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Aspectos psicossociais do trabalho e sofrimento psíquico na estratégia de saúde da família
Izadora Joseane Borrajo Moreira; Jorge André Horta; Luciano Nunes Duro;
Izadora Joseane Borrajo Moreira; Jorge André Horta; Luciano Nunes Duro; Jéssica Chaves; Camila Signor Jacques; Kelly Martinazzo; Roberta Barela Pimentel; Viviane Baumhardt; Daniela Teixeira Borges
Aspectos psicossociais do trabalho e sofrimento psíquico na estratégia de saúde da família
Psychosocial aspects of work and psychological suffering among family health strategy workers
Aspectos psicosociales del trabajo y la angustia psicológica en la estrategia salud de la familia
Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 7, núm. 1, pp. 1-7, 2017
Universidade de Santa Cruz do Sul
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Resumo: Justificativa e objetivos: O estresse ocupacional pode estar relacionado ao surgimento de doenças físicas e psíquicas. Objetiva-se avaliar a associação dos aspectos psicossociais do trabalho, de acordo com o Modelo Demanda-Controle, com a ocorrência de transtornos mentais entre os trabalhadores das Estratégias de Saúde da Família em Santa Cruz do Sul, RS. Métodos: estudo de corte transversal e quantitativo. A população alvo do estudo foi constituída por 89 profissionais, entre médicos, enfermeiros, técnicos/auxiliares de enfermagem (TE) e agentes comunitários de saúde, pertencentes às equipes das 11 Estratégias de Saúde da Família do município de Santa Cruz do Sul. Utilizou-se um questionário contendo questões sociodemográficas, ocupacionais e outras pertencentes à Job Stress Scale e ao Self Reporting Questionnaire. Resultados: Constatou-se que 30,1% dos profissionais apresentavam alta demanda e baixo controle sobre o trabalho, resultando em alta exposição ao desenvolvimento de estresse ocupacional. A prevalência de transtorno mental comum nos profissionais submetidos ao trabalho de alta exigência foi de 38%. Conclusões: Frente a esses resultados preocupantes faz-se necessário que se tomem atitudes visando a prevenção ou redução do estresse laboral e do adoecimento no trabalho.

Palavras-chave: Estresse Psicológico, Saúde do Trabalhador, Saúde Mental, Atenção Primária à Saúde.

Abstract: Background and objectives: The occupational stress may be related to the emergence of physical and mental illnesses. Objective is to evaluate the association between psychosocial aspects of work, according to the Demand-Control Model, with the occurrence of mental disorders among workers of the Family Health Strategies in Santa Cruz do Sul, RS. Methods: study with epidemiological approach, cross and quantitative court. The study target population consisted of 89 professionals, including doctors, nurses, technicians / nurses (TE) and community health workers, belonging to teams of 11 Health Strategies of the city of Santa Cruz do Sul family. Used A questionnaire containing demographic questions, occupational and other belonging to the Job Stress Scale and the Self Reporting Questionnaire. Results: It was found that 30.1% of professionals had high demand and low job control, resulting in high exposure to the development of occupational stress. The prevalence of common mental disorders in professional subject to high strain jobs was 38%. Conclusions: In view of these worrying results it is necessary to be taken attitudes aimed at preventing or reducing work stress and illness at work.

Keywords: Psychological stress, Occupational Health, Mental Health, Primary Health Care.

Resumen: Antecedentes y Objetivos: El estrés laboral puede relacionarse con la aparición de enfermedades físicas y mentales. Se objetiva evaluar la asociación entre los aspectos psicosociales del trabajo, según el Modelo Demanda-Control, con la aparición de trastornos mentales entre trabajadores de Estrategias Salud de la Familia en Santa Cruz do Sul, RS. Métodos: Estudio de corte transversal y cuantitativo. La población objetivo estuvo constituida por 89 profesionales, entre médicos, enfermeros, técnicos/auxiliares de enfermería (TE) y agentes comunitarios de salud, pertenecientes a los equipos de las 11 Estrategias Salud de la Familia del municipio de Santa Cruz do Sul. Se utilizó un cuestionario incluyendo cuestiones sociodemográficas, ocupacionales y otras pertenecientes a la Job Stress Scale y al Self Reporting Questionnaire. Resultados: Se constató que el 30,1% de los profesionales sufrían alta demanda y bajo control del trabajo, resultando en alta exposición al desarrollo de estrés laboral. La prevalencia de trastorno mental común en profesionales sometidos a trabajo de alta exigencia fue del 38%. Conclusiones: Ante estos preocupantes resultados resulta necesario tomar actitudes apuntando a prevenir o reducir el estrés laboral y el padecimiento del trabajo.

Palabras clave: El estrés psicológico, Salud Ocupacional, Salud mental, Precaución Atención primaria de salud.

Carátula del artículo

Aspectos psicossociais do trabalho e sofrimento psíquico na estratégia de saúde da família

Psychosocial aspects of work and psychological suffering among family health strategy workers

Aspectos psicosociales del trabajo y la angustia psicológica en la estrategia salud de la familia

Izadora Joseane Borrajo Moreira
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Jorge André Horta
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Luciano Nunes Duro
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Jéssica Chaves
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Camila Signor Jacques
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Kelly Martinazzo
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Roberta Barela Pimentel
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Viviane Baumhardt
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Daniela Teixeira Borges
Universidade de Santa Cruz do Sul, Brasil
Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 7, núm. 1, pp. 1-7, 2017
Universidade de Santa Cruz do Sul

Recepción: 07 Enero 2016

Aprobación: 06 Septiembre 2016

INTRODUÇÃO

O trabalho pode ser considerado um dos pilares mais importantes e significativos na vida de um indivíduo, sendo indissociável de sua própria existência.1-3Nessa perspectiva, nota-se que a atividade laboral pode ser considerada um meio de inserção do indivíduo na sociedade e, por sua vez, engloba uma gama de aspectos físicos e psíquicos inter-relacionados.4,5 O trabalho, além de garantir a subsistência do trabalhador e sua família, constitui-se em um espaço de construção de identidade, podendo adquirir um caráter nocivo e patogênico ou ser uma fonte produtora de saúde mental e física.4

A relação entre trabalho-saúde ou doença é bastante complexa e dependente do ambiente psicossocial do trabalho.6Assim, a maneira como essas relações são desenvolvidas podem influenciar na saúde, na qualidade de vida e no desempenho dos trabalhadores, bem como na satisfação pessoal e profissional.

Ao longo dos anos as transformações ocorridas pelos processos industriais, de ordem política, cultural, econômica e social, acarretaram significativas mudanças nos fatores psicossociais relacionados ao trabalho e favoreceram o surgimento de eventos estressores organizacionais, tais como: sobrecarga laboral (excesso de demandas físicas e psíquicas, pressão de tempo), subcarga (monotonia, baixa demanda), falta de controle e autonomia no trabalho executado e baixo apoio social, além dos fatores de natureza física (iluminação, ventilação, ruídos e outros).1,7,8

Quando os eventos estressores ocupacionais promovem um desequilíbrio entre as demandas do trabalho e os recursos disponíveis para o enfrentamento e execução das mesmas, o estresse ocupacional pode surgir como um recurso adaptativo frente às novas imposições.9,10

Dentre as alterações que podem ocorrer em função do estresse prolongado destacam-se os transtornos mentais comuns, responsáveis por quadros de sofrimento psíquico com alterações fisiológicas e psicológicas significativas que comprometem a qualidade de vida e podem gerar incapacidades funcionais graves.11-13

Visando compreender a produção de estresse relacionada especificamente ao ambiente e processo de trabalho, Karasek propôs o chamado Modelo Demanda-Controle (DC).14 Trata-se de um modelo bidimensional com foco na organização psicossocial do trabalho e que sistematiza a influência das demandas do ambiente externo e do nível de controle que o trabalhador tem sobre seu trabalho com o risco de adoecimento.10,14-16

O trabalho desenvolvido pelas equipes das Estratégias de Saúde da Família requer uma complexa organização laboral, exigindo profissionais capacitados e qualificados, aos quais são atribuídas múltiplas atribuições com alto grau de responsabilidade, de modo que possam prestar um atendimento resolutivo e satisfatório à população pela qual são responsáveis.7,17-21 Com isso, percebe-se que esses trabalhadores também está suscetível ao desenvolvimento de estresse o que, por sua vez, pode estar implicado no desenvolvimento de sofrimento psíquico.

Ao se considerar esses aspectos, o presente estudo tem por objetivo avaliar a exposição desses trabalhadores às demandas psicológicas, ao grau de controle no trabalho e à presença de suporte social, segundo o modelo proposto por Karasek relacionando-o à prevalência de transtornos mentais entre os trabalhadores das Estratégias de Saúde da Família em Santa Cruz do Sul, RS.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo com abordagem epidemiológica, de corte transversal e quantitativo. A população alvo do estudo foi constituída por 89 profissionais, entre médicos, enfermeiros, técnicos/auxiliares de enfermagem (TE) e agentes comunitários de saúde (ACS), pertencentes às equipes das 11 Estratégias de Saúde da Família do município de Santa Cruz do Sul (SCS), sem necessidade de cálculo de tamanho amostral (inclusão de todos os profissionais). Atualmente o município de SCS conta com 11 equipes, tendo uma cobertura de 9.173 famílias e 31.294 pessoas.

A coleta de dados ocorreu no período de junho a agosto de 2013. Os trabalhadores elegíveis para o estudo receberam explicações referentes à pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e responderam um questionário identificado apenas pela unidade de saúde, autoaplicável e anônimo. Todos os entrevistados referiram contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), sem ingresso por concurso público.

O instrumento de pesquisa constituiu-se em um questionário autoaplicável composto por quatro blocos que avaliaram: aspectos sociodemográficos (sexo, idade, escolaridade, situação conjugal, renda per capita, presença de filhos), aspectos ocupacionais (categoria profissional, regime de trabalho semanal, tempo de trabalho na instituição, tipo de vínculo), 20 questões pertencentes ao Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20), para avaliar a presença de transtornos mentais comuns, e 17 questões pertencentes à Job Stress Scale (JSS), para avaliar os aspectos psicossociais do ambiente de trabalho de acordo com o modelo demanda/controle/suporte social.

O SRQ-20 foi utilizado para o rastreamento de transtornos mentais comuns. Trata-se de um instrumento desenvolvido por Harding e colaboradores sendo traduzido e validado para uso no Brasil por Mari e Williams.22,23 A partir das respostas obtêm-se um escore, acima do qual é provável que o indivíduo desencadeie um processo de sofrimento mental. No presente estudo, utilizaremos o ponto de corte de seis ou mais respostas positivas para homens, e oito ou mais respostas positivas para mulheres para detecção de casos suspeitos de TMC. Nessa condição, o teste apresenta sensibilidade de 83%, especificidade de 80%, com uma taxa de classificação equivocada de 19% para detecção de transtornos psiquiátricos não psicóticos.

A JSS foi utilizada para avaliação dos aspectos demanda/controle/suporte social e constitui-se em uma versão reduzida e modificada da Job Content Questionnaire (JCQ) desenvolvida por Karasek visando avaliar as dimensões do modelo Demanda-Controle. No Brasil, a Job Stress Scale (JSS) foi validada e adaptada para o português por Alves et al., sendo composta por 17 questões: cinco delas avaliam a dimensão demanda psicológica, seis avaliam a dimensão controle e as outras seis, o suporte social.15

Trata-se de uma escala Likert, de forma que a dimensão demanda psicológica assume valores de 5 a 20 pontos como mínimo e máximo possível e o controle e o suporte social de 6 a 24 pontos, como mínima e máxima pontuação, respectivamente. Dessa forma, utilizando-se como ponte de corte a média da soma dos pontos atribuídos a cada resposta, criam-se duas categorias para cada dimensão avaliada: “baixa ou alta demanda”, “baixo ou alto controle” e “baixo ou alto suporte”. O suporte social, por ter sido incorporado ao modelo posteriormente, será analisado como outra variável de desfecho.

Após, os níveis de demanda e controle serão dicotomizados e combinados, de modo que possam construir os quadrantes do Modelo Demanda-Controle de Karasek: trabalho de alta exigência (alta demanda e baixo controle); trabalho ativo (alta demanda e alto controle); trabalho passivo (baixa demanda e baixo controle); trabalho de baixa exigência (baixa demanda e alto controle).

Os dados coletados foram inseridos numa base de dados, utilizando-se, para isso, o programa estatístico Statistic Package for Social Sciences (SPSS) versão 20.0. Realizou-se dupla digitação de dados para diminuição de erros de consistência.

A análise dos dados foi feita a partir da estatística descritiva. Para detectar a existência de associações entre as variáveis estudadas, utilizou-se o Teste Qui-quadrado ou o Teste de Fisher, estabelecendo-se um nível de significância de 5%.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade de Santa Cruz do Sul, sob CAAE número 06706912.3.0000.5343 e pela coordenação da Secretaria de Saúde do município.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 83 trabalhadores, correspondentes a 93,2% da população alvo. Foram avaliados 48 ACS (57,8%), vinte TE (24,1%), oito enfermeiros (9,6%) e sete médicos (8,4%). Caracteriza-se por ser predominantemente do sexo feminino (95,1%), com idade média de 37,1±8,9 anos, casados ou com companheiro (a) (80,2%), com até dois filhos (68,7%) e renda familiar per capita de até dois salários mínimos da época (75%). Em relação à escolaridade, 43,9% possuíam ensino médio completo e dos que possuíam nível superior 68,7% referiram curso de pós-graduação completo. Em relação aos aspectos ocupacionais, 80,7% referiu carga horária semanal de 40 horas com dedicação exclusiva e tempo de trabalho na instituição entre 6 meses e 5 anos (61,4%). Todos os entrevistados referiram contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), sem ingresso por concurso público.

Dos 83 indivíduos que compuseram a amostra, sete (8,4%) participantes não preencheram todos os itens do questionário SRQ-20 e foram excluídos da análise quanto à ocorrência de transtornos mentais comuns. A prevalência geral de transtorno mental comum, de acordo com o ponto de corte adotado, foi de 19,7%, observando-se uma variação de 14,3% a 25% entre as categorias profissionais. Não se encontrou diferença estatística significativa de TMC entre as categorias avaliadas (p=0,91).

Em relação à situação de trabalho, de acordo com modelo D-C, a figura 1 mostra que 30,1% dos trabalhadores encontram-se no quadrante referente ao trabalho com alta exigência. Nesse grupo (25/83 ou 30,1%) observou-se predomínio de ACS (16/25 ou 64%), seguido pelos TE (6/25 ou 24%), enfermeiros (2/25 ou 8%) e médicos (1/25 ou 4%), sem diferenças estatísticas entre as categorias profissionais nessa situação de trabalho (p=0,76); (FIGURA 1)


Figura 1
Distribuição dos trabalhadores das Estratégias Saúde da Família segundo o Modelo D-C (Demanda-Controle). Santa Cruz do Sul, 2013.

Na situação de trabalho de baixa exigência (26/83 ou 31,3%) constatou-se maior proporção de ACS (12/26 ou 46,1%), seguido pelos TE (8/26 ou 30,8%), enfermeiros (2/26 ou 7,7%) e médicos (4/26 ou 15,3%), sem diferenças estatísticas nessa situação de trabalho (p=0,27);

Dos profissionais alocados no quadrante referente ao trabalho passivo (23/83 ou 27,7%), a maior proporção corresponde aos ACS (18/23 ou 78,2%), seguido pelos TE (4/23 ou 17,4%) e enfermeiros (1/23 ou 4,3%). Nenhum médico encontrava-se nessa situação de trabalho; não foram observadas diferenças entre as categorias profissionais (p=0,09).

Em relação ao trabalho ativo (9/83 ou 10,8%), a maior proporção de trabalhadores correspondeu aos enfermeiros (3/9 ou 33,3%), sendo significativa a diferença entre as categorias profissionais (p=0,01).

A análise dos fatores psicossociais do trabalho evidenciou que 39,5 % dos trabalhadores estavam submetidos a altas demandas psicológicas, 55,2% possuíam baixo controle do trabalho e 58% referiram baixo apoio social no âmbito laboral.

A associação individual de cada componente do Modelo D-C (demanda/controle/suporte) com a ocorrência de TMC mostrou diferença significativa apenas para alta demanda psicológica (p=0,02). Para a dimensão controle sobre o trabalho e suporte social, a maior prevalência de TMC ocorreu entre profissionais com baixo controle e baixo suporte, embora as diferenças não tenham sido significativas (p=0,39 e p=0,38, respectivamente), dados representados na tabela 1.

A prevalência de TMC variou segundo os quadrantes do Modelo D-C sendo 38% (8/21).

Tabela 1
Prevalência de transtorno mental comum entre trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo as dimensões da Job Stress Scale (ISS). Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

Na situação de alta exigência, 22,2 % (2/9) no trabalho ativo, 12% (3/25) no quadrante de baixa exigência e 9,5% (2/21) no trabalho passivo. Não houve diferenças estatísticas significativas entre os grupos referidos (p=0,07) (Tabela 2).

Tabela 2
Prevalência de transtorno mental comum entre trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo quadrantes do Modelo D-C (Demanda-Controle). Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

A avaliação da dimensão apoio social no trabalho revelou um percentual de 50% (ou 6/12) de TMC entre os profissionais com baixo apoio social e que desempenham trabalho de alta exigência. Entretanto, sem diferenças significativas (p=0,06). Já os trabalhadores com alto apoio social, alocados no mesmo quadrante, apresentaram um percentual menor (2/9 ou 22,2 %) de TMC (p=0,71) (Tabela 3).

Tabela 3
Distribuição dos trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo Modelo D-C, existência de suporte social no trabalho e presença de transtornos mentais comuns. Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

A prevalência de TMC segundo a categoria profissional e o Modelo D-C, demonstrada na tabela 4, evidenciou que, entre os ACS a taxa de TMC foi maior naqueles alocados no quadrante de alta exigência (6/12 ou 50%) e na situação de trabalho ativo (2/1 ou 50%), sendo essa diferença estatisticamente significativa (p=0,01). Para as demais classes profissionais não foram encontradas associações significativas entre o tipo de trabalho desenvolvido e a presença de sofrimento psíquico.

Tabela 4
Distribuição dos trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo categoria profissional, Modelo D-C (Demanda-Controle) e presença de transtornos mentais comuns. Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

DISCUSSÃO

O Modelo D-C de Karasek pressupõe que o trabalho desempenhado em condições de baixo controle e alta demanda (alta exigência) é considerado prejudicial à saúde dos profissionais.20No presente estudo, observou-se que 30,1% dos trabalhadores avaliados encontravam-se alocados nesse quadrante e, portanto, considerados altamente expostos ao estresse ocupacional e com maior risco de adoecimento.

Essa hipótese foi confirmada quando notamos que, entre os trabalhadores com alta exigência, as taxas de TMC foram maiores em relação as observadas nas outras situações laborais. Embora não se tenha encontrado diferenças significativas entre os tipos de trabalho definidos pelos quadrantes do Modelo D-C, as frequências de TMC são preocupantes e reforçam os efeitos negativos das altas demandas à saúde, corroborando o encontrado em outros estudos com trabalhadores da saúde.10,24

Além disso, 38,5% dos profissionais avaliados foram considerados em posição intermediária ao estresse ocupacional, percentual considerado relevante, visto que esses profissionais poderão a qualquer momento, dependendo da interação estabelecida entre demanda e controle, tornarem-se grupo de alta exposição. Inclusive, os profissionais alocados no quadrante referente ao trabalho ativo apresentaram a segunda maior prevalência de TMC, já indicando algum grau de sofrimento psíquico apesar do alto controle sobre o trabalho, o que também foi verificado em outras pesquisas.10,21,23

Percebe-se com esses achados que o grau de demanda psicológica parece desempenhar um papel mais significativo do que o controle no desenvolvimento de sofrimento psíquico. Entretanto, o baixo controle sobre o trabalho parece interferir de forma negativa na qualidade de vida dos profissionais.24O presente estudo mostrou associação positiva (e significativa) entre altas demandas e ocorrência de TMC, estando de acordo com o resultado de outros estudos desenvolvidos entre profissionais de saúde.22,24

Em relação à ocorrência de TMC, identificou-se, embora sem diferenças estatísticas, diferentes graus sofrimento mental entre as categorias profissionais avaliadas. Esse fato pode estar relacionado à exposição desses profissionais a altas demandas psicológicas no trabalho.

No presente estudo, a maioria dos enfermeiros encontra-se alocada no quadrante referente ao trabalho ativo. A atividade laboral desempenhada por esses profissionais no âmbito das ESF engloba, além dos cuidados de enfermagem, funções de gerenciamento das unidades de saúde24que por sua vez, podem ser responsáveis por uma sobrecarga laboral. Assim, o alto controle pode indicar uma tentativa compensatória de efeitos negativos provenientes das altas demandas, reduzindo o risco de adoecimento.

Em relação à presença de suporte social no trabalho observou-se que trabalhadores expostos a situação de alta exigência, porém com alto apoio social, apresentaram menores taxas de TMC quando comparados com os trabalhadores expostos à mesma situação laboral, porém com baixo suporte social. As diferenças, apesar de não significativas, são importantes e talvez novos estudos com amostras maiores possam mostrar a influência do suporte social na ocorrência de TMC.

O apoio social pode capacitar e fornecer subsídios aos indivíduos, fazendo com que os mesmos tenham plena capacidade de lidar com eventos e condições estressoras. Desse modo, podem agir como protetores contra os TMC.23

Assim, ambientes de trabalho com presença de apoio social alto e satisfatório podem agir de modo a minimizar ou proteger os trabalhadores dos efeitos negativos oriundos da exposição a diferentes níveis de estresse; também acredita-se que, mesmo na ausência de estresse, as relações promotoras de apoio podem provocar sentimentos de bem-estar e satisfação nos indivíduos.17,20,23

Algumas limitações podem ser identificadas no presente estudo. A amostra, embora tenha incluído o total dos trabalhadores do município estudado, é relativamente pequena, predominantemente feminina e composta por profissionais cujos processos de trabalho são bastante heterogêneos, alterando, dessa forma, a percepção a respeito dos aspectos psicossociais do trabalho e de sofrimento psíquico. Com isso, a generalização dos resultados é limitada.

Outro fato a ser considerado diz respeito ao delineamento transversal empregado, de forma que causalidade reversa não pode ser descartada, levando-se em conta que a exposição e o desfecho são avaliados simultaneamente. O uso de questionários autoaplicáveis também representa limitações, já que eles podem ser influenciados por fatores como viés de memória e de suspeição diagnóstica, além de eventuais falhas em seu preenchimento, ocasionando perdas.

O SRQ-20 não permite o estabelecimento de diagnósticos, visto que se trata de um instrumento de rastreamento; os estudos que o utilizam adotam diferentes pontos de corte para suspeição diagnóstica o que, por vezes, prejudica a comparação de resultados entre eles.

Em relação ao uso do Modelo D-C, embora tenha sido estimulado e disseminado em diversos estudos que avaliam trabalhadores (inclusive os da saúde), leva em consideração a interação simultânea de demanda e controle sobre o trabalho e seu impacto na produção de estresse. Por outro lado, não discrimina os eventos estressores específicos do ambiente laboral dentro de cada categoria que, por sua vez, poderiam ser alterados ou minimizados com o propósito de reduzir o estresse ocupacional.24Além disso, o próprio modelo de análise não considera questões subjetivas importantes que interferem nos dados encontrados e extrapolam o quantitativo.

Esse estudo demonstrou que uma parcela importante dos profissionais que atuam nas ESF de Santa Cruz do Sul está submetida à situação de trabalho considerada de alta exigência e, consequentemente, expostos a estresse ocupacional e com risco de adoecimento físico ou psíquico. Além disso, identificou-se que o sofrimento psíquico está presente em todas as categorias profissionais, embora em graus variados, podendo estar relacionado com aspectos laborais.

Esses achados são preocupantes e indicam que medidas de prevenção e proteção de agravos à saúde do trabalhador devem ser instituídas. Sugere-se a criação de espaços para debates que possibilitem a detecção e a solução de problemas no ambiente de trabalho, levando-se em consideração a participação dos trabalhadores. O apoio social por parte dos gestores e entre os colaboradores deve ser reforçado.

Os resultados apresentados servem como subsídio para que novas pesquisas sejam conduzidas de modo a caracterizar mais precisamente os aspectos psicossociais do trabalho nos serviços de saúde, visando, com isso, a redução do estresse ocupacional e o melhor entendimento a respeito do adoecimento psíquico no ambiente de trabalho.

Material suplementario
REFERÊNCIAS
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Notas

Figura 1
Distribuição dos trabalhadores das Estratégias Saúde da Família segundo o Modelo D-C (Demanda-Controle). Santa Cruz do Sul, 2013.
Tabela 1
Prevalência de transtorno mental comum entre trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo as dimensões da Job Stress Scale (ISS). Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

Tabela 2
Prevalência de transtorno mental comum entre trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo quadrantes do Modelo D-C (Demanda-Controle). Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

Tabela 3
Distribuição dos trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo Modelo D-C, existência de suporte social no trabalho e presença de transtornos mentais comuns. Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

Tabela 4
Distribuição dos trabalhadores das Estratégias Saúde da Família, segundo categoria profissional, Modelo D-C (Demanda-Controle) e presença de transtornos mentais comuns. Santa Cruz do Sul, 2013 (N=76)**

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