Um estudo sobre a administração do capital de giro nas micro e pequenas indústrias de fundição de Divinópolis, MG

A study on working capital management in micro and small foundry companies in Divinópolis, MG

Valdilene Gonçalves Machado Silva
Universidade do Estado de Minas Gerais, Brasil
Felipe Zenith Fonseca
Universidade do Estado de Minas Gerais, Brasil
Erika Andrade Bitarais
Universidade do Estado de Minas Gerais, Brasil

Um estudo sobre a administração do capital de giro nas micro e pequenas indústrias de fundição de Divinópolis, MG

Research, Society and Development, vol. 7, núm. 3, pp. 01-14, 2018

Universidade Federal de Itajubá

Recepção: 18 Novembro 2017

Aprovação: 30 Novembro 2017

Resumo: A administração do capital de giro tem papel importante no desempenho das empresas. A carência de capital de giro e dificuldades na área financeira está entre as principais causas da ineficiência na gestão das empresas vivas e é o motivo do encerramento das que foram extintas. Assim, o objetivo deste trabalho foi analisar os principais fatores que influenciam a administração do capital de giro nas micro e pequenas indústrias de fundição de Divinópolis, MG. Foi realizada uma pesquisa exploratória e descritiva, cuja abordagem foi qualitativa e quantitativa. Os dados foram levantados por meio de questionário aplicado a nove empresas do setor de fundição de Divinópolis. Portanto, de forma geral, a falta de informatização das empresas, seu caráter predominantemente familiar, o baixo grau de escolaridade e a falta de formação na área de finanças de seus administradores são as principais barreiras para uma gestão eficiente do capital de giro.

Palavras-chave: Fundições, Gestão de capital de giro, Micro e pequenas indústrias.

Abstract: Working capital management plays an important role in the performance of companies. The lack of working capital and difficulties in the financial area are among the main causes of inefficiency in the management of living businesses and it is the reason for the closure of those that have been extinguished. Thus, the goalof this paper was to analyze the main factors that influence the administration of working capital in the micro and small industries of Divinópolis, MG. An exploratory and descriptive research was carried out, which approach was qualitative and quantitative. The data were collected through a questionnaire applied toninecompanies in the casting sector of Divinópolis. It was generally concluded that the lack of computerization of companies, their predominantly familial character, low level of education and lack of training in the area of finance of their managers are the main barriers to efficient management of working capital.

Keywords: Foundries, Working capital managemen, Micro and small interprises.

1. Introdução

A eficiência na gestão do capital de giro é fator determinante no desempenho e sobrevivência das empresas, sendo representado pelo ativo circulante, composto basicamente pelas disponibilidades, contas a receber e estoque, que suporta as operações diárias da empresa e representa a parte do investimento que circula durante as atividades operacionais da empresa.

Silva et al. (2017) apontam que empresa de pequeno porte localizada na cidade de Divinópolis, MG, onde foi realizada a pesquisa, não fazia uma gestão financeira eficiente por não utilizar adequadamente as ferramentas de gestão e por não realizar os controles de forma apropriada, o que comprometia a qualidade de seu processo decisório e impactava negativamente nos resultados da empresa.

Esta pesquisa justifica-se pela importância do setor de fundidos na economia de Divinópolis e, a partir deste estudo, as empresas terão uma visão geral do que é possível melhorar em seu sistema financeiro, tornando-o mais eficiente, contribuindo, assim, para o aumento do lucro e preservação da liquidez, fundamental em tempos de crise.

Partiu-se da hipótese de que o funcionário responsável pela gestão financeira dessas empresas é também responsável por outras áreas e, associando-se isto ao seu baixo grau de instrução, acredita-se que ele não tenha as competências necessárias para realizar uma gestão eficiente do capital de giro.

Assim, o objetivo geral desta pesquisa foi analisar os principais fatores que influenciam a administração do capital de giro nas micro e pequenas indústrias de fundição de Divinópolis. Para que esse objetivo fosse alcançado foi necessário analisar o perfil dos gestores financeiros, descrever como fazem os controles financeiros e identificar suas principais dificuldades na gestão do capital de giro.

Este texto, além desta introdução, trata na seção 2 dos principais conceitos de capital de giro sob a ótica de diversos autores, na parte 3 discorre sobre os materiais e métodos utilizados; a seção 4 trata dos resultados e discussão; na seção 5 são apresentadas as conclusões; e, por fim, são registradas as referências.

2. Capital de giro

Para Gitman (2010), o capital de giro é representado pelo ativo circulante. É chamado de giro, pois esse capital gira, de forma corrente, do caixa para estoques e de estoque para contas a receber e, quando recebido, retorna ao caixa. Segundo Di Agostini (1999), ele corresponde ao valor aplicado no ciclo operacional da empresa, e para Assaf Neto e Silva (2002), é o ativo circulante representado pelas disponibilidades, valores a receber e estoques.

Para compreender como esse capital gira dentro da empresa, é necessário conhecer seu ciclo operacional, econômico e financeiro. O ciclo operacional é, para Gitman (2010), uma conversão constante do capital circulante de caixa para estoque, de estoque para duplicatas a receber e novamente para o caixa. O ciclo financeiro envolve desde o pagamento aos fornecedores até o recebimento pelas vendas do produto acabado ou serviço prestado; esta fase está relacionada diretamente com a necessidade de capital de giro (VIEIRA, 2005). O ciclo econômico, para Assaf Neto e Silva (2012), são todas as atividades de natureza econômica da empresa, da compra de materiais até sua venda, desconsiderando movimentações financeiras. A Figura 1 ilustra esses três ciclos.

Ciclo operacional, econômico e financeiro
Figura 1 –
Ciclo operacional, econômico e financeiro
Fonte: Vargas, 2016.

A administração do capital de giro, conforme Assaf Neto e Silva (2012), envolve tanto as contas do ativo como do passivo circulante e as suas inter-relações. Para Gitman (2010), a administração dos ativos e passivos correntes deve ser feita de tal forma que um nível aceitável de capital circulante líquido seja mantido. De acordo com Braga (1995), a administração do capital de giro é um processo permanente de tomada de decisões, cujo objetivo é preservar a liquidez da empresa, impactando diretamente a sua rentabilidade.

Gitman (2010) elenca algumas estratégias para uma administração eficiente do capital de giro, destacando: girar dos estoques o mais rápido possível; cobrar as contas a receber o quanto antes; gerir os tempos de correspondência, processamento e compensação; e pagar as contas o mais tarde possível. Assim, contas como caixa, duplicatas a receber e estoque, exercem forte impacto na gestão do capital de giro.

2.1 Administração de contas a receber

Contas a receber, de acordo com Santos (2001), é uma parcela importante do capital de giro, representada pelas vendas a prazo, e sua administração deve envolver planejamento e controle para que seu recebimento seja efetivo. Sanvicente (1997) destaca a importância do crédito por ser um mecanismo para aumentar as vendas e ser amplamente empregado como forma de atrair clientes. A área de contas a receber abrange a política de crédito e cobrança.

Iudícibus, Martins e Gelbcke (2003) definem contas a receber como um dos mais importantes ativos da empresa, decorrentes das vendas a prazo de mercadorias e serviços a clientes ou oriundo de outras transações que não fazem parte do escopo da empresa, são inerentes, porém, às suas atividades. Gitman (2010) salienta a importância de técnicas que determinam o grau de confiabilidade do cliente para o fornecimento de crédito. O modelo dos cinco Cs do crédito e o método dos escores de crédito são bastante difundidos para realizar essa análise.

Para Megliorini e Silva (2009) os Cs são:

  1. a) Caráter: intenção dos clientes pagarem seus compromissos.

  2. b) Condições: impactos de fatores externos sobre a capacidade dos clientes pagarem suas dívidas.

  3. c) Capacidade: gerar recursos suficientes para o pagamento da dívida.

  4. d) Capital: potencial financeiro, refletido pela situação patrimonial.

  5. e) Collateral: garantias oferecidas para suprir a fragilidade em um dos outros Cs.

O método dos escores de crédito é empregado quando há muitos pedidos de crédito de pequeno volume; consiste no fornecimento de pontuações (escores) para determinadas características financeiras e creditícias importantes, sendo que, ao final da análise, se o cliente obtiver uma pontuação consistente, o fornecimento de crédito é recomendado (GITMAN, 2010). O escore de crédito caracteriza-se por ser uma ferramenta de análise de crédito rápida e de baixo custo para a empresa.

2.2 Administração de caixa

A administração de caixa, para Santos (2001), envolve o planejamento e controle das disponibilidades financeiras representadas pelos depósitos bancários e aplicações financeiras de liquidez imediata. O fluxo de caixa e a análise de custo-benefício auxiliam a administração de caixa.

A administração do fluxo de caixa, segundo Kato (2012), destina-se ao planejamento e controle do capital de curto prazo da empresa; seu objetivo é manter o saldo de caixa positivo, evitando que a empresa recorra a empréstimos, o que aumenta os custos pelo pagamento de juros. Conforme Assaf Neto e Silva (2012), o fluxo de caixa demonstra a geração e aplicação dos recursos de caixa oriundos das atividades operacionais da empresa, dos investimentos e dos financiamentos. Zdanowicz (2002) destaca que entre os principais objetivos do fluxo de caixa estão: facilitar a análise e o cálculo na seleção das linhas de crédito a serem obtidas; verificar a possibilidade de aplicar possíveis excedentes de caixa da forma mais rentável possível; desenvolver o uso eficiente e racional do disponível; financiar as necessidades sazonais ou cíclicas da empresa.

Desta forma, a administração de caixa é um componente-chave na gestão do capital de giro, pois permite a empresa planejar as entradas e saídas de capital e tomar decisões financeiras mais vantajosas.

2.3 Administração de estoques

Segundo Gitman (2010), o objetivo da administração de estoques é girá-los o mais rápido possível sem perder vendas pela sua falta. Manter estoques justifica-se, segundo Assaf Neto e Silva (2012), por tornar o fluxo econômico contínuo.

A decisão de manter estoque pode ser tanto benéfica quanto dispendiosa para uma empresa. Assaf Neto e Silva (2012) destacam que a falta de matéria-prima pode paralisar a linha de produção, podendo gerar grandes prejuízos para a empresa, e o estoque mínimo (de segurança) é uma forma de a empresa precaver-se da possibilidade de falha no fornecimento de materiais ou de um pedido inesperado de clientes. Marion (1998) ressalta que um elevado investimento financeiro em estoque pode reduzir a liquidez da empresa, podendo levá-la à dependência do mercado financeiro para suprir sua necessidade de capital de giro.

Para uma gestão eficiente do estoque é necessário: vender o quanto antes para gerar caixa; possuir apenas um estoque mínimo que garanta a demanda dos clientes; estar atento a fatores como tendências, médias e sazonalidade do consumo; manter uma relação próxima com o fornecedor para garantir as especificações e qualidade do lote de entrega; e utilizar técnicas e métodos científicos para arranjos físicos e movimentação de materiais (KATO, 2012). Assim, ferramentas e métodos específicos para o gerenciamento de estoques auxiliam uma gestão mais eficiente, podendo-se destacar o lote econômico de compra (LEC), estoque de segurança, curva ABC, just in time (JIT) e o sistema de planejamento de necessidades de materiais (MRP) (GITMAN, 2010).

3. Metodologia

Esta pesquisa classifica-se como exploratória e descritiva com abordagem qualitativa e quantitativa, pois seu objetivo foi descrever o perfil dos administradores financeiros das micro e pequenas indústrias de fundição da cidade de Divinópolis, delinear como fazem a gestão do capital de giro e suas principais dificuldades nessa gestão. É exploratória pois, apesar de existirem diversas pesquisas sobre o tema, ainda foi pouco explorado no segmento de fundições na região de Divinópolis. Para a pesquisa quantitativa foi utilizado o questionário, elaborado a partir da pesquisa bibliográfica, composto por questões fechadas e abertas, aplicado no período de agosto/2016 a outubro/2016, cujos resultados, após tabulados e transformados em gráficos, passaram por uma análise qualitativa.

Primeiramente se realizou um estudo bibliográfico sobre o tema proposto; a partir dele desenvolveu-se o questionário-base da pesquisa, iniciando-se a seguir a fase de agendamento das visitas, realizada por telefone. Os contatos das empresas foram obtidos com a ajuda do Sindicato dos Metalúrgicos de Divinópolis e da Associação Comercial e Industrial de Divinópolis (Acid). Para maior aceitação da pesquisa pelas empresas, o questionário teve uma introdução com explicação dos seus objetivos e sua importância para o setor. Após introduzir a pesquisa, o aplicador lia o questionário, preenchendo-o à medida que o responsável financeiro da empresa respondia às perguntas. Esta forma de preenchimento do questionário foi a prática mais adequada, pois se observou que, se o questionário fosse apenas entregue para preenchimento, a pessoa que iria respondê-lo poderia ter dúvidas por não entender determinados termos específicos da área administrativa e, assim, comprometer os resultados da pesquisa.

Por fim, os dados obtidos foram tabulados, transformados em gráficos representativos da realidade das empresas na gestão do capital de giro, com o auxílio do programa Excel, que foram analisados para conclusões. Os dados expressos por eles serão explicados com mais detalhes no capítulo “Análise dos resultados”.

A fabricação de materiais fundidos em Divinópolis tem grande importância para sua economia. O desenvolvimento deste setor está diretamente relacionado à forte presença da indústria transformadora de metais na cidade, destacando-se as siderúrgicas de ferro-gusa. Dados do DataViva (2014) apontam que, juntas, as fundições de metais ferrosos e não ferrosos têm participação em 1,7% no produto interno bruto (PIB) da cidade, o que representa uma entrada mensal de 1,8 milhões de reais em sua economia e geram cerca de 998 empregos, num total de trinta estabelecimentos ativos.

O universo amostral foi delimitado pelas micro e pequenas empresas (MPEs), já que empresas deste porte apresentam maior índice de mortalidade comparado às empresas maiores, e a gestão do capital de giro tem papel fundamental em seu crescimento e em sua saúde financeira (SEBRAE, 2007).

A Lei Complementar n.o 123, de 14 de dezembro de 2006, determina que microempresas são aquelas que possuem receita bruta anual menor ou igual à R$ 360.000,00 e as empresas de pequeno porte possuem renda bruta anual entre R$ 360.000,00 e R$ 3.600.000,00 (BRASIL, 2006). Como informações financeiras geralmente não são divulgadas pelas MPEs, o critério adotado nesta pesquisa para definir porte foi o número de empregados. Para o Sebrae (2016) uma indústria é considerada microempresa quando possui até dezenove empregados e pequena empresa quando possui entre vinte a 99 empregados. Assim, todas as fundições que possuíam mais de 99 empregados foram desconsideradas nesta pesquisa.

O número total de empresas que fizeram parte do universo amostral foi estimado de acordo com dados do DataViva (2014), do Sindicato dos Metalúrgicos de Divinópolis e da Acid. Para o DataViva (2014) existiam na cidade trinta empresas ativas na área de fundição de metais ferrosos e não ferrosos, já os dados do Sindicato e da Acid apontavam um total de 63 empresas. Muitos contatos fornecidos pelo Sindicato e pela Acid, porém, eram de empresas inativas, por isso essa discrepância com os dados do DataViva.

Excluindo-se as empresas de médio e grande porte e as que não concordaram em responder à pesquisa, chegou-se a um número de aproximadamente vinte empresas em que a realização da pesquisa era viável, entre estas, a pesquisa foi realizada em nove. As demais foram contatadas, mas, ou se recusaram a responder ao questionário ou não atenderam às ligações.

O questionário foi desenvolvido a partir da pesquisa bibliográfica, em que se buscou incluir em um único documento toda a abordagem do tema, capital de giro; foi adotado um modelo de resposta binário (sim ou não), podendo ser acrescidos dados adicionais se o respondente julgasse necessário.

O questionário foi dividido em três seções. A primeira com onze questões direcionadas a delimitar o perfil da empresa e do principal administrador financeiro. A segunda com 45 questões referentes à análise do controle financeiro e a última com apenas uma questão sobre as principais dificuldades na gestão do capital de giro na empresa, com catorze opções de resposta para que fossem assinaladas aquelas que melhor representassem as dificuldades vivenciadas pela empresa e uma opção outras, para que fossem informadas as dificuldades da empresa que não estivessem entre as catorze listadas anteriormente.

O questionário passou por um pré-teste e, após sua aprovação, iniciou-se a sua aplicação, que foi longa e desgastante, principalmente pela resistência de muitos empresários em responder à pesquisa e falar abertamente sobre valores, desempenho econômico e medidas administrativas, o que acabou gerando dados inconsistentes ou até mesmo sua ausência, por isso não foram considerados na análise de dados.

Para contornar essas dificuldades, fez-se uma parceria com a Acid, que, percebendo a importância do resultado da pesquisa para desenvolvimento de ações para melhoraria do desempenho do setor, enviou comunicado para todas as empresas do setor que eram membros da associação, informando e convidando-as a participarem do trabalho, aumentando, assim, a adesão à pesquisa.

4. Análise dos resultados

Neste capítulo serão analisados e discutidos os resultados da pesquisa,

4.1 Perfil da empresa e dos administradores

Os dados levantados indicaram que 56% das empresas possuíam até vinte funcionários, o que as caracterizava como microempresas, sendo que 45% possuíam até dez anos de funcionamento. Quanto ao número de sócios, a pesquisa indicou que 78% das fundições possuíam apenas dois. Por fim, ficou atestado que 78% das empresas fabricavam utensílios domésticos, destacando-se a produção de panelas de alumínio.

Pelos dados obtidos, 78% dos administradores eram homens e 45% possuíam idade entre vinte e trinta anos. Quanto ao grau de instrução, 45% possuíam apenas ensino fundamental completo e 35% possuíam ensino superior completo. Entre os que possuíam formação superior, 60% eram na área de administração ou áreas relacionadas, sendo que apenas 33% dos que responderam à pesquisa possuíam cursos na área de finanças.

Referente ao cargo que ocupavam na empresa, 56% eram também os proprietários da empresa e possuíam até dez anos de empresa. 89% tinham parentesco com algum dos funcionários, o que é forte indicador de que as empresas eram, em sua maioria, familiares, já que seu principal administrador era também o proprietário e este possuía parentesco com algum dos funcionários.

Um fato interessante observado in loco e que não fazia parte do escopo do questionário foi que, em muitas empresas visitadas, o principal administrador (na maioria, o proprietário) não possuía formação superior, tinha consciência, porém, de que a formação acadêmica era importante para uma gestão mais eficaz da empresa. Para suprir essa carência, eles contavam com o auxílio, na maioria das vezes de seus filhos, que estavam sendo formados na área de administração, indicando que os sucessores apresentariam um grau de instrução mais elevado do que dos atuais gestores.

4.2 Análise do controle financeiro

A primeira análise foi sobre o planejamento, controle e financiamento do capital de giro. Levantou-se que 67% das empresas faziam balanço patrimonial e calculavam prazo médio de recebimento dos clientes, mas somente 11% calculavam índices de liquidez. Cerca de 56% das empresas elaboravam o demonstrativo de resultado e calculavam o prazo médio de recebimento de clientes, e apenas 33% calculavam o giro de caixa. 78% alegaram que possuíam capital de giro suficiente e 67% adotavam alguma medida para evitar a falta de capital de giro. Apenas 33%, porém, calculavam a necessidade de capital de giro e somente 11% implementavam ações para redução dessa necessidade. Quanto ao financiamento do capital de giro, 78% utilizavam capital de giro próprio e 33% utilizavam algum tipo de financiamento.

Os resultados apontaram que a administração do capital de giro não estava sendo realizada de forma eficiente pelas empresas, pois ferramentas importantes, como cálculo do giro de caixa, dos índices de liquidez e da necessidade do capital de giro, estavam sendo negligenciadas por grande parte dos administradores. Di Agustini (1999) destaca a relação direta entre gestão do capital de giro e liquidez. Portanto, calcular índices de liquidez auxilia a gestão do capital de giro, contribuindo diretamente para a manutenção da liquidez. Para Assaf Neto e Silva (2012) a definição do montante de capital de giro é uma tarefa que exerce grande influência no sucesso dos negócios, trazendo evidentes efeitos sobre a liquidez e rentabilidade das empresas. No entanto, a maioria das empresas pesquisadas não passavam por problemas financeiros decorrentes da falta de capital de giro

A análise seguinte foi a administração de contas a receber. Sobre a política de crédito, levantou-se que 78% dos empreendimentos concediam descontos para pagamentos antecipados, 67% possuíam critérios de aprovação de crédito, mas apenas 22% estipulavam limite de crédito para clientes. Quanto à análise de crédito, 56% faziam a análise de crédito de todos os clientes e nenhuma vendia para clientes com restrições cadastrais. Na administração da cobrança, 78% utilizavam cobrança bancária; apenas 33%, porém, possuíam sistema de cobrança informatizado e calculavam índices de desempenho para cobrança.

Percebeu-se, então, certa preocupação das empresas com a política de crédito, pois a maioria possuía critérios para aprovação de crédito, sendo a consulta à Empresa Brasileira de Análises e Informações para Decisões de Crédito e Apoio a Negócios (Serasa) o principal método adotado. Cabe destacar, porém, que apenas a consulta à Serasa não era suficiente para a elaboração de um cadastro consistente. Existiam ferramentas que, se bem utilizadas, minimizariam o risco na concessão de crédito. Notou-se uma tendência das empresas por negócios que ofereciam menos risco em vez de negócios mais lucrativos, posto que a maioria oferecia descontos para pagamentos antecipados, fato que justificava o baixo número de empresas que calculavam o desempenho da cobrança, e a maioria considerava a consulta ao Serasa suficiente para atestar a idoneidade do cliente. Conclui-se que a gestão da cobrança não era eficiente, pois a principal estratégia adotada pelas empresas era eliminar de sua carteira os clientes inadimplentes.

As vendas a prazo, conforme Kato (2012), fazem parte de um processo comum de comercialização para a empresa manter-se competitiva no mercado, atraindo clientes, aumentando vendas e lucros. Desta forma, focar mais em vendas a prazo pode representar, se bem geridas, maior lucro em longo prazo, do que a atual visão focada nas vendas à vista. Uma forma de alavancar as vendas do setor seria instituir vendas a prazo, seria necessário, porém, primeiramente, definir uma política de crédito com regras claras para elaboração do cadastro e estabelecimento de limite de crédito para os clientes, com uma política de cobrança eficiente que minimize a inadimplência.

Na terceira parte analisou-se a administração de caixa. Sobre planejamento de caixa, 75% das empresas elaboravam o fluxo de caixa, somente 38%, porém, calculavam a sua precisão. Considerando o controle de caixa, 75% possuíam margem de segurança no caixa e 38% possuíam grande oscilação de caixa, entretanto apenas 25% adotavam medidas para reduzir essa oscilação. Quanto aos aspectos econômicos de caixa, 88% faziam análise de custo-benefício antes de tomar uma decisão financeira e 63% calculavam o nível ideal de recursos que deviam ser mantidos em caixa.

A maioria das empresas fazia uso de ferramentas essenciais na administração de caixa, ou seja, o fluxo de caixa e a análise de custo-benefício. Poucas, porém, calculavam a precisão do fluxo de caixa; desta maneira não era possível confrontar os resultados do planejamento com os ocorridos na prática, tornando-se mais difícil a aferição do seu desempenho. Zdanowicz (2002) reitera a importância do fluxo de caixa na gestão do capital de giro, considerando que todos os valores em caixa ou a receber serão bem empregados, assim, se os fluxos de caixa são otimizados, haverá um dimensionamento seguro do capital de giro. O fato de nem todas as empresas pesquisadas possuírem grande oscilação de caixa, pode estar relacionado a previsibilidade de demanda nesse setor. Tomaz (2013), presidente do Sindicato da Indústria de Fundição de Minas Gerais (Sifumg), declarou que a produção das fundições é maior, tradicionalmente, nos três primeiros meses do ano, sofrendo um decréscimo no trimestre seguinte e um aumento no terceiro trimestre. Portanto, as empresas podem precaver-se para as oscilações de mercado, entretanto é fundamental que elas tenham medidas preventivas para a oscilação de caixa, já que é notória a influência de fatores econômicos externos no mercado de metais.

A última parte considerada na análise do controle financeiro foi a administração de estoques. Verificou-se que todas as empresas negociavam descontos na aquisição de itens de estoques e 88% possuíam estoque de segurança. Por outro lado, apenas 25% calculavam o lote econômico de compras, apenas 25% utilizavam software na administração de estoques e nenhuma empregava o modelo Optimized Production Technology (OPT) na sua administração. Na avaliação da decisão de estocagem, 63% mensuravam o desempenho de seus estoques e somente 25% faziam uso do sistema ABC na classificação de seus estoques.

É possível concluir que as empresas tinham certa preocupação com a administração de seus estoques, já que negociavam descontos em sua aquisição, possuíam estoques de segurança e faziam a mensuração de seu desempenho. Sua administração, porém, poderia ser otimizada consideravelmente com a adoção de práticas consagradas no controle de estoques, como o cálculo do lote econômico de compras e a implantação do sistema ABC no gerenciamento de estoques. Além disso, softwares específicos para administração de estoques trazem ganhos na economia de tempo e na precisão das decisões de estocagem, seu uso deve, assim, ser considerado pelas MPEs. Sobre investimento em estoques, Assaf Neto e Silva (2012) destacam a importância dos estoques para manter o fluxo econômico contínuo. Seu excesso, porém, não é benéfico para a empresa. Segundo Ross, Westerfield e Jordan (1998), quando há excesso de estoque numa empresa, ela pode até ser rica em ativos, entretanto a falta de dinheiro em caixa pode levá-la à extinção.

4.3 Principais dificuldades na gestão do capital de giro

A última seção do questionário analisou os pontos fracos da administração do capital de giro na visão de seus administradores. Para isso, listaram-se possíveis problemas que poderiam ocorrer no seu gerenciamento e coube ao responsável financeiro apontar aqueles que se aplicavam à sua realidade.

O Gráfico 1 apresenta as principais dificuldades das empresas na gestão do capital de giro.

Principais dificuldades na gestão do capital de giro.
Gráfico 1 –
Principais dificuldades na gestão do capital de giro.
Fonte: Dados da pesquisa, 2016.

As principais dificuldades levantadas foram: a falta de controle dos estoques; nível de estoques muito alto; falta de controle dos resultados; falta de cobrança das dívidas vencidas de clientes; falta de sincronização entre recebimento e pagamento; e baixo grau de informatização do sistema financeiro da empresa. Destaca-se o último ponto como a principal dificuldade na gestão do capital de giro, indicado pela maioria dos administradores. Isto ocorre porque, segundo eles, muitas vezes a informatização de algum setor representa um alto investimento para a realidade da empresa, eles reconhecem, porém, a sua importância para agilizar tarefas rotineiras, evitando erros e otimizando processos.

5. Conclusão

Esta pesquisa buscou analisar os principais fatores que influenciam a administração do capital de giro das MPEs do ramo de fundições em Divinópolis. A partir dos dados levantados, pode-se afirmar que os objetivos propostos foram alcançados, pois se identificou o perfil das empresas e de seus administradores financeiros. A maioria delas são microempresas, indicando uma tendência desse setor em Divinópolis ser formado majoritariamente por empresas desse porte. Elas possuíam até dez anos de existência, fabricavam utensílios domésticos e possuíam dois sócios. Seu principal administrador financeiro era predominantemente do gênero masculino, proprietário da empresa, com idade entre vinte e trinta anos, possuía ensino fundamental completo, sem formação na área de finanças e tinha familiares trabalhando na empresa. Sobre a gestão do capital de giro, percebeu-se que a maioria tomava decisões baseadas na experiência em detrimento da formação técnica, algumas, porém, faziam uso de técnicas consagradas como fluxo de caixa. Apesar de não calcularem o giro de caixa nem índices de liquidez, não passavam por problemas financeiros. Verificou-se que é uma prática entre as empresas não fornecer crédito aos clientes com restrições no Serasa, e a maioria julgava desnecessário calcular o desempenho da cobrança. Quanto à administração de estoques, as empresas negociavam descontos no ato da compra, possuíam estoque de segurança e faziam o cálculo de desempenho de estoque, entretanto quase nenhuma delas utilizava ferramentas para seu gerenciamento. Por fim, a principal dificuldade apontada pelos administradores no controle financeiro foi o baixo grau de informatização do sistema financeiro, o que impactava negativamente a eficiência dos processos.

Assim, ficou claro que, por não se utilizarem ferramentas que contribuíssem para o aumento da eficiência da gestão, isso levava a empresa a um estado de estagnação econômica, fato percebido pelo longo tempo de funcionamento de algumas empresas e, mesmo assim, ainda eram de pequeno porte. Portanto, a hipótese levantada foi confirmada, já que seus administradores financeiros, em sua maioria, também eram os proprietários das empresas e por isso exerciam outras funções além da financeira e não possuíam a formação necessária para uma gestão eficiente do capital de giro a ponto de proporcionar um crescimento sustentado do empreendimento, apesar de ser capazes de manter a empresa em operação.

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