A regulamentação do ensino na Primeira República
The regulation of education in the First Republic
A regulamentação do ensino na Primeira República
Research, Society and Development, vol. 7, núm. 1, pp. 1-36, 2018
Universidade Federal de Itajubá

Recepção: 30 Junho 2017
Aprovação: 01 Agosto 2017
Resumo: Durante o período da Primeira República, muitas foram as transformações políticas, econômicas e sociais vivenciadas pelo Brasil e, consequentemente, pelo estado do Rio Grande do Norte. Neste momento, também a instrução pública sofrerá profundas alterações em sua estrutura, estas têm início a partir das reformas previstas pela Legislação Educacional. Assim, este artigo tem por objetivo analisar a Legislação Educacional para entender a atuação do Estado na construção da cultura escolar através da regulamentação do ensino no período que compreende os anos de 1989 a 1930. Para a realização desta pesquisa, foi adotado o método de análise documental, com base na concepção de documento fornecida por Jacques Le Goff (1990). Para tanto, com relação às fontes históricas, esta pesquisa pauta-se na produção legislativa do estado do Rio Grande do Norte, no tocante à instrução pública. Ao estudar a História da Educação, Stamatto (2012) concebe a importância da legislação enquanto fonte histórica, por estes documentos permitirem a compreensão da implantação e das modificações das políticas educacionais. A legislação se consolida, segundo Thompson (1987), como um importante instrumento de mediação e reforço das relações de classe, ao mesmo tempo em que atua ideologicamente como legitimadora dessas relações. Na legislação encontram-se as pretensões referentes à constituição da própria sociedade e suas instituições, através de uma relação complexa e contraditória. A primeira lei educacional potiguar da era republicana foi sancionada em seis de maio de 1892, daí por diante, muitas foram as intervenções governamentais no ensino que se seguiram. Estes documentos abordavam diversas temáticas, tais como: a hierarquização/organização do ensino; o material didático a ser utilizado; a construção dos edifícios escolares; a higienização; a grade curricular; a inspeção; a criação de Grupos Escolares; dentre outras determinações. Por fim, com base no estudo realizado, pode-se afirmar que o Estado atuou decisivamente na regulamentação da instrução pública, de modo a consolidar a cultura escolar no Rio Grande do Norte, em conformidade com os moldes propostos por Julia (2001).
Palavras-chave: Legislação Educacional, Instrução Pública, Rio Grande do Norte.
Abstract: During the First Republic period, many were the political, economic and social transformations experienced by Brasil and, consequently, by the state of Rio Grande do Norte. At the moment, the public education will also undergo profound changes in its structure, these begin with the reforms foreseen by the Educational Legislation. Thus, this article aims to analyze the Educational Legislation to understand the State's performance in the construction of school culture through the regulation of teaching in the period from 1989 to 1930. For the accomplishment of this research, the method of analysis Based on the document design provided by Jacques Le Goff (1990). For this, in relation to historical sources, this Research is based on the legislative production of the state of Rio Grande do Norte, regarding public education. In studying the history of education, Stamatto (2012) conceives the importance of legislation as a historical source, because these documents allow the understanding of the implementation and changes in educational policies. Legislation consolidates, according to Thompson (1987), as an important instrument of mediation and reinforcement of class relations, while at the same time acting ideologically as legitimating these relations. In the legislation are the pretensions regarding the constitution of the own society and its institutions, through a complex and contradictory relation. The first Potiguar educational law of the Republican era was sanctioned on May 6, 1892, from then on, many governmental interventions in teaching ensued. These documents addressed several themes, such as: hierarchization / organization of teaching; The teaching material to be used; Construction of school buildings; Hygiene; The curriculum grid; Inspection; The creation of School Groups; Among other determinations. Finally, based on the study carried out, it can be stated that the State acted decisively in the regulation of public education, in order to consolidate the school culture in Rio Grande do Norte, in accordance with the models proposed by Julia (2001).
Keywords: Educational Legislation, Public Instruction, Rio Grande do Norte.
1. Introdução
No ano de 1889 foi proclamada a República no Brasil, com a alteração do sistema político, buscou-se ideologicamente concretizar uma transformação física e social no país. Neste momento, as cidades tornaram-se alvos de intervenções, para poderem representar o progresso da nação. O mesmo aconteceu com a sociedade, por meio da intensificação de políticas públicas voltadas instrução, o Estado se propôs a civilizar a população. A partir deste entendimento, o presente artigo tem por objetivo analisar a Legislação Educacional para entender a atuação do Estado na construção da cultura escolar através da regulamentação do ensino no período que compreende os anos de 1989 a 1930. Como fonte histórica primária, foi adotada a produção legislativa do estado do Rio Grande do Norte, no tocante à instrução pública.
No primeiro tópico, buscar-se-á esclarecer, metodologicamente, como este estudo foi realizado. O presente artigo refere-se a uma abordagem qualitativa e teve como principal método de pesquisa a análise documental, com base na concepção de documento fornecida por Le Goff (1990). Para o autor o documento deve ser considerado enquanto testemunho do passado, mas, não como verdade absoluta. Por este motivo, os documentos analisados serão comparados com outras fontes e com a produção histórica que aborda a educação potiguar.
Em um segundo momento, será discutida a concepção de Lei e sua utilização enquanto fonte histórica. Para tanto, parte-se do pressuposto de Thompson (1987) quando entende que a legislação se consolida como um importante instrumento de mediação e reforço das relações de classe, ao mesmo tempo em que atua ideologicamente como legitimadora dessas relações. Para o autor, na legislação encontram-se as pretensões referentes à constituição da própria sociedade e suas instituições, através de uma relação complexa e contraditória. Devido à relevância da Lei, Stamatto (2012) concebe a importância da legislação enquanto fonte histórica, por estes documentos permitirem a compreensão da implantação e das modificações das políticas educacionais.
Por conseguinte, propõe-se entender como a Proclamação da República foi legitimada através da legislação e como o Estado republicano se organizou. Além disso, é abordada a instrução e como ela se apresenta nos primeiros documentos do período, o que conduziu à percepção de um cenário de valorização e obrigatoriedade da educação.
No tópico que aborda a regulamentação do ensino norte-rio-grandense, é desenvolvida uma análise dos documentos, em ordem cronológica, destacando-se as transformações no ideário e na organização educacional por eles suscitadas.
Na sequência, buscou-se esclarecer como foi consolidada cultura escolar, a partir do estudo da presença dos três elementos que a constituem (ensino seriado, a presença de vários profissionais e a construção de prédios próprios), de acordo com definição de Dominique Julia (2001).
Por último, serão abordados os Grupos Escolares, enquanto instituições que difundiram a cultura escolar por todo o Estado.
2. Metodologia
Esta pesquisa histórica possui um caráter qualitativo, de acordo com Andrade, a “Pesquisa qualitativa é basicamente aquela que busca entender um fenômeno específico em profundidade” (2005, p.133). A autora enfatiza que a pesquisa qualitativa não se refere apenas à quantificação, ou, simples descrição dos dados estudados, este tipo de pesquisa é norteada pelas informações que podem ser geradas a partir de um olhar cuidadoso e crítico das fontes documentais. Dentre os métodos que podem ser utilizados na pesquisa qualitativa, aqui foi selecionado o método que compreende a análise documental.
Sobre o método da análise documental, Antônio Carlos Gil (2002) esclarece que a diferença entre a pesquisa documental e a pesquisa bibliográfica consiste na natureza das fontes utilizadas. Na pesquisa documental as fontes ainda não receberam um tratamento analítico, o que possibilita ao pesquisador tirar suas próprias conclusões acerca da leitura e da análise das fontes, conforme os objetivos propostos na pesquisa.
Contudo, faz necessário entender o que é um documento, este pode ser tido, conforme aponta o historiador francês Jacques Le Goff (1990), como resultante de uma edição, consciente ou inconsciente, da sociedade que o produziu, ao mesmo tempo em que é responsável pela criação da imagem desta mesma sociedade.
O documento não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder. Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de causa (LE GOFF, 1990, p. 545).
Com base na perspectiva de Le Goff (1990), o documento/monumento deve ser desmontado pelo historiador, que não deve entendê-lo enquanto verdade absoluta, mas, buscar nos pormenores e nas críticas o que dele pode ser percebido, o que há de verdadeiro e de falso na sua construção. Em suma, o autor esclarece que o documento deve ser transportado do campo monumental da memória para a ciência histórica propriamente dita.
Para tanto, é relevante destacar que antes da escolha das fontes históricas. faz-se necessário elaborar uma questão que possa ser respondida pelos documentos que serão analisados. Uma vez que as fontes históricas não falam por si, figuram como testemunhas, vestígios do passado capazes de responder aos questionamentos do historiador.
Nesse sentido, esta pesquisa partiu da seguinte problemática: Como o Estado atuou na construção da cultura escolar potiguar durante a Primeira República? Com base neste questionamento, foi percebido que a legislação educacional potiguar poderia responder a esta questão. Entretanto, como alertou Le Goff e aponta Bacellar, “A elaboração de um documento não necessariamente significa que seguiram as normas de conteúdo informacional originalmente previstas” (BACELLAR, 2005, p. 44). Por este motivo, decidiu-se trabalhar a legislação educacional contrapondo-a com as informações dispostas em outros tipos de fontes e na produção histórica do Rio Grande do Norte.
3. A Lei
Esta pesquisa pauta-se teoricamente na concepção de Lei, fornecida pelo representante da escola neomarxista inglesa, Edward Palmer Thompson. Para o autor, “[...] não é possível conceber nenhuma sociedade complexa sem lei” (THOMPSON, 1987, p.351). A Lei pode ser interpretada como sendo um instrumento que media e reforça as relações entre as classes sociais, dos dominantes e dos dominados. Para tanto, a Lei também atua, ideologicamente, na legitimação da dominação.
Se a lei é manifestamente parcial e injusta, não vai mascarar nada, contribuir em nada para a hegemonia de classe alguma. A condição prévia essencial para a eficácia da lei, em sua função ideológica, é a de que mostre uma independência frente a manipulações flagrantes e pareça ser justa. (THOMPSON, 1987, p. 354)
No tocante apontado por Thompson, a Lei precisa ter um caráter de universalidade e igualdade, devendo atender todos os tipos de homem, para que possa atuar de modo eficiente na legitimação dos pressupostos almejados pelos dominantes. A Lei caracteriza-se por uma dicotomia, ao mesmo tempo em que pressupõe a dominação e a desigualdade, carece ainda parecer igualitária para ser legitimada socialmente.
O autor entende que a legislação se consolida como um importante instrumento da classe dominante, que através do Estado, realiza suas pretensões com relação à constituição da própria sociedade. “[...] a lei é por definição, e talvez de modo mais claro do que qualquer outro artefato cultural ou institucional, uma parcela de uma “superestrutura” que se adapta por si às necessidades de uma infra-estrutura de forças produtivas e relações de produção” (THOMPSON, 1987, p. 349-350).
Assim, a Lei atua na defesa e na definição dos anseios da classe dominante, como por exemplo, na busca pela transformação do súdito imperial em cidadão republicano, o que figurou como uma ação civilizatória da sociedade através da instrução. Já que a Lei determinava que só seria considerado cidadão quem fosse alfabetizado. O que provoca, uma discursão acerca da utilização da legislação educacional no desenvolvimento de políticas públicas voltadas para instrução, tida como meio de civilizar a população.
Para tanto, parte-se da percepção de que, no Rio Grande do Norte, as Leis educacionais do período republicano incutiram socialmente uma ideologia, que resultou na consolidação da cultura escolar, conforme será visto adiante. Deste modo, é importante entender a legislação educacional enquanto fonte histórica.
“a legislação educacional como um corpus documental que permite perceber e compreender o processo da instalação do sistema escolar no país e as modificações referentes às políticas educacionais implementadas, podendo, assim, ser utilizada como fonte histórica” (STAMATTO, 2012, p. 280).
Na concepção da historiadora Inês Stamatto, pelo fato da Legislação ser um resquício do passado, que contém em seu âmago uma intencionalidade, com base nela pode-se fomentar a compreensão da ação histórica de uma determinada sociedade. De acordo com este ponto de vista, adotou-se a Legislação Educacional do Estado do Rio Grande do Norte como fonte histórica para esta pesquisa.
4. A Proclamação da República: legitimação, legislação e instrução
No dia 15 de novembro de 1889 foi implantado, com um levante político/militar, o sistema de governo republicano no Brasil. Para legitimar a Proclamação da República, é expedido pelo Governo Provisório[1], liderado pelo Marechal Deodoro da Fonseca, o Decreto Nº 1, no dia 15 de novembro de 1889. Em seu primeiro artigo lê-se “Fica proclamada provisoriamente e decretada como a forma de governo da Nação brasileira - a República Federativa” (BRASIL, 1889). No referido documento, as antigas províncias tornam-se Estados, que juntos, compõe a Federação. Assim como todas as repartições brasileiras, civis e militares, que anteriormente eram subordinadas ao Império, passam a ser subordinadas ao Governo Provisório republicano.
No Decreto n◦ 7, foram dissolvidas as assembleias provinciais e fixadas, provisoriamente, as atribuições dos governadores estaduais. Este documento indica que, desde os primórdios da era republicana, a instrução figurou como uma das principais preocupações da administração pública. Dentre as atribuições dos governadores, observa-se no Art. 2º, que cabe ao governador “§ 2º Providenciar sobre a instrucção publica e estabelecimentos proprios a promovel-a em todos os seus graós” (BRASIL, Decreto nº 7, de 20 de Novembro de 1889). Este inciso é relevante para o entendimento de que a promoção de uma instrução adequada era uma obrigação do Estado.
Os Estados brasileiros se mantiveram autônomos nos quesitos que compreendem a tributação, a desapropriação e a instrução pública, no entanto, conservaram a força pública sob o Governo Federal, o que garantiu a unidade nacional. Continuava, assim, o caráter descentralizado da questão educacional, em conformidade com o Ato Adicional de 1834.
Em conformidade com o cenário de valorização e de obrigatoriedade[2]da educação, fora excluído o voto dos analfabetos, conforme disposto no Decreto Nº 6, de 19 de novembro de 1889, no “Art. 1o Consideram-se eleitores, para as camaras geraes, provinciaes e municipaes, todos os cidadãos brazileiros no gozo dos seus direitos civis e politicos, que souberem ler e escrever” (BALEEIRO, 2012, p. 16). Assim, só poderia participar dos pleitos republicanos, os poucos cidadãos que tiveram acesso à instrução no período, o que deixava de fora a maioria da população brasileira.
No ano de 1889, José Ricardo Pires de Almeida afirmou que no Brasil “havia um grande número de negociantes ricos que não sabiam ler” (2000, p. 37). Para embasar este fato é importante lembrar que durante o Império os analfabetos tinham direito ao voto, desde que, possuíssem riquezas e títulos. Ou seja, a instrução não era considerada como obrigatoriedade para o exercício da cidadania, já que a maioria dos brasileiros não era alfabetizada.
Para consolidação do Estado Republicano, previa-se a publicação da Constituição nacional. O primeiro passo para a elaboração da Lei Maior se deu com a publicação do Decreto nº 29, de 3 de dezembro de 1889, que nomeou a comissão responsável pelo projeto. A referida comissão ficou conhecida como Comissão dos Cinco e era composta por: Joaquim Saldanha Marinho (presidente), Américo Brasiliense de Almeida Melo, Antônio Luís dos Santos Werneck, Francisco Rangel Pestana e José Antônio Pedreira de Magalhães Castro.
No dia 24 de fevereiro de 1891, foi promulgada a primeira Constituição da era republicana, única da Primeira República, com noventa e um artigos e oito Disposições Transitórias[3]. A Constituição de 1891 mantém o predisposto nos decretos anteriores, no tocante a organização nacional em Estados federativos e a administração descentralizada. Assim, o Estado continuaria sendo responsável pela instrução pública nele ofertada. Outro aspecto importante desta Constituição refere-se à cisão entre a Igreja e o Estado, inclusive no âmbito educacional, conforme aponta o Art. 72, § 6º - “Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos publicos” (BALEEIRO, 2012, p. 82). Até então, foram abordados, sumariamente, os aspectos gerais da organização legislativa republicana. Com base nestes primórdios, será dada ênfase à atuação legislativa do estado do Rio Grande do Norte no âmbito educacional.
5. A regulamentação do ensino Norte-rio-grandense
Os anos iniciais da República foram marcados pela instabilidade política em todo o território nacional, e, no Rio Grande do Norte não foi diferente. Os desacordos existentes entre a elite local, os novos administradores estaduais e o poder central[4] geraram conflitos, uma vez que a proclamação da República representava a oportunidade de romper com o centralismo imperial, ou, com o centralismo de modo geral. Por esse motivo, os primeiros anos da era republicana ficaram marcados pela intensa instabilidade vivenciada na política das antigas províncias. Diante desta perspectiva, o historiador Almir Bueno revela que “de novembro de 1889 a fevereiro de 1892, o Rio Grande do Norte teve, ao sabor das conjunturas, onze administrações diferentes” (2016, p. 122).
No período que compreende os anos de 1889 e 1892, o governo do Rio Grande do Norte passou por nove governadores nomeados, dois governadores eleitos indiretamente[5] e uma Junta Governativa Militar. Em ordem cronológica, o Estado foi governado por: Pedro Velho de Albuquerque Maranhão (17 de novembro a 6 de dezembro de 1989); Adolfo Afonso da Silva Gordo (6 de dezembro de 1889 a 8 de fevereiro de 1890); Jerônimo Américo Raposo da Câmara (8 de fevereiro a 10 de março de 1890); Joaquim Xavier da Silveira Junior (10 de março a 19 de setembro de 1890); Pedro Velho (19 de setembro a 8 de novembro de 1890); João Gomes Ribeiro (8 de novembro a 7 de dezembro de 1890); Manuel do Nascimento Castro e Silva (7 de dezembro de 1890 a 2 de março de 1891); Francisco Amintas da Costa Barros (2 de março a 13 de junho de 1891); José Inácio Fernandes Barros (13 de junho a 6 de agosto de 1891); Francisco Gurgel de Oliveira (6 de agosto a 9 de setembro de 1891); Miguel Joaquim de Almeida Castro (9 de setembro a 28 de novembro de 1891); Junta Governativa Militar[6](28 de novembro de 1891 a 22 de fevereiro de 1892); Jerônimo Américo Raposo da Câmara (22 a 28 de fevereiro de 1892).
No entanto, esta instabilidade finda quando Pedro Velho de Albuquerque Maranhão assumiu a administração pública em 28 de fevereiro de 1892[7], com isso, é iniciada a oligarquia dos Albuquerque Maranhão, que governará o Rio Grande do Norte durante quase todo o período da Primeira República. Quando Pedro Velho assumiu, o Estado carecia de uma constituição, conforme previsto pelo Decreto Nº 1 e pela Constituição brasileira de 1891.
Segundo apontou Almir Bueno, “A 7 de abril de 1892, os deputados promulgaram a Constituição estadual que vigeria até 1898, considerando-a propositadamente a primeira, ignorando a constituição de “Amintas”” (BUENO, 2016, p. 154). Sendo então considerada oficialmente a primeira Constituição do Estado, buscou-se entender como a Carta Magna tratou a instrução pública potiguar, uma vez que esta forneceu as diretrizes para as leis e decretos posteriores.
No Capítulo II da Constituição potiguar, que versa sobre as atribuições do Congresso, o Artigo 11º deliberava que cabe ao Congresso: “Legislar sobre instrucção publica, tendo em vista auxiliar e desenvolver o progresso da educação e do ensino” (CONSTITUIÇÃO/RN, 1892, p. 313)[8]. Com base no referido texto, entende-se a instrução como um dos ideais progressistas republicanos, seu desenvolvimento fomentaria a civilização da população e era tido como um dos objetivos da administração pública. De acordo com a historiadora Inês Stamatto, “o indivíduo passou a ser visto como um cidadão de uma república, não mais um súdito de uma realeza” (STAMATTO, 2005, p. 77). A transformação do súdito em cidadão republicano perpassava obrigatoriamente pela educação, como visto no Decreto Nacional Nº 6 (1889) e na Constituição Federal de 1891, só era considerado cidadão o indivíduo que soubesse ler e escrever. Este pensamento foi expresso na legislação, como pode-se observar na fala de Prudente de Morais, quando ainda era governador do Estado de São Paulo, na introdução do Decreto Nº 27, nota-se o caráter modernizador da educação no período.
Considerando que a instrucção bem dirigida é o mais forte e efficaz elemento do progresso e que ao governo incumbe o rigoroso dever de promover o seu desenvolvimento ; Considerando que de todos os factores da instrucção popular o mais vital, poderoso e indispensavel é a instrucção primaria largamente diffundida e convenientemente ensinada; Considerando que, sem professores bem preprados, praticamente instruidos nos modernos processos pedagogicos e com cabedal scientifico adequado ás necessidades da vida actual[...] (SÃO PAULO. DECRETO Nº 27, 12 de março de 1890, p. 30).
Texto similar pode ser encontrado na legislação potiguar, o que indica a integração nacional em prol deste ideal de civilização, que tem por base a geração do cidadão republicano através da educação. Para os potiguares, “O desejo de mudança, a euforia, a convicção na força da técnica e da ciência para melhorar a vida na cidade; a esperança de dar à capital a expressão que ela não teve no século XIX [...]” (ARRAIS; ANDRADE; MARINHO, 2008, p. 180). Como se pode perceber nas considerações feitas pelo governador potiguar Pedro Velho, no texto do Decreto Nº 18.
O Governador do Estado, considerando que e de urgente necessidade reorganizar a Instrução Publica, elevando moral e materialmente o nível do ensino entre nós. Considerando que o vigente Regulamento no 32 de 11 de janeiro de 1887, pelo qual se rege a Diretoria Geral da Instrução Publica não satisfaz as necessidades, nem se harmoniza com os progressos da pedagogia moderna; resolve mandar que pelo Regulamento que com este baixa se dirijam todos os estabelecimentos de instrução primaria secundaria ou profissional do mesmo Estado. (RIO GRANDE DO NORTE. DECRETO Nº 18, de 18 de setembro de 1892)
A análise destes dois trechos presentes nas legislações dos estados de São Paulo e do Rio Grande do Norte torna evidente que a educação passa a figurar como uma necessidade vital para a administração pública republicana, de acordo com Stamatto: “O ideário republicano, destacando ao máximo a educação como um dos seus pilares, transformando-a em um dos seus símbolos, apropriou-se da instituição escolar como se fosse uma conquista para o povo brasileiro realizada pela República” (STAMATTO, 2005, p. 82).
O Estado do Rio Grande do Norte, através da Constituição, intimou também os municípios a contribuírem com o projeto nacional de desenvolvimento da instrução pública, como se pode observar no Título II, que trata das obrigações do Município (que era tido como base da organização político/administrava do Estado), lê-se no Artigo 7º que cabe ao município: “Crear e manter escolas de educação cívica e instrucção primaria gratuita” (CONSTITUIÇÃO/RN, 1892, p. 326). Com isso, os municípios tinham a obrigação legal de contribuir com o melhoramento do ensino no Estado.
A situação do ensino no Rio Grande do Norte, como também em praticamente o território nacional, durante o período antecedente, não era das melhores. A deficiência da instrução ofertada no decurso do Império é expressa na fala do Diretor Interino da Instrução Pública, Aleixo Barbosa da Fonseca Tinoco, quando afirmou que “É bem pouco lisonjeiro o estado da instrucção primaria nesta província” (RELATÓRIO 1867). A situação do ensino é abordada no Artigo 6º, das Disposições Transitórias da Constituição do Estado.
Art. 6º O Congresso, tendo em vista as condições em que se acha a Instrucção Publica do Estado, reformará o ensino sobre as seguintes bases:
1ºGarantindo a inamovibilidade dos professores, que só poderão ser removidos por accesso ou a pedido.
2º Estabelecendo um curso profissional de tres anos anexo ao curso secundário do Atheneo, aproveitadas as cadeiras deste estabelecimento e augmentadas as que forem necessarias para completamento do ensino secundario e profissional.
3º Dispensando os professores sem concurso e os de concurso que tiverem menos de cinco annos de nomeação. Estes ultimos, quando apresentando-se a concurso, serão em igualdade de approvação, preferidos para o provimento das cadeiras.
4º Aproveitando para a nova organização da Instrucção primaria os professores de concurso que tiverem mais de cinco annos de nomeação, ou aposentando-os com os vencimentos correspondentes ao tempo de ensino no magisterio publico. (CONSTITUIÇÃO/RN, 1892, p. 329)
Este Artigo admite a necessidade urgente de se reformar a instrução pública potiguar e lança as bases para que esta reforma seja efetivada, como estava ocorrendo em diversas partes do país. Como, por exemplo, a Reforma Benjamim Constant - expressa no Decreto nº 981, de 8 de Novembro de 1890 – onde o ensino torna-se graduado em ciclos, assim como é facilitado o acesso ao ensino superior. Também a Reforma de Caetano de Campos, em São Paulo, regulamentada pelo Decreto nº 27, de 12 de março de 1890, que criava a Escola Normal e duas Escolas Modelo a ela anexas. Dentre as disposições do referido documento, são abordadas: a necessidade de um currículo adequado; a disposição dos alunos em diferentes graus de aprendizado; a existência de um professor para cada disciplina; a necessidade de formação adequada para os professores; o melhoramento dos salários; a implantação do cargo de diretor escolar, dentre outras.
Seguindo os princípios da Constituição do Estado do Rio Grande do Norte de 1892, o Estado republicano promulga a sua primeira lei educacional, a Lei Nº 6, de 30 de maio de 1892, que autorizava o governo do Estado a reformar a instrução pública. Dentre as disposições legais, é expresso que será mantida e reformada a Diretoria Geral de Instrução Pública, esta Diretoria existia desde o período Imperial e foi criada através da Lei nº 135 – de 7 de novembro de 1845.
A Lei Nº 6 prevê também: A manutenção, por parte do Estado, de duas escolas masculinas e duas femininas na capital, assim como uma para cada sexo em cada um dos municípios; A reforma do ensino secundário (ofertado apenas pelo Atheneu), deve ser realizada com base na adoção de métodos e programas utilizados na Capital Federal; A reforma da biblioteca existente no Atheneu; A existência de uma publicação, Revista Oficial da Instrução Pública, a ser organizada pelos professores do Atheneu, a qual todos os professores deveriam contribuir com 1% dos vencimentos[9]; A implantação do ensino Profissional voltado para a formação do magistério[10]; Que o Promotor de Justiça seria o responsável por inspecionar a instrução ofertada em cada município; segundo a Lei o Ensino Particular seria livre e que o Estado atuará apenas como fiscalizador do ensino ofertado nos municípios.
Para complementar a referida Lei, é expedido o Decreto Nº 18, em 30 de setembro de 1892, que tinha como objetivo reorganizar a instrução pública do Estado. Inicialmente, é disposto que o ensino acha-se dividido nos seguintes níveis: Ensino Primário, Ensino Secundário e Ensino Normal. É tido também que o Ensino será leigo e gratuito e que todos os estabelecimentos estão sujeitos à Diretoria Geral de Instrução Pública, que por sua vez, cabe-lhe: “Dirigir, fiscalizar e superintender o ensino público em todos os estabelecimentos de instrução existentes no Estado” (RIO GRANDE DO NORTE, DECRETO Nº 18, 30 de setembro de 1892), dentre outras atribuições. A Diretoria era composta por um Diretor Geral da Instrução Pública – nomeado pelo governador, um secretário e um Conselho Literário[11]. O cargo de Diretor Geral da Instrução Pública teve uma grande importância durante quase todo o período da Primeira República, portanto, faz-se entender as suas atribuições.
Art. 11o − O Diretor Geral compete: § 1o − A fiscalização direta e superintendência de todos os estabelecimentos do ensino publico. § 2o − O estudo de todas as questões referentes à instrução pública, sua aplicação e pratica no Estado. § 3o − A direção da repartição a seu cargo.§ 4o − Convocar e presidir o Conselho Literário.§ 5o − Presidir os concursos para o magistério, dando ao Governador a sua opinião sobre a marcha deles, valor das provas exibidas, capacidade literária e profissional dos candidatos e o mais que lhe parecer conveniente aos interesses da Instrução.§ 6o − Propor a nomeação de todos os funcionários da Secretaria da Instrução Publica.§ 7o − Expedir instruções e programas pedagógicos aos estabelecimentos de ensino publico.§ 8o − Apresentar anualmente ao Governador um minucioso relatório do movimento geral do ensino publico e seu desenvolvimento no Estado.§ 9o − Impor, na forma deste Regulamento, as penas em que incorrerem os membros do magistério publico.§ 10o − Declarar vagas as cadeiras abandonadas pelos respectivos professores por mais 30 dias, segundo o Art. deste Regulamento.§ 11o − Conceder, na forma deste Regulamento, licença aos funcionários da Instrução Publica.§ 12o − Visar os atestados passados aos professores primários para a cobrança dos vencimentos respectivos e atestar aos da capital ou aos do interior, quando reconhecer que as autoridades incumbidas deste serviço negam-se a isto por motivos não justificados.§ 13o − Marcar prazo aos professores para entrarem no exercício de suas cadeiras.§ 14o − Visitar, sempre que puder, as escolas e estabelecimentos fora da capital.§ 15o − Nomear os examinadores para todos os exames e concursos para o magistério primário, secundário e normal.§ 16o − Todas as mais obrigações inerentes ao cargo e atribuições consignadas neste e nos demais regulamentos concernentes à Instrução Publica (RIO GRANDE DO NORTE, DECRETO Nº 18, 30 de setembro de 1892).
Com isso, observa-se que a organização da instrução pública de todo o Estado estava sob a tutela do Diretor Geral, suas funções compreendiam as mais diversas questões, conforme disposto no documento. Outro ponto relevante, que diz respeito ao controle do Estado sobre a instrução pública, foi à inspeção do ensino. Desde o Império, a fiscalização eficiente do ensino praticado nas escolas era considerada como um meio capaz de controlar e desenvolver a instrução pública. No Decreto Nº 18, foram enfatizados os deveres dos delegados e do Diretor Geral da Instrução Pública nesse quesito, como aponta o Art. 30º - “A fiscalização do ensino e sua inspeção, além do que incumbe ao Diretor Geral, será nas escolas do interior, direta e especialmente feita pelos delegados escolares” (RIO GRANDE DO NORTE, DECRETO Nº 18, 30 de setembro de 1892). Até então, os Delgados foram encarregados pela inspeção do ensino nos municípios, exerciam essa função os Promotores Públicos, nos municípios sede de Comarca, e os Presidentes das Intendências municipais nos demais. Como visto no Art. 31º, compete aos delegados escolares:
§ 1o − Visitar frequentemente as escolas do seu município, assistindo, tanto quanto for possível, aos trabalhos escolares.§ 2o − Inspecionar rigorosamente os estabelecimentos de ensino público primário, secundário ou outros, abrangendo na sua inspeção, a parte material e técnica e as condições higiênicas do local.§ 3o − Cumprir e fazer cumprir fielmente os regulamentos escolares e determinações do Diretor Geral.§ 4o − Admoestar e repreender os professores por suas faltas.§ 5o − Lavrar, no livro competente, o termo de visita as escolas, observando minuciosamente quanto lhe parecer digno de louvor ou de censura.§ 6o − Verificar se os livros escolares são os adotados oficialmente.§ 7o − Apresentar anualmente ao Diretor Geral de 1 a 20 de dezembro, um relatório da sua inspeção e visitas, com as observações que entenderem necessárias.§ 8o − Reclamar da Diretoria Geral as medidas que lhes parecem necessárias ao melhoramento do ensino.§ 9o − Informar de ordem da Diretoria geral, sobre quanto interesse ou diga respeito a Instrução Publica.§ 10o − Organizar a estatística escolar do município, segundo as normas e recomendações da Diretoria Geral.§ 11o − Transmitir a Diretoria, previamente informados, os requerimentos e mais papeis dos professores do município, e bem assim atestar-lhes a frequência, procedimento e trabalho e representar pro ou contra eles.§ 12o − Presidir os exames feitos nas escolas sob sua fiscalização e nomear os mais examinadores.§ 13o − Dar posse aos professores públicos em suas perspectivas cadeiras.§ 14o − Abrir, numerar, rubricar e encerrar os livros de matricula das escolas do município (RIO GRANDE DO NORTE, DECRETO Nº 18, 30 de setembro de 1892).
A demanda dos Delegados apresenta algumas características importantes para a compreensão do ensino na época e do desejo de seu desenvolvimento. A inspeção deveria abranger os bens materiais existentes na escola, a técnica pedagógica utilizada pelos professores e a higiene do local onde aconteciam as aulas. Percebe-se também que os livros didáticos precisavam ser os autorizados pelo Estado e que os Delegados poderiam contribuir com o desenvolvimento educacional, uma vez que sua opinião era solicitada, como ainda deveriam ser os responsáveis pela matrícula.
Apesar da regulamentação, a inspeção do ensino não foi efetivada, em parte, devido à falta de compromisso dos Promotores Públicos e dos Presidentes das Intendências Municipais no exercício da função de Delegados Escolares, o governador Pedro Velho expediu o Decreto nº 60, de 14 de fevereiro 1892. Este documento aprovou um novo regulamento para a instrução pública do Estado, no que tange especialmente à inspeção do ensino. Nele, os Promotores e os Presidentes das intendências são dispensados da função de Delegados, para tanto, seriam contratados Delegados Escolares. Contudo, faltavam pessoas capacitadas para exercer a função, bem como também faltavam professores, segundo Nestor Lima (1921), “Sem professorado sufficientemente idôneo para effectuar a reforma do ensino primario de 1892, ella teve de falhar por completo” (LIMA, 1921, p. 17).
Neste momento, o ensino primário ofertado pelo Estado ainda não era seriado, e se organizava através do estudo dos seguintes conteúdos[12]: Leitura e Escrita; Aritmética Elementar; Geometria Elementar e Desenho Linear; Lições de Coisas; Noções de Geografia e História, especialmente do Brasil; Gramática Nacional; Educação Moral e Cívica; Elementos de Música; Ginástica; e, Trabalhos Manuais, compreendendo os trabalhos de agulha para o sexo feminino. Com as reformas, de 1892 e 1896, pouco mudou com relação à instrução pública no Rio Grande do Norte.
Mediante este quadro, no ano de 1907, o governador Antônio de Souza, através da Lei Nº 249, de 22 de novembro de 1907, autoriza a reforma do ensino. O primeiro passo dado, em prol da referida reforma, foi a criação do primeiro Grupo Escolar potiguar, por meio do Decreto Nº 174, de 5 de março de 1908. O Grupo Escolar Augusto Severo localizava-se no bairro da Ribeira e abrangeria as duas cadeiras de ensino, mantidas pelo Estado, que lá funcionavam.
Ao analisar o Regimento do Grupo Escolar Augusto Severo - elaborado pelo então Diretor da Instrução Pública, Francisco Pinto de Abreu - é possível perceber diversos pontos de evolução da educação norte-rio-grandense, o ensino passa a ser seriado e a possuir outros profissionais (Diretor e porteiro), além dos professores. Com o Decreto nº 198, de 10 de maio de 1909, o Grupo Escolar Augusto Severo torna-se a Escola Modelo.
Art. 1º O Grupo Escolar “Augusto Severo” que funciona no bairro baixo desta capital, à praça do mesmo nome, será a Escola Modelo para servir de tipo ao ensino público elementar em todo Estado, devendo os Regimentos Internos dos diversos grupos e escolas já inaugurados e a inaugurarem-se neste e em outros municípios, modelar-se pelo Regulamento e Regimento Interno do “Augusto Severo”.
Assim, o Augusto Severo passa a servir de modelo para todo o ensino público ofertado pelo Estado do Rio Grande do Norte, como também passa a ser vigiado de perto pelo Governador e pelo Diretor Geral da Instrução Pública, dada a sua representatividade no cenário educacional potiguar. Pouco depois da criação do primeiro Grupo Escolar, a reforma do ensino - prevista na Lei Nº 249 - foi implantada pelo governador Alberto Maranhão quando expediu o Decreto Nº 178, de 29 de abril de 1908.
Alberto Maranhão reformou a instrução primária no Decreto de 29 de abril de 1908. Um inspirador fora Francisco Pinto de Abreu, professor do Atheneu, jornalista, advogado, poeta, Diretor da Instrução Pública. Nasceu a Escola Normal, os Grupos Escolares nas sedes municipais, as escolas mistas, a extinção de todas as cadeiras existentes e a disponibilidade para todo o corpo de professores do Estado (CASCUDO, 2010, p. 242).
As palavras do historiador potiguar, Luís da Câmara Cascudo, enaltecem a atuação do Chefe de Estado, como também indica a participação efetiva de Francisco Pinto de Abreu na elaboração deste Decreto. Na mencionada regulamentação, foi mantida a Diretoria Geral de Instrução Pública, nos moldes propostos pela reforma de 1896. Também tem início a difusão dos Grupos Escolares no Estado, de acordo com o Artigo 4º.
Art. 4º O Governo estabelecerá, pelo menos, um grupo escolar em cada sede de comarca e uma escola mista em cada um dos outros municípios do Estado, nos prédios estaduais existentes e nos que forem construídos diretamente pelos mesmos municípios ou a custas de particulares que os queiram ceder para tal fim, mediante contrato gratuito feito com o Diretor da Instrução Pública e aprovado pelo Governador (RIO GRANDE DO NORTE. DECRETO Nº 178, 29 de abril de 1908).
A partir deste decreto muitos Grupos Escolares foram criados no interior do Estado. Ainda foram extintas as antigas Cadeiras, que deram lugar para as escolas mistas. O documento ainda afirmou que a contração dos professores, tanto para os Grupos Escolares quanto para as escolas mistas, teria duração de um ano, até que se formassem os alunos da Escola Normal, criada no mesmo Decreto, no Artigo 5º - “É criada a Escola Normal de Natal para o preparo do Magistério de ambos os sexos, anexa ao Atheneu Rio Grandense, regida pelo Regulamento com o que este baixa” (RIO GRANDE DO NORTE. DECRETO Nº 178, 29 de abril de 1908).
Apesar da criação da Escola Normal ser mencionada em legislações anteriores[13], ela só se consolidou com a reforma de 1908. A Escola Normal passa a funcionar na escola de ensino secundário, o Atheneu, que também passará a contar com diversos funcionários: um Diretor, um porteiro arquivista, um secretário, dois contínuos e dois inspetores de alunos (um de cada sexo). De acordo com Cascudo, a Escola Normal “Inaugurou-se a 13 de maio do mesmo 1908. Seu primeiro Diretor foi Francisco Pinto de Abreu. A escola hospedou-se no Atheneu até 31 de dezembro de 1910. Instalou-se no Grupo Escolar Augusto Severo, na praça de mesmo nome, a 2 de janeiro de 1911” (CASCUDO, 2010, p. 239). Como aponta Cascudo, a Escola Normal foi Dirigida pelo Diretor Geral da Instrução Pública do Estado, mas, com o Decreto Nº 239, de 15 de dezembro de 1910, foi criado o cargo de Diretor, o qual, Nestor Lima ocupou por mais de dez anos, até ser indicado como Diretor Geral da Instrução Pública, ao final de 1923.
Para os estudiosos da História da Educação Potiguar, a reforma empreendida pelo governador Alberto Maranhão, representou um divisor de águas no curso do ensino até então ofertado. Segundo Câmara Cascudo, “Para o tempo e recursos do Estado foi uma revolução verdadeira, estabelecendo métodos e renovando o ambiente educacional. Os governadores subsequentes continuaram a campanha de 1908, aproveitando os elementos modernos, humanos e materiais” (CASCUDO, 2010, p. 242).
Ainda no mandato de Alberto Maranhão, é expedido o Decreto nº 192, de 12 de março de 1909, que reorganizava a Escola de Música, criada pelo Decreto Nº 176, de 31 de março de 1908. A Escola de Música funcionava no Teatro Carlos Gomes[14] e para estudar nela os alunos precisavam pagar o valor de dez mil réis, contudo, eram oferecidas 30 vagas para os alunos mais pobres, indicados pelo Diretor Geral da Instrução Pública. Todos os professores pertenciam à Orquestra do Teatro Carlos Gomes e a Escola de Música oferecia as seguintes Cadeiras: 1ª cadeira − Ensino de Harmonia e Composição; 2ª cadeira − Ensino de Piano; 3ª cadeira − Ensino de Violino e Viola; 4ª cadeira − Ensino de Violoncelo e Contrabaixo; 5ª cadeira − Ensino de Instrumento de sopro-madeira; 6ª cadeira − Ensino de Solfejo; 7ª cadeira − Ensino de coral acompanhado. De acordo com Cascudo (2010), esta escola foi extinta, devido a necessidade de redução de gastos, em seis de janeiro de 1914.
Na sequência, é homologada a Lei nº 284, de 30 de novembro de 1909, que reafirma o que foi publicado no Decreto de 1908 e dá outras providências. O seu primeiro Artigo diz que “Será criado, pelo menos, um grupo escolar em cada município, correndo as despesas materiais e de expediente a custa das Intendências, associações ou particulares” (RIO GRANDE DO NORTE. Lei nº 284, de 30 de novembro de 1909). O que abrange o alcance dos Grupos Escolares, anteriormente previstos apenas para os municípios que fossem sede de comarca. A contratação dos professores continuava a ser por contrato, até que os primeiros egressos da Escola Normal concluam seus estudos, o que ocorrerá em 1910, quando se formam os vinte e nove primeiros professores primários no Estado[15].
O Estado reorganiza a inspeção do ensino, como visto no Artigo 14º - “A inspeção técnica ou profissional será feita pessoalmente pelo Diretor Geral e pelos inspetores de ensino que forem escolhidos livremente entre os professores de primeira classe, com jurisdição em cada distrito” (RIO GRANDE DO NORTE, Lei Nº 284, de 30 de novembro de 1909). Com esta Lei, os Inspetores de Ensino passam a ser remunerados pelo Estado, seu vencimento anual, conforme a tabela anexa à Lei Nº 284, é de 9.000$000 réis. Já os Delegados Escolares eram de responsabilidade dos municípios, a eles cabia verificar: se os professores são assíduos e moralizados; se as condições de higiene são rigorosamente cumpridas; se o ensino corresponde às necessidades da população.
Estas inspeções foram o meio encontrado, no período em questão, para supervisionar o ensino, acompanhar a construção e o funcionamento dos estabelecimentos educacionais, a fim de definir as diretrizes para os diretores e os professores em conformidade com arranjo técnico de suas classes, bem como na elaboração de métodos e de processos de ensino recomendados pela Legislação Nacional e Estadual. No Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910, Artigo 173, são elencadas as atribuições dos Inspetores de Ensino.
Art. 173º Incumbe aos inspectores de ensino: 1º Visitar assiduamente as escolas, observando as instrucções do Director Geral; 2º Instruir os diretores e professores sobre os melhores methodos e processos de ensino, esclarecendo ás duvidas que ocorrem; 3º Cumprir e fazer cumprir o Regimento Interno, programmas, horarios e instrucções da Directoria Geral; 4º Impor as penas disciplinares de sua alçada, communicando sempre ao Director Geral; 5º Registrar as impressões de suas visitas e escripturar mappas de estatística, conforme os modelos adoptados; 6º Promover conferencias publicas sobre assumptos de edificação popular; 7º Verificar pessoalmente o estado de cada alumno, para attender ás reclamações das famílias interessadas; 8º Requisitar dos presidentes das Intendencias as providencias relativas ao material e expediente das escolas; 9º Fiscalizar a construção e mobiliamento dos estabelecimentos de ensino, para que se executem fielmente as plantas e projectos approvados pelo conselho de instrucção; 10º Providenciar sobre a perfeita instalação das escolas e presidir as solemnidades de inauguração na ausencia do Director Geral;11º Desempenhas as comissões que foram distribuídas; 12º Apresentar á Directoria Geral minucioso relatório sobre os serviços a seu cargo, no dia 30 de setembro de cada anno ou quando deixar a commissão (RIO GRANDE DO NORTE. Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910).
Após reflexão sobre estas incumbências, concorda-se com Jéssica Pereira, quando ela afirma que a Inspeção do Ensino “faz parte do processo de gestão educacional, mas em alguns momentos pode ser utilizada literalmente como forma de controle de gestão da vida, ou seja, articula-se a jogos de relações de poder ligados a estratégias políticas específicas” (PEREIRA, 2012, p. 60). Para a realização do propósito republicano, a inspeção do ensino foi uma ferramenta muito eficiente para o controle do Estado no âmbito educacional durante a Primeira República. No Rio Grande do Norte, entre os anos de 1910 a 1920, a atuação dos inspetores Amphilóquio Câmara e Francisco Gonzaga Galvão mereceu destaque no cenário educacional potiguar.
O Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910, cria o código de ensino. No Título I, referente à organização do Ensino Público, em seu Artigo primeiro é informado que que o ensino oficial do Rio Grande do Norte obedecerá às seguintes divisões: “I Curso primário: 1º Graduado a) infantil b) elementar / 2º Isolado: II Curso Normal; III Curso Geral; IV Cursos profissionais de: a) agronomia b) zootecnia c) comércio d) indústria e) agrimensura f) belas-artes.
Na sequencia, foi informado que o ensino primário era ofertado nos Grupos Escolares, nas Escolas Isoladas e nos cursos noturnos. O magistério profissional era ministrado na Escola Normal da Capital, o ensino de Ciências e Letras eram matérias avulsas, só ofertadas mediante a necessidade dos candidatos. O Estado ainda mantém o Atheneu, sendo este equiparado ao ginásio nacional e necessário para quem quisesse ingressar no ensino superior, compreendendo assim o ensino secundário. “A instrucção especial e pratica, necessaria aos que se dedicam ao desenvolvimento da riqueza publica ou a cultura esthetica , será ministrada em cadeiras independentes, anexas ás colonias agricolas, estabulos modelos, almoxarifado e Theatro Carlos Gomes” (RIO GRANDE DO NORTE. Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910, p. 120).
No Decreto Nº 239, as Escolas Mistas, que haviam substituído as antigas cadeiras na reforma de 1908, passam a ser denominadas de Escolas Isoladas. O ensino nelas oferecido deve ser similar, na medida do possível, ao ministrado nos Grupos Escolares.
Também é percebida a presença das escolas noturnas, que tinham por finalidade a alfabetização dos adultos. A educação profissional também foi uma preocupação manifestada pelo Estado no, onde foram previstos os cursos de: agronomia, zootecnia, comércio, indústria, agrimensura e belas-artes.
As escolas de agronomia e zootecnia foram assim criadas: “Art. 110º E’ creada uma escola de lavoura em cada colonia agricola e uma escola de zootechnia em cada posto zootechnico, fundado no Estado por iniciativa do Governo ou concessão aos particulares” (RIO GRANDE DO NORTE. Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910, p. 133). E tinham por objetivo ofertar o ensino da língua nacional, contabilidade, desenho e geografia, ainda deveriam incluir as disciplinas inerentes ao trabalho na lavoura e zootécnico, tais como as que envolvem o uso de máquinas agrícolas e economia rural. Sendo a organização dessas escolas condizentes com as condições de cada localidade.
Do mesmo modo ocorreu com a escola de comércio, onde o governo se propunha a entrar em acordo com os industriais, “a fim de estabelecerem escolas primarias e praticas para seus operários, mediante subvenção official” (RIO GRANDE DO NORTE. Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910, p. 134). Como aponta o Artigo 115º “A instrucção nas escolas industriaes constará principalmente de leitura escripta, contabilidade, desenho, noções de physica, mecânica, chimica industrial, tecnologia de materiaes, aprendizagem de manufactura e artes diversas” (p. 134). Sendo as habilitações direcionadas para os diversos ofícios de natureza mercantil. Também é criada no Decreto a escola de agrimensura, sobre ela só consta a necessidade do aluno, antes de ingressar, realizar testes de habilitação em português, matemáticas elementares, desenho e geografia. As Escolas de Belas-Letras e de Belas-Artes funcionariam no Teatro Carlos Gomes, tendo por designío desenvolver as capacidades estéticas e artísticas dos potiguares.
Ainda sobre o Decreto Nº 239, é fortuito perceber que aparece, pela primeira vez na Legislação do Ensino Potiguar, instruções técnicas sobre a edificação escolar. Neste documento fica claro que as construções devem ser erigidas em lugar adequado e salubre, que devem ser “elegantes, modestos e espaçosos”, possuir área aberta para o recreio mobília adequada para o tamanho dos alunos, dentre outras disposições, ressaltando-se que sua construção deve ser inspecionada de perto pelo Diretor Geral da Instrução Pública e pelos Inspetores de Ensino.
Por conseguinte, na administração de Ferreira Chaves, é sancionada a Lei Nº 405, de 29 de novembro de 1916. Sobre os Grupos Escolares, o Artigo 4º esclarece que “Os grupos escolares serão constituidos pela reunião de trez ou mais escolas, regidas cada uma por um ou mais professores, comprehendendo os cursos infantil e elementar, sob a direcção de um funccionario administrativo” (RIO GRANDE DO NORTE. Lei Nº 405, de 29 de novembro de 1916, p.39). Cumpre esclarecer que uma escola, diferentemente das escolas dos dias atuais, refere-se à atuação educacional de um professor em uma turma, assim, o grupo escolar nada mais era que a reunião de três ou mais professores lecionando em um mesmo espaço, o que fomentou a institucionalização do ensino.
Outro ponto que é importante ressaltar, diz respeito ao §1º - “Os grupos escolares serão creados e mantidos pelo governo do Estado nos municípios que concorrerem para o seu estabelecimento” (RIO GRANDE DO NORTE. Lei Nº 405, de 29 de novembro de 1916, p. 39). Este inciso é deveras relevante, nele o Estado assume a fundação e o custeio dos Grupos Escolares, anteriormente, a construção e a despesa do educandário eram compartilhadas com as Intendências Municipais e os particulares, conforme já explicito nesta pesquisa. Por vezes, as Intendências e os particulares não tinham o interesse necessário para levar a cabo a consolidação deste empreendimento.
As escolas isoladas são mantidas e passam a ser mistas, são liberadas para funcionar em qualquer dos turnos, diurno ou noturno. O ensino primário elementar torna-se totalmente gratuito e obrigatório para ambos os sexos, dos oito aos 14 anos. Esta obrigatoriedade é contestada pelo fato do Estado não oferecer vagas suficientes para toda a população em idade escolar. Outro aspecto que continua a ser enaltecido pela legislação educacional do Rio Grande do Norte são os sentimentos do nacionalismo e da cidadania republicana, como é possível observar no Artigo 52.
Art.52 – A formação do sentimento cívico será feita, principalmente, por meio de explicações summarias sobre a organização politica do Brazil, do Rio Grande do Norte e seus municípios, o exercício dos direitos e deveres do cidadão brazileiro e referencias aos factos capitães da historia patria (RIO GRANDE DO NORTE. Lei Nº 405, de 29 de setembro de 1916, p. 55).
Os cuidados com a higiene também se caracterizam como uma preocupação constante do Estado. Esta preocupação recai sobre os prédios, os professores e os alunos. Era vetada a matrícula dos alunos que “que soffrerem de moléstias contagiosas ou repugnantes, os imbecis e os que, por defeito orgânico, forem incapazes de receber instrucção. [...] Os que não houverem sido vacinados” (RIO GRANDE DO NORTE. Lei Nº 405, 29 de setembro de 1916, p. 63). Mas, as exigências higiênicas não incidiam apenas no ato da matrícula, o professor também teria de atuar nesse quesito.
Art. 55 – Para os cuidados da hygiene pessoal dos alumnos, o professor, antes de iniciar os trabalhos da aula, verificará se eles estão devidamente asseiados no corpo e nas roupas. No caso de encontrar algum com falta de asseio, providenciará para que seja a falta corregida, sem expôr o alumno ao ridículo (RIO GRANDE DO NORTE. Lei Nº 405, 29 de setembro de 2016, p. 55).
No mais, a reforma do ensino realizada em 1916, manteve vários aspectos semelhantes às legislações anteriores: como as funções do Diretor Geral da Instrução Pública, dos Inspetores de Ensino, dos Diretores Escolares e dos professores; as orientações voltadas para a construção das escolas; o ensino seriado; dentre outros. Alguns aspectos foram ampliados, outros permaneceram intocados. Contudo, esta reforma representou a preocupação do Estado com relação à imposição, da recém-nascida, cultura escolar. No ano de 1921, ao fazer um balanço dos últimos anos da instrução pública potiguar, o então Diretor Geral da Instrução Pública Manoel Dantas, afirmou:
Decidido a dar ao ensino a feição moderna que o estado actual da civilização reclama, o governador Antonio de Souza, em 1908, deu o primeiro passo creando o grupo escolar “Augusto Severo”, para ministrar o ensino graduado.
O governador Alberto Maranhão creou a Escola Normal de Natal, decretou o Codigo do Ensino e disseminou os grupos escolares por vários pontos do interior do Estado.
O Governador Ferreira Chaves continuou a creação de Grupos e decretou a actual reforma do ensino, que o Congresso Legislativo converteu na lei n. 405, de 29 de Novembro de 1916, verdadeiro monumento de sabedoria, porque, em mais de cinco anos de execução, ainda não precisou de retoques e tem servido á organização e aperfeiçoamento dos diversos ramos do ensino publico (DANTAS. PEDAGOGIUM, 1921, vol. 1 - p. 32 -33).
A Lei n° 471, de 3 de dezembro de 1919, promulgada pelo governador Antônio de Souza, criou as Escolas Rudimentares. Segundo a Lei, estas escolas foram criadas para atender as comunidades rurais e objetivava levar a instrução pública para todos os recantos do Estado. Estavam aptos para receber uma Escola Rudimentar os povoados, fazendas ou propriedades que contassem com 50 ou mais analfabetos.
A escola rudimentar pode ser fixa, nocturna e ambulante, obedecendo, porém, á mesma organização, seguindo o mesmo programma, de modo a dar, em dois annos, o ensino em curso graduado, da leitura, escripta e contabilidade, até as quatro operações, com ligeiras noções de conhecimentos geraes e instrução cívica. (DANTAS, PEDAGOGIUM, 1921, p. 33).
De acordo com Manoel Dantas (1921), esta escola atendia as pessoas que não tinham possibilidade de frequentar os Grupos Escolares, por habitarem longe dos perímetros urbanos mais populosos. Para o Diretor Geral da Instrução Pública, as escolas rudimentares eram um meio racional e econômico de disseminar o ensino oficial e desanalfabetizar a população potiguar.
O que remete a concepção de Thompson (1987) quando afirma que se a lei parece injusta não vai ter a eficácia social esperada, não vai ser consolidada, nem garantir o domínio da classe dominante sobre os dominados. Para que a lei seja realmente eficaz, ela precisa atuar no âmbito ideológico, para isso, ela precisa parecer justa. A criação das escolas rudimentares, assim como das escolas ambulantes, noturnas e isoladas, faz com que a população creia que o Estado está se esforçando para servir a todos. Mesmo que as diferenças entre os Grupos Escolares e as Escolas Rudimentares sejam gigantescas, elas são negadas ou amenizadas por discursos como o proferido por Manoel Dantas à Pedagogium.
Com o intento de suprir a demanda por professores, nas escolas rudimentares, isoladas e ambulantes, é expedido o Decreto nº 165, de 19 de janeiro de 1922, o seu Artigo primeiro informou que: “É criada na cidade de Mossoró uma Escola Normal primária, especialmente destinada ao preparo de professores para as escolas isoladas, rudimentares e ambulantes do interior do Estado” (RIO GRANDE DO NORTE. Decreto nº 165, de 19 de janeiro de 1922). Com esta medida, o Estado tenta suprir a constante escassez de professores, principalmente, para atuar nas cidades do interior Norte-Rio-Grandense.
Retomando o tópico da Higienização, o Decreto nº 210, de 16 de maio de 1923 autoriza a inspeção médico-escolar no Rio Grande do Norte, para se cumprir o que foi previsto na Reforma Educacional instaurada pela Lei 405 de 1916. De acordo com o Regulamento, “A inspeção abrangerá todos os estabelecimentos estaduais, municipais e particulares de ensino primário, normal, profissional e secundário de todo o Estado” (RIO GRANDE DO NORTE. Regulamento da inspeção médico-escolar no Rio Grande do Norte, 1923).
Destarte, a referida inspeção tinha por objetivo: a educação sanitária dos alunos e dos professores; a sistematização dos exercícios físicos; e a profilaxia das moléstias transmissíveis ou evitáveis. De modo que, salienta que o Estado não apenas necessitava de cidadãos alfabetizados, como também era evidenciada a criação de gerações fisicamente fortes e robustas.
Não deveria escapar de fato a nenhum observador mais atento o quanto o adestramento físico e suas necessárias implicações, em termos de hábitos de higiene, profilaxia, alimentação e regularização da vida cotidiana, acarretariam não só em aumento de aptidões físicas individuais, mas sobretudo numa consistente disciplina do comportamento e num estímulo extraordinário dos dispêndios de atividade, os quais causariam um impacto principalmente na dimensão das expressões coletivas (SEVCENKO, 2009, p. 47).
O adestramento físico condiz com o modo de pensar republicano, não apenas higiênico, mas, atlético, por meio do que Sevcenko convencionou chamar de filosofia dos corpos em ação. Uma pessoa educada com base nesses preceitos seria, em tese, bem mais eficiente no desempenho social, representaria o cidadão republicano moldado para exalar saúde e competitividade. Assim, com o Decreto nº 210, é formalizado mais um tipo de inspeção que se soma à inspeção de ensino e à inspeção de alunos, o que denota o caráter fiscalizador do Estado.
Ao final da Primeira República, é extinta a antiga Diretoria Geral de Instrução Pública, em seu lugar, passa a vigorar o Departamento de Educação, conforme estabelece o Artigo primeiro, na letra E do Decreto nº 238 de 30 de junho de 1924. Em 24 de março de 1925 é publicado o Regimento do Departamento de Educação. O artigo segundo, do Regulamento, informa que o Departamento de Educação é composto pelos seguintes órgãos:
I − O Diretor Geral do Departamento de Educação.
I − O Diretor Geral do Departamento de Educação.
II −O Conselho de Educação.
III – A Inspetoria de Ensino.
IV – O Secretário e mais funcionários da secretaria.
V – Os Conselhos Escolares, seus presidentes e os delegados destes.
VI – Os diretores e funcionários da Escola de Farmácia e Odontologia, Atheneu, Escola Normal de Natal, Escola Normal Primária de Mossoró, Escolas Profissionais, Grupos Escolares e os professores de Escolas Isoladas e Rudimentares, Diretor e funcionários do Teatro “Carlos Gomes”, bem como o corpo administrativo das escolas, colégios, instituições e sociedades subvencionados pelo Estado (RIO GRANDE DO NORTE. Regimento do Departamento de Educação, 24 de março de 1925).
Salvo algumas novidades - escolas de ensino superior, rudimentares e diferentes nomenclaturas[16]- a estrutura é basicamente a mesma da Diretoria Geral de Instrução Pública. As funções do Diretor Geral e dos Inspetores de Ensino, por exemplo, permaneceram as mesmas. Vale ressaltar o fato de que a organização do Departamento de Educação pouco difere da organização da imperial Diretoria Geral da Instrução Pública, entretanto, a mudança na nomenclatura denota a busca pelo rompimento com o passado imperial, bem como o anseio pela modernidade e progresso, tão enaltecidos na época. Nesse sentido,
Quando abordou o histórico da educação no Estado, o diretor da Escola Normal – o Professor Nestor Lima, rememora com tristeza os anos iniciais do Rio Grande do Norte, quando, segundo ele, o ensino era tratado com indiferença pelos governantes. Para o autor “A história da nossa instrucção é, por assim dizer, dos nossos dias” (PEDAGOGIUM, 1921, vol. 1. - p. 12). Deste modo, Nestor Lima enaltece os governos republicanos que se propuseram a valorizar e incentivar a instrução pública dos seus cidadãos, uma vez que esta graça não foi concedida aos potiguares, colonos e súditos das épocas passadas. O período da Primeira República foi posto como marco histórico do desenvolvimento educacional negando-se assim as iniciativas do passado.
7. A Lei e a consolidação da cultura escolar potiguar
Com embasamento na obra de Dominique Julia, entende-se a cultura escolar, dentro de uma abordagem histórica, atua como sendo uma mescla de normas e práticas, aquelas “que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar” e como um conjunto “que permite a transmissão desses conhecimentos e a incorporação de comportamentos” (JULIA, 2001, p. 2). Tendo a cultura escolar como objeto da historiografia, esse autor estabelece que a escola, em sua relação com a sociedade, tem uma história que não é muito diferente da história de outras instituições, por isso é detentora de uma cultura própria. Assim, a cultura escolar evidencia que a escola não é somente um lugar de transmissão de conhecimentos, mas, detém em seu âmbito relações sociais específicas e hierarquizadas, influenciadas por fatores internos e externos a ela.
A necessidade de conformação dos objetivos educacionais aos limites apresentados pela sociedade, em cada período da história, também tem impacto decisivo no estabelecimento da cultura escolar, pois ela é uma “cultura conforme, e seria necessário traçar, a cada período, os limites que traçam a fronteira do possível e do impossível” (JULIA, 2001, p. 25). Para o autor, “Estes três elementos, espaço escolar específico, cursos graduados em níveis e corpo profissional específico, são essenciais à constituição de uma cultura escolar [...]” (JULIA, 2001, p. 14-15). Portanto, a partir desde momento, buscar-se-á entender como estes elementos foram inseridos no cenário educacional do Rio Grande do Norte através da legislação, o que resultou na consolidação da cultura escolar potiguar.
A divisão do ensino em diferentes níveis de aprendizado é estabelecido, primeiramente, no Estado de São Paulo, com a Reforma de Caetano de Campos, regulamentada pelo Decreto Nº 27, 12 de março de 1890. Este quesito aparece, na legislação nacional, com a Reforma de Benjamim Constant (Decreto nº 981, de 8 de Novembro de 1890). No Rio Grande do Norte, o ensino seriado tem início com a criação do Grupo Escolar Augusto Severo, como determina o Artigo 2º - “A instrução será primária, infantil e elementar, consoante os métodos modernos, graduada em quatro classes distintas, visando o desenvolvimento intelectual, moral e físico” (RIO GRANDE DO NORTE. Regimento do Grupo Escolar “Augusto Severo”, 1908).
Pode-se observar a importância da aplicação do ensino em diferentes níveis de aprendizado, toma-se o exemplo do disposto na Lei 405, no Art. 47 – “O fundamento do ensino primario consiste em leitura, escripta, calculo e desenho, que serão cuidadosamente seriados, constituindo as demais materias os elementos accessorios da instrucção primária” (RIO GRANDE DO NORTE. Lei Nº 405, de 29 de setembro de 1916). O uso termo “cuidadosamente seriados” denota o zelo com que este aspecto é tratado. Em pouco tempo, a aplicação do ensino seriado vai além dos Grupos Escolares, se estendendo até as Escolas Isoladas, Noturnas e Rudimentares, chegando até os dias atuais.
Na província do Rio Grande do Norte durante todo o período imperial, de acordo com Nestor Lima (1927), de todas as escolas de Primeiras Letras existentes, apenas três possuíram prédios próprios. Estas estavam localizadas nas cidades de Ceará-Mirim, Martins e no povoado de Parelhas. No período, as atividades escolares eram realizadas nos lugares que estivessem disponíveis, na casa dos professores, na casa paroquial, dentre outros. Por exemplo, o Atheneu Norte-rio-grandense, inicialmente, funcionou em um quartel.
A partir de 1889, o ideário positivista de ordem e progresso norteará todo o período que compreende a Primeira República. Cabia ao estado “domesticar” o espaço urbano e as populações nele existentes. Para o arquiteto Pedro de Lima, “Natal viveu uma espécie de belle époque, com ações públicas voltadas para a educação, atividades artísticas e culturais. Junto com a ordenação física da cidade, a intendência de Natal também buscava o disciplinamento da população” (LIMA, 2006, p. 112).
A primeira escola edificada neste momento histórico foi o Grupo Escolar Augusto Severo, que ficava localizado na Praça de mesmo nome. Era o endereço mais nobre da cidade, onde foram edificados os signos da modernidade. Para se ter uma ideia, a escola ficava ao lado do Teatro Carlos Gomes, seus circunvizinhos eram: o Cinema Polytheama, a estação ferroviária, a elegante loja Paris em Natal e a Escola Doméstica. Segundo Cascudo, “O governo estadual mandou construir a casa-da-escola na Ribeira, edifício moderno, um tanto precioso, pelo arquiteto Herculano Ramos, renovador da construção oficial” (CASCUDO, 2010, p. 242). As normas que nortearam a edificação das escolas foram regulamentadas no Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910. Orientava-se a construção da seguinte maneira:
Art. 44 – “Os edificios das escolas serão situados em terreno elevado e secco, isolados de outros predios, afastados dos centros de grande actividade insdustrial, de pantanos e logares suspeitos”.
Art. 45 – Os predios, elegantes, modestos, bem arejados e banhados pelo sol, terão salas de aula, para quarenta alumnos no maximo, sob forma retangular, medindo, pelo menos, seis metros de largura por sete de comprimento, com um pé direito de quatro metros, ou sejam de mais de quatro metros cubicos para cada alumno.
Art. 46º - Haverá no edifício as aberturas necessarias para que as classes recebam a luz de maneira mais conveniente.
Art. 47º Os edifficios serão pintados a côres neutras, preferindo-se azul ou verde-claro.
Art. 48º Cada sala de aula terá como dependencia um vestuario guarnecido de cabides.
Art. 49º Os prédios terão compartimento para directoria e archivo e uma área descoberta para recreio, com divisões para cada sexo.
Art. 50º Em falta de esgottos publicos, as letrinhas constarão de uma fóssa séptica ou reservatório estanque, onde as matérias organicas purifiquem-se pelos proprios microbios. Na falta destas, serão construidas fóssas ordinarias, com paredes impenetraveis aos liquidos, os quaes se deve esvaziar e desenfectar frequentemente.
Art. 51º Todas as carteiras e bancas de elevação facultativa, serão proporcionadas á estatura dos educandos e construidas de maneira a garantir a saude, facilitando a vigilancia do professor e a responsabilidade individual do alumno.
Art. 52º As plantas e projectos para construção de escolas, serão previamente remetidas ao Conselho de Instrucção para as devidas correcções e approvação.
Art. 53º Nenhum estabelecimento de instrucção poderá ser inaugurado sem o parecer do respectivo inspector de ensino, depois de rigorosa verificação (RIO GRANDE DO NORTE. Decreto Nº 239, 15 de dezembro de 1910).
Com isso, o prédio escolar fora inserido no moderno espaço urbano, idealizado na era republicana, simbolizava o poder do Estado, como outrora o fez a igreja. O modelo proposto foi seguido pelas cidades do interior, que também ansiavam o progresso.
É sabido que, no Rio Grande do Norte, as escolas anteriores a 1908 eram compostas por um único profissional, no caso, o professor. Ele era responsável pelo funcionamento geral da escola, sua limpeza e o que mais demandasse. A inserção de outros profissionais no âmbito escolar, de acordo com Julia (2001), é entendida como um dos elementos que constituem a cultura escolar.
No Rio Grande do Norte, a escola passa a contar com a atuação de outros profissionais a partir da criação dos Grupos Escolares. No Regimento do Grupo Escolar Augusto Severo é possível perceber que foram inseridas duas novas funções, o diretor[17] e o porteiro[18]. Passados poucos anos, a escola passa a ser implementada com mais profissionais: os contínuos, inspetores de alunos, secretários e porteiro-zelador. Como se pode observar no Código de Ensino, quando é disposto que as escolas seriam acrescidas com os seguintes funcionários administrativos:
§ 1º − Na Diretoria Geral: 1 Diretor Geral, 3 inspetores de ensino, 1 secretário e 1 porteiro-contínuo.
§ 2º − No Atheneu Norte-Riograndense: 1 Diretor, 1 secretário, 1 inspetor de alunos, 1 porteiro e 2 contínuos.
§ 3º − Na Escola Normal: 1 Diretor, 1 secretário, 1 inspetor de alunos, 1 inspetora de alunas e 1 porteiro contínuo, que exercerá as mesmas funções no Grupo Modelo.
§ 4º − No Grupo Modelo: 1 Diretor.
§ 5º − Nos outros grupos escolares: 1 Diretor e 1 porteiro-zelador.
(RIO GRANDE DO NORTE. Decreto nº 261, de 28 de dezembro 1911).
Deste modo, a escola como é conhecida na contemporaneidade, vai criando forma e se consolidando no cenário potiguar e nacional.
8. Os grupos escolares
O primeiro Grupo Escolar brasileiro foi a Escola Modelo da Luz, localizado na cidade de São Paulo e criado pela Lei Nº 169, de 7 de agosto de 1893. O que influenciou a criação, quinze anos mais tarde, do primeiro Grupo Escolar potiguar, o Grupo Escolar Augusto Severo. O Grupo Escolar foi o grande responsável pela consolidação da cultura escolar, uma vez que foi o primeiro a contar com funcionários administrativos, teve o ensino seriado e realizava suas atividades em um prédio específico para este fim.
De 1908 a 1913, muitos Grupos Escolares foram criados pelo Estado: Natal – Grupo Escolar Augusto Severo (Decreto nº 174, de 5 de março); Mossoró – Grupo Escolar Trinta de Setembro (Decreto nº 180, 15 de novembro de 1908); Caicó – Grupo Escolar Senador Guerra (Decreto nº 189, 16 de fevereiro de 1909); Acary (Acari) – Grupo Escolar Thomaz de Araújo (Decreto nº 193, 13 de março de 1909); Caraúbas – Grupo Escolar Antônio Carlos (Decreto nº 194, 15 de março de 1909); Martins – Grupo Escolar Almino Affonso (Decreto nº 196, 21 de abril de 1909); Serra Negra – Grupo Escolar Coronel Mariz (Decreto nº 202, 2 de julho de 1909); São José de Mipibu – Grupo Escolar Barão de Mipibu (Decreto nº 204, 12 de agosto de 1909); Goyaninha – Grupo Escolar Moreira Brandão (Decreto nº 220, 7 de maio de 1910); Pedro Velho – Grupo Escolar Fabrício Maranhão (Decreto nº 224, 8 de julho de 1910); Jardim do Seridó – Grupo Escolar Antônio de Azevedo (Decreto nº 225, 8 de julho de 1910); Papary (atual Nísia Floresta) – Grupo Escolar Nysia Floresta (Decreto nº 226, 8 de julho de 1910); Pau dos Ferros – Grupo Escolar Joaquim Correa (Decreto nº 234, 10 de novembro de 1910); Arez – Grupo Escolar Jacunaíma (Decreto nº 243, 4 de março de 1911); Assú – Grupo Escolar Tenente Coronel José Correia (Decreto nº 254, 11 de agosto de 1911); Macahyba (Macaíba) – Grupo Escolar Auta de Souza (Decreto nº 255, 19 de outubro de 1911); Currais Novos – Grupo Escolar Capitão-Mór Galvão (Decreto nº 256, 25 de novembro de 1911); Apody (Apodi) – Grupo Escolar Ferreira Pinto (Decreto nº 257, 25 de novembro de 1911); Angicos – Grupo Escolar José Rufino (Decreto nº 258, 11 de dezembro de 1911); Nova Cruz – Grupo Escolar Alberto Maranhão (Decreto nº 263, 8 de janeiro de 1912); Luiz Gomes – Grupo Escolar Coronel Fernandes (Decreto nº 265, 20 de janeiro de 1912); Ceará-Mirim – Grupo Escolar Felippe Camarão (Decreto nº 266, 23 de março de 1912); Natal (bairro do Alecrim) – Grupo Escolar Frei Miguelinho (Decreto nº 277-B, 28 de novembro de 1912); Canguaretama – Grupo Escolar Pedro Velho (Decreto nº 286, 10 de julho de 1913).
A criação de vinte e quatro Grupos Escolares, no período de tempo que compreende apenas seis anos, denota o grande interesse, por parte do governo, de incutir na sociedade potiguar a cultura escolar. O estabelecimento da instrução primária, pública e obrigatória, que foi apregoada pelo Estado na legislação educacional, relaciona-se com o estudado por Julia (2001) na Europa, “construiu-se mais frequentemente ligada a um projeto político que visa a associar cada cidadão ao destino da nação à qual pertence” (2001, p. 23).
9. Considerações finais
Nos estudos referentes ao campo da história da educação, muito tem sido discutido com relação à cultura escolar. Este conceito tem sido analisado com base em diferentes perspectivas, no entanto, não foram localizados estudos brasileiros que se propusessem a entender o surgimento e a consolidação desta cultura escolar no âmbito social. De maneira que, a importância deste estudo reside na intenção de compreender como o Estado incutiu a cultura escolar na sociedade por meio da análise dos elementos contidos na legislação educacional.
De acordo com a pesquisa realizada, entende-se que durante a Primeira República, o Estado atuou decisivamente na regulamentação da instrução pública, de modo a consolidar a cultura escolar no Rio Grande do Norte. As reformas realizadas, no âmbito nacional e no Estado de São Paulo, em grande medida, influenciaram as iniciativas potiguares. Na Legislação Educacional potiguar, foi observado que a documentação abordou diversas temáticas, tais como: a hierarquização/organização do ensino; a fiscalização; o material didático a ser utilizado; a construção dos edifícios escolares; a higienização; a grade curricular; a criação de Grupos Escolares; dentre outras determinações.
Além disso, é perceptível a questão dicotômica que atravessa a Lei, já que ela se apresenta como instrumento de dominação e, ao mesmo tempo, precisa ser justa para sua legitimação ideológica. Este aspecto torna-se evidente na relação existente no tocante à criação dos Grupos Escolares e das Escolas Isoladas – Rudimentares - Noturnas, os primeiros eram voltados para as elites e possuíam uma estrutura físico/curricular/intelectual bem mais complexa do que era oferecido nas escolas mencionadas, voltadas para a alfabetização dos dominados. O que leva a crer que as Escolas Isoladas – Rudimentares - Noturnas foram criadas para justificar o investimento feito nos Grupos Escolares.
O caráter fiscalizador do Estado é evidente na análise das atribuições da Diretoria Geral da Instrução Pública/ Departamento de Educação, da Inspetoria de Ensino e da Inspetoria Médico-Escolar. Por fim, a criação e a difusão dos Grupos Escolares foram essenciais para que a cultura escolar se fizesse presente no contexto potiguar.
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Notas
Art. 85º A direção do Grupo Escolar pertence ao professor indicado ao governo pelo Diretor Geral, com direto à gratificação adicional de 15% dos vencimentos.
Art. 86º Compete ao diretor:
1º A representação oficial do Grupo nas relações externas.
2º A fiscalização das classes para o seu regular funcionamento.
3º Propor ao Diretor Geral a criação e supressão dos lugares de adjuntos.
4º Representar contra os funcionários encontrados em falta.
5º Velar pela boa conservação e asseio do edifício, dependências e utensílios.
6º Requisitar à Diretoria da Instrução o fornecimento de material e expediente.
7º Encerrar diariamente o livro do ponto, marcando as faltas do pessoal.
8º Organizar no último dia de cada mês, conforme o livro do ponto, a folha do pagamento do pessoal, mencionando as faltas e seus motivos, para ser enviada ao Diretor da Instrução Pública.
9º Enviar no dia 30 de junho à Diretoria Geral um relatório dos trabalhos do Grupo, dando conta de todo o movimento das aulas.
10º Fazer cumprir fielmente as instruções do Diretor Geral (RIO GRANDE DO NORTE. Departamento de Educação. Regimento do Grupo Escolar “Augusto Severo”, 1908).
Art. 87º São deveres do porteiro zelador:
1º Guardar as chaves do estabelecimento, abrindo meia hora antes do começo das aulas e fechando logo depois de encerrados.
2º Responder pelo asseio e conservação do edifício, mobília, utensílios e iluminação.
3º Velar na polícia do grupo, especialmente na entrada e saída, dispensando a todos os alunos carinhoso tratamento.
4º Guardar o livro da porta.
5º Receber requerimento, ofícios e mais papéis e remeter ao seu destino a correspondência oficial.
6º Transcrever no livro da porta os despachos do diretor.
7º Receber, emassar, classificar e rotular todos os papéis que lhe forem entregues para o arquivo.
8º Receber com urbanidade os visitantes, levando-os à presença do diretor.
9º Cumprir as ordens relativas ao serviço em geral (RIO GRANDE DO NORTE. Departamento de Educação. Regimento do Grupo Escolar “Augusto Severo”, 1908).