade de generalizar (AMADO; COSTA; CRUSOÉ, 2014). O sistema de categorias foi elaborado num processo misto, que combinou o contributo de escalas prévias obtidas na revisão bibliográfica com a criação de categorias decorrentes da nossa própria interpretação após sucessivas leituras. A análise dos foi efetuada com recurso ao software MAXQDA (versão 11), e teve em conta as seguintes categorias: “Contato entre gerações”, “Características atribuídas aos diferentes grupos etários”, “Relações entre as gerações dos jovens e dos adultos idosos”.

Resultados

Contato entre gerações

Verifica-se que o contato de todas as gerações com os adultos idosos é reduzido, embora, e como seria de esperar, o contato com adultos idosos familiares seja maior do que o contato com adultos idosos não familiares. No que diz respeito ao contato com adultos idosos familiares, verifica-se que, à medida que a idade das pessoas aumenta, a frequência e o contato com adultos idosos familiares diminui. No nosso estudo os jovens surgem como a geração que tem mais contato com os adultos idosos familiares (no entanto, consideramos que estes resultados foram influenciados pelo facto de dois dos entrevistados serem criados por familiares, avós e padrinhos de batismo). Verificou-se, porém, que a partir do momento em que o indivíduo sai do núcleo familiar primário, esse contato privilegiado passa a ter menor frequência.

No que concerne ao contato com os adultos idosos não familiares, verifica-se o oposto, ou seja, que aumenta com a idade; no entanto, ele resulta, sobretudo, de relações estabelecidas na esfera laboral. Contudo, o contato mais referido pelos entrevistados de todas as gerações é o de natureza casual, um contato de cordialidade e funcionalidade do dia-a-dia, como explica este jovem:

O único contato que tenho são questões simples de quase cordialidade. De perguntar se posso passar à frente ou, se estou no meio da rua e estão duas senhoras a ocupar… a andar muito devagarinho, eu peço «com licença». É o único contato que eu penso que tenho, acho eu. (M, 20 anos).

Os lugares mencionados para este contato cordial e de funcionalidade pelos entrevistados são: na rua, nos transportes públicos, nos supermercados, centros de saúde e farmácias.

No que diz respeito ao contato dos entrevistados com os jovens, apura-se, mais uma vez, que este contato é superior na esfera familiar. Verifica-se que a geração dos jovens adultos é a que tem maior frequência de contato com os jovens (filhos e trabalho), mantendo-se diário e regular. Na geração dos adultos de meia-idade, aqueles que têm filhos mantêm-se numa relação diária com jovens; mas os que não têm não mencionam qualquer contato com jovens familiares, ainda que este grupo etário refira que os tem com jovens não familiares, na esfera laboral. Os dados mais interessantes advêm do grupo dos adultos idosos; estes afirmam ter contato regular com jovens familiares (netos e filhos) e com jovens não familiares (vizinhos e colegas). O que pode indicar que os adultos idosos avaliam o contato de cordialidade e funcionalidade como um contato regular.

É de referir que os entrevistados que fazem parte de congregações religiosas (quatro entrevistados de uma congregação católica e um entrevistado de uma congregação jeová), demonstraram ter um contato regular com pessoas de todas as idades, e que, nas atividades e tarefas que realizam conjuntamente, se criam relações, como é dito no testemunho de uma jovem:

Uma das atividades em que participo, no grupo coral. Eu tenho um senhor que para mim... O meu avô faleceu há um ano e esse senhor praticamente para mim é como um avô. Eu passo imenso tempo com ele nesse local [grupo coral] e estamos sempre os dois... E até mesmo pelo facebook conversamos os dois. Temos uma relação muito próxima, conseguimos uma relação muito próxima, quase familiar. (F, 20 anos).

Opinião sobre a relação dos jovens e os adultos idosos

Dos vinte entrevistados, dezassete consideram que a relação entre jovens e adultos idosos é difícil; três, ao contrário, pensam que é fácil. Os jovens, os adultos jovens e os adultos de meia-idade consideram, unanimemente, que esta é uma relação difícil. Os jovens apontam como principais problemas os preconceitos de uma geração em relação à outra, e o afastamento entre as gerações. Os jovens adultos referem que as maiores dificuldades nesta relação são, a falta de contato e de pontos comuns entre estas duas gerações. E os adultos de meia-idade consideram esta relação difícil, apontando a culpa a ambos os grupos etários e que esta dificuldade se deve a culturas geracionais diferentes, como se infere deste testemunho:

Não é, não é uma coisa fácil porque é um choque de mentalidades, são conhecimentos completamente diferentes, são ideias de pensar diferentes, são comportamentos diferentes, são morais diferentes, tudo isso joga para que realmente a dificuldade exista. (F, 48 anos).

A geração que avalia mais positivamente a relação entre os jovens e os adultos idosos é, precisamente, esta última. Todavia, os seus membros acrescentam sempre um “mas” ao seu julgamento, demonstrando certa ambivalência sobre a análise que fazem sobre esta relação. Por exemplo, um dos entrevistados considera esta relação fácil, “mas existem jovens que abusam um bocado”; outro considera esta relação difícil, “mas há jovens que se entendem bem com idosos”.

Pretendendo aprofundar mais esta questão, perguntámos, ainda, sobre quais as atitudes dos adultos idosos para com os jovens. Descobrimos consenso entre todas as gerações estudadas relativamente à opinião de que os adultos idosos não compreendem os jovens e que os reprovam. Quer no sentido de desaprovar as suas atitudes, comportamentos, ideias, quer no sentido de excluí-los e ter uma atitude distante e desconfiada. O sentimento de reprovação por parte dos adultos é consensual na geração dos jovens. Todos eles referem que os adultos idosos comparam, habitualmente, os jovens de hoje com os jovens de antigamente, sempre com uma atitude crítica em relação àqueles. As outras gerações referem o mesmo e, a esse respeito uma adulta idosa diz:

Há pessoas que têm uma certa idade que dizem «No meu tempo não se fazia isso». Nesse tempo também se as faziam, mas de outra maneira. […] Os jovens são mais extrovertidos, já gostam mais de fazer as coisas à frente dos pais; antigamente, fazíamos às escondidas dos pais. (F, 67 anos).

O discurso desta senhora indica, por um lado, que os adultos idosos (o seus pares) utilizam este tipo de discurso frequentemente em relação aos jovens e, por outro lado, pode indicar um certo saudosismo que os leva a ser pouco realistas sobre o passado. Esmiuçando esta comparação entre os jovens de hoje com os jovens de antigamente, verifica-se, nos discursos dos entrevistados adultos idosos, que as comparações são “os jovens de antigamente eram mais disciplinados”, “respeitavam mais os idosos” e “eram mais trabalhadores”.

Analisando a questão sobre o comportamento dos jovens para com os adultos idosos, verifica-se que o foco, por parte de todas as gerações, está no valor do respeito, evidenciando ser este um ponto sensível na relação entre jovens e adultos idosos. Todavia as opiniões divergem sobre este assunto. Verifica-se que entre os cinco adultos idosos entrevistados, dois afirmam que os jovens respeitam os mais velhos, e três que não respeitam. Nos discursos dos jovens, este comportamento é sempre referido, mas quase todos os jovens entrevistados mencionaram a diversidade de atitudes entre os jovens em relação a esta questão. Uma jovem justifica que o que diferencia estes jovens é terem ou não contato com os adultos idosos familiares:

Acho que tem um bocado a ver com as influencias que tiveram, quem tiver mais contato com avós vai acabar por respeitar porque vai ver que são idosos. Têm um bocado mais de respeito pelas pessoas porque percebem. Agora quem se calhar nunca teve contato e quem os vê apenas como pessoas que não os compreendem, que só dizem mal deles, se calhar vai ter uma atitude um bocado mais negativa.” (F, 17 anos)

Esta jovem afirma que é o facto de os jovens pensarem que os adultos idosos “falam mal deles” que os leva a assumir uma atitude desrespeitosa em relação aos adultos idosos. Ou seja, que os preconceitos conduzem a atitudes negativas. O comportamento preconceituoso dos jovens para com os adultos idosos é um comportamento mencionado recorrentemente pelos entrevistados. Um adulto de meia-idade explica que “Têm [os jovens] uma ideia preconcebida. Depois o contexto dificulta a comunicação com a anterior geração.” (M, 62 anos); confirma, assim, que a imagem estereotipada e preconceituosa que os jovens têm em relação aos adultos idosos resulta da separação e da falta de contato entre as gerações, o que dificulta o conhecimento de uma geração em relação à outra.

A atitude de distanciamento dos jovens em relação às gerações mais velhas é referida por todas as gerações. No entanto, na generalidade, os jovens pensam que o seu grupo etário é mais tolerante e entende melhor os mais velhos do que o contrário. Finalmente, encontra-se vontade, embora também um certo receio, por parte dos jovens, em relacionar-se com os adultos idosos.

Estereótipos atribuídos aos jovens e aos adultos idosos

No que diz respeito estereótipos atribuídos aos adultos idosos, verifica-se que existe uma mistura entre estereótipos negativos e positivos, prevalecendo os estereótipos negativos. Encontramos 13 estereótipos (8 negativos e 5 positivos) nos discursos dos jovens adultos; 14 estereótipos (10 negativos e 4 positivos) nos discursos dos adultos de meia-idade; 17 (12 negativos e 5 positivos) nos discursos dos jovens.

A Tabela 1 mostra os primeiros cinco estereótipos negativos e positivos que foram mais mencionados por cada uma das gerações.

Tabela 1
Estereótipos positivos e negativos atribuídos aos adultos idosos
Estereótipos positivos e negativos atribuídos aos adultos idosos
Fonte:Elaboração dos autores

Na tabela 1 podemos dar conta, ainda, dos estereótipos negativos que foram mencionados por todas as gerações: que é o caso de solitários, 32% adultos de meia-idade, 17% adultos jovens e 4% jovens, e, mente fechada (retrógrados, sem vontade para aprender, não querem novas experiências e não aceitam a mudança), 11% adultos de meia-idade, 5,5% adultos jovens, 21% jovens. Os adultos jovens (11%) e os jovens (8%) mencionam, igualmente, inativos/sedentários.

Não se encontram estereótipos positivos mencionados em comum pelas três gerações, contudo, os mais mencionados são: disponíveis/prestáveis (5,5% adultos jovens e 13% jovens) com sabedoria e experiência de vida (11% adultos jovens, 4% jovens) autónomos/independentes (7% adultos de meia-idade e 5,5% jovens adultos) e ativos (11% jovens adultos e 4% jovens).

Das características atribuídas aos jovens pelas outras gerações verifica-se que prevalecem os estereótipos negativos, embora também se atribuam características positivas. Identificam-se 16 estereótipos (10 negativos e 6 positivos) nos discursos dos idosos; 12 estereótipos (8 negativos e 4 positivos) nos discursos dos adultos de meia-idade, e 14 estereótipos (13 negativos e 1 positivo) nos discursos dos adultos jovens.

A Tabela 2 ilustra, apenas, os estereótipos positivos e negativos atribuídos aos jovens pelas outras gerações.

Tabela 2
Estereótipos positivos e negativos atribuídos aos jovens
Estereótipos positivos e negativos atribuídos aos jovens
Fonte:Elaboração dos autores

Verifica-se que não se encontra um consenso entre todas as gerações sobre estereótipos negativos dos jovens, mas destacam-se: o serem desrespeitosos e mal-educados (24% adultos idosos e 13% adultos jovens), não quererem trabalhar nem aprender (12% adultos idosos), pouco esforçados e preguiçosos (17% jovens adultos), dependentes das novas tecnologias (5,8% adultos de meia-idade e 17% adultos jovens), egocêntricos (16% adultos de meia-idade) e agressivos e violentos (9% adultos idosos e 4% jovens adultos). Como estereótipos positivos destacam-se: o serem autónomos/ independentes (3,1% idosos e 21% adultos de meia-idade) e terem muito conhecimento (9% adultos idosos).

Atividades de jovens e de adultos idosos

No que concerne à perceção dos jovens sobre as atividades dos idosos, verifica-se que as mais referidas foram, por ordem decrescente: Veem televisão (4), passeiam (3), Jogam às cartas (3), dormem e descansam (3), fazem a lida da casa (2), cantam (2), passam o dia em casa (1), visitam familiares (1), vão a bailes (1), jogam dominó, pião, e malhas (1) e estão no facebook (1). As atividades mais apontadas são atividades realizadas dentro de casa (veem televisão), atividades consideradas mais passivas por Cabral, Ferreira, Alcântara, Jerónimo & Marques (2013). Verifica-se, ainda, que aos olhos dos jovens desta comunidade, as atividades das mulheres e dos homens idosos são distintas: elas dedicam-se mais às atividades de casa e eles a atividades sociais. É de referir que as atividades jogar às cartas, dominó, pião e malhas, assim como cantar foram associadas a espaços públicos da comunidade, o jardim de São Lazaro e o jardim do Marquês, demonstrando que o conhecimento destes jovens sobre as atividades dos adultos idosos é o que veem na rua e de passagem.

No que diz respeito à perceção dos adultos idosos em relação às atividades dos jovens, as mais mencionadas foram, por ordem decrescente: Estudam (2), fazem desporto (2), usam computadores (2), usam telemóveis (1) e passeiam (1). As respostas desta geração foram muito limitadas: expressões como “não sei” e “não sei mais” foram utilizadas por vários entrevistados. No nosso entender este facto está relacionado com a falta de conhecimento, mas também, com o estereótipo mencionado anteriormente, o de não quererem trabalhar nem aprender. “Se andassem a trabalhar eu dizia a atividade que eles faziam, não trabalham andam para ai à solta, não posso, não posso dizer nada” (F, 88 anos).

Discussão dos resultados

Neste estudo, conscientes de todas as limitações que um estudo desta natureza implica, desde logo por não podermos assumir qualquer generalização, procurámos, no entanto, indicadores seguros de que, numa comunidade restrita, interior à freguesia do Bonfim, da cidade do Porto, existe um contato reduzido entre as diferentes gerações. Não só em relação às gerações dos adultos idosos mas também em relação aos jovens, embora se afigure que a geração dos adultos idosos é a que tem menos contato com as outras gerações. Apurou-se, neste estudo, que a família e o trabalho são os espaços que oferecem mais oportunidades de contato entre os indivíduos de todas as idades, sendo o contato intergeracional familiar o mais frequente. No entanto há indicadores de que, com a entrada no mundo do trabalho e a independência económica dos indivíduos, esse contato se vai tornando menos frequente na esfera familiar e aumentando na esfera laboral.

Estes resultados indicam que é importante aprofundar a reflexão sobre a separação das gerações, não só em termos das gerações das crianças e jovens e adultos idosos, mas em termos da separação e falta de contatos entre todas as gerações. O pouco contato que encontramos entre as duas gerações intermédias (jovens adultos e adultos de meia-idade) com os adultos idosos, coloca-nos na posição de aceitarmos conclusões de outros estudos que concluem que as famílias portuguesas têm dificuldade em conseguir manter a frequência de relações com os familiares mais velhos, o que põe em risco o apoio social familiar tão necessário aos adultos idosos de idade avançada (RAMOS, 2008, 2013). Cremos que o discurso sobre este assunto, em Portugal, tem de mudar para se conseguir fazer face a esta situação e promover as relações e solidariedades intergeracionais.

O discurso habitual é o de que as famílias portuguesas “ainda” cuidam dos seus adultos idosos, um discurso em que o “ainda” está direcionado para o mais e que é fruto de uma comparação entre Portugal e os países mais desenvolvidos, em que este fenómeno é fortemente assinalável. Mas este discurso deveria ser analisado com o “ainda” direcionado para o menos, visto que se continuarmos a minimizar este fenómeno não tomamos medidas preventivas e não tardará que as famílias portuguesas deixem de poder cuidar dos seus familiares adultos idosos.

Apurou-se igualmente que, excluindo a esfera familiar e a esfera laboral, o contato intergeracional entre as diferentes gerações é um contato casual, de cordialidade e de funcionalidade, e que este contato se dá na rua, nos transportes públicos, nos supermercados, centros de saúde e farmácias. Dito de outro modo, um contato superficial e ocasional que não permite que indivíduos de diferentes gerações interajam, se conheçam e se ajudem mutuamente. Parece poder concluir-se que as atividades organizadas demonstram servir para reunir diferentes gerações e promover a criação de vínculos afetivos e solidários entre os indivíduos de diferentes gerações, através do exemplo dado pelos entrevistados sobre as atividades realizadas por congregações religiosas.

No que concerne à relação entre jovens e adultos idosos, esta é maioritariamente considerada como uma relação difícil. Com base na opinião dos entrevistados verificou-se que as pessoas consideram que a separação entre as gerações é, hoje, uma realidade, e que a falta do conhecimento de umas em relação a outras conduz ao aumento de estereótipos, de preconceitos e de atitudes negativas.

Foi mencionado, por vários entrevistados, que as pessoas que têm contato mais frequente com os avós têm uma atitude mais positiva em relação aos adultos idosos sem laços familiares, o que vem ao encontro das conclusões de Lowenstein (2007). Porém, no estudo de Allan e Johnson (2009) os jovens que viviam com parentes idosos mostraram ter atitudes mais negativas para com os adultos idosos sem laços familiares. E, de facto, no nosso estudo, um jovem em particular, que vive com familiares adultos idosos, demonstrou ter uma imagem muito negativa dos adultos idosos, assim como uma atitude conflituosa. Pelo que, consideramos que a qualidade das relações estabelecidas na esfera familiar influencia a adoção de atitudes positivas ou negativas em relação aos adultos idosos não familiares por parte dos jovens.

Da análise das atitudes negativas reportadas por todas as gerações sobre os jovens para com os adultos idosos e destes para com os jovens, entende-se que estas não são muito diferentes, já que ambas as gerações são acusadas de ser intolerantes, separatistas e de não se compreenderem uma à outra. Neste estudo aproximámo-nos dos autores para quem no cerne desta questão estão, por um lado, as imagens estereotipadas que uma geração tem em relação à outra (BOUSFIELD; HUTCHISON, 2010; TEATER; CHONODY, 2017), e por outro lado, a perspetiva diferente que as gerações têm sobre os valores (GERVILLA, 2010).

No que concerne aos estereótipos verificou-se que as diferentes gerações desta comunidade têm uma imagem estereotipada mais negativa do que positiva quer dos adultos idosos quer dos jovens, sendo a imagem sobre os jovens mais negativa do que a imagem sobre os adultos idosos. Os estereótipos negativos mais mencionados em relação aos jovens são: desrespeitosos, preguiçosos, agressivos e violentos como se verifica nos estudos de Down et al. (2016) e de Sharma (2016); e em relação aos adultos idosos: inativos e de mente fechada, como se verifica no estudos de Tearter e Chonoby (2017) e de Sharma, (2016). Não encontramos documentado em nenhum outro estudo o estereótipo negativo em relação à geração jovem: “dependentes das tecnologias”. A análise sobre as atividades atribuídas aos jovens confirma este estereótipo, sendo que o uso de telemóveis e de computadores são as atividades mais atribuídas a este grupo etário. Por outro lado, a análise das atividades atribuídas aos adultos idosos por parte dos jovens, confirma o estereótipo negativo de inatividade deste grupo etário.

Neste estudo encontramos também uma confirmação de que uma das causas das atitudes negativas de uma geração em relação às outras é a transformação dos valores que acompanha o desenvolvimento das sociedades (GERVILLA, 2010). Os adultos idosos, de hoje, cresceram na cultura da modernidade com valores tais como o absoluto, a unidade, o esforço, a sacralização, a razão, a ética, a certeza, a formalidade, etc. Os jovens, por sua vez, cresceram numa cultura pós-moderna com valores tais como o relativo, a diversidade, o prazer, o presente, o sentimento, o agnosticismo, etc. Em Portugal, em particular, os adultos idosos viveram grande parte das suas vidas num regime ditatorial do Estado Novo, um regime autoritário, conservador, católico, nacionalista, que impunha de forma excessiva muito destes valores e que restringia a liberdade aos cidadãos; os jovens, por sua vez, viveram toda a sua vida num país democrático que integra a União Europeia, que tem como valores fundamentais a liberdade e a igualdade. Este estudo apurou que valores tais como a liberdade, a igualdade, o respeito, o prazer versus esforço são motivo de muitas das atitudes negativas de umas gerações em relação às outras.

Contributo da educação intergeracional para a desconstrução de estereótipos e atitudes negativas de umas gerações em relação às outras

Nas sociedades cada vez mais envelhecidas, se pretendemos construir relações mais frutíferas e enriquecedoras, bem como menos antagónicas e conflituosas entre as gerações, impõe-se a mudança das perceções negativas que umas gerações têm em relação às outras (BIGGS; HAAPLA; LOWENSTEIN, 2011). A educação intergeracional, ao criar oportunidades de debate e reflexão através do diálogo empático que se baseia em sentimentos, sensações e pensamentos das pessoas participantes e apelando ao que têm em comum, pode contribuir para a construção de uma perceção mais positiva de umas gerações em relação às outras, e para o aumento da compreensão e da valorização dos indivíduos sobre a sua própria vida e a vida dos outros membros da sociedade, mulheres e homens, de todas as gerações e culturas no contexto social contemporâneo.

Daí defendermos que os programas e atividades intergeracionais atingem mais eficazmente o objetivo de criar relações entre as diferentes gerações, se desconstruírem os estereótipos e atitudes negativas de umas gerações em relação às outras, na base dos objectivos, conceitos e práticas da educação intergeracional, em vez de deixarem essa desconstrução e educação ao acaso. Tal como mencionámos anteriormente, o mero contato não é suficiente para esta construção, são indispensáveis contatos de qualidade e desenvolvimento de atitudes e comportamentos, o que implica planificação, implementação e avaliação cuidadas e adequadas.

Somos da opinião que o processo de educação e de desconstrução se deve fundamentar no conhecimento dos estereótipos negativos e das atitudes negativas da população com a qual se pretende trabalhar. Antes de mais, consideramos que o ideal é trabalhar separadamente, com os grupos geracionais, num primeiro momento, tal como sugerem Sánchez, Kaplan e Sáez (2010), de forma a reduzir a ansiedade e dificuldades de contato (BOUSFIELD; HUTCHINSON, 2010; PETTIGREW; TROPP, 2008) e evitar que surjam conflitos. O trabalho individual com os diferentes grupos etários deve começar pela identificação e apresentação dos estereótipos que as outras gerações têm a respeito da geração com a qual estamos a trabalhar; trata-se de conduzir a reflexão para o grau de veracidade dessas crenças e de promover a compreensão de que se trata de ideias preconcebidas que não correspondem à realidade (BLANCO; PINAZO, 2016).

Se, por exemplo, como aconteceu no nosso estudo, estivermos a trabalhar com um público jovem, apenas após esta reflexão se deve apresentar a discussão sobre os estereótipos encontrados em relação aos adultos idosos e conduzir a reflexão pelo questionamento sobre o que pensam das características atribuídas aos adultos idosos; segue-se depois um debate sobre o que devem sentir os adultos idosos em relação a isso, e por último, analisar se estas crenças não são tão infundadas com as crenças que se têm sobre os jovens. Os objetivos desta discussão são: entender a diversidade que existe entre os indivíduos que fazem parte do mesmo grupo etário, compreender o quanto estes julgamentos preconcebidos são irrealistas e, por último, identificar a injustiça destes julgamentos como um ponto comum entre as duas gerações.

Como se apurou no nosso estudo é necessário, igualmente, refletir sobre as diferentes perspetivas que as gerações têm sobre os valores. Se até a este ponto do processo pedagógico ainda não se abordou este tema, a apresentação das comparações que as gerações mais velhas fazem entre os jovens da sua época e os jovens atuais, que identificamos, é uma forma de introduzi-lo na discussão moderada através da contextualização histórico-social que conduzirá a uma maior compreensão de determinados comportamentos das diferentes gerações.

Uma planificação cuidada dos recursos educativos para esta primeira sessão é fundamental para o seu sucesso. É necessário encontrar formas que, por um lado, despertem a curiosidade e o interesse dos participantes e, por outro lado, propiciem um ambiente descontraído. Por exemplo, a utilização de vídeos, filmes, sketches de comédia e imagens que ridicularizem e contradigam os estereótipos de idade, e que mostrem visualmente como eram as coisas no tempo antigo e como são agora (neste caso, sugere-se a utilização de materiais da própria comunidade, caso existam, facilitando a identificação de uma identidade comum com as gerações que irão trabalhar juntas a posteriori). Contudo, nem todos os contextos de educação intergeracional permitem a realização deste primeiro encontro, em separado. Como por exemplo, as salas de aula cada vez mais multigeracionais. Nesse caso, a reflexão deve ser mediada com mais cuidado e muita sensibilidade.

Em segundo lugar, é importante ter consciência de que a mudança de estereótipos e atitudes é morosa e exige do indivíduo um conhecimento de si próprio, uma atitude crítica e uma auto-análise constantes. Assim, durante as atividades e tarefas de interesse comum que as diferentes gerações irão desenvolver em colaboração, o indivíduo, vai defrontar-se continuamente com os seus próprios preconceitos ou com os preconceitos dos outros em relação a si; o que pode acontecer naturalmente, durante a cooperação e interação com indivíduos de diferentes gerações na realização de atividades e tarefas, ou ser orquestrado, através do lançamento de novos desafios que rompam com as imagens estereotipadas que continuam registadas no inconsciente de cada indivíduo. Este confronto é necessário para o despertar de emoções e sentimentos que levarão o indivíduo à autoanálise fundamental para que haja mudança e transformação de uma imagem negativa para uma imagem positiva dos indivíduos de outras gerações.

Contudo, para atingir este intento, há que garantir uma relação igualitária, de tolerância e de respeito mútuo entre todos os envolvidos e que as atividades e tarefas tenham continuidade no tempo. Dito de outra forma, é necessário dar tempo e criar condições para que o indivíduo tenha consciência reconheça que a imagem que tem da outra geração não se adequa a todos os indivíduos, mudando assim as suas atitudes e comportamentos e tornando-se mais recetivo à criação de novas relações e amizades.

Considerações finais

O presente estudo oferece indicadores de que na comunidade da freguesia do Bonfim da cidade do Porto, Portugal, o contato entre as diferentes gerações (pessoas de todas as idades) é, sobretudo, causal, de cordialidade e de funcionalidade, quando se trata de indivíduos não familiares. Mas sugere ainda que o contato familiar pode estar em risco, o que exige a criação de oportunidades para que este contato se estabeleça com mais qualidade e aproveitando todas as suas potencialidades.

Por outro lado, evidencia que a imagem negativa que as diferentes gerações têm sobre os jovens e os adultos idosos, assim como a diferente perspetiva sobre determinados valores por parte dos adultos idosos e dos jovens, resultam em atitudes negativas e discriminatórias de umas gerações em relação às outras. Fica também demonstrada a necessidade de desconstruir estereótipos e de contextualizar histórico-socialmente os valores para reduzir atitudes antagónicas entre os jovens e os adultos idosos e promover relações mais frutíferas entre as diferentes gerações. Para além do alerta que fica dado, procurámos exemplificar, com base no projeto que concretizamos para este estudo, como a educação intergeracional pode facilitar a desconstrução de tais estereótipos.

Tivemos sempre presente o facto de a nossa amostra não ser probabilística e que o nosso estudo era essencialmente de natureza “descritivo-interpretativa” (AMADO, 2014, p, 118) assente no testemunho de um número muito reduzido de sujeitos de investigação, e que, por isso, a nossas conclusões não poderão ter um cunho generalizante. Para além disso, apontamos como limitação o facto de não se ter averiguado a qualidade e o tipo de relações que os indivíduos mantêm com os membros da família e as pessoas não familiares de outras gerações (de solidariedade, de ambivalência ou de conflito).

Como mais-valias apontamos a abordagem, ainda sujeita a poucos estudos, aos estereótipos e atitudes negativas em relação aos jovens por parte dos adultos idosos. Acresce a isso, a inclusão das gerações intermédias (adultos jovens e jovens adultos) no estudo, o que permitiu demonstrar que a separação entre as gerações não diz respeito apenas à separação entre as gerações dos jovens e adultos idosos, mas a todas as gerações, pelo que, e a nosso entender esta variável deve ser incluída em futuras investigações.

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