Desafio da higienização das mãos para a implementação dos bundles de cateter venoso central
Hand hygienization challenge for the implementation of the central venous cateter bundles
Desafío de lahigienización de las manos para laimplementación de losbundles de cateter venoso central
Desafio da higienização das mãos para a implementação dos bundles de cateter venoso central
Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 8, núm. 3, pp. 216-223, 2018
Universidade de Santa Cruz do Sul

Recepção: 01 Novembro 2017
Aprovação: 09 Março 2018
Resumo: Justificativa e objetivo: Na prevenção de eventos adversos associados às infecções da corrente sanguínea, a higienização das mãos (HM) é uma das medidas prioritárias nas ações destinadas à segurança do paciente. Objetivou-se verificar o desafio da HM para a implementação dos bundles de cateter venoso central. Métodos: Estudo transversal quantitativo exploratório-descritivo, realizado na unidade de terapia intensiva de um hospital filantrópico do interior de Minas Gerais. Fez-se observação direta da equipe multiprofissional por meio de um instrumento de coleta de dados que continha variáveis como a HM na administração de medicamentos, na troca de curativos e na inserção do cateter. Utilizaram-se testes qui quadrado de Pearson quando o valor esperado foi > 5 e o teste exato de Fisher para o valor esperado <5.O nível de significância foi de 5%.Resultados: os técnicos de enfermagem tiveram maior número de oportunidades de HM na chegada do leito do paciente mas a maioria não a fazia (p<0,05). 75,0% dos fisioterapeutas não faziam a HM quando na chegada no leito do paciente (p<0,05). 35,29 % dos enfermeiros realizaram a HM após troca de curativo do acesso central. Verificou-se que nem todos os médicos aderiam à HM antes (75,61%) e após (73,17%) a inserção do cateter. Conclusão: Os resultados indicaram que, mesmo com a presença de bundle as medidas de controle de HM não eram efetivas para a manutenção e inserção do cateter. Sugerem-se uma educação contínua e efetiva a fim de gerar um impacto positivo na redução das taxas das infecções da corrente sanguínea.
Palavras-chave: Controle de infecções, Cateterismo Venoso Central, Protocolos, Educação continuada.
Abstract: Background and objectives: In the prevention of adverse events associated with bloodstream infections, the hand Hygiene (HM) is one of the priority measures in actions aimed at patient safety. The objective was to verify the challenge for the implementation of bundles for the prevention of blood infection associated with the central venous catheter. Methods: Exploratory-descriptive quantitative cross-sectional study, performed at the intensive care unit of a philanthropic hospital in the interior of Minas Gerais. A multiprofessional team was directly observed by means of a data collection instrument that contained variables such as HM in medication administration, exchange of dressings and insertion of the catheter. Pearson's chi-square test was used when the expected value was> 5 and Fisher's exact test for the expected value <5.The level of significance was 5%. Results: nursing technicians had a greater number of HM opportunities on arrival of the patient's bed but most did not (p <0.05). 75.0% of physiotherapists did not do HM when they arrived at the patient's bed (p <0.05). 35.29% of the nurses performed the MH after the dressing change of the central access. It was found that not all physicians adhered to HM before (75.61%) and after (73.17%) the insertion of the catheter. Conclusion: The results indicated that even with the presence of bundle the control measures of HM were not effective for the maintenance and insertion of the catheter. Continuous and effective education is suggested to have a positive impact on reducing the rates of bloodstream infections.
Keywords: Infection Control, Catheterization, Central Venous, Protocols, Education, Continuing.
Resumen: Justificación y objetivo: En la prevención de eventos adversos asociados a las infecciones del flujo sanguíneo, la higienización de las manos (HM) es una de las medidas prioritarias en las acciones destinadas a la seguridad del paciente. Se objetivó verificar el desafío de HM para la implementación de los lotes de catéter venoso central. Métodos: Estudio transversal cuantitativo exploratorio-descriptivo, realizado en la unidad de terapia intensiva de un hospital filantrópico del interior de Minas Gerais. Se hizo observación directa del equipo multiprofesional por medio de un instrumento de recolección de datos que contenía variables como la HM en la administración de medicamentos, en el intercambio de curativos y en la inserción del catéter. Se utilizaron pruebas qui cuadradas de Pearson cuando el valor esperado fue> 5 y la prueba exacta de Fisher para el valor esperado <5.El nivel de significancia fue del 5% .Resultados: los técnicos de enfermería tuvieron mayor número de oportunidades de HM a la llegada del lecho del paciente pero la mayoría no la hacía (p <0,05). El 75,0% de los fisioterapeutas no hacían la HM cuando a la llegada al lecho del paciente (p <0,05). El 35,29% de los enfermeros realizaron la HM tras el intercambio de curativo del acceso central. Se verificó que no todos los médicos se adhirieron a la HM antes (75,61%) y después (73,17%) la inserción del catéter. Conclusión: Los resultados indicaron que, aun con la presencia de lote las medidas de control de HM no eran efectivas para el mantenimiento e inserción del catéter. Se sugiere una educación continua y efectiva para generar un impacto positivo en la reducción de las tasas de las infecciones del flujo sanguíneo.
Palabras clave: Control de Infecciones, Cateterismo Venoso Central, Protocolos, Educación Continua.
INTRODUÇÃO
A infecção da corrente sanguínea associada às falhas no momento da inserção e manutenção do cateter venoso central (CVC) são as mais frequentes causas das infecções associadas aos estabelecimentos de saúde em Unidades de Terapia Intensiva (UTI)1. Nos Estados Unidos 10% das admissões nas UTIs são de pacientes com sepse severa associada ao CVC.1,2Na Suécia ocorrem 80.000 casos anualmente de infecções da corrente sanguínea associada ao uso de cateter venoso central3.
Entre os 39 hospitais participantes do National Health Care Safety Network (NHSN), a taxa de 40% de infecção de corrente sanguínea relacionada ao CVC variou de 1,3 a 1,5/1.000 cateteres-dia3. A infecção da corrente sanguínea associada ao uso do CVC é considerada quando o paciente faz uso deste dispositivo num período superior a 48 horas e que não está relacionada à infecção a outro sítio de inserção.4-9
Estudos internacionais têm mostrado que, a adoção dos bundles, conjunto de medidas baseadas em evidências científicas, aliadas a treinamento e vigilância da equipe responsável pela inserção e manutenção do CVC é uma importante estratégia para a redução de infecções da corrente sanguínea associada ao CVC.1,4-6,10-12 Tais medidas são descritas pelo Center for Disease Control and Prevention (CDC) e têm sido incluídas na prática clínica, por meio de revisão de práticas de inserção e manipulação do CVC, refletindo em melhor qualidade da assistência e na redução da morbidade e da mortalidade decorrentes dessa infecção9.
Para evitar as complicações decorrentes da inserção e manutenção de cateter vascular, estudos e guidlines direcionam para programas regulares de educação que visam reduzir as taxas de infecção na unidade de terapia intensiva. 13-18 Para definir essas estratégias estudos observacionais tem mostrado efetivo para definição de programas educacionais direcionados para cada perfil de profissionais e de instituição a fim de implantar diretrizes e protocolos adequados à realidade específica de cada instituição. 1,3-6,10,15,16 No Brasil, em 2017, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) publicou protocolos de inserção e manutenção do CVC, a fim de reduzir as taxas de infecções da corrente sanguínea7. A vigilância epidemiológica publicou recentemente a confirmação de exames laboratoriais de 341 hospitais brasileiros com uma taxa de infecção da corrente sanguínea associada ao CVC que variava de 4,62 a 15,18 por 1000 cateteres dias8. Ainda é uma lacuna no conhecimento, entretanto, taxas epidemiologicamente preconizadas para cada cateter/dia, sendo um desafio mundial como se verifica em diretrizes e em publicações oficiais.7,9,13
Pacientes internados em UTI que possuem CVC são propensos a adquirirem a infecção da corrente sanguínea devido a frequentes manipulações de conectores para administração de medicamentos, troca e manipulação de curativos.13-15
A adequada higienização de mãos (HM) antes e após a inserção ou manipulação do CVC, uso de clorexidina alcoólica para antissepsia e barreira máxima estéril de proteção durante a inserção, seleção da veia subclávia, descontaminação dos conectores, uso de sistema fechado de infusão e revisão diária da necessidade de manutenção do cateter são as medidas preventivas de impacto contra a infecção na corrente sanguínea.4-6
Para a efetividade dessas estratégias a criação dos bundles, foi comprovada eficaz desde que seja feito de forma coletiva pela instituição, com avaliação contínua de desempenho quanto à adoção de medidas de prevenção de infecções da corrente sanguínea associada ao CVC. 5,6,10
Na prevenção de eventos adversos associados às infecções da corrente sanguínea, a HM é uma das medidas prioritárias nos programas e ações de saúde destinada à segurança do paciente, bem como a adesão dos profissionais e os recursos institucionais, tidos como fundamentais para propiciar assistência segura e de qualidade2. A HM é reconhecida, tanto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) quanto pelo CDC, como um indicador de qualidade para a segurança dos pacientes, sendo considerada a ação mais importante para reduzir a transmissão cruzada de microrganismos.2,9
Existem diferentes fatores que contribuem para a não realização da HM tais como: falta de conhecimento sobre a importância de prevenção de infecções, falta de entendimento da técnica apropriada, ocorrência de dermatite de contato e pela própria organização hospitalar.3,4,19 Além disso a não adesão da HM esta geralmente associada à sobrecarga de trabalho, dificuldade de acesso aos pontos utilizados para a HM convencionais, e, finalmente, a ausência de um compromisso institucional para a melhoria global do HM.3-6
Apesar de várias evidências provenientes de organizações nacionais e globais de saúde, de que a HM reduz custos, aumento da mortalidade e da permanência na internação, a adesão á HM esta aquém do desejado nas unidades de terapia intensiva.8,10,11 Várias medidas foram propostas, em outros estudos para melhorar a adesão à HM mas ainda é falha a efetividade desta prática.8,10,11,17,18 Medidas de observação direta da equipe multiprofissional podem ser efetivas para identificar fatores dificultadores e facilitadores para HM como medida da efetividade do bundle do CVC. O conhecimento de tais fatores contribuem para a implementação de intervenções específicas para a prevenção de infecções da corrente sanguínea associada ao CVC. Diante do exposto, objetivou-se verificar o desafio da HM das mãos para a implementação dos bundles de cateter venoso central.
MÉTODOS
Tratou-se de um estudo quantitativo do tipo transversal, de caráter exploratório e descritivo realizado na UTI de um hospital filantrópico do interior de Minas Gerais. A UTI possui 20 leitos sendo que o hospital é referência para uma macrorregião de saúde do estado com 23 municípios e população superior a 290.000 habitantes, referência em neurologia e trauma, maioria do atendimento via Sistema Único de Saúde.
O período de estudo foi de novembro de 2016 a julho de 2017 após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE 53642016100005149), sob o número de parecer 1.578.051, da Universidade Federal de Minas Gerais.
A população do estudo incluiu 95 profissionais da UTI, sendo 20 médicos, 15 fisioterapeutas, 45 técnicos de enfermagem e 15 enfermeiros presentes nos turnos de trabalho matutino, vespertino e noturno. Incluiu ainda aqueles que concordassem participar do estudo após apresentação e assinatura do Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE). Sendo assim, os objetivos e o motivo do estudo foram devidamente apresentados a todos os profissionais da unidade.
Foram excluídos os profissionais que se encontravam de folga, férias ou licença durante o período de coleta de dados. As sessões de observação para cada profissional ocorreu no intervalo de 40 a 60 minutos. A observação foi feita por dois alunos de iniciação científica, devidamente treinados, sendo realizada de forma que os profissionais não associassem o motivo da presença do observador, no ambiente de trabalho.Sendo assim buscou-se amenizar o feito Hawthorne.
O instrumento de coleta de dados foi construído pelos próprios pesquisadores de acordo com os parâmetros que foram estudados nos guidelines de prevenção de infecções relacionados ao cateter intravascular do CDC, de estratégias para prevenção de infecções relacionadas ao cateter central da The Society for Healthcare Epidemiology of America (SHEA), Checklist para prevenção de cateter central associada a infecção da corrente sanguínea do CDC e do Manual para Observadores: Estratégia Multimodal da OMS para a melhoria da higienização de mãos; Guia para Implantação: Um Guia para a implantação da estratégia multimodal da OMS para a melhoria da higienização das mãos e Segurança do paciente.9,12-14Observou-se as seguintes variáveis categorizadas como Sim ou Não:1-Chegada no leito: a) O profissional fez a HM (higienização simples das mãos e/ou fricção alcoólica)? ; b) O profissional usou luvas?
2- Manipulação do cateter: a) Administração de medicamentos - o profissional fez a HM? O profissional faz desinfecção do conector do cateter? O profissional usou luvas? b) Manipulação do curativo: o profissional fez a HM? O profissional usou luvas? O curativo estava íntegro, úmido, sujo ou solto?c) Troca de curativos: o profissional fez a HM?O profissional usou luvas de procedimentos, estéril ou não utilizou? O curativo foi feito com gaze estéril ou com curativo transparente e impermeável 3-Saída do leito. o profissional fez a HM?4-Inserção do cateter: o profissional realizou HM?Usou luvas, capotes e campos estéreis? Usou máscara? Usou gorro? O profissional fez antissepsia da pele do paciente?
As análises foram realizadas com o auxílio do programa estatístico Data Analysis and Statistical Software (Stata)., versão 15.
Para verificar se houve diferença das variáveis (chegada no leito, administração de medicamentos, desinfecção do conector do cateter e manipulação do curativo) entre as categorias profissionais utilizou-se o teste qui-quadrado de Pearson quando o valor esperado foi > 5 e o teste exato de Fisher para o valor esperado <5. O nível de significância considerado para inferência estatística foi de5% (. = 0,05) e o intervalo de confiança de 95%.
RESULTADOS
Foram observadas as oportunidades de HM de acordo com as seguintes categorias profissionais: 205 dos técnicos de enfermagem, 51 dos Enfermeiros, 41 do médico e 20 do fisioterapeuta. O tempo de permanência dos cateteres observados variou de 7-15 dias. Verificou-se que, quando associados às categorias profissionais versus HM na chegada do leito, uso de luvas e HM antes e após a administração de medicamentos, desinfecção do conector do cateter, uso de luvas e HM antes e após a manipulação do curativo, foram significativas (p<0,05).
A tabela 1 apresenta a associação entre as variáveis chegada no leito, administração de medicamento, desinfecção do conector do cateter e manipulação do curativo versus a categoria profissional.

No que se refere à realização de curativos feita por enfermeiros da UTI, registrou-se que todos os profissionais dessa categoria observados, usavam luvas e faziam a antissepsia da pele durante a troca de curativos. No entanto, 5,88% não fizeram a HM antes da troca de curativos e, 35,29% não fizeram a HM após a troca de curativos.
A tabela 2 apresenta a distribuição do número de oportunidades de HM dos enfermeiros durante a troca de curativos.

Quando os médicos foram observados, verificou-se que nem todos esses profissionais aderiam à prática de HM antes da inserção do cateter (75,61%) e após a inserção do CVC (73,17%).
A tabela 3 apresenta a distribuição do número de oportunidades de HM dos médicos e o uso das medidas de prevenção da infecção da corrente sanguínea quando na inserção do CVC.

Cabe ressaltar que, dos 50 pacientes que faziam uso do CVC e que foram submetidos às observações diretas do presente estudo, 18 (36,0%) foram diagnosticados com choque séptico e 12 (24,0%) foram diagnosticados com sepse de foco pulmonar. Inicialmente realizou-se tratamento clínico e após 3 dias os diagnósticos foram confirmados pela Comissão de Infecção de Controle Hospitalar (CCIH).
Todos os cateteres observados eram não tunelizados e,14 (28,0%) estavam inseridos na subclávia direita e 36 (72,0%) na jugular interna direita.
DISCUSSÃO
No presente estudo verificou-se que a técnica de observação direta possibilitou o registro de oportunidades de realização das medidas de prevenção de infecção da corrente sanguínea associada ao CVC recomendadas por organizações nacionais e internacionais.2,7,9,13
Verificou-se que a realização da HM ainda é um desafio na UTI deste estudo uma vez que, os técnicos de enfermagem, apesar de apresentarem um maior número de oportunidades de HM na chegada do leito do paciente a maioria não fazia a HM (p<0,05) (Tabela 1). Registrou-se ainda que a equipe de enfermagem não seguia a prática adequada dos bundle de manutenção do CVC quando na administração de medicamentos por meio do lúmen do cateter. Tal fato pode indicar ausência de estratégias específicas de controle do cumprimento das diretrizes de cuidado referentes ao CVC o que pode levar a ocorrência de eventos adversos nos pacientes, como por exemplo, a infecção da corrente sanguínea, muitas vezes subnotificada na instituição de saúde.
Quanto as oportunidades de desinfecção do conector do cateter observou-se neste estudo, que a equipe multiprofissional não costuma fazer esta prática. Tal medida, no entanto, é recomendada pelo CDC e pelo OMS, devido às evidências de contribuição de redução da infecção da corrente sanguínea com a aplicação desta medida de prevenção. 2,9,13,20
Estudos recentes de revisão realizado nos Estados Unidos sugerem que a fricção com álcool a 70,0% por no mínimo 5 segundos é suficiente para evitar a contaminação por meio de conectores do CVC. 16,17,20-22No presente trabalho, observou-se uma frequência baixa (2,0%) da realização de desinfecção do conector do cateter realizada pelos técnicos de enfermagem.
Um estudo que avaliou a adesão dos técnicos de enfermagem à desinfecção do conector, observou um aumento da adesão (10,4% para 12,8%) após intervenções educativas e implementação do bundle.15 Comparado ao alto número de oportunidades que os profissionais tiveram de desinfecção do conector quando na administração de medicamentos, o aumento ainda foi pequeno, o que poderia aumentar o risco de infecção pós-inserção do CVC.15Para vencer tal desafio é necessária uma observação direta dos profissionais de saúde para monitoração da adesão à desinfecção do conector do CVC.18,21,22
O conector do CVC pode ser considerado a fonte primária de contaminação bacteriana e subsequente contaminação no interior do lúmen do cateter.11,18 A colonização do conector com consequente entrada de bactéria no lúmen do CVC é considerada a causa de 50,0% de infecções da corrente sanguínea pós-inserção com formação de biofilmes intraluminais.11,18
No que se refere à manipulação do curativo, estratégias de educação continuada deveriam focar nesta ação, sobretudo, por ser uma prática em que médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem faziam com frequência na instituição. A justificativa de manipulação frequente, deve-se ao fato de que avaliação diária acontecia com contato do sitio de inserção para avaliar se esta úmido, sujo ou solto.
A manipulação pode favorecer a entrada de microrganismos no sítio de inserção, pois, muitas vezes sejam por excesso de trabalho ou até pela falta de conhecimento, o curativo não é recolocado de forma estéril como acontece na inserção do CVC ou na troca de curativo. Isto é, o uso de clorexidine alcoólico 0,5% quando na recolocação do curativo após manipulação e, o uso da técnica asséptica no decorrer do procedimento não acontece.
Tais resultados apontam que, a existência do bundle não é condição suficiente para a prevenção das infecções, mas é preciso vigilânciae mudança de comportamento; além da criação de indicadores de saúde e avaliação.64,71% dos enfermeiros após realizarem a troca de curativo do acesso central não realizaram a HM, isto é não fizeram nem a higienização simples nem a fricção alcoólica (Tabela 2). Quanto aos médicos, a maioria fazia uso de barreira máxima estéril de precaução e a antissepsia da pele do paciente, no entanto, a higienização das mãos antes e após a inserção do CVC (>70,0%) não apresentou adesão suficiente relacionado ao número de oportunidades de HM (Tabela 3).
A HM não foi realizada previamente a inserção de luva estéril, isto é, não foi feita, nem a fricção alcoólica, nem assepsia cirurgia ou a higienização anti-séptica. Diante desses resultados, questionam-se as forma de intervenção educativa e a divulgação do bundle na UTI em que o estudo foi realizado. Além disso, é importante para o sucesso e retorno positivo das medidas de prevenção, a análise da realidade e da cultura institucional.3-8
De forma semelhante, um estudo realizado no Brasil avaliou em uma UTI a adesão dos profissionais em relação às medidas de prevenção de infecção da corrente sanguínea associada ao CVC.15Diferente dos resultados do presente estudo, os enfermeiros demonstraram adesão á HM após a troca de curativos e os médicos faziam a higienização das mãos antes a após a inserção do CVC alcançando 100% no preparo cirúrgico das mãos.15
Outro estudo de intervenção realizado na Suíça avaliou a competência e o conhecimento dos médicos para a inserção do CVC6. Realizaram-se treinamentos e práticas educativas por meio de simulações com a equipe médica a respeito de técnicas de inserção, higiene das mãos apropriada para a técnica, máxima barreira estéril de proteção e manutenção do campo estéril.. Ao comparar a realização da inserção do CVC antes e após o treinamento houve uma melhora significativa de 76.0% para 87,7% (p < 0,001) quando se comparava a inserção do CVC previamente os treinamentos6. Assim como esse estudo, um trabalho educativo com a equipe médica da UTI, do presente trabalho, poderia ser feito a fim de atentar, sobretudo, sobre a importância da adequada HM para esse procedimento. Importante comentar que, dos 50 pacientes observados que estavam com CVC 24,0% foram diagnosticados com choque séptico. Este diagnóstico apesar de multifatorial, expressa a necessidade de comparação de taxas de adesão ao bundle de manutenção e inserção de CVC associado às taxas de choque séptico na instituição.
Um estudo realizado na Nova Zelândia avaliou a equipe multiprofissional após treinamentos, vigilância e implementação de bundles5. O resultado mostrou que as combinações de práticas de treinamento e de implantação do bundle reduziram a taxa média de infecção de 6,43 para 1,83..No presente estudo observou-se que, a UTI havia somente o bundle implantado na teoria, mas na prática diária, a equipe multiprofissional não estava capacitada de modo que houvesse um feedback em relação às medidas de prevenção de infecção da corrente sanguínea associada ao CVC.
O bundle é o melhor conjunto de práticas baseado em evidências e tem se mostrado efetivo, sobretudo na redução de custos hospitalares, no entanto, se não há vigilância o retorno da equipe multiprofissional sobre o conjunto dessas práticas ele pode não ser efetivo e torna-se um desafio.19,20
Um estudo de intervenção realizado no Brasil, quase experimental, antes e depois, mostrou que, após medidas educativas de inserção, manipulação e manutenção do CVC associada à implantação de bundles houve uma redução significativa de infecção da corrente sanguínea associada ao cateter venoso central diminuindo os episódios de 4,3 para 1,0 cateteres dia (95% IC:2,27-6,35)8.
Outro estudo realizado na Itália conduziu práticas educativas para a prevenção da infecção de corrente sanguínea associado ao CVC na UTI.. Após a estratégia educativa, adotou a vigilância da equipe por meio de observação direta para analisar a adesão da equipe sobre as práticas implantadas1.
Observou-se nesse estudo que, a adesão à HM entre a equipe multiprofissional aumentou de 47% para 89%1. Apesar dos médicos terem mostrado uma menor adesão quando comparado a outras categorias profissionais, a diferença não foi significante (p<0,05) e todas as categorias profissionais no geral mostraram melhora na adesão à HM1. Além disso, houve redução de 55% das infecções da corrente sanguínea associada ao CVC após o programa de treinamento (de7,9 para 6,2 infecções por 1000 cateteres dia)1.
Quanto à via de inserção observou-se neste estudo que,72,0% dos cateteres estavam na jugular interna direita dos pacientes. Um estudo de ensaio clínico realizado na França mostrou que, a inserção do CVC na veia subclávia há um risco reduzido de infecção da corrente sanguínea quando comparado á veia jugular.21Tais resultados são consistentes com o guideline de prevenção de infecções relacionadas ao CVC do CDC.9,13Segundo esse estudo verificou-se que, a via subclávia possui uma menor carga microbiana e esta relativamente mais protegida contra a ruptura de curativos.21
Outro estudo de meta-análise também apontou que a ocorrência de infecção da corrente sanguínea em pacientes que estavam com cateteres inseridos na jugular foi mais alto quando comparada à subclávia (razão de risco, 1,80 [95%IC;1,01-3,20]).22Essas evidências sugerem que, quando não apresentar contra-indicações para o paciente seria indicado a via subclávia como escolha preferencial para a inserção de CVC.
Foi possível observar que a HM não era realizada por médicos e enfermeiros não na maioria das oportunidades, sobretudo após os procedimentos de inserção de manutenção do CVC.75,61% dos técnicos não faziam a HM após a administração de medicamentos na via do CVC e 87,32% não faziam antes da administração.
Além disso, quando os enfermeiros administravam medicamentos, 64,71% não faziam a HM após o procedimento e 54,90% não faziam antes da administração. Essas taxas podem indicar a falta de um adequado treinamento baseado em evidencias para a equipe multiprofissional, sugerindo que, na falta de um programa de intervenção, o bundle se torna ineficiente e a sua implementação será um desafio para as instituições de saúde.
Além disso, a utilização da técnica de observação direta pode contribuir para definir possíveis fatores facilitadores (adesão da equipe à determinadas práticas de manutenção e inserção do CVC) e dificultadores (carga de trabalho excessiva, falta de educação permanente e vigilância continua; falta de adesão e conhecimento a determinadas práticas de controle de infecção associada ao CVC). O conhecimento de tais fatores pode levar a treinamentos mais efetivos uma vez que possibilita entender o comportamento da equipe multiprofissional na prátiva clínica diária na UTI.
Finalmente, houve algumas limitações no presente estudo como a ausência de resultados efetivos de treinamentos com a equipe e seu feedback em relação à educação continuada das práticas de inserção e manutenção do CVC. Além disso, não houve obtenção de taxas da variação da incidência de infecção de corrente sanguínea associada ao CVC antes e após intervenções e vigilância do “bundle”. No entanto, este estudo, ainda está em continuidade na UTI e foi apresentado para a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar da instituição de estudo a fim de se obter um maior controle na vigilância e na notificação de infecções de corrente sanguínea associada ao CVC.
A metodologia deste estudo foi fundamental para constatar se o programa de educação continuada e treinamentos na instituição de estudo geravam impactos para a diminuição de taxas de infecções da corrente sanguínea. Evidenciou ainda que, estudos recentes nacionais e internacionais, buscam técnicas metodológicas semelhantes para avaliar a efetividade dos bundles associado a taxas de morbi-mortalidade e custos institucionais.1,3-6,9,15
Os resultados do presente estudo indicaram que a HM para a prevenção de infecções da corrente sanguínea associada ao CVC ainda é um desafio na UTI. Mesmo com a presença do bundle para esse fim, as medidas de controle não eram efetivas para a manutenção e inserção do CVC. Tais resultados podem indicar estudos futuros para controle da efetividade do bundle para a prevenção de infecção da corrente sanguínea.
Os resultados deste estudo, no entanto, podem levar a implicações positivas tanto para a prática clínica, quanto para a comunidade científica uma vez que ainda é uma lacuna no conhecimento a ocorrência de infecções da corrente sanguínea, que frequentemente levam a ocorrência de sepse e choque séptico em pacientes com CVC.
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