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Estrutura de capital e rentabilidade de empresas moderada pela assimetria informacional
Estructura de capital y rentabilidad de empresas moderadas por la asimetría informacional
Capital structure and firm performance moderated by information asymmetry
Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa, vol. 20, núm. 3, pp. 144-165, 2021
INDEG-IUL - ISCTE Executive Education

Artigo


Recepção: 14 Agosto 2021

Aprovação: 03 Janeiro 2022

DOI: https://doi.org/10.7440/res64.2018.03

Financiamento

Fonte: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

Número do contrato: 001

Resumo: Este trabalho analisa a influência da estrutura de capital, moderada pela assimetria informacional, na rentabilidade das empresas abertas do mercado brasileiro. A amostra foi composta por 106 empresas em períodos trimestrais de 2011 a 2020. A análise dos dados em painel indica que o aumento do endividamento geral diminui a rentabilidade do ativo (ROA) e do patrimônio líquido (ROE). A assimetria informacional atua como um fator potencializador do efeito negativo do endividamento no ROA e ROE. Esses resultados contribuem para a Teoria da Pecking Order, visto que, como proposto por esta teoria, companhias abertas do mercado brasileiro têm menor rentabilidade à medida que aumentam o endividamento. Além disso, a assimetria interfere nessa relação, o que pode contribuir para que os investidores entendam o impacto do endividamento na rentabilidade de companhias com diferentes níveis de assimetria informacional.

Palavras-chave: Assimetria informacional, Endividamento, Rentabilidade.

Resumen: Este trabajo analiza la influencia de la estructura de capital, moderada por la asimetría informativa, sobre la rentabilidad de las empresas que cotizan en bolsa en el mercado brasileño. La muestra estuvo conformada por 106 empresas en períodos trimestrales de 2011 a 2020. El análisis de datos de panel indica que el aumento del endeudamiento general disminuye el rendimiento de los activos (ROA) y del patrimonio neto (ROE). La asimetría de información actúa como un factor potenciador del efecto negativo del endeudamiento sobre el ROA y el ROE. Estos resultados contribuyen a la teoría del orden jerárquico, ya que, según lo propuesto por esta teoría, las empresas que cotizan en bolsa en el mercado brasileño tienen menor rentabilidad a medida que aumenta su endeudamiento. Además, la asimetría interfiere en esta relación, lo que puede ayudar a los inversores a comprender el impacto del endeudamiento en la rentabilidad de empresas con diferentes niveles de asimetría de información.

Palabras clave: Asimetría informacional, Endeudamiento, Rentabilidad.

Abstract: We analyzed the influence of the capital structure, moderated by the information asymmetry, on the profitability of public companies in the Brazilian market. We analyzed 106 companies in quarterly periods from 2011 to 2020. We submitted this information to panel data analysis, indicating that the increase in indebtedness reduces the return on assets (ROA) and the return on equity (ROE). We found that information asymmetry acts as a potentializing factor in the negative effect of indebtedness on ROA and ROE. Our results corroborate and contribute to the pecking order theory since publicly traded companies in the Brazilian market have lower profitability as they increase their indebtedness. Also, the results help investors to understand the impact of indebtedness on the profitability of companies with different levels of information asymmetry.

Keywords: Information asymmetry, Capital structure, Profitability.

INTRODUÇÃO

A estrutura de capital é um dos temas centrais em finanças e sua discussão se intensificou com a publicação da proposta de irrelevância de Modigliani e Miller (1958). Ao longo do tempo, emergiram discussões a respeito do impacto da estrutura de capital na rentabilidade e no valor de mercado, o que resultou na emersão da Teoria do Trade-off e da Teoria da Pecking Order. A Teoria de Trade-off preconiza a existência de uma estrutura de capital ótima, determinada pelo equilíbrio entre os custos e os benefícios da dívida (MYERS, 1984). A Teoria da Pecking Order defende opções de financiamento baseadas em uma determinada hierarquia, pelo entendimento de que as companhias financiam o seu capital baseadas em uma hierarquia pré-determinada que privilegia a obtenção de recursos por meio da retenção de lucros (MYERS e MAJLUF, 1984).

Sabe-se que um dos objetivos dos gestores à frente do comando das empresas é a rentabilidade econômico-financeira. As teorias Trade-off e Pecking Order preconizam que a estrutura de capital afeta de modo distinto a rentabilidade do período. Sob a lógica da Teoria do Trade-off, o aumento da proporção de recursos de credores em relação ao capital próprio gera aumento da rentabilidade, uma vez que as companhias buscam investimentos externos para potencializar seus investimentos e, dessa forma, angariar maiores níveis de rentabilidade (CORREA, BASSO e NAKAMURA, 2013). De outro modo, a Teoria da Pecking Order prescreve que, quando as empresas aumentam o endividamento, há diminuição da rentabilidade (MYERS e MAJLUF, 1984; CORREA, BASSO e NAKAMURA, 2013).

Diante dessas abordagens antagônicas acerca do impacto da estrutura de capital na rentabilidade, diversos estudos buscaram compreender qual(is) teoria(s) poderia(m) explicar de melhor forma tal relação. Fama e French (2002) e Lara e Mesquita (2008) expressam que várias empresas recorrem ao financiamento corporativo para angariar recursos que melhorem o seu desempenho. O uso de financiamento via credores possui o propósito de maximizar a rentabilidade e, consequentemente, o valor da empresa (PROCIANOY e SCHNORRENBERGER, 2004). Assim, na perspectiva destes autores, o impacto da estrutura de capital na rentabilidade segue a lógica da Teoria do Trade-off.

Tais descobertas suscitaram ainda mais estudos ao redor do mundo com objetivo de investigar a relação entre estrutura de capital e rentabilidade. Em diferentes países, a exemplo da China (JING, 2017), Malásia e Indonésia (RAMLI, LATAN e SOLOVIDA , 2019) e Brasil, Chile, México e Peru (MARDONES e CUNEO, 2019), ficou demonstrado que os gestores optam por financiamento de terceiros para potencializar a rentabilidade da corporação. Dessa forma, esses trabalhos sustentaram que a Teoria do Trade-off é a mais adequada para a discussão a respeito do debate da relação entre estrutura de capital e rentabilidade.

Apesar dessas evidências, os resultados de outros estudos apontaram para uma direção diferente. Correa, Basso e Nakamura (2013), Vuong, Quynh e Mitra (2017), Khémiri e Noubbigh (2018) e Li e Islam (2019) depreenderam que a relação entre financiamento de terceiros e rentabilidade é negativa. Isso ocorre porque são mais rentáveis as empresas que prioritariamente utilizam recursos próprios para financiar suas atividades. Esse resultado se deve às taxas de juros sobre os empréstimos, já que esses dispêndios impactam negativamente no resultado líquido (KHÉMIRI e NOUBBIGH, 2018). Com isso, os resultados desses trabalhos ratificam a ótica da Teoria da Pecking Order, uma vez que indicam que o aumento do endividamento resulta na diminuição da rentabilidade, como prescrito por Correa, Basso e Nakamura (2013).

De acordo com o exposto, percebe-se que o impacto da estrutura de capital na rentabilidade ainda é alvo de debates, visto que os resultados conflitantes nas pesquisas apontam para direções distintas. Acredita-se que essas divergências possam ser decorrentes do fato de as análises abrangerem características institucionais e contextos econômicos de cada país. No Brasil, por exemplo, empresas de grande porte possuem, comparativamente às companhias de pequeno porte, maior facilidade de captação de recursos para financiar projetos internos. Isso é um fator que pode se transformar em vantagem competitiva das empresas de capital aberto e, por sua vez, implicar aumento das margens de lucro das empresas, o que reforça a lógica da Teoria do Trade Off, como elucidado por Mardones e Cuneo (2019). No Brasil, entretanto, há um histórico de altas taxas de juros (WORLD BANK, 2021), aspecto que implica aumento do custo do financiamento de terceiros e pode ser um fator que diminui a propensão ao uso de recursos provenientes de terceiros (DURAN e STEPHEN, 2020).

Além disso, o mercado brasileiro possui a maior parte das companhias com capital concentrado e, muitas vezes, com maciça posse das ações sob domínio de controle familiar (MONTEIRO, GAPARETTO e LUNKES, 2019). Tais empresas, conforme Prencipe, Bar-Yosef e Dekker (2014) e Yousaf e Hassan (2016), tendem a preferir o uso de lucros retidos ao capital de terceiros, pois, em caso de não pagamento das dívidas, os sócios podem perder o controle da companhia. Todos esses motivos reafirmam a priorização, por parte dos gestores, do financiamento via recursos próprios retidos e não do recurso às dívidas, o que corrobora a Teoria da Pecking Order e os achados de Correa, Basso e Nakamura (2013). Ou seja, os gestores utilizam, em um primeiro momento, lucros retidos para o próprio financiamento e, em um segundo momento, valem-se de recursos de terceiros, restando-lhes, como última opção, a abertura de capital da empresa para negociação das ações da companhia.

Embora haja a discussão sobre como a estrutura de capital influencia a rentabilidade, os estudos que se debruçaram sobre a temática apresentam a limitação de não considerar aspectos específicos das empresas, os quais podem interagir com o endividamento e potencializar o efeito na rentabilidade. Dentre os aspectos específicos, tem-se a assimetria informacional. Informações assimétricas levam a um menor nível de qualidade da informação contábil (KAO e WEI, 2014), visto que esta liga-se a menores níveis de transparência acerca da prestação de informações sobre a empresa (COELHO, NIYAMA e RODRIGUES, 2011). Quando a empresa apresenta baixa rentabilidade, os gestores tendem a tornar as informações mais assimétricas, prejudicando, assim, a avaliação da saúde econômico-financeira da empresa pelos investidores (SCOTT, 2015).

A assimetria informacional não está apenas relacionada à rentabilidade, mas também à estrutura de capital (BERGER et al., 2005; BHARATH, PASQUARIELLO e WU et al., 2009; AGARWAL e O’HARA, 2011). À medida que a assimetria informacional aumenta, ocorre também o aumento da emissão de dívidas e da procura por financiamento de terceiros (AGARWAL e O’HARA, 2011). Nesse contexto, a assimetria informacional, além de impactar a rentabilidade das empresas, também pode atuar como um fator potencializador do impacto do endividamento na rentabilidade. Com base nisso, o estudo tem por objetivo analisar a influência da estrutura de capital, moderada pela assimetria informacional, na rentabilidade de empresas abertas do mercado brasileiro.

Esta pesquisa se justifica por apresentar uma nova perspectiva a respeito da temática, uma vez que, sob a lente da Teoria da Pecking-Order, traz à tona como a assimetria pode atuar como fator potencializador do impacto da estrutura de capital sobre a rentabilidade. A assimetria informacional, por exemplo, como fator que prejudica a compreensão da situação real em que a companhia se encontra, pode impactar a relação entre endividamento e rentabilidade, pois, de acordo com Scott (2015), é utilizada para ofuscar o real desempenho econômico-financeiro pelos usuários externos da informação contábil. Essa perspectiva de análise contribui para as discussões de Gaud, Jani, Hoesli e Bender (2005), Correa, Basso e Nakamura (2013), Vuong, Quynh e Mitra (2017), Khémiri e Noubbigh (2018) e Li e Islam (2019), haja vista tais investigações não terem verificado os aspectos que podem interferir na relação entre estrutura de capital e rentabilidade. Feltes e Ribeiro (2020) demonstraram que a relação entre endividamento e rentabilidade não é absoluta, ela é mitigada ou potencializada por fatores que interferem nessa relação. Os autores investigaram a interferência do ambiente econômico, mas fica claro que características da própria companhia também podem interferir em tal relação. Na vertente prática, o presente trabalho evidencia como a assimetria informacional, nociva aos investidores, interfere no efeito da estrutura de capital sobre o nível de rentabilidade da companhia.

Outra justificativa consiste em apresentar nuances do panorama de empresas brasileiras. Isso porque o Brasil, por ser um país com um mercado de capitais emergente, possui maiores níveis de assimetria do que países desenvolvidos (SOSCHINSKI, et. al., 2020). Por esse motivo, a assimetria tem capacidade de potencializar o efeito negativo do endividamento tomado emprestado de terceiros sobre a rentabilidade. Vale lembrar, ainda, que o mercado brasileiro é caracterizado por ser majoritariamente composto por empresas com capital concentrado, muitas vezes em domínio familiar (SILVA e FERREIRA, 2016; MONTEIRO, GAPARETTO e LUNKES, 2019). Assim, o Brasil é um ambiente diferenciado em relação a países desenvolvidos. Estudos que abordam o seu contexto específico podem servir de parâmetro para outras economias emergentes, que partilham de características semelhantes.

Este trabalho contemplou empresas abertas do mercado de capitais brasileiro, a amostra foi composta por 106 empresas, considerando períodos trimestrais de 2011 a 2020. Os resultados evidenciaram que o endividamento implica diminuição da rentabilidade do ativo e do patrimônio líquido das empresas. Ou seja, as companhias brasileiras de capital aberto seguem o preconizado pela Teoria da Pecking Order. Os achados também elucidaram que a assimetria informacional potencializa a relação negativa entre o endividamento, de um lado, e a rentabilidade do ativo e a rentabilidade do patrimônio líquido, do outro. Com isso, companhias com informações mais assimétricas têm diminuição mais acentuada na rentabilidade à medida que o endividamento aumenta, comparativamente às empresas com informações menos assimétricas.

Além da introdução, o presente trabalho é constituído de mais quatro seções: (i) referencial teórico e hipóteses, (ii) metodologia, (iii) apresentação e discussão dos dados, e (iv) conclusões.

REFERENCIAL TEÓRICO E HIPÓTESES

A estrutura de capital corresponde à relação entre o capital próprio e o capital de terceiros utilizado para financiar as atividades organizacionais (THIPPAYANA, 2014). Os trabalhos de Modigliani e Miller (1958) ganharam destaque pela forma de abordagem na discussão sobre estrutura de capital. Os autores pontuaram algumas premissas necessárias para que a lógica apresentada fosse válida, dentre elas, tem-se: i) existência de mesmas taxas de juros para empresas e investidores, ii) existência de informação perfeita, iii) inexistência de custos de transação, iv) inexistência de impostos, v) inexistência de custos de falência e vi) inexistência de custos de agência (HARRIS e RAVIV, 1991).

As premissas de Modigliani e Miller (1958) sofreram críticas de algumas correntes tradicionalistas, como a de Durand (1959), que defendeu a inexistência de mercados perfeitos na prática. Tal crítica fez Modigliani e Miller (1963) elaborarem uma nova pesquisa reconhecendo alguns pontos negativos da sua proposta, com realce à irrelevância de impostos na determinação da estrutura de capital. Modigliani e Miller (1963) discordaram de algumas das críticas, mas estas impulsionaram os estudos no sentido de melhor compreender a estrutura de capital das empresas. As pesquisas que tiveram mais destaque foram as de Jensen e Meckling (1979), Myers e Majluf (1984), Harris e Raviv (1991) e Fama e French (2002), uma vez que propiciaram o surgimento de duas significativas contribuições teóricas: a Teoria do Trade-off e a Teoria da Pecking Order.

Na Teoria do Trade-off, Myers (1984) defende a existência de uma estrutura ótima a ser alcançada pelas empresas para maximizar o seu valor, ou seja, as empresas devem buscar um equilíbrio entre os benefícios fiscais e os custos de falência. Fama e French (2002) salientam que a principal preposição dessa teoria é de que, para o financiamento de capital, os gestores buscam uma relação ótima entre os capitais próprios e os capitais de terceiros, analisando os custos e benefícios fiscais.

A Teoria da Pecking Order tem o intuito de explicar as formas de financiamento de capital das empresas. O argumento principal é de que, para o financiamento de capital, as empresas seguem uma ordem hierárquica que prioriza o financiamento interno por meio de retenção de lucros (MYERS, 1984; MYERS e MAJLUF, 1984). Essa teoria preconiza que somente em caso de insuficiência de recursos internos, ao financiar suas atividades, as empresas buscarão por capital de terceiros, tendo como última opção a possibilidade de emissão de ações (MYERS, 1984; MYERS e MAJLUF, 1984).

Como a estrutura de capital é uma forma de angariar recursos e tem impacto direto na rentabilidade (FAMA e FRENCH, 2002; LARA e MESQUITA, 2008), as Teorias de Trade-off e Pecking Order foram utilizadas por diferentes estudos como base para explicar como acontece essa influência. A Teoria do Trade-off defende que o aumento de capital de terceiros é uma forma de buscar recursos com o propósito de fazer investimentos mais eficientes e, desse modo, aumentar a rentabilidade da empresa (CORREA, BASSO e NAKAMURA, 2013).

Pesquisas empíricas que analisaram a relação entre estrutura de capital e rentabilidade atestaram a lógica da Teoria do Trade-off, encontrando relação positiva entre essas duas variáveis. Jing (2017) analisou o impacto da estrutura de capital na rentabilidade das empresas imobiliárias que negociavam ações em Hong Kong e Xangai e descobriu que o aumento da proporção de endividamento em relação ao financiamento por meio de capital próprio impulsiona a rentabilidade do período. Ramli, Latan e Solovida (2019) detectaram que o aumento da proporção do financiamento por terceiros exerce influência positiva no desempenho de empresa da Malásia e Indonésia. Relatam que, mesmo os países sendo vizinhos, apresentam uma leve diferença quanto ao impacto da estrutura de capital no desempenho. Assim, pode-se entender que contextos internos de um país podem influenciar no impacto da estrutura de capital sobre a rentabilidade das companhias. Mardones e Cuneo (2019) analisaram países de economia emergente da América Latina e detectaram que, quando as companhias aumentam a proporção de recursos provenientes de terceiros, apresentam efeitos positivos em termos de rentabilidade.

Embora haja a confirmação de que a Teoria do Trade-off possa explicar o impacto da estrutura de capital na rentabilidade, investigações se contrapõem a esse pensamento, já que os resultados apontam para uma outra perspectiva. Tais pesquisas concluíram que a Teoria da Pecking Order apresenta uma explicação mais adequada, visto que as empresas priorizam os recursos próprios retidos para financiar suas atividades operacionais, deixando para recorrer ao capital oriundo de terceiros quando há escassez desses recursos (CORREA, BASSO e NAKAMURA, 2013).

As investigações empíricas que recorreram à Teoria da Pecking Order para analisar o impacto da estrutura de capital no desempenho das organizações (CORREA, BASSO e NAKAMURA, 2013; VUONG, QUYNH e MITRA, 2017; KHÉMIRI e NOUBBIGH, 2018) identificaram influência negativa da estrutura de capital na rentabilidade das empresas. Vuong, Quynh e Mitra (2017), ao analisar empresas britânicas, verificaram que o aumento do endividamento das empresas leva à diminuição de diferentes índices de rentabilidade, como a rentabilidade do ativo e a rentabilidade do patrimônio líquido. Khémiri e Noubbigh (2018) identificaram que, em empresas da África subsaariana, níveis de endividamento acima do normal são nocivos à rentabilidade. Dessa forma, altos níveis de endividamento levam as despesas financeiras, oriundas dos juros, a sobrecarregar as despesas totais e provocar diminuição na rentabilidade. Correia, Basso e Nakamura (2013) descobriram que o aumento da proporção de endividamento causa a diminuição da rentabilidade de empesas brasileiras. Dessa forma, quando as companhias aumentam a proporção de capital de terceiros em sua estrutura de capital, há impacto negativo nos índices de rentabilidade. Isso pode se refletir no valor da empresa, dado que os investidores utilizam informações de rentabilidade para avaliar como precificar uma empresa.

Uma justificativa para esse comportamento consiste em aspectos intrínsecos das companhias; em companhias brasileiras de capital aberto, por exemplo, há predominância de capital concentrado (SILVA e FERREIRA, 2016), pois muitas são controladas por uma família (MONTEIRO, GAPARETTO e LUNKES, 2019). Tais aspectos, conforme Prencipe, Bar-Yosef e Dekker (2014) e Yousaf e Hassan (2016), tornam os gestores avessos à requisição de financiamento de terceiros pelo receio de não conseguir honrar os pagamentos referentes a parcelas e juros do empréstimo adquirido e, desse modo, perder o controle acionário da companhia. Por esse motivo, tendem a financiar as operações da empresa via recursos próprios e, apenas na indisponibilidade ou escassez de suas reservas, recorrem a terceiros para angariar recursos adicionais.

O comportamento avesso a angariar recursos financeiros de terceiros pode ser potencializado, a depender do contexto macroeconômico. Quando a taxa de juros praticada no país da sede da empresa é superior à praticada em outros países, os gestores passam a ter aversão ao aumento da alavancagem. No Brasil, por exemplo, há um histórico de taxa básica de juros acima de 5% predominantemente ao longo do tempo (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2021), o que coloca o País, historicamente, entre aqueles com maiores taxas de juros no mundo (WORLD BANK, 2021). É válido ressaltar que o aumento da taxa de juros no Brasil, muitas vezes, é decorrente da instabilidade da economia nacional e uma resposta ao aumento das taxas de inflação.

Essa característica peculiar do Brasil faz a obtenção de empréstimos resultar em maior despesa financeira e, consequentemente, menor rentabilidade, mesmo com incentivos fiscais. Isso leva as companhias a priorizar o financiamento com recursos próprios, em detrimento do financiamento externo, oriundo de credores (DURAN e STEPHEN, 2020). Nesse panorama, assume-se como escopo teórico de base a Teoria da Pecking Order, em que o aumento da proporção de recursos oriundos de terceiros em relação ao ativo total tem como consequência a diminuição da rentabilidade. Desse modo, sustenta-se que:

H1: Há uma relação negativa e significativa entre o nível de endividamento e a rentabilidade.

A Teoria da Pecking Order emerge da assimetria informacional (MYERS, 1984; SHYAM-SUNDER e MYERS, 1999), que ocorre quando os gestores possuem mais informações do que os investidores e se aproveitam dessa vantagem, gerando problemas de seleção adversa e/ou risco moral (JENSEN e MECKLING, 1976). A assimetria informacional é um problema para os usuários da informação contábil, pois está associada a menores níveis de qualidade das demonstrações contábeis (KAO e WEI, 2014).

No mercado de capitais, os investidores, devido à assimetria informacional, têm dificuldade de precificar adequadamente os ativos negociados (DEMSETZ, 1968). Isso eleva a diferença em relação às ofertas de compra e venda dos papéis negociados (WELKER, 1995). Por essa característica, evidências empíricas (COPELAND, 1979; COPELAND e GALAI, 1983; GLOSTEN e MILGROM, 1985; GLOSTEN, 1987; STOLL, 1989) demostram que o bid-ask spread é o mais adequado para evidenciar a assimetria de informação, uma vez que possibilita mensurar as diferenças entre a oferta de compra e a oferta de venda de um determinado ativo (DEMSETZ, 1968).

Kao e Wei (2014) descobriram que a assimetria informacional está negativamente relacionada com a rentabilidade, uma vez que a primeira impacta a segunda. Essa relação pode se intensificar na ocasião em que as empresas apresentam “pequenos lucros”, visto que os gestores se sentem incentivados a manipular de modo mais intenso os resultados do período (MARTINEZ, 2001), o que gera maior assimetria informacional (CORMIER, HOULE e LEDOUX, 2013).

Como a assimetria da informação provoca impacto negativo na rentabilidade, o aumento do nível de endividamento tende a diminuí-la (CORREA, BASSO e NAKAMURA, 2013; VUONG, QUYNH e MITRA, 2017; KHÉMIRI e NOUBBIGH, 2018). Ou seja, quanto maior o nível de assimetria de informação, mais intenso é o efeito do nível de endividamento de terceiros sobre a rentabilidade. Assim, sustenta-se que:

H2: Há relação negativa e significativa entre o nível de endividamento, moderado pela assimetria informacional e a rentabilidade.

METODOLOGIA

A população foi composta por empresas de capital aberto não financeiras, listadas na bolsa de valores brasileira - Brasil, Bolsa, Balcão (B3) - em ciclos trimestrais no período entre 2011 e 2020. Após a coleta dos dados, para definir a amostra do estudo, realizou-se a aplicação de alguns critérios necessários, uma vez que a maior parte da população (158 empresas) não apresentou informações substanciais, muitas vezes, ligadas à assimetria informacional. A falta de informações para calcular a assimetria informacional é proveniente do baixo número de negociações no mercado de capitais brasileiro. Além disso, procedeu-se à exclusão de 67 empresas com patrimônio líquido negativo, uma vez que distorce o resultado da variável rentabilidade do patrimônio líquido. Assim, mostra-se no Quadro 1 os critérios para exclusão.


QUADRO 1
CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO DA AMOSTRA DE ESTUDO
Nota: * Cada companhia apresentou somente um código de ação listada, portanto não havia dois ou mais ativos listados para uma mesma companhia; *** Neste estudo, optou-se pelo emprego do painel balanceado. Fonte: Elaborado pelos autores.

Com os critérios de seleção, a amostra inicial do estudo foi composta por 107 companhias, das quais foi possível obter 4.280 observações. Contudo, como a análise multivariada utilizada para cumprir o objetivo do estudo é baseada em médias, os dados discrepantes podem distorcer a interpretação dos resultados. Por esse motivo, submeteram-se os dados ao teste multivariado de Hadi (1992), com objetivo de rastrear observações discrepantes. Tal teste detectou a presença de 348 observações classificadas como outliers. Esses dados discrepantes pertencem a diferentes companhias da amostra - das 106 empresas, 55 companhias possuíam, ao menos, uma observação discrepante.

Por causa do efeito nocivo dos dados discrepantes, optou-se pela exclusão de todos os outliers. Ressalta-se que todas as observações de uma empresa tiveram seus dados excluídos por serem classificados como discrepantes. Assim, a amostra final foi composta por 3.932 observações (92% da amostra inicial) correspondentes a 106 empresas. A opção pela exclusão das observações outliers levou à conversão do painel balanceado em um painel desbalanceado, como sugerido por Fávero e Belfiore (2017).

A pesquisa utiliza duas variáveis dependentes (retorno sobre o patrimônio líquido e retorno sobre o ativo) e duas variáveis independentes de interesse (endividamento geral e assimetria da informação). Além disso, tem-se variáveis independentes de controle, conforme apresentado no Quadro 2.


QUADRO 2
VARIÁVEIS DO ESTUDO
Fonte: Elaborado pelos autores.


Quadro 2
continuação

Em um primeiro momento, realizou-se a estatística descritiva dos dados da pesquisa com objetivo de compreender sua distribuição. De modo complementar, foram segmentados os dados trimestrais das variáveis rentabilidade sobre o ativo, rentabilidade sobre o patrimônio líquido e endividamento geral de acordo com os períodos anuais do lapso temporal deste estudo.

As informações referentes às variáveis apresentadas no Quadro 2 foram analisadas por meio de modelos multivariados que constam nas Equações 1 e 2. Destaca-se que, pelo motivo de multicolinearidade entre as variáveis END*AINFO e END, foi necessário dividir os modelos em duas equações. Com isso, o uso dos modelos da Equação 1 tem por objetivo averiguar o impacto do endividamento na rentabilidade. Os modelos da Equação 2 foram utilizados com o propósito de descobrir se há efeito moderador da assimetria informacional na relação entre endividamento e rentabilidade.

R O A i t e R O E i t = β 0 + β 1 E N D i t + β 2 A I N F O i t + β 3 T A N G i t + β 4 C R E S C i t + β 5 I D A D E i t + β 6 T A M i t + ε i t (1)

R O A i t e R O E i t = β 0 + β 1 A I N F O i t + β 2 E N D i t * A I N F O i t + β 3 T A N G i t + β 4 C R E S C i t + β 5 I D A D E i t + β 6 T A M I T + ε i t (2)

Em que: ROA = rentabilidade sobre o ativo da empresa i no período t; ROE = rentabilidade sobre o patrimônio líquido da empresa i no período t; END = endividamento total da empresa i no período t; AINFO = assimetria informacional da empresa i no período t; TANG = tangibilidade do ativo da empresa i no período t; IDADE = horizonte temporal em que a empresa i no período t negocia ações no mercado de capitais; TAM = tamanho da empresa i no período t.

Como os dados da pesquisa são oriundos de diferentes empresas entre 2011 e 2020 e os quatro modelos multivariados foram analisados tendo por base a metodologia de dados em painel, os dados de cada modelo foram submetidos ao teste de Chow, cuja finalidade é verificar a estimação mais adequada entre pooled e efeitos fixos. Para optar entre o modelo fixo e aleatório, as observações foram testadas por meio do teste de Hausman e, por fim, para averiguar a estimação que mais se ajusta aos dados, ao considerar a comparação entre efeitos aleatórios e pooled, realizou-se o teste LM de Breusch-Pagan (LM de BP). Os resultados destes testes (apresentados na Tabela 3) sugerem que, para os quatro modelos multivariados, o método que mais se ajusta aos dados é a estimação por efeitos fixos.

A normalidade multivariada foi testada por meio do teste de Doornik-Hansen. Como o teste de Kolmogorov-Smirnov identificou que os dados não apresentaram distribuição univariada normal, empregou-se o teste de Spearman, e a partir dele o teste de Variance Inflation Factor (VIF), que verificou a questão da multicolinearidade. Os pressupostos de inexistência de heterocedasticidade e autocorrelação serial foram averiguados por meio dos testes de Breusch-Pagan (BP) e Wooldridge, respectivamente.

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS

Na Tabela 1 apresentam-se as estatísticas descritivas dos valores atribuídos às variáveis de estudo.

TABELA 1
ESTATÍSTICAS DESCRITIVAS

Nota: O = Overall; B = Between; W = Within; KS (valor p) = valor p do teste de normalidade univariado de Kolmogorov-Smirnov. Fonte: Dados da pesquisa (2021).

Os resultados indicam que a média de ROA foi de 1,17% com desvio padrão de ±1,63%, valores que podem ser considerados próximos aos de Mardones e Cuneo (2019), pois identificaram que este índice de rentabilidade foi de 8,02%, ao considerar o período anual. Com isso, ao fazer a transformação trimestral, percebe-se que a média foi de 2,05%. A similaridade dos resultados também ocorre quando analisado o ROE, uma vez que, neste trabalho, a média trimestral deste indicador financeiro foi de 2,41% (±3,48) e Mardones e Cuneo (2019) encontraram média trimestral de 3,05%.

As evidências sobre médias de ROE e ROA (Quadro 1) também são correlatas com os achados de Pamplona, Dal Magro e Silva (2017), que descobriram que o ROA e o ROE trimestral das empresas brasileiras apresentaram, em média, os valores de 2% e 2,75%. As semelhanças entre as evidências podem indicar que a ROA e o ROE das companhias que negociam ações no Brasil se mantiveram estáveis, mesmo considerando tempos diferentes.

Quanto ao endividamento, os achados indicam que os valores oriundos das dívidas de terceiros compreendem, em média, 29,21% (± 15,83%) do ativo total do período. Resultado que se aproxima ao de Mardones e Cuneo (2019) e Pamplona, Dal Magro e Silva (2017), cujos achados apontam que o endividamento médio ficou em torno de 36,60% e 25,00% respectivamente. Com isso, infere-se que a maior parte dos montantes empregados nas operações das companhias é oriunda de recursos próprios.

Esse comportamento pode ser justificado pelas altas taxas de juros praticadas no Brasil, que tornam o valor total a ser pago significativamente superior ao obtido nos empréstimos. Duran e Stephen (2020) discorrem que altas taxas de juros tornam os gestores mais receosos em relação a fontes de financiamento com capitais de terceiros. Isso ocorre porque, à medida que há aumento de financiamentos provenientes de terceiros, há aumento da probabilidade do não pagamento de parcelas, o que, em caso de alguma eventualidade, colocaria em risco o controle dos acionistas sobre os ativos líquidos, sobretudo nas companhias com alta concentração de capital.

Mesmo que o endividamento geral, rentabilidade do ativo e rentabilidade do patrimônio líquido apresentem resultados similares quando comparados com investigações anteriores, vale ressaltar que o comportamento dessas variáveis demonstrou uma baixa oscilação ao longo do tempo, como apresentado na Tabela 2.

TABELA 2
ESTATÍSTICA DESCRITIVA AO LONGO DO TEMPO

Legenda: KW = Valor Qui-quadrado do teste Kruskal-Wallis ao considerar o nível de confiança de 95%; níveis de significância bicaudal a: *10%; **5%; ***1%. Fonte: Dados da pesquisa (2021).

As evidências contidas na Tabela 2 indicam que o ano em que houve registro dos trimestres com os maiores índices de rentabilidade do ativo e rentabilidade do patrimônio líquido foi o de 2019, com 1,36% e 2,79% respectivamente. Já o ano de 2012 comportou, em média, os trimestres com os menores índices de rentabilidade do ativo e rentabilidade do patrimônio líquido, com 1,05% e 2,13 respectivamente. Tais resultados indicam baixa volatilidade de ROE e ROA ao longo do tempo. Além disso, ao considerar o teste de Kruskal-Wallis, identificou-se que não há diferença significativa da rentabilidade do ativo trimestral (Qui-quadrado = 15,295; valor p < 0,083) e da rentabilidade do patrimônio líquido trimestral (Qui-quadrado = 13,962; valor p < 0,124) alocada nos períodos anuais.

Resultado similar também foi encontrado ao verificar a média do endividamento trimestral segmentado em grupos de períodos anuais, dado que não houve variação significativa ao longo do tempo (Qui-quadrado = 2,542; valor p < 0,978). Isso mostra que, mesmo em períodos marcados pelo aumento da incerteza econômica, como em 2015, 2016 e 2020, as empresas mantiveram o mesmo nível de endividamento. Tal comportamento é diferente do esperado quando comparado com outros países: Zhang et al. (2015) verificaram que, à medida que a incerteza econômica cresce, os gestores aumentam o número de decisões com a finalidade de diminuir o grau de endividamento. Isso ocorre porque ambientes de incerteza costumam apresentar diminuição do capital de giro (BAUM, CAGLAYAN e TALAVERA, 2010) e, dessa forma, intensifica-se o risco de não pagamento das parcelas das dívidas contraídas.

Ao analisar as correlações entre as variáveis independentes, o teste de Spearman indicou que nenhum dos pares de variáveis apresentou correlação acima de 0,70, exceto a correlação entre as variáveis END e END*AINFO, que apresentou coeficiente de 0,76. Tal resultado indica a presença de colinearidade, conforme Fávero e Belfiore (2017).

Ademais, para identificar a possível presença de multicolinearidade, os dados foram submetidos ao teste de VIF, que, da mesma forma como o de Spearman, apontou colinearidade das variáveis END e END*AINFO. Em razão disso, não podem ser empregadas conjuntamente no mesmo modelo multivariado, como sugerido por Fávero e Belfiore (2017) e Wooldridge (2016). Assim, a análise da variável moderadora END*AINFO e da variável END foi realizada separadamente em quatro modelos distintos, conforme as Equações 1 e 2.

Sobre os outros pressupostos dos modelos multivariados, o Teste de Doornik-Hansen rejeitou a hipótese nula de presença de normalidade multivariada em todos os modelos multivariados. O teste de BP e de Wooldridge rejeitaram a ausência de autocorrelação e heterocedasticidade na distribuição dos dados; por isso, optou-se por amenizar tais problemas com o emprego de erros-padrão robustos clusterizados nos indivíduos. Com base nisso, são apresentados na Tabela 3 os resultados relacionados ao impacto do endividamento sobre a rentabilidade, e a moderação desta relação por meio da assimetria da informação.

TABELA 3
RESULTADOS DAS ESTIMAÇÕES DOS PAINÉIS POR MQO, COM EFEITOS FIXOS DE EMPRESAS

Legenda: Os quatro modelos multivariados foram estimados por meio de efeitos fixos com erros-padrão clusterizados nos indivíduos. * relação significante a 10%; ** relação significante a 5%; *** relação significante a 1%. ¹ = Valores de erros-padrão robustos clusterizados nos indivíduos. ² = Teste de normalidade multivariado de Doornik-Hansen. Fonte: Dados da pesquisa (2021).

Os resultados permitem inferir que o endividamento apresentou efeito significativamente negativo em relação ao ROA (Estat T = -3,50; valor p < 0,001) e ao ROE (Estat T = -1,98; valor p < 0,051). O coeficiente negativo entre o endividamento e a rentabilidade conduz ao aceite da H1. Esta evidência corrobora os resultados encontrados por Correa, Basso e Nakamura, (2013), Vuong, Quynh e Mitra, (2017) e Khémiri e Noubbigh, (2018), os quais identificaram uma relação negativa entre estes dois construtos. Uma possível explicação para essa relação negativa pode estar baseada na Teoria da Pecking Order, a qual sugere que as empresas privilegiam o financiamento por meio de recursos próprios retidos, pois a busca por capital de terceiros aumenta o seu nível de endividamento e consequentemente as torna menos rentáveis.

Também a assimetria informacional demonstrou relação, de maneira significativa e negativa, com a rentabilidade, em termos de ROA (Estat. T = -7,58; valor p < 0,000) e ROE (Estat T = -8,05; valor < 0,000), corroborando o resultado de Kao e Wei (2014), o qual atestou que a assimetria informacional degrada a informação contábil e reduz a rentabilidade das organizações. Uma forma de mitigar esse efeito prejudicial, conforme Kao e Wei (2014), consiste no aprimoramento de mecanismos de comando e controle mediante práticas de governança corporativa.

Adicionalmente, com a moderação da assimetria, o endividamento apresentou um efeito significativamente negativo sobre ROA (Estat. T = -3,54; valor p < 0,001) e ROE (Estat. T = -2,72; valor p < 0,008). Isso indica que a assimetria potencializa o efeito negativo do endividamento sobre a rentabilidade, resultado este que permite comprovar a H2, a qual conjectura que há relação negativa e significativa entre o nível de endividamento, moderado pela assimetria informacional, e a rentabilidade.

Estes achados corroboram o estudo de Correa, Basso e Nakamura (2013), que comprovam que no mercado brasileiro as empresas possuem um comportamento baseado na Teoria da Pecking Order, em que se privilegia o financiamento de capital mediante a retenção de lucros, em detrimento das fontes de financiamento externo. Uma provável explicação para isso está na predominância de capital concentrado neste mercado (SILVA e FERREIRA, 2016), controlado majoritariamente por empresas familiares (MONTEIRO, GAPARETTO e LUNKES, 2019). A inserção da informação assimétrica na moderação agrava o relacionamento entre a estrutura de capital e a rentabilidade, demonstrando que, embora haja necessidade de busca por capital de terceiros, as empresas possuem tendência a ocultar informações privilegiadas para o mercado.

Os resultados fornecem indícios de que, conforme aumenta o endividamento, a redução na rentabilidade é reforçada pela presença da assimetria da informação. A assimetria influencia o custo de capital (KAO e WEI, 2014); em vista disso, quanto mais intensa for a assimetria, maior será o custo de empréstimos e financiamentos, o que contribui para o aumento da despesa financeira e consequente redução da rentabilidade.

Há, ainda, segundo a Teoria da Pecking Order, uma relutância em recorrer a fontes de capital externas em decorrência de questões informacionais (MYERS e MAJLUF, 1984). Dessa forma, como a contração de dívidas e a abertura de capital ensejam compartilhamento de informações com os fornecedores de capital, e a propriedade das empresas brasileiras é predominantemente concentrada, há certa tendência de perpetuamento da assimetria informacional, comportamento este que acaba contribuindo para potencializar o efeito negativo sobre a rentabilidade.

CONCLUSÕES

Como resultados apresentam-se dois pontos centrais: o endividamento implica diminuição de ROA e ROE; a assimetria informacional age como um fator potencializador do impacto negativo do endividamento na rentabilidade.

O primeiro resultado mostra que, no Brasil, o aumento do endividamento diminui as taxas de rentabilidade. Isso denota que empresas abertas do mercado brasileiro comportam-se de acordo com o previsto na Teoria da Pecking Order, optando pelo financiamento por meio de recursos retidos em detrimento do obtido por fontes externas. A justificativa está no fato de que o aumento do endividamento reduz a rentabilidade. Esse comportamento, alinhado à Teoria da Pecking Order, pode ser justificado pelas características das empresas brasileiras, uma vez que muitas possuem concentração de propriedade. Ou seja, uma grande proporção das ações negociadas está em posse de poucos acionistas; muitas vezes, de membros da mesma família. Dessa forma, os acionistas que detêm a maior parcela do capital tendem a escolher fontes de recursos próprios da empresa, já que o não pagamento dos juros e parcelas dos empréstimos pode resultar na perda de poder desses acionistas.

O segundo achado mostra que a assimetria informacional potencializa o efeito negativo do aumento do endividamento em índices de rentabilidade - o que se traduz em uma contribuição ao estudo de Kao e Wei (2014) -, de maneira que a assimetria não prejudica apenas a qualidade das informações contábeis, mas é um indicativo de que duas companhias que aumentam na mesma proporção o endividamento podem obter impactos diferentes sobre a rentabilidade, a depender do nível de assimetria informacional.

Esses dois achados não contribuem apenas para a literatura, mas também possuem uma veia prática, dado que os investidores podem compreender que, no Brasil, a relação negativa entre endividamento e rentabilidade não ocorre da mesma forma em todas as empresas, pois a assimetria informacional exerce um papel importante nessa relação. Assim, os investidores podem entender, de melhor forma, quais os impactos do aumento no nível de endividamento sobre a rentabilidade, o que pode ajudar na tomada de decisões relativas à escolha entre diferentes ativos como alternativa de investimento.

Em relação às limitações dos estudos, destaca-se que foram contemplados apenas o endividamento geral e não as diferentes nuances do endividamento, como o curto e o longo prazo. Com isso, abre-se espaço para sugestões de pesquisas futuras acerca da temática, especialmente sobre como a assimetria informacional interage com esses dois tipos de endividamento na rentabilidade. Para estudos futuros, sugere-se a análise de mais mercados de capital ao redor do mundo também caracterizados pela alta concentração de capital, para saber se o aumento do endividamento (geral, curto e longo prazo) provoca diminuição na rentabilidade e se a assimetria atua como fator potencializador da relação, o que poderia fornecer contribuições às análises de investidores e fomentar o debate entre as teorias de Pecking Order e Trade-off.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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Autor notes

Elcídio Henriques Quiraque - Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade Federal do Paraná (UFPR). E-mail: elcidioquiraque@gmail.com
Allison Manoel de Sousa - Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade Federal do Paraná (UFPR). E-mail: allison.msousa@gmail.com
Renata Orsato - outoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade Federal do Paraná (UFPR). E-mail: re.orsato@gmail.com
Romualdo Douglas Colauto - Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); Professor do Programa de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade Federal do Paraná (UFPR). E-mail: rdcolauto.ufpr@gmail.com


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