Resumo: Este artigo objetiva revisar a literatura nacional e internacional sobre a inserção estratégica de unidades de gestão de pessoas (GP) em arenas decisórias organizacionais, analisando elementos que influenciam na atuação dessas unidades no processo de tomada de decisão. Dedicando-se à lacuna teórica da dimensão política que permeia a GP, procedeu-se a uma pesquisa bibliográfica sem recorte temporal no portal de periódicos Capes. Como resultado, com base numa análise de conteúdo pós-categórica realizada em 32 artigos, foram identificados quatro elementos que compõem a atuação da área de GP para uma efetiva influência do setor nos negócios organizacionais. São eles: as ações formais e informais, a representação na alta liderança, os papéis dos profissionais e o envolvimento na tomada de decisão. Como limitação, considerando que os modelos de GP se abstêm de estudar modelos políticos, ressalta-se a dificuldade de definição dos descritores para pesquisa bibliográfica.
Palavras-chave: Política de gestão de pessoasPolítica de gestão de pessoas,Gestão estratégica de pessoasGestão estratégica de pessoas,Inserção estratégicaInserção estratégica,Tomada de decisãoTomada de decisão.
ABSTRACT: This article reviewed the Brazilian and international literature on the strategic insertion of Human Resource Management (HRM) units in organizational decision-making arenas, analyzing elements that influence the performance of these units in the decision-making process. Dedicated to the theoretical gap in the political dimension that permeates human resources, bibliographic research was conducted without a temporal cut in the Capes Portal of Periodicals. A post categorical content analysis carried out on 32 articles identified four elements that make up the performance of the HRM area for an effective influence of the sector in organizational business, they are: the unit’s formal and informal actions of HRM, the representation of the HRM unit in top leadership, the roles of HRM professionals, and the involvement of the HRM unit in decision-making. As a limitation, considering that the people management models abstain from studying political models, the difficulty of defining the descriptors for bibliographic research is highlighted.
Keywords: Human resource management policies, Strategic human resource management, Strategic insertion, Decision making.
Resumen: Este artículo tuvo como objetivo revisar la literatura nacional e internacional sobre la inserción estratégica de unidades de gestión de recursos humanos (GRH) en los espacios decisorios organizacionales, analizando los elementos que influyen en el desempeño de estas unidades en el proceso de toma de decisiones. Al considerar el vacío teórico en la dimensión política que permea la GRH, se llevó a cabo una búsqueda bibliográfica sin corte temporal en el portal de publicaciones periódicas CAPES. Como resultado, a partir de un análisis de contenido poscategórico realizado en 32 artículos, se identificaron cuatro elementos que componen el desempeño del área de GRH para una influencia efectiva del sector en el negocio organizacional. Estos son: las acciones formales e informales de la unidad de GRH, la representación de la unidad de GRH en el liderazgo superior, los roles de los profesionales de GRH y la participación de la unidad de GRH en la toma de decisiones. Como limitación, considerando que los modelos de GRH se abstienen de estudiar modelos políticos, se destaca la dificultad de definir los descriptores para la investigación bibliográfica.
Palabras clave: Política de gestión de recursos humanos, Gestión estratégica de recursos humanos, Inserción estratégica, Toma de decisiones.
Artigo
Inserção estratégica de unidades de gestão de pessoas em arenas decisórias organizacionais
Strategic insertion of human resource management units in organization decision-making arenas
Inserción estratégica de unidades de gestión de recursos humanos en arenas de decisión organizacional
Recepção: 01 Março 2021
Aprovação: 13 Dezembro 2021
O processo de tomada de decisão nas organizações ocorre por meio de escolhas definidas por diferentes grupos de poder, visando influenciar e direcionar a estratégia, os objetivos, os resultados e as políticas organizacionais para esses fins, entre aquelas empreendidas pelas unidades de gestão de pessoas (BEER, BOSELIE e BREWSTER, 2015; BREWSTER, LARSEN e MAYRHOFER, 2000; MINTZBERG, 1983; PAAUWE e BOON, 2009). Nesse âmbito, a literatura de gestão estratégica de pessoas (GEP) demonstra que determinadas práticas impactam os resultados operacionais, financeiros e de pessoal da organização, principalmente quando alinhadas à estratégia organizacional (LENGNICK-HALL et al., 2009; JIANG et al., 2012). Por outro lado, poucos estudos avaliam o contexto político que eventualmente modela os sistemas de gestão de pessoas (BEER, BOSELIE e BREWSTER, 2015; SHEEHAN et al., 2015).
A perspectiva política e processual da atividade organizacional, desenvolvida sobretudo pela literatura de estratégia, é considerada uma lacuna fundamental na literatura de GEP ao revelar a necessidade de o campo demonstrar como as atividades de gestão de pessoas (GP), assumindo uma posição central nas decisões estratégicas, táticas e operacionais, podem influenciar a estratégia e os resultados organizacionais (BECKER e HUSELID, 2006; BECKER, HUSELID e ULRICH, 2001; HENDRY e PETTIGREW, 1990; JACKSON, SCHULER e JIANG, 2014; WRIGHT e MCMAHAN, 1992).
Assim, pressupondo que a influência a ser compreendida é contingente às relações interpessoais, as quais são tecidas por sucessivas negociações e marcadas por inúmeros conflitos entre os membros das unidades de GP e os demais atores organizacionais, sobretudo os detentores dos meios de ação, merece destaque o fenômeno da inserção estratégica, ao qual se dedicou o presente estudo. Evidências até então reunidas demonstraram como fundamental a inserção estratégica das unidades de GP nas arenas decisórias para o enfrentamento de diferentes dificuldades no contexto da organização, na medida em que implica alguma autonomia do setor para discutir, formular, monitorar e revisar propostas para a área e instituições (CASTRO, 2018; CÔRTES, 2016; FONSECA et al., 2013).
Diante desse quadro, este artigo tem por objetivo, baseado numa revisão sistemática da literatura internacional e nacional do campo da GP, identificar os elementos que influenciam na atuação das unidades de GP no processo de tomada de decisão.
Considerando a integração vertical um dos princípios da GEP, a qual se fundamenta no alinhamento de políticas e práticas de GP com a estratégica organizacional (WRIGHT e MCMAHAN, 1992), o estudo do processo estratégico organizacional tem sido uma das agendas do campo dedicadas a compreender como essas unidades podem assumir posição de destaque no processo decisório organizacional (BEER et al., 1984; INGRAHAM e RUBAII-BARRETT, 2007; PAAUWE e BOON, 2009; SHEEHAN et al., 2007; TRUSS, 2003).
Sendo a tomada de decisão um processo dinâmico e resultante de escolhas inter-relacionadas, adotadas por diferentes atores e em diferentes momentos, que cumulativamente contribuem para o impacto final (HEIDEMANN e SALM, 2010), torna-se evidente a necessidade de considerar a influência de aspectos políticos no total e qualquer processo decisório, inclusive os relativos às matérias de pessoal.
Essa dimensão política do processo decisório considera diferenças de status e poder, as quais são manifestadas por meio da interação das pessoas e dos grupos em direção aos próprios interesses e aos da organização (NEIVA e PAZ, 2005; PAGÈS et al., 1987). Dessa forma, há um grupo relevante de atores que delimita o campo em que as disputas ocorrem e cujas características determinam, em grande parte, a dinâmica da vida política, conforme as instituições decisórias vigentes, a configuração organizacional dos grupos, os valores e as prioridades dos indivíduos envolvidos (REIS, 2013).
De outro modo, o processo decisório depende de aspectos racionais, ideológicos, culturais e profissionais manobrados por atores diversos, cada qual detentor de uma fração maior ou menor dos recursos à disposição da organização. Nesse ponto, a inserção estratégica, fenômeno a que se dedica o estudo em tela, figura como uma representação conceitual de como as unidades de GP buscam participar das arenas decisórias com vistas a exercer alguma influência nos processos que lhes competem direta e indiretamente. Por meio do estudo da inserção estratégica da área de GP nas arenas decisórias, é possível reconhecer que a dimensão política, associada ao processo de tomada de decisão, circunda tanto os profissionais quanto as unidades de GP nas organizações em suas questões burocráticas e estratégicas, com o objetivo de efetivação das políticas da área (ARAÚJO, 2018; SHEEHAN et al., 2016).
A participação das unidades de GP no processo decisório das organizações pode ser compreendida pela perspectiva formal-sinóptica ou informal-incremental (BREWSTER, LARSEN e MAYRHOFER, 2000). Na primeira, a tomada de decisão organizacional é um processo deliberado, no qual há uma divisão sequencial de formulação e implementação da estratégia. Assim, a participação do setor de GP no processo estratégico se dá de forma direta, por meio do acesso regulamentado às arenas decisórias organizacionais. Na segunda, a tomada de decisão ocorre por um processo interativo com várias retroalimentações, no qual as ecisões se dão sem divisões e a estratégia se desenvolve de maneira incremental, tornando-se visível na sua implementação, de maneira que a participação do setor de GP no processo decisório acontece pelo acesso não regulamentado aos membros componentes das arenas decisórias organizacionais (Figura 1).

Dessa maneira, a GEP não deve ser reduzida à vinculação de suas políticas ao planejamento e aos objetivos organizacionais, e sim responder a outros aspectos do processo global de formulação estratégica, a exemplo dos processos decisórios informais e emergentes que influenciam as demandas submetidas à área (FONSECA et al., 2013). Ainda que se trate de uma estrutura engessada de natureza rotineira e repetitiva, o processo decisório nas organizações varia de acordo com os contextos estrutural e institucional de cada situação de tomada de decisão (HOWLETT, RAMESH e PERL, 2013). Ademais, conforme mencionado, a dimensão política inerente às relações entre os atores envolvidos nos negócios organizacionais demanda uma atuação das unidades de GP no sentido de influenciar o processo de tomada de decisão e, consequentemente, de implementação de políticas e práticas de GP. Além de reconhecer elementos políticos na GEP, essa atuação fundamenta a relevância do fenômeno da inserção estratégica das unidades de GP nas arenas decisórias em organizações.
Na ausência de uma revisão da literatura sobre o tema e para melhor compreender o objeto deste estudo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica sem recorte temporal, a fim de identificar elementos que influenciam na atuação das unidades de GP no processo de tomada de decisão.
Foram feitas consultas na plataforma de periódicos Capes, que reúne diversas bases de dados, sendo possível acessar a produção nacional e internacional sobre o tema. Inicialmente, a busca se deu com a combinação de descritores “gestão estratégica de pessoas” e “inserção estratégica”, em que o único artigo encontrado foi Fonseca et al. (2013), já usado no embasamento teórico da pesquisa. Dessa maneira, foram utilizados termos com base na literatura usada na problematização da pesquisa (Quadro 1).

Ao todo, foram realizadas 30 combinações de descritores, seguidas por um processo de análise de conteúdo para identificação dos artigos coerentes com o fenômeno da inserção estratégica. O processo de busca e filtragem se iniciou com uma base de dados contendo 1.245 artigos e foi finalizado com 32. A análise de conteúdo pós-categórica seguiu o protocolo recomendado por Bardin (1977) em duas etapas: leitura do material selecionado, a fim de identificar as mensagens contidas nos artigos e propor as direções a serem seguidas; exploração do material, em que os textos foram desmembrados em unidades e sistematizados em categorias temáticas, a fim de identificar similaridades.
Foram realizadas interpretações e sínteses do material analisado, de modo a possibilitar a descrição e a análise das categorias identificadas. Constatou-se que o fenômeno em estudo é composto por diferentes elementos que se complementam, representados por quatro categorias temáticas: as ações formais e informais das áreas de GP (11 artigos), a representação das áreas de GP na alta liderança (4 artigos), os papéis dos profissionais de GP (14 artigos) e o envolvimento da GP no processo de tomada de decisão (16 artigos).
Considerando que a influência dos diretores de GP no processo de tomada de decisão impacta diretamente na eficácia da implementação de políticas de GEP, a visão dominante tem sido excessivamente formal e estrutural, de forma que o destaque da função de GP depende de como os dirigentes da unidade usam ações influentes e simbólicas, por meio da participação em processos de planejamento estratégico e de presença na alta liderança para aumentar seu poder, seu status e sua influência diante da organização (KELLY e GENNARD, 2010; NGUYEN et al., 2019; OTHMAN, 2009). Assim, tendo em vista que a tomada de decisão formal envolve a alta administração e a arena decisória da organização na responsabilidade operacional e estratégica pelo desempenho dos negócios organizacionais, o acesso a comitês formais é necessário para o reconhecimento da influência da GP, exigindo uma abordagem política sobre a atuação do profissional dessas áreas para a efetivação da mudança de valores na organização (KELLY e GENNARD, 2010; SHEEHAN et al., 2015; SHEEHAN et al., 2016).
A autoridade formal ainda é o atributo dominante das organizações contemporâneas, indicando para onde o poder percebido e exercido dos gestores flui na tomada de decisões. Há evidências de que os profissionais de GP têm atingido crescente reconhecimento com a participação em conselhos de diretores nas organizações (SHEEHAN et al., 2016). No entanto, a ausência de representantes do setor de GP na alta liderança não diminui sua influência, tendo em vista que existem outras maneiras de se envolver em processos de tomada de decisão por meio de grupos distintos de executivos da organização (CALDWELL, 2011; SHEEHAN, 2005). Embora estejam presentes na sala de reuniões e sejam convidados a fazer parte de decisões tomadas, a atuação da unidade de GP em ambientes formais não configura necessariamente uma influência nas decisões organizacionais, uma vez que a tomada de decisão formal e informal são vias de acesso para que os profissionais de GP participem do processo de planejamento estratégico (KELLY e GENNARD, 2010; SHEEHAN, 2005; SHEEHAN et al., 2016).
Assim, o poder da unidade de GP pode advir de outras fontes, como o conhecimento especializado, o controle de informações e o relacionamento direto com o restante da organização, situações que fornecem um acesso adequado para a contribuição do setor de GP com o negócio organizacional, haja vista que, em discussões informais, as pessoas podem dedicar tempo para pensar baseadas em opções, debater possibilidades e formular ideias (BUYENS e DE VOS, 2001; NGUYEN et al., 2019; SHEEHAN, 2005). Além disso, outros fatores, como a credibilidade dos negócios do gerente de GP, o nível de comprometimento da alta liderança com a gestão dos recursos humanos e o nível de apoio cultural que a organização fornece ao setor de GP, também são aspectos considerados determinantes para a integração estratégica da área de GP com o restante da organização. Desse modo, a ausência de tais fatores pode representar um compromisso apenas simbólico da organização com a área de GP, não resultando em apoio tangível de iniciativas para a área (SHEEHAN, 2005).
A participação informal tende a deixar uma série de questões intocadas, como considerações mais amplas sobre a tomada de decisões, carga de trabalho e representação em disputas (TOWNSEND, WILKINSON e BURGESS, 2013), confirmando que pesquisas dedicadas às relações informais entre os principais intervenientes e as discussões em torno dos ambientes formais têm sido negligenciadas (KELLY e GENNARD, 2010; OTHMAN, 2009). O alinhamento entre as perspectivas formal e informal não acontece por acaso; demanda uma integração aberta e sistemática, a fim de que se obtenham melhores resultados para a organização. Um ambiente organizacional que permita a superação de barreiras impostas pela estrutura formal demonstra a importância das relações informais na melhoria dos processos de trabalho e na difusão do conhecimento, visto que, conquanto o conhecimento técnico esteja bem distribuído entre as funções hierárquicas, é necessário haver condições para que este seja acessado e utilizado, a fim de gerar melhorias para a organização, impactando, assim, na atuação da GEP no processo estratégico e melhorando a credibilidade da área frente à organização como um todo (AMALOU-DÖPKE e SÜß, 2014; CONDE e FARIAS FILHO, 2016; TOWNSEND, WILKINSON e BURGESS, 2013).
Em conclusão, o uso de mecanismos formais e informais têm relevância para descrever a inserção estratégica das unidades de GP nas arenas decisórias. A representação do setor de GP na alta administração e todos os aspectos que a envolvem configuram o acesso formal ao processo de tomada de decisão organizacional. No entanto, as ações informais, tal qual a atuação da unidade de GP diante das relações existentes na organização, permitem o desenvolvimento de discussões que auxiliem na manifestação do fenômeno, a fim de obter o sucesso na implementação de políticas de GP.
A segunda categoria de temas identificados na pesquisa bibliográfica remete à representação das áreas de GP na alta liderança. Investigar a dinâmica das parcerias de GP com a alta liderança é fundamental para entender as etapas do processo decisório estratégico, independentemente de as conversações ocorrerem dentro de configurações formais ou informais (ZHAO et al., 2019). Assim, existe uma necessidade crescente de os profissionais de GP fazerem parte da alta liderança e participarem de uma parceria de negócios com gerentes de linha. Sem o apoio da alta administração, a GP deixará de fazer parte dos estágios iniciais do processo de tomada de decisões estratégicas. Dessa forma, a representação do setor de GP em arenas decisórias é um indicador-chave do papel estratégico da área, indicando o capital simbólico da profissão, isto é, a legitimidade, a estima profissional, o reconhecimento, o status e o respeito (BUYENS e DE VOS, 2001; SINGH, DARWISH e ANDERSON, 2012; TEO e CRAWFORD, 2005).
Esse status do setor de GP e sua capacidade de exercer influência sobre outros atores são considerados aspectos críticos no processo de implementação da GEP, especialmente para alcançar a integração entre a função de gestão de pessoas e o processo de gestão estratégica (TEO e CRAWFORD, 2005). Dessa maneira, os autores afirmam que a GEP, ao ser deixada para um grupo principal na alta liderança, exige que os gerentes de linha aceitem as responsabilidades pelo gerenciamento dos recursos humanos, de forma que a unidade de GP fique disponível para se concentrar mais em aspectos estratégicos.
Um relacionamento efetivo entre o gerente de GP e a alta administração baseado em confiança, com valores compartilhados sobre as questões de desenvolvimento estratégico, aumenta a oportunidade de participação do setor de GP na estratégia organizacional (SINGH, DARWISH e ANDERSON, 2012). A imagem do departamento de GP como parceiro estratégico se reflete no papel desempenhado pelos departamentos de GP em apoiar a alta administração na busca por uma estratégia corporativa e em atender aos requisitos de seus clientes internos de forma proativa, sugerindo que a mensuração das atividades de GP pode melhorar a credibilidade do departamento de GP, sua posição e relevância para a organização em comparação com outras funções, a fim de que o setor pertença ao grupo real de tomadores de decisão (AMALOU-DÖPKE e SÜß, 2014).
A principal premissa é que experiências, valores e personalidades da alta liderança afetam o entendimento que têm das situações que a organização enfrenta, de forma que as atitudes dos atores da alta liderança em relação aos profissionais de GP têm uma influência importante no envolvimento da área na tomada de decisões estratégicas (ZHAO et al., 2019; BOADA-CUERVA, TRULLEN e VALVERDE, 2019). Na realidade, é a alta cúpula organizacional que toma as decisões, de forma que a atuação do setor de GP é condicionada à supremacia da posição hierárquica da alta administração e da base de poder decorrente dessa estrutura (KELLY e GENNARD, 2010). Portanto, o apoio da alta liderança à gestão de pessoas tem sido visto como um indicador crucial da promulgação do papel estratégico do setor de GP, que só consegue ser exercido quando conta com o apoio da alta gerência, reconhecendo a contribuição estratégica da unidade de GP para a organização (AMALOU-DÖPKE e SÜß, 2014; BOADA-CUERVA, TRULLEN e VALVERDE, 2019; ZHAO et al., 2019). Assim, o apoio da alta liderança é importante para fornecer aos profissionais de GP oportunidade de colaborar em discussões estratégicas de tomada de decisão (KELLY e GENNARD, 2010; ZHAO et al., 2019).
Em síntese, a representação dos setores de GP na alta liderança é importante para a busca do sucesso da área na tomada de decisões estratégicas organizacionais e na implementação de políticas. Por evidenciar um papel estratégico da área de GP, essa representação reflete uma expectativa dos profissionais do setor, que visam estar presentes nas arenas decisórias das organizações, representadas pelas autoridades formais. Entretanto, é importante que essa representação exista não apenas na estrutura organizacional, como em diretorias colegiadas e conselhos administrativas, mas também em grupos executivos de efetiva discussão e formulação da estratégia organizacional, os quais podem exercer influência nos resultados organizacionais.
A trajetória da administração de recursos humanos (ARH) para a gestão estratégica de pessoas (GEP) reflete um suposto comprometimento de toda a organização para o desenvolvimento do capital humano, colocando em discussão a atuação estratégica das unidades de GP e a responsabilidade exercida pelas funções de GP em toda a organização (SHEEHAN, 2007; TANG et al., 2015). A GEP pode ser entendida como uma resposta à percepção de que as unidades de GP desempenham múltiplos papéis e, assim, seus profissionais enfrentam pressões para evitar funções tradicionais, focadas em tarefas funcionalistas (VAN BUREN, GREENWOOD e SHEEHAN, 2011).
Conforme apresentado em seção anterior, a visão dominante de atuação das unidades de GP tem sido excessivamente formal e estrutural, de forma que o papel desempenhado pela unidade na organização é percebido por meio das funções exercidas pelo setor de GP (SHEEHAN et al., 2016). Embora haja a tentativa de inserir uma abordagem estratégica no setor de GP, o gerenciamento dos papéis exercidos pelo profissional da unidade - funções estratégicas e atividades administrativas tradicionais - reflete diretamente na contribuição que a área pode proporcionar à organização, pois a variedade de deveres pode dificultar a inclusão de suas unidades no processo de tomada de decisão estratégica, de forma que são necessárias mais evidências acerca do impacto deles na variabilidade da implementação de políticas de práticas de GP (SHEEHAN et al., 2015; SHEEHAN et al., 2016; STEFFENSEN et al., 2019).
Numa perspectiva estratégica, as áreas de GP devem assumir parte no centro de direção e comando de uma organização, haja vista que seus diferentes atores desempenham, de alguma forma, um papel importante, determinante em decisões ligadas à área em toda a hierarquia organizacional (CHIU e SELMER, 2011; STEFFENSEN et al., 2019). No entanto, mesmo em organizações em que os profissionais de GP e os gerentes de linha entendem os conceitos de uma gestão de pessoas estratégica, a reputação da função de GP é frequentemente um obstáculo significativo a ser superado (BECKER e HUSELID, 2006; KELLY, 2001). Pesquisas apontam que a alta liderança e gerentes de linhas acreditam que a maioria das áreas de GP não está no centro organizacional, identificando uma lacuna entre elas e o restante da organização, sobretudo por duas razões. Em primeiro lugar, muitas organizações ainda não incluem os gerentes de GP no processo de planejamento estratégico e de tomada de decisões, além de reduzir o papel do gestor a uma mera implementação de práticas da área. Em segundo lugar, as funções de GP nem sempre interagem produtivamente com o gerenciamento das demais atividades organizacionais, vistas diversas vezes como rotinas administrativas que pouco impactam na eficácia organizacional (CHIU e SELMER, 2011; RAUB, ALVAREZ e KHANNA, 2006; TEO, 2000).
Segundo Stewart et al. (2010), a função de gestão de pessoas pode ocorrer principalmente de três maneiras: no centro de gestão administrativa, na atuação como centro de excelência e na parceria estratégica com as unidades organizacionais. Tais funções definem um perfil de gestão estratégica de pessoas orientado para o ambiente interno da organização, ainda que o ambiente externo seja considerado sob uma óptica contingencial para o entendimento das práticas estratégicas de GP (STEWART et al., 2010; TEO e RODWELL, 2007).
A função de centro de gestão administrativa se refere à administração funcional e representa o papel tradicional da unidade de GP, cuja transição para um papel estratégico demanda o desempenho das outros dois papéis complementares para a legitimação da função de GP como ator central no suporte ao alcance dos resultados organizacionais (STEWART et al., 2010; TEO e RODWELL, 2007). O centro de excelência, por sua vez, representa uma competência técnica da unidade em traduzir as necessidades organizacionais em serviços relevantes a gestores e funcionários, sobretudo sob a forma de ações de desenvolvimento de pessoal (STEWART et al., 2010). Por fim, na parceria estratégica, a unidade de GP demonstra competências políticas de articulação junto aos demais atores organizacionais para a manutenção do alinhamento de suas práticas às necessidades previstas e emergentes da organização (TEO e RODWELL, 2007). Considerar um setor de GP como um parceiro estratégico de negócio depende da posição de destaque exercida pela unidade ao alcançar o vínculo entre as atividades de gestão de pessoas e os negócios estratégicos organizacionais, evidenciando seu status e sua influência na organização (GALANG e FERRIS, 1997).
Assim, para ter um papel de influência em longo prazo na organização, aspectos políticos são competências necessárias à unidade de GP (NGUYEN et al., 2019). Infere-se que não são capacidades técnicas, e sim a atuação da unidade, que destaca sua eficácia no processo estratégico. Em que pese a área de GP não ser diretamente responsável pelos negócios de uma organização, sua atuação está diretamente ligada à implementação de políticas e práticas. Dessa forma, ao considerar que os aspectos políticos, intrínsecos a essa atuação, permeiam suas funções instrumentais e estratégicas, reconhece-se que o desafio das organizações é destacar a dimensão política dos papéis das unidades de GP, no sentido de viabilizar sua inserção estratégica nas arenas decisórias, a fim de que possam contribuir para os negócios organizacionais.
Os papéis exercidos pelos profissionais de GP estão sujeitos a grandes mudanças em razão da necessidade de demonstrar o valor agregado da área para a organização. Para isso, é necessário aumentar a legitimidade do setor, a fim de que ganhe maior status e tenha mais influência dentro das organizações (VAN BUREN, GREENWOOD e SHEEHAN, 2011; LEMMERGAARD, 2009). Tal situação pode ser mais bem alcançada quando a unidade de GP tem envolvimento estratégico e exerce influência nesse processo organizacional, o que pode ser importante para a efetivação das políticas de gestão estratégica (BUYENS e DE VOS, 2001; TEO e RODWELL, 2007).
Em suma, o nível de envolvimento da unidade de GP na gestão estratégica da organização indica o nível de integração estratégica de RH, isto é, sua interação com outras unidades para integrar a GP à estratégia de negócios (GOLDEN e RAMANUJAM, 1985; TEO e RODWELL, 2007). Assim, é a influência na tomada de decisões que admite a eficácia da unidade, a qual é avaliada com base no que e como pode atender a expectativas e demandas da organização (NGUYEN et al., 2019; TEO e RODWELL, 2007; ZHAO et al., 2019). Além disso, o envolvimento estratégico e a influência da unidade de GP dependem das relações institucionalizadas entre a unidade e outras partes interessadas, de forma que os dirigentes de GP buscam legitimar suas funções e seu status numa organização, explicando os benefícios do envolvimento do setor em questões estratégicas (GOLDEN e RAMANUJAM, 1985; KELLY e GENNARD, 2010). Dessa maneira, é preciso um envolvimento efetivo da área de GP nas atividades estratégicas da organização, bem como a devolução das questões diárias de gestão de pessoas aos gerentes de linha e à alta liderança, fator que pode ser considerado um indicador relevante da integração e da valorização da função de RH dentro da organização (BUYENS e DE VOS, 2001; SINGH, DARWISH e ANDERSON, 2012).
O envolvimento da área de GP no processo de planejamento estratégico é fundamental para o desempenho da organização. Quando esta percebe um alto nível da eficácia desse segmento, seu envolvimento no planejamento estratégico é considerado construtivo e exerce influência positiva no desempenho futuro da organização. Em contraste, quando nota um baixo nível de efetividade de GP, o envolvimento é visto como um desperdício de recursos organizacionais, resultando em baixo relacionamento com o desempenho futuro da organização (CHEN, HSU e YIP, 2011; WELCH e WELCH, 2012). Assim, quando um profissional de GP exerce um papel majoritariamente operacional e tem pouco tempo para se dedicar a outras questões devido à sobrecarga de tensões entre expectativas conflitantes, isso pode reduzir a confiança na capacidade estratégica do profissional de GP e impactar negativamente na probabilidade de que eles serem incluídos em processos formais e informais de envolvimento estratégico (SHEEHAN et al., 2016; WELCH e WELCH, 2012).
Os setores de GP buscam a aceitação do restante da organização como parceiros estratégicos de negócios, estabelecendo políticas para a implementação e o desenvolvimento de capacidades humanas, além do desenvolvimento de responsabilidades de funções para os gerentes de linha (TANG et al., 2015). Essa função de parceiro estratégico de negócio pode ser exercida de diferentes maneiras, de forma que a atuação dos profissionais varia desde o envolvimento na formulação estratégica organizacional até a contribuição para a implementação da GEP. Assim, os setores de GP auxiliam no alinhamento de suas práticas com a estratégia de negócios organizacionais (BUYENS e DE VOS, 2001; RAUB, ALVAREZ e KHANNA, 2006).
Vale destacar uma pesquisa realizada por Buyens e De Vos (2001), em que foi desenvolvida uma estrutura, apresentada na Figura 2, cujo envolvimento da função de GP é representado em diferentes momentos do processo de tomada de decisão, baseados em problematização, desenvolvimento de solução, implementação e controle. Os autores preferiram o termo “tomada de decisão”, em vez de “formulação de estratégia”, pelo fato de que o primeiro abrange mais decisões sobre GP do que referentes à estratégia organizacional. Cada momento de envolvimento, na etapa de formulação ou de implementação, pode ser importante para a efetivação das políticas de gestão estratégica, de forma que, quanto mais cedo as unidades de GP se envolverem no processo de tomada de decisão, melhor poderá ser o impacto sobre as decisões estratégicas (BUYENS e DE VOS, 2001; DYER, 1983).

Ao assumir que o processo de tomada de decisão começa com a observação de uma lacuna entre a situação real e uma situação desejada, o envolvimento da unidade de GP pode ser descrito como muito antecipada, caso a área esteja envolvida no primeiro momento do processo de tomada de decisão, de forma que é possível reconhecer e determinar problemas. O segundo momento, descrito como antecipado, é caracterizado por um envolvimento oportuno da GP no processo decisório e se refere ao momento em que a unidade está ativamente envolvida no processo de tomada de decisões, criando instrumentos e apoiando os gerentes de linha responsáveis pela implementação. Já no terceiro momento, o envolvimento numa decisão é tardio e restringe-se à implementação de atividades de GP sem qualquer contribuição ativa da equipe. Por fim, o último momento de envolvimento da GP no processo decisório é chamado de muito tardio, tendo em vista que a unidade é consultada apenas para controle ou caso as soluções implementadas não funcionem conforme o esperado, sendo necessário alguma atuação para a solução do problema (BUYENS e DE VOS, 2001).
O envolvimento da GP em todas as fases do processo decisório é tido como relevante para políticas eficazes na área, visto que a implicação antecipada e total nos processos de tomada de decisão é necessário para que a área seja considerada em situações estratégicas. No entanto, quanto mais cedo o representante de GP estiver envolvido no processo de tomada de decisão, ou seja, desde a fase de identificação de problemas até a solução das propostas, maior será seu impacto, pois estar envolvido no início da formulação da estratégia melhora as chances de as questões de GP serem refletidas na estratégia (DYER, 1983).
De forma complementar, apesar de tanto os dirigentes de GP quanto os demais profissionais expressarem o mesmo desejo de reduzir a carga de trabalho operacional e envolver-se mais fortemente em papéis estratégicos de RH, os dirigentes têm maior chance de influenciar as decisões em estágios iniciais, ainda que os resultados apontem que a maioria dos setores tenham um envolvimento tardio nas decisões organizacionais (BUYENS e DE VOS, 2001; RAUB, ALVAREZ e KHANNA, 2006).
Em suma, visto como um elemento que auxilia na inserção estratégica das unidades de GP nas arenas decisórias, pode-se considerar que o envolvimento antecipado da unidade de GP no processo de tomada de decisão aumenta as chances de as reivindicações do setor repercutirem nas decisões organizacionais e se concretizarem em políticas de GP. Assim, a influência nos negócios organizacionais é mais eficaz a depender da fase do processo de tomada de decisão em que a unidade de GP atua, de forma que, quanto mais os profissionais de GP estiverem envolvidos nesse processo, maior será o impacto sobre as decisões estratégicas organizacionais.
Mais do que considerar o alinhamento entre a função de GP e a estratégia organizacional, a inserção de tais unidades nas arenas decisórias se volta para o reconhecimento de aspectos políticos na eficácia da implementação de políticas de GP. Assim, uma redefinição do papel da gestão dos recursos humanos demanda que os profissionais se envolvam, tanto de maneira forma quanto informal, no processo decisório da organização (BUYENS e DE VOS, 2001; SINGH, DARWISH e ANDERSON, 2012; LEMMERGAARD, 2009), refletindo um nível de influência das áreas de GP no processo de tomada de decisão organizacional, cujo efeito recai na eficácia da implementação de políticas de GP (BUYENS e DE VOS, 2001; KELLY e GENNARD, 2010; TEO e RODWELL, 2007).
Segundo Côrtes (2016), a inserção estratégica da unidade de GP pode ser considerada a presença da unidade de GP nas arenas decisórias, com liberdade para discutir, formular, monitorar e revisar propostas para a área. No entanto, o fenômeno aqui estudado aborda mais elementos além dessa liberdade da unidade de GP mencionada. É necessário reconhecê-las como ponto-chave nas organizações, compreendendo os motivos que as levam a estar presentes nas arenas decisórias e porque a dinâmica organizacional exclui o setor dessa posição central. Elementos como os papéis exercidos pelos profissionais de GP, os níveis de envolvimento desse setor nas arenas decisórias e sua atuação formal e informal evidenciam a política como um objeto inerente à inserção estratégica das unidades de GP nas arenas decisórias das organizações, com vistas a influenciar decisões organizacionais e garantir a efetiva integração com os negócios da organização.
Com base nesta pesquisa bibliográfica, foi possível identificar elementos que compõem a inserção estratégica das unidades de GP em arenas decisórias organizacionais, tendo em vista que o fenômeno se manifesta de diversas maneiras e considera, primordialmente, a atuação da área para uma efetiva influência nos negócios organizacionais. De maneira gerencial, as evidências que compõem a inserção estratégica podem auxiliar gestores e lideranças a traçarem estratégias para melhor participar dos negócios organizacionais e influenciar processos de tomada de decisão.
No que tange às limitações, considerando que os modelos de GP se abstêm de estudar aspectos políticos, ressalta-se a dificuldade de definição dos descritores para uma pesquisa bibliográfica evidenciada nos artigos analisados, os quais não tratavam da inserção estratégica como objeto central. Dessa forma, o presente artigo, ao se dedicar à lacuna teórica do estudo da dimensão política que permeia a GEP, evidenciou a necessidade de um aprofundamento no tema, abrindo questões que ampliam essa agenda. O que leva uma unidade de GP a participar do processo decisório? Como é a participação delas no processo estratégico e como se envolvem nas decisões? Ser estratégico é exercer poder? Dar subsídio a outros atores é estar inserido nas decisões? Essas são perguntas que podem incentivar novas pesquisas sobre a inserção estratégica de unidades de GP nas arenas decisórias organizacionais.


