Resumo: Este artigo possui como objetivo mapear as principais violências educacionais no período de 2015 a 2020, no banco de dados científicos do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT). É resultado de uma revisão sistemática. As/os principais autoras/es identificadas/os nos trabalhos pesquisados, em ordem de recorrência, foram: Abramovay (2002), Fante (2005), Lopes Neto (2005), Debarbieux (2001, 2002), Charlot (2002), Antunes (2010), Silva (2010), Bourdieu (2014), Franco (2014), Beane (2010), Priotto (2006), Michaud (2001), Sardenberg (2007), Rossato e Rossato (2013), Tudisco (2011), Laterman (2000), Sposito (2001). Também se verificou os tipos de violências educacionais mais recorrentes, as instituições por estado que mais produziram pesquisas sobre a temática, as estratégias de prevenção e enfrentamento das violências educacionais nos 24 trabalhos científicos (18 dissertações e seis teses). Abramovay é a autora com mais recorrência nas produções, utilizada como referência principal em 16 das 24 pesquisas estudadas. Em síntese, foi possível perceber as contribuições das autoras citadas acima na compreensão do complexo fenômeno da violência, pluralidade de termos sobre violências escolares e as causas e consequências das violências na vida de crianças e adolescentes.
Palavras-chave: Escola, Professoras/es, Violência educacional.
Abstract: This article aims to map the main educational violence in the period from 2015 to 2020, in the scientific database of the Brazilian Institute of Information in Science and Technology - IBICT. It is the result of a systematic review. The main authors identified in the research works, in order of recurrence, were: Abramovay (2002), Fante (2005), Lopes Neto (2005), Debarbieux (2001, 2002), Charlot (2002), Antunes (2010), Silva (2010), Bourdieu (2014), Franco (2014), Beane (2010), Priotto (2006), Michaud (2001), Sardenberg (2007), Rossato and Rossato (2013), Tudisco (2011), Laterman (2000), Sposito (2001). Also, it was verified the most recurrent types of educational violence, the institutions by State that produced the most research on the subject, the prevention and confrontation strategies of educational violence in the 24 scientific works (18 dissertations and six theses). Abramovay is the author with more recurrence in productions, quoted in 16 of the 24 studies studied. In summary, it was possible to perceive the contributions of the authors mentioned above in understanding the complex phenomenon of violence, the plurality of terms on school violence and its causes and consequences of violence in the lives of children and adolescents.
Keywords: Educational violence, School, Teachers.
Resumen: Este artículo tiene como objetivo mapear las principales violencias educativas en el período de 2015 a 2020, en la base de datos científica del Instituto Brasileño de Información en Ciencia y Tecnología IBICT. Es el resultado de una revisión sistemática. Los principales autores identificados en los trabajos investigados, por orden de recurrencia, fueron: Abramovay (2002), Fante (2005), Lopes Neto (2005), Debarbieux (2001, 2002), Charlot (2002), Antunes (2010), Silva (2010), Bourdieu (2014), Franco (2014), Beane (2010), Priotto (2006), Michaud (2001), Sardenberg (2007), Rossato y Rossato (2013), Tudisco (2011), Laterman (2000), Sposito (2001). También se verificaron los tipos de violencia educativa más recurrentes, las instituciones por Estado que produjeron más investigaciones sobre el tema, las estrategias de prevención y enfrentamiento de la violencia educativa en los 24 trabajos científicos (18 disertaciones y seis tesis). Abramovay es el autor con más frecuencia en producciones, siendo citado en 16 de los 24 estudios estudiados. En resumen, fue posible percibir los aportes de los autores mencionados anteriormente en la comprensión del complejo fenómeno de la violencia, la pluralidad en términos de violencia escolar y sus causas y consecuencias de la violencia en la vida de niños, niñas y adolescentes.
Palabras clave: Escuela, Maestros, Violencia educativa.
Publicação Contínua
Violência educacional: uma revisão sistemática
Educational violence: a systematic review
Violencia educativa: una revisión sistemática
Recepción: 30 Noviembre 2021
Aprobación: 02 Febrero 2022
Publicación: 30 Marzo 2022
A violência é um fenômeno que está presente na sociedade há muito tempo, em nosso dia a dia ouvimos relatos em vários locais, seja na mídia, no ambiente familiar, no trânsito, na internet, no entorno e dentro das escolas. A violência é resultado de fatores sociais e culturais, contra crianças, adolescentes, mulheres, idosas/os, negras/os, homossexuais, pessoas com deficiência, pessoa indígenas, entre outras. Atualmente a temática das violências vem ganhando espaço, sendo objeto de reflexão, discutido e estudado por pesquisadoras/es e profissionais, mas ainda assim, existe a carência de estratégias de prevenção e enfrentamento para minimizar as situações de violências no contexto educacional.
A escola, local que deveria ser seguro, de proteção às/aos estudantes, rompe este ideal ao serem reproduzidas uma variedade de violências neste ambiente, sendo percebidas nas dimensões físicas, psicológicas, verbais, simbólica, patrimonial, violências de gênero, entre outras.
O tema é muito amplo, na concepção da autora Abramovay (2002), não existe uma única percepção do que seja violência, esta varia de acordo com contexto social, cultural e apresenta características, normas, condições, peculiaridades de cada período histórico. Por este motivo, conceituar violência exige cuidado, no entanto é importante para compreensão das diversas manifestações, quem pratica, como acontece nas escolas, quais consequências e como preveni-la.
A instituição escolar configura-se como o primeiro espaço de contato social para crianças, local de formação e transformação social, portanto, é um local privilegiado para identificação, prevenção e enfrentamento das violências. Compreender as violências educacionais torna-se fundamental, pois o que ocorre na escola reflete na sociedade e as consequências são decisivas para a vida de todas as pessoas, por isso é necessário pesquisar e estudar sobre a prevenção e o enfrentamento das violências. Atitudes autoritárias são frequentes, regras rígidas para manter a disciplina, intimidação, coação, constrangimento de crianças e adolescentes precisam ser substituídas por outras regras de convivências, propiciando espaços de diálogo e acolhimento, para que as crianças e os adolescentes tenham condições de identificar situações que que desencadeiam ações violentas no contexto educacional.
Nesse sentido, é importante que todas/os as/os profissionais da educação tenham uma formação inicial que aborde sobre a temática de prevenção e enfrentamento de violências no contexto educacional. Também, é necessário que estes/as profissionais busquem constantemente conhecimentos, formações continuadas, conheçam o fluxo e os protocolos que podem seguir nas diversas situações de violências - como notificar as autoridades, como dialogar com as famílias, orientar os jovens sobre prevenção, enfrentamento e denúncias, como demonstrar confiança para saberem que a escola está disponível para ouvi-las/os e informá-las/os e atendê-las/os de forma adequada, que evite traumas, problemas de ensino e aprendizagem, evasão entre outras consequências.
Observamos nos trabalhos pesquisados, que as/os autoras/es chamam a atenção para o assunto, demonstram a realidade do problema das violências nas escolas como um obstáculo a ser enfrentado, para que a sociedade alcance uma cultura de respeito à pessoa pautada nos direitos humanos, sem distinção de gênero, classe social, raça, credo ou religião. Foram apontados vários tipos de violências, diferentes conceitos atribuídos ao termo violências no espaço escolar e alguns fatores que contribuem para a existência e perpetuação das práticas violentas nas escolas.
Deste modo, no decorrer desta pesquisa identificamos nas produções acadêmicas dos últimos cinco anos, as/os principais autoras/es que embasaram os estudos sobre a temática de violências escolares, os termos utilizados, as propostas e estratégias que os estudos apontaram e as produção e instituições por estado.
Para a elaboração deste artigo foi realizada uma revisão sistemática por meio do levantamento de produções acadêmicas no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), no segundo semestre de 2021. A pesquisa foi dividida em subtemas, nomeados como descritores: “Violência AND Gênero AND Escola”; “Violência AND Gênero AND Professores”; “Violência de Gênero AND educação”; “Violência AND Escolares AND Pandemia”. Na sequência, foi adicionado o recorte temporal de 2015 a 2020, tendo como lócus da pesquisa o Brasil, e com abrangência de diferentes áreas do conhecimento (educação, sociologia, psicologia).
Foram encontrados no total 769 trabalhos na plataforma (IBICT). Utilizou-se como filtro os seguintes critérios para excluir alguns trabalhos: a) ausência do foco da temática no título e no resumo; b) trabalhos que abordavam violência educacional no ensino superior; c) trabalhos sobre as modalidades (educação especial, educação de jovens e adultos, educação do campo, educação quilombola); d) trabalhos que abordavam violência escolar na educação privada e e) trabalhos repetidos.
No que se refere à “Violência AND Gênero AND Escola”, o total de publicações foi de 254 resultados, visto que apenas 10 cumprem com os filtros da pesquisa. Foram eliminados todos os textos que não estavam de acordo com o recorte temporal de 2015 a 2020; os que não tratavam sobre práticas de violência na educação básica; os que desviavam do foco do descritor “escola; que abrangiam significados diferentes da palavra gênero, tais como os que se referiam a gêneros literários. Visto isso, dentre os 10 textos encontrados, 9 são dissertações e apenas 1 tese. Dentre os estados que mais publicaram textos sobre o tema estão: São Paulo, com 3 textos. Ainda no recorte estadual, tem-se produções de Paraíba (2), Pernambuco (2), Paraná (1) e, por fim, Rio de Janeiro (2).
O número de publicações encontradas com os descritores “Violência AND Gênero AND Professores” foi de 101 resultados de trabalhos no total. Após a leitura dos títulos e resumos, foram selecionados 17 trabalhos. Ao comparar estes trabalhos com os encontrados em outros descritores verificou-se alguns trabalhos repetidos, com isso restou apenas um trabalho referente à violência, gênero e professores. Trata-se de uma dissertação do ano de 2015, publicada pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), do estado de São Paulo.
Na busca pelos descritores “Violência de Gênero AND educação” localizamos 411 resultados. Ao delimitar com o critério temporal de 2015-2020, os resultados foram de 261 trabalhos, 194 dissertações e 69 teses. Após a exclusão de trabalhos repetidos e análise dos títulos e dos resumos que estavam em concordância com o tema, restaram 12 produções acadêmicas, destas são sete dissertações e cinco teses. Dois textos são referentes ao ano de 2015, um no ano de 2016, três de 2017, três de 2018, dois de 2019 e um no ano de 2020, realizados pelos estados de São Paulo (seis) pela UNINOVE, USP, UFSCar e UNESP, Paraná (dois) pela UFPR, Goiás (dois) pela PUC- Goiás e UFG, Pernambuco (um) pela UFRPE e Ceará (um) pela UFC.
Na pesquisa realizada com os descritores “Violência AND Escolares AND Pandemia”, foram encontrados 3 resultados, visto que apenas um cumpriu com os filtros da pesquisa. O trabalho que se adequa ao assunto dos descritores de maneira efetiva consiste em uma dissertação produzida no ano de 2020, pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
O total de resultados selecionados considerando os critérios de exclusão foi de 24 trabalhos. Estes 24 (18 dissertações e seis teses) abordam sobre a temática de violência educacional na educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio).
A próxima etapa consiste em apresentar os resultados organizados em tabelas seguidos da análise de dados. Apresentaremos a Tabela 1 com o quantitativo da recorrência das/os principais autoras/es nos trabalhos e o quantitativo de citações. A Tabela 2 apresenta a recorrência dos termos das violências educacionais. A Tabela 3 contempla as produções por estados brasileiros que apresentam maior produção na área da violência educacional e, por último é apresentado uma síntese sobre as principais estratégias de prevenção e enfrentamento identificadas nos 24 trabalhos.
Este trabalho foi escrito a partir de uma revisão sistemática que tinha como objetivo identificar as/os principais autoras/es citadas/os nas teses e dissertações no período de 2015 a 2020 sobre a temática da violência educacional, assim como, localizar a recorrência de termos, dos tipos de violências educacionais, as estratégias de prevenção e enfrentamento e os Estados brasileiros que apresentam maior número de produção acadêmica na área da temática pesquisada.
Ao realizar a pesquisa sobre os/as principais autores/as mais citados/as nas produções acadêmicas relacionadas com a temática das violências educacionais identificamos 22 autoras/es, mas nem todas/os abordam especificamente sobre este tema, como ´podemos observar na Tabela 1, que apresenta o nome dos/as principais autores/as citadas/os e a sua respectiva quantidade de recorrência nos trabalhos e o número de citações. Neste quantitativo de citações incluímos a contabilização das referências.
Os dados apresentados na Tabela 1 são resultantes da análise realizada no resumo, no corpo do texto e nas referências. Primeiramente, foram identificadas/os autoras/es que trabalham diretamente com a temática da violência, como: Abramovay (2002), Laterman (2000), Michaud (2001) e Sposito (2001), Charlot (2002), Saffioti (2001); Debarbieux (2001, 2002) e Priotto (2006). Em seguida foram identificadas autoras/es sobre a temática do bullying: Fante (2005), Lopes Neto (2005), Pereira (2009), Antunes (2010), Silva (2010), Beane (2011), Tudisco (2011), Franco (2014), Rossato e Rossato (2013).
É possível observar na Tabela 1 que a autora com o maior número de recorrência nas produções é Miriam Abramovay1, sendo citada em 16 das 24 pesquisas investigadas, seguida por Cleo Fante e Aramis Antonio Lopes Neto com destaque na temática do bullying nas escolas, uma das formas de violências que mais cresce no mundo.
Foucault teve um número alto de citações em apenas quatro trabalhos selecionados. Michel Foucault2(1987) em “Vigiar e punir”, direciona a compreensão sobre o que é o poder, e Paulo Freire3(1996), em suas obras como “Pedagogia do oprimido”, “Pedagogia da autonomia” entre outras, observa que a escola transforma e humaniza os sujeitos marginalizados pela sociedade. Estes dois autores possuem grande contribuição para várias pesquisas em educação, apesar de não trabalharem especificamente sobre a temática de gênero e violências, no entanto, contribuem para pesquisas acadêmicas na área da educação, sendo referenciados em diversos trabalhos.
Acerca das pesquisas realizadas pela autora Miriam Abramovay destacamos, especialmente duas obras: 1) o livro intitulado “Cotidiano das escolas: entre violências” (2006), com seus doze capítulos apresenta a temática das violências de forma aprofundada articulando a concepção teórica com as experiências vivenciadas por discentes, docentes e equipe pedagógica, compondo um caleidoscópio sobre a violência escolar; 2) o livro “Diagnóstico participativo das violências nas escolas: falam os jovens” publicado no ano de 2016, trata especificamente da violência escolar, apontando dados sobre a violência sofrida por jovens de escolas públicas de sete capitais brasileiras e no seu entorno.
Cleo Fante4(2005) e Aramis Antonio Lopes Neto5(2005) são autoras mais citadas na temática do bullying. Cleo Fante (2005) classifica e descreve os personagens que protagonizam as situações de bullying, sendo os seguintes: Vítima típica, Vítima provocadora, Vítima agressora, Agressor e Espectadores.
[...] A vítima típica é um indivíduo (ou grupo de indivíduos), geralmente pouco sociável, que sofre repetidamente as consequências dos comportamentos agressivos de outros e que não dispõe de recursos, status ou habilidades para reagir ou fazer cessar essas condutas prejudiciais. Suas características mais comuns são: aspecto físico mais frágil que de seus companheiros [...], timidez, passividade, submissão, insegurança, baixa autoestima [...], é “presa fácil” para os seus abusos (Fante, 2005, p. 71).
A autora Fante também aborda o conceito de vítima provocadora “é aquela que provoca e atrai reações agressivas contra as quais não consegue lidar com eficiência. [...], tenta brigar ou responder quando é atacada ou insultada, mas geralmente de maneira ineficaz; pode ser hiperativa, inquieta, dispersiva e ofensora”. (Fante, 2005, p. 72).
A vítima agressora costuma reproduzir a violência sofrida ao transferir os maus tratos recebidos para outra pessoa, a qual considera mais “fraco”. “[...] A vítima agressora é aquele aluno que, tendo passado por situações de sofrimento na escola, tende a buscar indivíduos mais frágeis que ele para transformá-los em bodes expiatórios, na tentativa de transferir os maus tratos sofridos”. (Fante, 2005, p. 72).
A autora destaca que o agressor é quem pratica o bullying, implica, agride ou ameaça, precisa exercer uma relação de poder sobre a vítima.
[...] O agressor é aquele que vitimiza os mais fracos [...], normalmente se apresenta mais forte que seus companheiros de classe e que suas vítimas em particular. [...] Ele sente uma necessidade imperiosa de dominar e subjugar os outros, de se impor mediante o poder e a ameaça e de conseguir aquilo a que se propõe (Fante, 2005, p. 73).
Fante considera que “espectador é o aluno que presencia o bullying, porém não o sofre nem o pratica. Representa a grande maioria dos alunos que convive com o problema e adota a lei do silêncio por temer se transformar em novo alvo para o agressor. (Fante, 2005, p.73).
Aramis Antonio Lopes Neto6(2005) pesquisou a faixa etária mais comum da ocorrência de bullying no ambiente escolar, sendo constatado a prevalência nos alunos com idades entre 11 e 13, a autora também classifica e descreve Autor de bullying, Alvo de bullying, Alvo/autor de bullying e Testemunhas de bullying.
De acordo com Lopes Neto, o termo “bullying” se refere a atitudes agressivas intencionais e consecutivas, sem motivo aparente, que lesa o psicológico e/ou o físico de outros, sendo uma concretização de uma relação desigual de poder interpessoal.
Lopes Neto também abrange outros contextos aparentes constantemente no debate do tema, como a identificação de “alvos de bullying”. Para o autor, a periodicidade e constância dos ataques de ações negativas- situações em que uma pessoa é ferida de maneira repetida e intencional por outro indivíduo- identifica um potencial alvo de bullying
Lopes Neto sobre autor de bullying:
O autor de bullying é tipicamente popular; tende a envolver-se em uma variedade de comportamentos antissociais; pode mostrar-se agressivo inclusive com os adultos; é impulsivo; vê sua agressividade como qualidade; tem opiniões positivas sobre si mesmo; é geralmente mais forte que seu alvo; sente prazer e satisfação em dominar, controlar e causar danos e sofrimentos a outros. Além disso, pode existir um componente benefício em sua conduta, como ganhos sociais e materiais. São menos satisfeitos com a escola e a família, mais propensos ao absenteísmo e à evasão escolar e têm uma tendência maior para apresentarem comportamentos de risco (consumir tabaco, álcool ou outras drogas, portar armas, brigar, etc.). As possibilidades são maiores em crianças ou adolescentes que adotam atitudes antissociais antes da puberdade e por longo tempo. Pode manter um pequeno grupo em torno de si, que atua como auxiliar em suas agressões ou é indicado para agredir o alvo (Lopes Neto, 2005, p. 4)
O autor ainda escreve sobre testemunha de bullying, que o mesmo reconhece sentir simpatia pelo alvo, porém que geralmente se calam temendo ocupar o protagonismo da vítima e por não confiar inteiramente nas atitudes dos docentes escolares. Esse silêncio age, ainda, negativamente ao reafirmar a posição de poder do autor do ato violento. As testemunhas ainda são classificadas de acordo com as ações diante dos ataques: os que participam ativamente dos ataques (auxiliares); os que incentivam o autor (incentivadores); os que assistem passivamente ou se afastam da situação (observadores); e, por fim, os defensores, que se mobilizam e se impõem a fim de proteger o alvo.
A autora Miriam Abramovay critica o conceito de bullying. A expressão bullying foi cunhada pelo pesquisador norueguês Dan Olweus, nas década de 1970 e 1980 e é associada como uma forma de violência entre pares, ou seja, entre os estudantes. No Brasil, o bullying aparece nas escolas de forma generalizada, sendo designada para qualquer tipo de violência que ocorre na escola. Com isso, a autora utiliza o conceito de violência, por considerar o conceito bullying muito restrito. (Abramovay, 2019).
Bernard Charlot (2002) distingue violência, incivilidade e indisciplina, investiga a realidade nas escolas francesas e constata que as violências seriam um conjunto de incivilidades. A violência não é nova, mas assume novas formas, mudanças, à medida que a sociedade também muda. Os fenômenos da violência são categorizados por Charlot (2002) como “na”, “da” e “contra” a escola, ou seja, “na escola”, dentro do espaço escolar, “à escola”, que estão relacionadas a instituição escolar e aqueles fenômenos que a representam e “da escola”, violências da instituição consideradas injustas ou racista pelas/os alunas/os. Em relação às incivilidades, estas se contrapõem “às regras da boa convivência: desordens, empurrões, grosserias, palavras ofensivas, geralmente ataque quotidiano” (Charlot, 2002, p. 437).
Eric Debarbieux7(2002) pesquisa a temática da violência na escola, ligando às desigualdades sociais e opta por substituir o termo incivilidades por micro violências, pois restringir o conceito das violências, a intimidação por exemplo, não leva em conta aspectos fundamentais como a violência dos adultos com discentes, como o vandalismo e leva a individualizar o problema. No entanto, a micro violência pode ser descrita em termos de incivilidade ou de intimidações.
A incivilidade é, antes de mais nada, resultante da pequena delinquência: passível de punição e qualificação, embora de difícil controle – sabemos que 80% das queixas não recebem acompanhamento [...]. Nas escolas, isso leva a uma forte crise de identidade, tanto entre os alunos quanto entre os professores, e a palavra-chave do discurso é “respeito”, sem o qual não pode haver nem prestígio nem uma identidade social adequada (Debarbieux, 2002, p. 27- 28).
A Heleieth Iara Bongiovan Saffioti8(1999) é uma autora utilizada nas reflexões sobre classe social, raça e gênero, e, também aborda a temática do patriarcado, uma violência masculina que é legitimada e incentivada pela nossa sociedade.
A autora Elis Palma Priotto9(2006) identificou os tipos de violência com adolescentes em uma escola pública e em outra particular, em 2008, na sua dissertação de mestrado “Violência escolar: políticas públicas e práticas educativas” investigou as práticas de escolas públicas na prevenção de violências. Elis Palma Priotto e Lindomar Wessler Boneti (2009), no artigo “Violência escolar: na escola, da escola e contra a escola” definem a violência escolar de forma abrangente como se expressa na escola, da escola e contra a escola, de acordo com as classificações de Abramovay (2003, 2006) e Charlot (1997, 2002).
Além das contribuições apontadas acima pelas autoras que foram recorrentemente citadas nos trabalhos, buscamos identificar a diversidade de conceitos que são, geralmente, utilizados pelas/es pesquisadoras/es para explicar o fenômeno das violências no contexto educacional, como podemos observar na Tabela 2:
Diante da tabela apresentado acima, percebe-se que o termo “bullying” consiste no maior número de repetições (5537); sendo seguido por “violência”, com 4367 repetições. Dois termos “generalistas” ocupam os primeiros colocados do ranking de menções apresentados na tabela acima. Essa incidência exacerbada aponta que o cotidiano escolar é permeado pelo “bullying”, que consiste em gestos que intimidam e agridem pessoas de modo verbal ou fisicamente.
No entanto, em relação ao número de trabalhos em que os termos , “violência” e “violência nas escolas” / “violência escolar” são citados, constatamos que estes três termos ocupam o primeiro lugar, e foram localizados em todos os trabalhos analisados.
É importante entender o conceito da violência escolar segundo os autores mais citados nestes trabalhos. Priotto e Boneti (2009, p. 162) define “violência escolar todos os atos ou ações de violência, comportamentos agressivos e antissociais, incluindo conflitos interpessoais, danos ao patrimônio, atos criminosos, marginalizações, discriminações, dentre outros [...]”. Em suas pesquisas Priotto (2009) ainda considera a denominação mais abrangente, violência “na”, “da” e “contra” a escola.
Em relação ao conceito de violência de gênero, Saffioti (2001, p. 01) aborda-o como um “conceito mais amplo, abrangendo vítimas como mulheres, crianças e adolescentes de ambos os sexos”. Saffioti ainda define “gênero” como uma construção social do masculino e feminino, desta forma, destaca que existe “[...] um conjunto de normas modeladoras dos seres humanos em homens e em mulheres, que estão expressas nas relações destas duas categorias sociais”. (1999, p. 82)
A violência doméstica para Abramovay et al. (2002), é o motivo de muitos jovens deixarem a família. Nos relatos de meninos e meninas de seu estudo, é um pai ou padrasto que espanca, abusa, o próprio ambiente familiar é local onde muitos jovens tiveram contato com a violência de forma direta, sendo vítimas de maus-tratos pelos próprios pais. Segundo a autora, a violência doméstica é “um elemento desencadeador do que poderia ser denominado cadeia de violências ou reprodução de violências”. Desta forma, “pais e mães violentos que têm os filhos como suas vítimas, que, por sua vez, se tornariam violentos, fazendo outras vítimas”. (Abramovay et al., 2002, p. 51).
Na definição de Fante (2005, p. 28-29), o “bullying” compreende um “conjunto de atitudes agressivas, intencionais e repetitivas que ocorrem sem motivação evidente, adotado por um ou mais alunos contra outro (s), causando dor, angústia e sofrimento”. A autora ainda exemplifica manifestações de comportamentos em relação a esta violência, algumas delas são insultos, intimidações, apelidos, gozações entre outras atitudes que ridicularizam e levam à exclusão, danos físicos, morais e materiais.
Lopes Neto (2005) acrescenta que essas atitudes são executadas numa relação desigual de poder, que pode ser pela diferença de idade, tamanho, desenvolvimento emocional ou outras assimetrias. “Trata-se de comportamentos agressivos que ocorrem nas escolas e que são tradicionalmente admitidos como naturais, sendo habitualmente ignorados ou não valorizados, tanto por professores quanto pelos pais”. (Lopes Neto, 2005, p. 165)
Veremos a seguir um levantamento dos estados com maior número de produção acadêmica nesta área da violência educacional.
Diante do exposto na tabela acima, é possível analisar que o estado de São Paulo lidera a produção dos textos com a temática de violência educacional, com 11 produções, seguido por Paraná, que conta com três dos 24 textos analisados.
A incidência desta problemática no cotidiano deve ser o motivo para a quantidade grande de produções acerca desse tema, já que pesquisas realizadas pelo Instituto Locomotiva Pesquisa e Estratégia indicam que 79% da população de São Paulo teve conhecimento de algum incidente de violência nas escolas do estado, em 2019. Devido a um aumento nos casos vivenciados desse desafio, o número de produções do estado cresce e, consequentemente, ele se torna referência em produções relacionadas a esta temática.
Ações de prevenção consistem em medidas relacionadas às intervenções antecipadas, sendo realizadas antes das ocorrências de violências e visam diminuir a sua intensidade. A importância dessas ações se faz cada vez mais necessária, à medida que a reparação (depois dos danos ocorridos) se faz de um acesso menos palpável. Dentre os tipos de prevenção, se destacam especialmente três tipos: primária, secundária e terciária. A prevenção primária é a que visa evitar o início dos acidentes, agindo de maneira totalmente preventiva. Já a secundária consiste em tentar minimizar o avanço e a progressão das consequências dos acidentes já acontecidos. E, por fim, a prevenção terciária e quaternária buscam o regresso dos danos já acontecidos e o evitar sequelas tardias, com o objetivo de normalizar novamente os indivíduos atingidos. (Brasil, 2013)
De acordo com a ONU, a abordagem de saúde pública para prevenir a violência consiste em quatro etapas. A primeira consiste em reunir conhecimentos sobre os aspectos da violência, obter informações a fim de conhecer mais sobre o assunto, obtendo propriedade para agir sobre o mesmo. A segunda é investigar as causas, fatores que intensificam ou reduzem o risco de violência e os fatores que podem ser modificados a partir de intervenção. Por terceiro, se encontra a exploração de tipos de intervenções para prevenir situações violentas. Por fim, em quarta etapa se encontra a tentativa de inserção da teoria das intervenções na realidade, observando quais são promissoras e determinando as relações de custo e benefício dos programas levantados. (ONU, 2017)
Desse modo, a fim de evitar antecipadamente fatalidades que possam ocorrer devido a violências em ambientes escolares, é de suma importância tomar medidas que, além de prevenir algumas situações de violências, irão minimizar danos e consequências de possíveis traumas, consequências, dificuldades no processo de ensino e aprendizagem. Para que o cotidiano escolar se torne um espaço seguro e livre de violências, ações preventivas consistem em uma estratégia essencial, que merece atenção e prioridade da sociedade.
Adiante, a partir do momento em que se cruza a linha da prevenção, é necessário adentrar no cenário de enfrentamento das violências educacionais. O enfrentamento consiste em combater uma crise, um problema já iniciado, que não conta mais com medidas preventivas efetivas e que necessita de ações interventivas assertivas para encerrar subitamente as tribulações enfrentadas.
Camacho (2001) afirma que os incidentes violentos que ocorrem com certa constância surgem pela intolerância às minorias, como pessoas negras, homossexuais, pessoas com deficiência, e inclusive mulheres. Além disso, Camacho também realizou um estudo que constata a maior incidência de agressões entre pares durante os intervalos entre as aulas, no recreio, corredores e áreas comuns do ambiente escolar.
Existem incontáveis estratégias de enfrentamento, cada uma individualmente focada em seu respectivo contexto de violências, a fim de minimizá-las. Nessa análise, é relevante conhecer o ambiente, compreender as causas e as possíveis consequências do óbice protagonista, para que, ao obter um maior entendimento sobre o assunto, seja possível a implementação de estratégias de prevenção e enfrentamento de violências educacionais. Entre as estratégias gerais mais utilizadas se encontra a proteção social. Proteção social consiste na busca do enfrentamento de desigualdades, riscos e vulnerabilidades, gerados como consequência de uma sociedade erguida em princípios tradicionalistas e intolerantes com as minorias. A violência se apoia em bengalas sociais que desestabilizam a harmonia comum dos sujeitos e, devido a isso, se prova necessário um enfrentamento efetivo, definitivo e urgente.
Diante da temática das violências educacionais abordada aqui, cabe ressaltar o papel protagonista que a prevenção e o enfrentamento deveriam ocupar no cenário, reduzindo as situações de violências e combatendo as intolerâncias no contexto escolar. Dentre os trabalhos analisados neste presente artigo, a totalidade reconhece a necessidade e importância de ações de prevenção e enfrentamento, alguns inclusive apresentando estratégias para a prevenção e extinção da problemática.
O método mais eficaz, diante dos levantamentos feitos nos textos, consiste no diálogo. Conversas em ambientes familiares é uma estratégia importante, mas exige a participação ativa dos membros familiares e a conscientização de todos os participantes da residência. Já nas escolas, é importante o trabalho de mediação entre professoras/es e estudantes sobre a prevenção e o enfrentamento de violências educacionais, a fim de de criar uma consciência crítica contrária às práticas violentas e, como o ambiente escolar acolhe a maioria das/os adolescentes em formação, criar uma bagagem de princípios que acompanhem os sujeitos na idade adulta.
Entre outros métodos, foi possível identificar nos trabalhos analisados, a criação de grupos de apoio, que compartilhem as dores em um ambiente seguro para tentar minimizar os danos e consequências das ações já sofridas, sendo assim, baseados em medidas de enfrentamento tardias, visto que não dão a oportunidade de prevenção mais. Além disso, é importante o engajamento de todas/os as/os profissionais, tal como a ajuda da/o médica/o pediatra, para a construção de um espaço seguro, de apoio para as crianças e os adolescentes em situações de violências.
Outras duas estratégias abordadas nas pesquisas analisadas se referem ao uso de questionários abertos para discentes e docentes e sobre a eficácia da lei N. 13.185 de 06 de novembro de 2015 conhecida como a lei anti-bullying10. A primeira estratégia mais recorrente nas pesquisas consiste em uma tentativa de dar voz às/aos professoras/es e estudantes para que possam se sentir ouvidos dentro do ambiente escolar e, consequentemente, mais confortáveis e em um estado de alerta na perspectiva da redução de incidentes violentos ou intolerantes. Sobre a lei anti-bullying, que entrou em vigor em 2015, prevê que as escolas desenvolvam medidas de conscientização, combate e prevenção ao bullying. Também, é relevante relembrar que no ano de 2018 foi publicada a Lei N. 13.663 de 14 de maio de 201811 que altera o art. 12 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, para incluir a promoção de medidas de conscientização, de prevenção e de combate a todos os tipos de violência e a promoção da cultura de paz nos estabelecimentos de ensino.
Além das estratégias de prevenção e enfrentamento levantadas nos textos selecionados, cabe ressaltar o posicionamento da ONU sobre o assunto. A Organização das Nações Unidas reuniu sete estratégias para prevenir situações violentas, entre elas estão: a redução da disponibilidade do uso excessivo de álcool; redução do contato com armas, facas e venenos; mudança de normas culturais que demonstram apoio a violência; desenvolvimento de habilidades de vida em crianças e adolescentes; desenvolvimento de relações seguras e saudáveis entre crianças e seus pais ou cuidadores; promoção de igualdade de gênero e a criação de programas de cuidado, identificação e apoio às vítimas. (ONU, 2017)
Também, é relevante ressaltar que nestes 24 trabalhos analisados constava uma certa preocupação com a efetivação e ampliação das atividades de prevenção e enfrentamento das violências educacionais, para além de campanhas, propagandas, atividades pedagógicas, pesquisas e apresentação de dados, textos sobre a temática. Alguns trabalhos apontavam sobre a importância da cultura da paz, da cultura da não violência e sobre a importância da inclusão da temática nos currículos de formação inicial e continuada de docentes.
A importância de prevenir e enfrentar os acontecimentos de violência educacional se faz mais necessária a cada tragédia que é notificada, devido ao grande risco à saúde mental e física das/os estudantes e profissionais que passam grande parte da vida nas escolas brasileiras. Diante de todas as situações problemáticas vivenciadas devido à violência educacional, torna-se relevante o levantamento das estratégias de prevenção e enfrentamento desse fenômeno.
Na análise dos trabalhos selecionados nesta pesquisa, foi possível constatar a seleção de diversas estratégias de prevenção e enfrentamento às violências educacionais, dentre elas estão a criação de cursos para as/os docentes a fim de prepará-las/os para lidar com a situação; equipes de ajuda entre iguais para as/os discentes contarem com uma rede de apoio, aprimorar as relações sociais e diminuir a violência; pesquisa e estudos sobre a eficácia da lei anti-bullying (13.185/2015); questionários abertos para discentes e docentes contribuírem com experiências próprias e sugestões; auxílio do médico (pediatra) no combate a violência e muitos outros; diálogo e estudo sobre o tema no contexto escolar. O diálogo é uma estratégia importante no enfrentamento e na prevenção das violências escolares. Debates mediados e estruturados nas escolas, diálogo entre discentes e docentes e o diálogo com a comunidade escolar e aos arredores da escola: - tais como em clubes, igrejas, associações de bairros, etc.
Em síntese, com a realização dessa pesquisa foi possível levantar as/os autoras/es mais citadas/os, a repetição dos termos relacionados a violência, os estados com mais produções e as estratégias de prevenção e enfrentamento das violências escolares instauradas no cotidiano brasileiro. Com isso observamos a relevância da temática da prevenção e do enfrentamento das violências educacionais, a fim de tornar o ambiente escolar um espaço mais seguro e equitativo.
Como citar: Graupe, M. E., Silva, F. P. M., & Maurente, R. M. (2021). Educational violence: a systematic review. Revista Tempos e Espaços em Educação, 15(34), e17173. http://dx.doi.org/10.20952/revtee.v15i34.17173
Contribuições dos Autores: Graupe, M. E.: concepção e desenho, aquisição de dados, análise e interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual; Silva, F. P. M.: concepção e desenho, aquisição de dados, análise e interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual; Maurente, R. M.: concepção e desenho, aquisição de dados, análise e interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual. As autoras leram e aprovaram a versão final do manuscrito.
prof.mareli@uniplaclages.edu.br