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Diálogos, partilhas e aprendizagens: A formação do professor gestor nas rodas de conversas
Dialogues, sharing and learning: The formation of the teacher manager in the conversation wheels
Dialogar, compartir y aprender: La formación del directivo docente en las ruedas de conversación
Diálogos, partilhas e aprendizagens: A formação do professor gestor nas rodas de conversas
Revista Tempos e Espaços em Educação, vol. 16, núm. 35, e18814, 2023
Universidade Federal de Sergipe
Recepción: 03 Noviembre 2022
Aprobación: 08 Febrero 2023
Publicación: 04 Abril 2023
Resumo: Este texto destaca a experiência Rodas de Conversas, do Projeto de Extensão “Professor-Gestor: a formação do professor”, vinculado ao Grupo de Estudos e Pesquisa Professor Gestor (GPPG)/CNPq), da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Trata-se de uma proposta metodológica de comunicação, lócus de diálogo, estudos e trocas de experiências entre profissionais do ensino superior e da educação básica, envolvidos em atividades de gestão educacional e de gestão escolar. As Rodas de Conversas tiveram início em 2019, presencialmente, passando ao modelo remoto no início de 2020, em virtude da pandemia de Covid-19, retornando ao formato híbrido em agosto de 2022, quando foram desenvolvidas 38 Rodas de Conversas. Na conjuntura de isolamento, a realização se deu por meio da utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e possibilitou tecer parcerias interinstitucionais com quatro universidades brasileiras, três universidades portuguesas e uma espanhola, ampliando a participação de estudantes, professores e gestores da educação básica. As Rodas de Conversas estabeleceram um espaço de diálogo, de troca de ideias e de práticas cotidianas. Avalia-se que as realizações delas impulsionam a partilha de ideias, práticas pedagógicas, planejamento, organização e gestão das instituições. O espaço dialógico tem contribuído para a coleta de dados empíricos sobre a gestão educacional e a gestão escolar. Além disso, é fundamental para a formação dos profissionais da educação, a partilha de ideias, de saberes e de sentimentos, e para o esclarecimento de dúvidas na busca de soluções para os processos relacionais e educacionais.
Palavras-chave: Espaços dialógicos, Formação do professor, Gestão escolar.
Abstract: This text highlights the experience of the Rodas de Conversas (Conversation Rounds) of the Extension Project "Teacher-Manager: teacher training", linked to the Study and Research Group Teacher Manager (GPPG)/CNPq), of the Faculty of Education, Federal University of Rio de Janeiro (UFRJ). It is a methodological proposal of communication, a place for dialogue, studies, and exchange of experiences among professionals from higher education and primary education involved in educational management and school management activities. The Conversation Rounds began in 2019 in a face-to-face format, moving to a remote model in early 2020 due to the Covid-19 pandemic, returning to the hybrid format in August 2022, when 38 Conversation Rounds were developed. In the context of isolation, the realization took place through the use of Information and Communication Technologies (ICTs) and made it possible to build inter-institutional partnerships with four Brazilian universities, three Portuguese universities, and one Spanish university, expanding the participation of students, teachers, and managers of basic education. The Conversation Rounds established a space for dialogue, exchanging ideas, and daily practices. It is evaluated that their realizations boost the sharing of ideas, pedagogical practices, planning, organization, and management of the institutions. The dialogical space has contributed to collecting empirical data on educational and school management. Moreover, it is fundamental for training education professionals, sharing ideas, knowledge, and feelings, and clarifying doubts in the search for solutions to relational and educational processes.
Keywords: Dialogical spaces, Teacher training, School management.
Resumen: Este texto destaca la experiencia de Rondas de Conversación, del Proyecto de Extensión "Profesor-Gestor: formación de profesores", vinculado al Grupo de Estudio e Investigación Profesor-Gestor (GPPG)/CNPq), de la Facultad de Educación de la Universidad Federal de Río de Janeiro (UFRJ). Se trata de una propuesta metodológica de comunicación, locus de diálogo, estudios e intercambio de experiencias entre profesionales de la educación superior y de la educación básica, involucrados en actividades de gestión educativa y gestión escolar. Las Rondas de Conversación se iniciaron en 2019, de forma presencial, pasando al modelo a distancia a principios de 2020, debido a la pandemia del Covid-19, volviendo al formato híbrido en agosto de 2022, cuando se desarrollaron 38 Rondas de Conversación. En el contexto de aislamiento, la realización se dio a través del uso de las Tecnologías de la Información y Comunicación (TICs) y posibilitó alianzas interinstitucionales con cuatro universidades brasileñas, tres portuguesas y una española, ampliando la participación de estudiantes, profesores y gestores de la educación básica. Las Mesas Redondas establecieron un espacio de diálogo, intercambio de ideas y prácticas cotidianas. Se evalúa que sus enterarese impulsan el intercambio de ideas, prácticas pedagógicas, planificación, organización y gestión de las instituciones. El espacio dialógico ha contribuido a la recolección de datos empíricos sobre gestión educativa y gestión escolar. Además, es fundamental para la formación de los profesionales de la educación, el intercambio de ideas, conocimientos y sentimientos, y la aclaración de dudas en la búsqueda de soluciones a los procesos relacionales y educativos.
Palabras clave: Espacios dialógicos, Formación del profesorado, Gestión escolar.
INTRODUÇÃO
O foco de um dos principais estudos desenvolvidos pelo Grupo de Estudos e Pesquisa Professor Gestor (GPPG), vinculado à Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ/CNPq), tornou-se a construção de um espaço de diálogo que promovesse o debate de ideias e a troca de experiências sobre as teorias e as práticas da gestão escolar. Com esse propósito, em 2019, o GPPG lançou o Projeto de Extensão “Gestão em Foco: a formação do professor”, que envolveu professores e estudantes universitários, diretores de escolas básicas e representantes da gestão pública municipal, na busca por uma consistente formação acadêmica em gestão escolar e educacional.
Diante da proposta de atender à questão relevante desse projeto de extensão de proporcionar a melhor formação acadêmica ao professor gestor, criou-se a metodologia Rodas de Conversas, desenvolvida com atividades previamente agendadas, visando promover a interlocução da universidade com as instituições de educação básica da rede pública, a troca de experiências e o desenvolvimento de pesquisas e estudos teóricos.
Com o advento das restrições sanitárias, impostas pela pandemia de Covid-19, as Rodas de Conversas adotaram, em 2020, o formato remoto para a interação dos licenciandos do Curso de Pedagogia e dos profissionais das escolas, alcançando mais estudantes universitários e professores, educadores, gestores da escola básica, em 38 encontros. Nesse momento de rodas virtuais, o GPPG teceu uma parceria interinstitucional, agregando professores de quatro universidades brasileiras, três universidades portuguesas e uma espanhola, estudantes licenciandos e profissionais da educação básica. Lideranças afetas aos órgãos de planejamento, organização e manutenção da educação pública, no Brasil e em Portugal, também interagiram e contribuir com seus saberes e vivências no planejamento, organização e desenvolvimento do ensino e da aprendizagem nas escolas.
Nos anos de 2020 e 2021, as plataformas digitais possibilitaram às Rodas de Conversas a ampliação do alcance territorial, a agregação de um número maior de estudantes e de profissionais da educação. Em agosto de 2022, o Projeto de Extensão “Gestão em Foco: a formação do professor” retornou ao formato presencial. Contudo, manteve o processo híbrido com transmissão online, a partir do Facebook da Faculdade de Educação, da UFRJ, agregando as experiências adquiridas com as parcerias construídas fora da UFRJ.
Desde a criação, as Rodas de Conversas, atuando como lócus privilegiado de diálogo, de troca de ideias e experiências, vêm possibilitando a produção e ressignificação de sentido e de saberes, a construção e reconstrução do conhecimento teórico e prático por meio do diálogo e da reflexão.
Essa metodologia de ensino e pesquisa vem contribuindo para agregar reflexão ao exercício de diálogo constante entre a universidade e a escola. Simultaneamente, também vem auxiliando na formação continuada dos professores gestores em seus espaços de atuação: a sala de aula, a coordenação pedagógica, a orientação educacional, a direção e a vice-direção escolar.
Para expor a experiência da metodologia Rodas de Conversa, no âmbito do Projeto de Extensão “Gestão em Foco: a formação do professor”, este texto está dividido em três seções. A primeira traz à vista a apresentação da escolha metodológica da Roda de Conversas e seus principais defensores para o debate em Educação. A segunda seção trata do exercício da fala no processo de construção humana e do conhecimento. Na terceira, são analisados os feedbacks dos participantes frentes às instigações e afetações provocadas pelas Rodas de Conversas. A finalização do texto se dá com os resultados alcançados no período em que as Rodas de Conversas contaram com interlocutores de vários lugares do Brasil, como também de Portugal e da Espanha.
RODA DE CONVERSA: METODOLOGIA REFLEXIVA CRÍTICA TRANSFORMADORA
A origem do método de reflexão é atribuída a Sócrates (469 – 399 a.C.), (Hergenberg, 2005). O método socrático utiliza o pensamento crítico, o raciocínio e a lógica para se chegar a uma conclusão acerca de questões e conceitos dos quais se tem certeza de conhecer. É o exercício do pensar e repensar sobre o que julga ser conhecido, ouvir e partilhar ideias e práticas que possibilita reconsiderar e ampliar as possibilidades de aprender e evoluir.
No Brasil, um dos grandes pensadores, internacionalmente reconhecido na área da educação, Paulo Freire (1979), a partir do seu referencial teórico-metodológico da Educação Popular, expressou a necessidade do diálogo, de dar voz como prática da liberdade. O diálogo, para ele, “[…] é o encontro entre os homens, mediatizados pelo mundo, para designá-lo. Se ao dizer suas palavras, ao chamar ao mundo, os homens o transformam, o diálogo impõe-se como o caminho pelo qual os homens encontram seu significado enquanto homens; o diálogo é, pois, uma necessidade existencial” (Freire, 2002, p.42).
A prática da liberdade, em Freire, concretiza-se quando os sujeitos se implicam, dialeticamente, como atores históricos e sociais críticos e reflexivos diante da realidade, superando a perspectiva de “transformar a experiência educativa em puro treinamento [o que significa] amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador” (Freire, 1996, p.37).
O referencial teórico-metodológico de Paulo Freire recorre a Círculos de Cultura como espaços em que dialogicamente se ensina e se aprende, como um espaço dialógico, horizontal, coletivo, que possibilita problematizações e construção de conhecimentos. Para Freire, é nos Círculos de Cultura que se conhece em vez de se fazer transferência de conhecimento, na visão da educação bancária. É nesse espaço dialógico que se constroem novas hipóteses, onde todos têm a palavra, onde todos leem e escrevem o mundo. É um espaço de trabalho, pesquisa, exposição de prática, dinâmicas, vivências que possibilitam a construção coletiva do conhecimento.
É com Freire (1970) e, em especial, na metodologia Círculos de Cultura, que emerge o diálogo como expressão de modos de vida. A busca por meio do diálogo possibilita que os sujeitos possam encontrar meios de transformação social, em um processo educativo pautado pela dinâmica crítico emancipatória. A própria ideia da roda remete a um círculo, em que ninguém fica atrás ou à frente, mas todos ao lado, em assembleia. Rompe com o modelo de educação bancária nos termos de Freire (1996) que pressupõe tutela/assistência e perpetua a estrutura da dominação para remeter a uma estratégia política libertadora, em comunhão, que favorece a emancipação humana, política e social.
Para Freire (1996), a educação para a vida e a cidadania consistem em uma tarefa primeira da educação libertadora comprometida com a conscientização das massas em situação de opressão. A visão de liberdade, segundo Freire, é a matriz que atribui sentido a uma prática educativa que só pode alcançar efetividade e eficácia na medida da participação livre e crítica dos educandos.
É também nessa perspectiva que Matias (2006) recorre à Silva (2000) para afirmar que a metodologia que envolve um fórum, como as Rodas de Conversas, não deve se limitar à mera contemplação das diferenças, nem colocar como meta o consenso, em uma tentativa de homogeneização. A possibilidade do diálogo pressupõe a abertura para outro mundo e a abertura para o outro. Lembra Silva (2000) que o próprio termo pedagogia significa a concepção da diferença, pois, ao educar, significa introduzir a cunha da diferença em dimensões do mundo que sem ela se limitaria ao parado e até ao morto. A pedagogia, assim, se efetiva como o novo, o capaz de diferenciar e de transformar o mundo.
Autores como Afonso e Abade (2008) acrescentam, a partir de abordagens da psicologia social, como da psicanálise e da educação, que as Rodas de Conversas se diferenciam de outras propostas de intervenção direta com pessoas, pois se trata de uma metodologia participativa. Ela comunga de um mesmo espaço de convivência. Os autores trazem contribuições para o entendimento sobre os participantes das Rodas de Conversas como participantes ativos em um contexto em que possam se expressar com liberdade.
Corroborando com essa perspectiva, Thompson (2009) elucidou que os cursos de formação de professores deveriam caminhar em diálogo constante com as práticas de ensino da educação escolar básica. Assim, tem-se a compreensão de que cada profissional, no campo de trabalho acadêmico ou escolar, adquire conhecimentos e saberes que devem ser compartilhados.
De acordo com este autor, a formação de professores/gestores, seja em fase inicial ou contínua, deve ser baseada em projetos interinstitucionais, que permitam aproximações constantes com o objetivo de que as reflexões, análises e ações, decorrentes de um exercício dialógico emancipador, sejam concretizadas tanto no contexto científico acadêmico quanto nas práticas educativas das escolas. Na gestão escolar, essa formação amalgamada permite que o planejamento e organização do ambiente educativo sejam construções coletivas, partilhadas entre todos os espaços de gestão de todos os níveis da educação básica (Paschoalino, 2017).
Também contribuíram para pensar a metodologia participativa das Rodas de Conversas outros autores, como Méllo, Silva e Di Paolo (2007), estudiosos que orientam a formação de rodas a partir de uma temática sugerida pelo grupo participante e selecionada a partir de objetivos claros e específicos.
As análises realizadas ressaltam que a metodologia escolhida foi ancorada nas concepções construídas e refletidas sobre a dinâmica das rodas. O Projeto “Gestão em Foco: a formação do professor” se constitui na defesa de que a formação de professores precisa garantir essa aproximação dialógica, afirmando que o espaço acadêmico da universidade não pode ficar distante da realidade educacional vivenciada na escola básica.
As Rodas de Conversas, no referido projeto, foram criadas com o propósito de aproximar duas realidades que deveriam caminhar juntas: a universidade e a escola. Historicamente, nem sempre foi possível manter o propósito de interlocução entre sujeitos formadores, que se mantêm sitiados em dois extremos, como se acreditava, podendo ser identificados como espaço de realidades antagônicas. O distanciamento entre a universidade e a escola básica, e até a sociedade nas suas múltiplas concepções, muitas vezes alicerçam barreiras difíceis de serem transpostas. Nesse sentido, a provocação de olhar a universidade em um exercício de dentro e de fora simultaneamente consiste em um aprendizado onde o “olhar para dentro da universidade desde esse lugar que me propus ocupar — um dentro-fora — me fez perceber os modos de andar e pensar a vida, os sujeitos, os coletivos, os valores e as forças que ali se produzem e disputam cenas” (Carvalho, Kidoiale, Carvalho, & Costa, 2020, p.156).
Os autores, ao problematizarem esses diversos olhares, se pautam pela ideia de que no cotidiano da vida os professores universitários precisam estar atentos à realidade que os cercam e que muda com muita rapidez. Portanto, o diálogo tem que ser constante. Com essa compreensão:
A partir dos encontros com os muitos mestres, mestras e aprendizes colaboradores desta pesquisa, busco olhar de novo, e de dentro, para a universidade. Para isso, não mudo de lugar; mudo de olhar. Porque esses mestres, ao se colocarem como sujeitos colaboradores da pesquisa, me emprestam também seus olhos, seus modos de ver. E o mundo ganhou outros coloridos (Carvalho et al., 2020, p.156).
As argumentações dos autores trazem as perspectivas de que o papel da universidade não precisa abdicar de seus preceitos, mas precisa incorporar as dinâmicas da vida para que a aprendizagem possa ser mais leve. Nessa lógica, o Projeto “Gestão em Foco: a formação do professor” defende que, nos cursos de Pedagogia, a formação de gestores escolares precisa garantir essa aproximação dialógica. O espaço acadêmico da universidade não pode ficar distante da realidade educacional vivenciada na escola básica.
Com esse entendimento, a formação dos professores/gestores, seja em fase inicial ou contínua, deve ser pautada por projetos interinstitucionais que permitam aproximações constantes no sentido de que as reflexões, análises e ações, oriundas de um exercício dialógico emancipador, sejam materializadas tanto no contexto científico acadêmico quanto nas práticas educativas das escolas.
DIÁLOGOS, REFLEXÕES E ANÁLISES DA EDUCAÇÃO ATUAL
É imprescindível lembrar que o processo de mudanças na educação, com a utilização das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDCIs) em larga escala e a adoção de um ensino híbrido, precisa caminhar pari passu ao processo de humanização, o que só ocorre tão somente pelas mãos dos homens. A sociedade humana recebeu e continua recebendo novas perspectivas de avanço seguindo, muitas vezes, uma lógica desestabilizadora, que crescerá envolta por conhecimentos e ações diversas, nem sempre condizente com o mundo almejado.
Ancorados na prerrogativa posta pelo neurobiólogo Maturana (1998), as transformações em curso ocorrem porque os seres humanos foram se humanizando a partir das linguagens. O autor afirma que a constituição do sujeito implica um processo que se realiza “[…] no entrelaçamento do emocional com o racional. O racional se constitui nas coerências operacionais dos sistemas argumentativos que construímos na linguagem, para defender ou justificar nossas ações” (Maturana, 2002, p.18).
Com essa lógica, pode-se inferir que um espaço de fala provoca uma organização no interlocutor e, simultaneamente, uma síntese dos acontecimentos vividos, permeados pelas ações da racionalidade e da emoção. Nessa mistura de sentimentos, a fala provoca um repensar sobre as ações passadas, torna-se análise de um passado recente.
A psicanálise de Freud (1891/1979) também argumentou que as palavras podem conseguir curar. “O sujeito freudiano é um sujeito livre, dotado de razão. Porém, sua razão vacila no interior de si mesma. É de sua fala e de seus atos, não de sua consciência alienada, que pode surgir o horizonte de sua própria cura” (Fochesatto, 2011, p.168). Ao compreender esse processo na associação com as Rodas de Conversas, o ato de se disponibilizar a falar sobre sua trajetória profissional e de suas experiências vividas possibilita ao professor, na condição de gestor, articular suas lembranças e ressignificar as emoções vivenciadas.
A princípio, parece inconsistência pensar a cura em um processo de formação de professores. Salienta-se, no entanto, a força das palavras que se constituiu a partir do “[...] nascimento da psiquiatria dinâmica e da psicanálise, e, ao longo do século XX, das psicoterapias – assentadas, cada uma a seu modo, no papel curativo da palavra” (Zorzanelli, 2011, p.304). Vale lembrar que, ao se distanciar das determinações da medicina, os usos das palavras para o alívio dos sofrimentos humanos já eram conhecidos “[...] tais como o magnetismo, a hipnose, a escrita automática – isso, se não nos detivermos nas suas variações religiosas, como as curas xamânicas e espíritas” (Zorzanelli, 2011, p.300).
Ao mesmo tempo, em que as possibilidades de oportunizar o espaço de fala e de aproximar o professor ao contexto em que atua podem levar às mudanças, é possível averiguar que as múltiplas situações que impedem o exercício da fala podem gerar adoecimentos. Nesse panorama, convém constatar as sucessivas desvalorizações e várias cobranças que afetam diretamente o trabalho desse profissional, que muitas vezes se isola e se culpa por não conseguir atingir os seus objetivos.
No contexto atual, em que as demandas são múltiplas e nas quais os professores que ocupam os lugares de gestão se percebem em uma dinâmica de isolamento e de pressões diversas, com tensionamentos frequentes, as oportunidades de falar sobre suas vivências são muito reduzidas. É nessa perspectiva que é possível averiguar que a falta de verbalizar e refletir sobre determinadas situações podem ocasionar o adoecimento. A importância do refletir e do falar se insere também na lógica da complexidade, pois “[...] somos conhecedores ou observadores no observar, e ao ser o que somos, o somos na linguagem” (Maturana, 1998, p.37)
O adoecimento docente tem se manifestado como uma perspectiva crescente no panorama educacional. Quanto mais se estuda e se reflete sobre o contexto da educação, com mais facilidade se reconhece vários momentos de mal-estar e adoecimento. Paschoalino (2009) delineou várias facetas desse mal-estar que se efetiva nos profissionais da educação. O silenciamento frente às dificuldades levam ao “[…] sentimento de solidão e a produção de novas formas de individualismo profissional defensivo, capazes de assegurar um ‘anonimato profissional protector’, constituam as características mais importantes das vivências profissionais” (Correia, 2008, p.44).
Nesse isolamento, as palavras perdem o sentido de expressar os sentimentos e os diversos mal-estares fazem parte do cotidiano do professor. Uma das possibilidades de quebrar essas sequências de ações que levam ao mal-estar e ao adoecimento é reestabelecer o uso da palavra.
Ao reconhecer-se como sujeito da palavra, imerso na linguagem, que diariamente humaniza o humano, ao permitir o deixar fluir das emoções, o professor deixa transparecer aquilo que o afeta e o constitui. Nessa perspectiva, ao possibilitar e provocar a fala sobre o exercício da docência, no âmbito da gestão, se abandona a percepção instituída e se inscreve na dimensão de instituinte.
Nessa capacidade de recriar frente ao novo, de se acoplar nas infidelidades do meio (Maturana, 1998), o humano se fortalece e se constitui. Assim, nesse constante movimento de reflexão e de ação, o ser humano sofre com os acoplamentos, que os instigam a mudanças. Dessa forma, as mudanças são necessárias, e como também ressignificar as perdas, para compreender que somos de renascer (Maturana, 1998). Essas sucessivas reinvenções e criações passam a se constituir como elementos indispensáveis para garantir a saúde em sua concepção ampla, como também o desempenho profissional efetivo.
Ao se reconhecer como ser da linguagem e estabelecer uma interlocução sobre o seu trabalho, o professor consegue romper as barreiras do seu isolamento e, inclusive, perceber que ao seu entorno os colegas de profissão também se exacerbaram com muitas dificuldades. A solidão e a solidariedade limitada do docente (Correia & Matos, 2001), consegue ser ultrapassada pelo uso da palavra que determina a consciência da ação e, sobretudo, a corresponsabilidade diante do trabalho pedagógico. Nesse sentido, a palavra, ao possibilitar o diálogo, também oportuniza análises e perspectivas de nossas ações.
Se a palavra em si já produz mudanças no humano, quando partilhada em um diálogo, as contações são mais evidenciadas em relação a sua constituição. Nós nos tornamos humanos nas relações (Maturana, 1998) e, dessa forma, o ato de falar e ser ouvido, e, principalmente, de ser interpelado pelo outro, provoca reflexões sobre a posição inicial da palavra.
Assim, as percepções individuais se mesclam com opiniões divergentes ou não, e novamente impulsionam outras reflexões. Freire (1996) deixou evidente nos seus escritos a capacidade de aprendizagem pelo diálogo. As palavras podem assumir o lugar, inclusive do próprio cuidado e de restauração do “eu” e do “outro”. Somente compreendemos a força primordial que movimenta as ações de cuidados quando habitarmos as duas dimensões como habitamos nossas casas – cuidar de si e cuidar do outro – e, com isso, somos estimulados a questionar as histórias interrompidas; as leituras de mundo que permaneceram às margens de nossa própria ignorância ou quando desenvolvermos a autoria em nós e no outro (Fazenda & Souza, 2012, p.114).
No contexto de impossibilidade da experiência, como nos adverte Jorge Larrosa (2015, p. 38), é preciso construir uma linguagem para a conversação, para podermos elaborar com os outros o sentido ou a ausência de sentido de nossa experiência. Elaborar o sentido de nossa experiência é nos colocarmos na tensão freiriana entre a denúncia de um presente cada vez mais intolerável e o anúncio de um futuro a ser criado por nós, mulheres e homens. Acreditamos que só podemos enunciar via uma linguagem para a conversação (Nóvoa & Alvim, 2021, p.5).
Em que pesem os estudos que apontam a importância da metodologia em pauta, as Rodas de Conversas, cumpre destacar os apontamentos de Burbules e Rice (1993). Para os autores, a instituição de um fórum, aberto, não significa, necessariamente, a possibilidade de diálogo. É preciso, segundo os autores, atentar para as relações presentes nesses espaços. Em uma sociedade estruturada pelo poder, as diferenças não estão todas situadas no mesmo nível. Segundo os autores, “o diálogo exige que reexaminemos nossos próprios pressupostos e o comparemos com pressupostos bastante diferentes; ele nos torna menos dogmáticos em relação à crença de que a forma pela qual o mundo aparece para nós é, necessariamente, a forma como o mundo é” (Burbules & Rice, 1993, p.190).
Cientes dessa perspectiva, nas Rodas de Conversas sempre era focado o objetivo de liberdade de expressão e de que o propósito não se limitava às experiências positivas, mas abria um espaço de reflexão sobre as práticas vivenciadas e dos desafios enfrentados.
Ao adotar a Roda de Conversas, o Projeto de Extensão “Gestão em Foco: a formação do professor” se propôs, a partir do modelo freiriano, a criar uma metodologia que possibilitasse a formação dos sujeitos histórico-sociais e a transformação social, pautada pela reflexão sobre a prática da gestão escolar. As rodas partiram da concepção de Paulo Freire, ao postular a inconclusão do sujeito histórico-social e a permanente busca do processo de humanização, como pode ser verificado no trecho a seguir.
Ressaltamos inicialmente a sua condição de ser histórico-social, experimentando continuamente a tensão de estar sendo para poder ser e de estar sendo não apenas o que herda, mas também o que adquire e não de forma mecânica. Isto significa ser o ser humano, enquanto histórico, um ser finito, limitado, inconcluso, mas consciente de sua inconclusão. Por isso, um ser ininterruptamente em busca, naturalmente em processo. Um ser que, tendo por vocação a humanização, se confronta, no entanto, com o incessante desafio da desumanização, como distorção daquela vocação (Freire, 1993, p.12).
Como metodologia, as Rodas de Conversas envolveram o diálogo entre a universidade e as escolas de educação básica, não impondo prescrições ou apresentando receitas de práticas, mas visando instigar reflexões a partir dos desafios postos à gestão escolar. Nesses termos, elas se afirmaram como espaços de fala e escuta, em que se pratica um exercício de despertar a consciência crítica e reflexiva, construída por valores humanos, individuais e sociais, tendo em vista a busca incessante do conhecimento no processo de humanização.
Ao gerar os momentos das rodas, o GPPG partiu do pressuposto de que cada profissional, no campo de trabalho, seja ele acadêmico ou escolar, contribuirá com as análises realizadas a partir das reflexões instigadas no seu trabalho. E, ao serem compartilhadas, essas experiências podem proporcionar, no profissional ou no outro, condição de fonte inspiradora sobre o respectivo cotidiano. Assim, o grupo coordenador do projeto de extensão sistematizou os encontros iniciais e os subsidiou com aportes teóricos e informações de pesquisa da realidade social em curso, com o intuito de realizar os encontros das rodas provocativamente.
A cada período, em cada roda, os desafios se misturam e também se interpelavam intensamente, como foi o período pandêmico. Nessa conotação, os avanços das TDICs, que minimizaram os impactos da urgente reinvenção do quadro e do giz, com o uso das telas de celulares, tablets, computadores e mouses (Novaes, Croce, Zanin, Basso, & Silva Filho, 2022) ultrapassaram fronteiras e limites, possibilitando o desenvolvimento das Rodas de Conversas virtuais. Vários arranjos e estratégias foram criadas para que as rodas não perdessem o objetivo precípuo de manter a possibilidade do diálogo, sem hierarquia, dando voz a todos os sujeitos.
A alteração da dinâmica para o ambiente virtual não impôs limites ou inibiu a participação. Pelo contrário, as fronteiras foram alargadas e, diante do desafio posto à educação e às escolas, pelas restrições sanitárias da pandemia, que impediram o contato físico das pessoas, as rodas mantiveram o propósito de permitir o diálogo, o aprendizado e a transformação social, incluindo, aproximando, estreitando laços e distâncias.
Realizadas de forma síncrona e mediadas por uma coordenação atenta aos preceitos da constituição da metodologia escolhida, as rodas mostraram-se uma estratégia profícua para trazer à vista a gestão educacional e das escolas brasileiras, portuguesas e espanholas. Por meio de perguntas dirigidas, construídas em um tema específico, as Rodas de Conversas do Projeto “Gestão em Foco: a formação do professor” estimularam os profissionais e estudantes a visualizarem uma determinada situação, que poderia ter sido vista por diferentes olhares e analisada em diferentes ângulos. Possibilitaram, assim, a colaboração e a cooperação e que todos se sentissem encorajados a partilhar suas questões e soluções de diferentes perspectivas.
A dimensão da formação do professor para utilização das mesmas ferramentas didáticas, metodológicas e recursos pedagógicos tradicionais tendem, cada vez mais, a serem superados. Avalia-se que a formação do professor para a realidade do ensino híbrido não deve, entretanto, desmerecer o diálogo permanente com várias instâncias da sociedade, entre pares e com profissionais da educação na promoção de uma nova dimensão de convívio humano e humanizador.
Ressalta-se a defesa de Nóvoa e Alvim (2021) de que a educação escolar e os professores não serão substituídos pelas tecnologias. As escolas, no entanto, devem se adaptar, expandir, modificar seus currículos e práticas pedagógicas, assim como os profissionais que nelas atuam, pois estes serão os agentes dessas transformações.
[...] novos ambientes escolares não surgirão espontaneamente. Os professores têm um papel essencial na sua criação. Graças ao seu conhecimento próprio e à sua experiência profissional, têm uma responsabilidade maior na metamorfose da escola. Para isso, devem fazer apelo às suas capacidades de colaboração e construir pontes, dentro e fora da profissão, na escola e na sociedade (Nóvoa & Alvim, 2021, p.7).
Considera-se que as pontes foram construídas. Por intermédio das Rodas de Conversas, profissionais da educação do Brasil, Portugal e Espanha participaram ativamente dos debates, pensando e construindo, juntos, possibilidades para atuar na educação em um diálogo constante entre a universidade e a educação básica.
A dimensão da internacionalização congregou diferentes profissionais da educação para o debate sobre temas específicos. De certa forma, requisitou de todos os sujeitos socioculturais o respeito e a valorização de outras culturas, o entendimento de um mundo que está fora e, o mais importante, o aprendizado para trabalhar na lógica de outra cultura. A internacionalização, por meio das Rodas de Conversas, possibilitou, ainda, o aprofundamento do conhecimento de si mesmo, da sua cultura, trazendo à luz sentimentos, valores para olhar o outro, o diferente, e pensar em possibilidades de transformação.
Nesse sentido, as Rodas de Conversas permitiram que o diálogo intercultural contribuísse para um processo de integração cultural que, além da produção do conhecimento, levasse à abertura das relações para o respeito e a igualdade de direitos entre as diferentes culturas.
RODAS: AFETAR E PROVOCAR MUDANÇAS
As provocações realizadas durante as Rodas de Conversas possibilitam tirar do lugar do conforto, tanto o sujeito que fala e como daquele que ouve, pois, ao serem questionados, um novo cenário se evidencia.
Nesse cenário, os aprendizados foram efetivados tanto no âmbito pessoal quanto do profissional. As análises das Rodas de Conversas deixaram manifestações de um sensibilizar-se e de um emocionar-se com o outro. Para a reflexão, trazemos duas circunstâncias, dentre tantas, em que os profissionais da educação de diferentes níveis foram afetados pelas dimensões de experiências compartilhadas.
Uma experiência positiva foi a de uma diretora. Ela trouxe uma dinâmica de grupo, que pode ser reverberada tanto para professores, como pais, até mesmo para os estudantes, mostrando as várias dimensões que o trabalho educacional exige. A atividade propunha a utilização do próprio corpo. Ao iniciar na posição de pé, os participantes recebiam diversos balões sobre as simultâneas tarefas relacionadas ao trabalho da gestão escolar.
As palavras escritas nos balões faziam alusão a todas as atividades: como relacionamento humano, acompanhamento pedagógico, administração de recursos financeiros, atendimentos aos estudantes, atendimentos às famílias, aos professores, aos servidores da limpeza, da merenda, das instâncias superiores, ao projeto político pedagógico, à ouvidoria, às leis, à comunidade, entre outras. Os participantes, em grupos de três, tinham como objetivo equilibrar todos esses balões, sem deixá-los cair. Uma vez que algum caísse, não se poderia pegar o balão de volta. Ele deveria permanecer no chão até o término da dinâmica.
Dessa maneira, as representações de tentativas de manter os balões no alto ficavam expressas em uma atividade corporal do constante exercício de uma flexibilidade para dar conta de tantas ações exercidas no cotidiano da escola. Essa partilha de experiências causou várias falas que parabenizaram a atividade realizada. “[…] que dinâmica interessante. Vou fazer na minha escola” (Diretora, 2021). Novas expressões foram colocadas no chat: “[…] puxa! Simples e complexa essa dinâmica (Professora, 2021). A participação de uma licencianda evidenciou: “[…] aprendi muito, obrigada” (Licencianda, 2021).
Outras expressões também comentadas durante a roda manifestaram que o relato trouxe três conotações diferentes. A primeira é a de que a atividade era simples, mas rica em possibilidades de reflexões. A segunda traz a compreensão sobre a sobrecarga de trabalho da gestão escolar. Por fim, a terceira trouxe à tona a questão do exercício de equilíbrio e de flexibilização diante das diversas demandas.
Nesse contexto de ser afetado por experiências que deram certo, sendo instigadas pelo outro lado, também se configurou em uma fala de uma realidade específica da cidade do Rio de Janeiro, em que a violência urbana se faz presente. Destarte, o relato de um professor sobre a gestão de seu trabalho salientou que ele trabalha por estar no lugar vulnerável e com risco iminente de tiros. A escola nessa situação foi pintada nas diversas partes, de acordo com perigo que cada local representava. Isso posto, a quadra, o local de trabalho dele, professor de Educação Física, estava pintada na cor vermelha, porque era considerado o lugar mais perigoso da escola.
Ao expressar a forma de trabalho, foi gradativamente mudando as faces dos participantes, que ficaram indignados com a situação. O vermelho tinha um efeito emocional grande tanto no próprio professor, como também nos estudantes jovens, que todos os dias estavam expostos ao lugar mais perigoso da escola.
Nessa conjectura, o professor, mesmo perante seus múltiplos desafios, não poderia aceitar resignadamente aquela situação, em vista de realizar o seu trabalho, às vezes pequeno, em acreditar e refletir sobre a transformação e não simplesmente de manter aquele status. O referido professor foi falando do acolhimento aos estudantes, mostrando que as pessoas por vezes têm que aceitar, mas não podem se acomodar àquela situação.
A fala contundente foi despertando a sensibilidade dos participantes. As expressões no chat tiveram dois entendimentos. Um deles de assombro sobre a situação desconcertante vivenciada por esse professor: “[…] que situação complicada”. (Professor 2022). Também na fala “[…] eu pensei que a minha escola era difícil”. (Gestora, 2002). Ou até mesmo a confirmação “[…] eu sei bem do que você está falando…” (Licencianda, 2022).
Por outro lado, as falas sobre o trabalho do professor para conduzir seus trabalhos, mesmo nas circunstâncias difíceis, foram se delineando e sendo parabenizadas pelos participantes.
Como se vê, as Rodas de Conversas contribuem para a produção de subjetividades por meio da dimensão da transversalidade. Para Guattari (2004, p.111),
[…] a transversalidade é uma dimensão que pretende superar os dois impasses, quais sejam o de uma verticalidade pura e de uma simples horizontalidade; a transversalidade tende a se realizar quando ocorre uma comunicação máxima entre os diferentes níveis e, sobretudo, nos diferentes sentidos.
É com a noção de transversalidade de Guattari e com a apropriação dessa noção nos estudos de Matias (2008) sobre a produção de subjetividades pelo currículo escolar que é possível analisar a dinâmica das Rodas de Conversas. Nas rodas, não havia uma hierarquização dos saberes. Pelo contrário, as relações eram oblíquas, não verticais, e remetem à articulação e ao trânsito entre os conhecimentos sobre a gestão, superando, assim, visões hierarquizadas e fragmentadas. Ao não impor prescrições e ao abandonar pretensões massificantes de disciplinarização e de controle, as rodas são pautadas por múltiplos referenciais, operando, também, como produtoras de subjetividades singulares e autônomas.
CONCLUSÃO
Após análise, é possível notar que as Rodas de Conversas podem contribuir para esse movimento de mudanças estruturais e estruturantes dos espaços escolares, ao referir-se ao ensino superior, aos cursos de formação de professores, em especial aos cursos de Pedagogia, responsáveis pela formação de professores gestores da educação, em todos os seus níveis de ensino.
Ao proporcionar o diálogo, as Rodas de Conversas desestabilizaram o conhecido, os valores pessoais e as verdades parciais, abrindo espaço para novas interrogações e novos aprendizados. O diálogo impulsiona um processo de reflexão que ultrapassa o espaço temporal, síncrono, das Rodas de Conversas. Esse processo reflexivo, instaurado, quando determinado participante é questionado ou expõe alguma problemática, não se encerrava com a finalização da Roda de Conversas, mas estende-se para além desse espaço e constitui um dispositivo que continuamente poderá ser acionado pela mente dos participantes.
Os temas variados se entrelaçam nas falas das Rodas de Conversas e deixaram transparecer os sentimentos e emoções que constituem os cotidianos das escolas. Diversas aprendizagens são colocadas em foco pelas análises das inter-relações que perpassam no campo das escolas, as diferentes atuações da gestão escolar e, sobretudo, as relações humanas instauradas, que deixam evidentes os desafios a serem enfrentados.
As Rodas de Conversas ultrapassaram, também, fronteiras. A dimensão da internacionalização, possibilitada pelos encontros virtuais, síncronos, aproximou diferenças, desconstruiu verdades e mostrou possibilidades de transformação em uma gama de complexidade, na qual transcorre do trabalho do professor e, de forma específica, daquele que ocupa a função diretiva das escolas.
As trocas de experiências sobre problemas e soluções, frente ao desafio de manter a educação escolar em funcionamento, demonstraram que a metodologia, para além de se constituir instrumento de aproximação dialógica, revelam sua eficácia na coleta de dados empíricos, nas trocas interpessoais de capacitação funcional, com ideias e sentimentos, dúvidas e soluções compartilhadas, que auxiliaram no fortalecimento psicossocial e profissional dos interlocutores dirigentes, mas principalmente permitiu aprendizagens enriquecedoras para a formação do professor gestor, aos estudantes de licenciaturas.
REFERÊNCIAS
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Notas de autor
jussarapaschoalino@yahoo.com.br
Información adicional
Como citar: Paschoalino, J. B. Q., Croce, M. L., & Queiroz, V. C. B. (2023). Diálogos, partilhas e aprendizagens: A formação do professor gestor nas rodas de conversas. Revista Tempos e Espaços em Educação, 16(35), e18814. http://dx.doi.org/10.20952/revtee.v16i35.18814
Contribuições dos Autores: Paschoalino, J. B. Q.: concepção e desenho, aquisição de dados, análise e interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual; Croce, M. L.: concepção e desenho, aquisição de dados, análise e interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual; Queiroz, V. C. B.: concepção e desenho, aquisição de dados, análise e interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual. Todos os autores leram e aprovaram a versão final do manuscrito.