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Reutilização de perfurocortantes na insulinoterapia e sua associação com infecções estafilocóccicas
Re-use of sharps in insulin therapy and their association with staphylococcus infections
Reutilización de punzocortantes en la insulinoterapia y su asociación con infecciones estafilocócicas
Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 9, núm. 1, pp. 15-20, 2019
Universidade de Santa Cruz do Sul


Recepção: 17 Junho 2018

Aprovação: 05 Novembro 2018

DOI: https://doi.org/10.17058/reci.v9i1.12243

Resumo: Justificativa e Objetivos: A insulinização de múltiplas doses é um dos tratamentos utilizados para diabetes. O manejo de seringas, agulhas e canetas na insulinoterapia têm sido descrito como um fator de risco ao desenvolvimento de processos infecciosos, causando dano a integridade da pele e lesões tissulares, facilitando a penetração de patógenos oportunistas. Diante disso, o objetivo desta pesquisa foi avaliar a prática de reutilização desses dispositivos na insulinoterapia e sua relação com o surgimento de contaminação por Staphylococcus sp. em agulhas e riscos de infecções. Métodos: Para a coleta de dados foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os participantes da pesquisa acerca dos aspectos da terapia insulínica. A pesquisa entrevistou 15 diabéticos, dos quais 13 (86,7%) do sexo feminino, sendo coletadas 20 agulhas com posterior envio para análise no laboratório de microbiologia da Faculdade Santa Maria. Resultados: Foi constatado que 53,3% dos participantes relataram adotar algum cuidado de hiegiene no local da aplicação, 80% reutilizaram a agulha de um a > 7 dias, variando de dois a > 15 aplicações, e 66,7% sentiram alguma reação no local da aplicação. Um total de nove agulhas reutilizadas mostraram-se contaminadas por Staphylococcus sp. após realização de cultura, coloração de Gram, teste da catalase e coagulase. Conclusão: Diante dos resultados, pode-se constatar que existe um potencial risco de infecção por Staphylococcus sp. associado à insulinoterapia.

Palavras-chave: Autocuidado, Contaminação, Infecções Estafilocócicas.

Abstract: Background and Objectives: Multiple dose insulin is one of the treatments used for diabetes. The management of syringes, needles and pens in insulin therapy has been described as a risk factor for the development of infectious processes, causing damage to skin integrity and tissue injuries, facilitating the penetration of opportunistic pathogens. Therefore, the objective of this research was to evaluate the practice of reuse of these instruments in insulin therapy and their relation with the emergence of Staphylococcus sp. contamination in needles and risks of infections. Methods: Semi-structured interviews were carried out with the participants of the study on the aspects of insulin therapy. The research interviewed 15 diabetic individuals, of which 13 (86.7%) were female, and 20 needles were collected and sent to the microbiology laboratory at Faculdade Santa Maria. Results: 53.3% of the participants reported adopting some hygiene care at the application site, 80% reused the needle from one to > 7 days, ranging from 2 to > 15 applications, and 66.7% felt some reaction at the application site. A total of nine reused needles were contaminated withStaphylococcus sp. after culturing, Gram stain, catalase and coagulase tests. Conclusion: According to the results, it can be verified that there is a potential risk of infection by Staphylococcus sp. associated with insulin therapy.

Keywords: Self-care, Contamination, Staphylococcus Infections.

Resumen: Justificación y Objetivos: Se utiliza la insulinización de múltiples dosis como uno de los tratamientos para la diabetes. El manejo de jeringas, agujas y plumas de injección en la insulinoterapia se considera como un factor de riesgo para el desarrollo de procesos infecciosos, siendo la causa de daños a la piel y de lesiones tisulares, lo que facilita la entrada de patógenos oportunistas. Por lo anterior, esta investigación busca evaluar la práctica de reutilización de estos aparatos en la insulinoterapia y su relación con el surgimiento de contaminación por Staphylococcus sp. en agujas y de riesgos de infecciones. Métodos: Para la recopilación de datos, se realizaron entrevistas semiestructuradas con los participantes de la investigación acerca de los aspectos de la terapia con insulina. En el estudio se entrevistó 15 diabéticos, de los cuales 13 (un 86,7%) son del sexo femenino, y se recolectó 20 agujas para enviarlas a análisis en el Laboratorio de Microbiología de la Facultad Santa Maria. Resultados:Se constató que el 53,3% de los participantes relataron adoptar algún cuidado de higiene en el lugar de aplicación; el 80% reutilizó la aguja de 1 a > 7 días, oscilando de 2 a > 15 aplicaciones, y el 66,7% tuvo alguna reacción en el lugar de aplicación. El total de nueve agujas reutilizadas estaban contaminadas con Staphylococcus sp. después de la realización de cultivo, tinción de Gram, prueba de la catalasa y coagulasa. Conclusión: A partir de los resultados, se comprobó que existe un potencial riesgo de infección por Staphylococcus sp. asociado a la terapia con insulina.

Palabras clave: Autocuidado, Contaminación, Infecciones Estafilocócicas.

INTRODUÇÃO

No Brasil, cômputo indica que a prevalência do Diabetes Mellitus (DM) atinge 12,5 milhões de pessoas, com estimativas de alcance de 20,3 milhões em 2045. Fatores como obesidade, sedentarismo e qualidade dietética contribuíram para esse quadro epidemiológico, caracterizando-se como um desafio ao Sistema Único de Saúde (SUS) no que tange ao cuidado integral a esse agravo.1

A conveniência quanto ao tratamento do DM segue o estado geral de cuidado ao controle metabólico e prevenção de complicações crônicas; a insulinização em múltiplas doses é o tratamento de escolha para o tipo I da doença, no DM tipo II pode ser utilizado na gravidez durante estágios transitórios de hiperglicemia, ou quando os fármacos orais são insuficientes, bem como quando a doença segue em evolução com falência das células β pancreáticas.2

O tratamento com insulina pode ser realizado por meio de diversos dispositivos com características particulares. Por essa razão, a sua autoadministração requer destreza psicomotora e conhecimento dos procedimentos de uso, incluindo o armazenamento, transporte e preparo, assim como o manuseio de seringas, agulhas e canetas, requerendo para tanto a competência do autocuidado. Imprecisões na administração tornam o diabético susceptível à complicações como lipo-hipertrofia, descontrole glicêmico e infecções.3

Em razão do gênero Staphylococcus figurar entre os gram-positivos mais comuns a colonizar a pele, são patógenos responsáveis por uma série de afecções cutâneas, incluindo infecções sistêmicas, de ossos e de tecidos moles. O Staphylococcus aureus destaca-se como agente virulento pela capacidade de adquirir resistência a diversos antimicrobianos, e causar desde manifestações clínicas de pele a intoxicações graves.4,5

Os estafilococos coagulase-negativos surgiram com significativa importância médica, causando infeccções nosocomiais, estando associados a resistências a múltiplos antibióticos e formação de biofilmes em dispositivos implantados, sendo esse um importante fator de virulência que contribui para a cronicidade e recidiva de infecções, além de mecanismo de escape de defesas imunológicas.6,7

Com base na problemática abordada, esta pesquisa teve como objetivos avaliar práticas de autocuidado na insulinoterapia e no manuseio do perfurocortante que constituem riscos ao surgimento de infecções estafilocócicas, e verificar a contaminação de Staphylococcus sp. em agulhas de seringas e canetas reutilizadas nessa terapia.

MÉTODOS

Pesquisa analítica e descritiva, com abordagem quantitativa, com população base composta por usuários de insulina do município de Cajazeiras-PB, selecionados por amostragem não probabilística, por conveniência, levando-se em consideração a acessibilidade e a disponibilidade em ter os elementos da população estudada. A amostra foi composta por 15 usuários do SUS, e foram realizadas análises bacteriológicas em 20 agulhas de perfurocortantes reutilizadas.

Para coleta de dados foram feitas entrevistas semi-estruturadas com os participantes da pesquisa acerca dos aspectos da terapia insulínica e do autocuidado, durante o período de agosto a dezembro de 2015. Posteriormente, para realização das análises bacteriológicas, as agulhas foram coletadas em sacos estéreis e levadas ao laboratório de microbiologia da Faculdade Santa Maria, onde foram imersos em 2,5 ml de caldo Brain Heart Infusion (BHI) e incubados durante 48 horas em estufa bacteriológica à 37° C, sob atmosfera aeróbica, sendo semeados por desgaste em placas de ágar sangue de carneiro à 5% e incubadas por 24 horas em estufa bacteriológica à 37° C. Os procedimentos de identificação seguiram o Manual de Microbiologia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária para identificação de Staphylococcus sp., incluindo coloração de Gram, teste da catalase e da coagulase.8

Esta pesquisa foi regida pela Resolução nº 466, de dezembro de 2012 do Conselho Nacional de Saúde, segundo os preceitos éticos de pesquisas científicas envolvendo seres humanos, principalmente no que diz respeito à dignidade e à autonomia do participante, sendo esta aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Santa Maria sob parecer consubstanciado nº 1.223.255. Para o desenvolvimento dessa pesquisa foi imprescindível a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, tanto pelo pesquisador, quanto pelo participante.

Os dados coletados e os resultados das análises bacteriológicas foram processados por meio de estatística descritiva utilizando o software Stastistical Package for the Social Sciences – IBM SPSS v.20, sendo as variáveis expressas em frequências relativas e absolutas sob a forma de tabelas.

RESULTADOS

A amostra foi constituída por 15 diabéticos, equivalente a 12% da população diabética usuária de insulina do município de Cajazeiras cadastrada na 9a Gerência Regional de Saúde da Paraíba. Destas, treze (86,7%) eram usuárias do sexo feminino e dois (13,3%) do sexo masculino, com faixas etárias compreendidas entre 10 e 85 anos. Quanto ao grau de escolaridade, quatro (26,7%) se autodeclararam analfabetos, cinco (33,3%) cursaram o fundamental I, um (6,7%) cursou o ensino fundamental II, dois (13,3%) o ensino médio, um (6,7%) o ensino superior e dois (13,3%) dos entrevistados não informaram, dados descritos na tabela 1.

Tabela 1
Distribuição dos usuários segundo sexo, faixa etária e grau de escolaridade

Em relação à higienização, foi verificado que oito (53,3%) adotavam cuidados com a higiene antes da injeção, citados apenas a antissepsia com álcool no local da aplicação, entretanto, eles não souberam responder a concentração alcoólica. Os outros sete (46,7%) entrevistados não adotaram cuidado algum com a higiene, e nenhum deles citou a lavagem das mãos e/ou assepsia do frasco ampola. 12 (80%) dos usuários relataram a reutilização do mesmo perfurocortante no período de um a > sete dias, variando de dois a > 15 aplicações realizadas com a mesma agulha, dados descritos na tabela 2.

Tabela 2
Variáveis relacionadas ao autocuidado, aplicação da insulina e agulhas analisadas

Entre os usuários que reutilizavam as agulhas do perfurocortante (n=12), os motivos das trocas das agulhas foram: a perda da graduação da seringa [n=1 (8,3%)], o tempo pré-determinado de uso [n=6 (50,0%)] e a troca da caneta [n=5 (41,7%)]. Com relação à higienização das agulhas, cinco (41,7%) adotaram a desinfecção com álcool e sete (58,3%) não realizam nenhum procedimento de limpeza. Os motivos principais reportados para reuso do perfurocortante foram: o não fornecimento de material de uso único pelo SUS – citado por seis (50%) usuários –, sendo a condição financeira o empecilho para compra, e a economia de material, citado por outros seis (50%).

Dentre os participantes da pesquisa, nove relataram já ter sentido alguma reação adversa no local da aplicação, como sangramento (33,3%), eritema (33,3%), hematoma (22,2%), edema (11,1%) e a lipodistrofia do tipo lipo-hipertrofia (11,1%).

No que se refere à contaminação bacteriana das agulhas reutilizadas obteve-se o seguinte resultado: após 24 horas de incubação, nove placas de cultura apresentaram crescimento, constatando-se a contaminação de 45% das agulhas. A identificação presuntiva foi indicativa de Staphylococcus sp. pelas características morfológicas típicas das colônias, esbranquiçadas e cremosas no ágar sangue, γ e β-hemolíticos, confirmadas por meio da coloração de Gram e das provas da catalase e coagulase à presença desse gênero em todas as placas. Quanto às espécies, seis (66,7%) amostras contaminadas foram positivas para S. aureus, sendo a mais prevalente, e três (33,3%) para Staphylococcus coagulase-negativos.

DISCUSSÃO

As práticas recomendadas para a preparação asséptica da dose insulínica, segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) – que incluem a lavagem das mãos e a desinfecção da borracha do frasco/ampola com álcool à 70% –, não foram aderidas por nenhum usuário. Essas práticas são de suma importância para manter as condições de assepsia da insulina e para a redução dos riscos de contaminação dos instrumentos utilizados.3

A antissepsia no local de aplicação recomendada pela SBD, que reduz substancialmente a carga de Staphylococcus em tecidos biológicos, foi adotada por um número exíguo de diabéticos (53,3%) que usaram álcool. Entretanto, os adeptos a essa prática não souberam determinar a concentração alcoólica do produto utilizado, não sendo possível atestar a sua eficácia.3,9

Observou-se o baixo grau de escolaridade em mais de 66% da amostra dos indivíduos, com a presença de analfabetos e pessoas que cursaram apenas o ensino fundamental I e II. Estudos demonstram a importância da educação adequada, e da reeducação na autoadministração da insulina, a fim de reduzir os riscos de possíveis danos, para tanto, faz-se útil delinear diretrizes educacionais em saúde que atinjam pacientes diabéticos de diferentes níveis de instrução, a fim de promover práticas seguras de autocuidado.10

Quanto ao índice de reuso da agulha, 80% da amostra é adepta a esta prática. À luz da literatura científica, esses índices chegaram a atingir 94,6% e, no que se refere à frequência da quantidade e em tempo de uso, a maior frequência constatada nesse trabalho foi de 3 aplicações (40%) e 3 dias de utilização (40%). Observado o motivo mais reportado para o descarte da agulha/perfurocortante comprovou-se o tempo pré-determinado de uso (40% dos entrevistados).11

Segundo o New injection recommendations for patients with diabetes, uma publicação elaborada por centenas de colaboradores especializados na questão, as recomendações são de que as agulhas de seringas e canetas devam ser de uso único e descartadas logo após a aplicação, assim como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por meio da Resolução 2.605 de 2006, proíbe de serem reprocessadas as agulhas com componentes plásticos não desmontáveis.12-13

Embora as bases legais e científicas adotem a postura contrária ao reuso de perfurocortantes usados na insulinoterapia, o Ministério da Saúde considera adequada essa prática, limitando o uso em até 8 aplicações por uma mesma pessoa, citando os cuidados de reencapar, evitar reuso em caso de feridas abertas nas mãos ou de infecções nos locais da aplicação, e notada destreza manual, ausência de tremores e acuidade visual do aplicador.3

A condição econômica foi preponderante na escolha da prática de reuso das agulhas, pois esses componentes das canetas não eram fornecidos pelas Secretarias Estadual e Municipal de Saúde, órgãos responsáveis pelo provimento de materiais e insumos utilizados na insulinoterapia, tornando oneroso o custo para os usuários, como relatado nas entrevistas. No caso das seringas acopladas às agulhas, o empecilho era a falta de padronização e regularização quanto a distribuição, não se adequando à quantidade e à necessidade de cada usuário em detrimento do uso único.

Dentre as estratégias adotadas para reutilizar as agulhas, 41,7% dos usuários que reutilizam afirmaram adotar o asseio com álcool. Esse tem notável ação bactericida, além da simplicidade do processo, rapidez e baixo custo. Estudo confirmou a sua eficácia na eliminação de Staphylococcus aureus em superfícies abióticas após higienização com álcool à 70%, entretanto, o Staphylococcus epidermidis não foi afetato pelo processo. Apesar da eficácia parcial, o ideal é o descarte após o primeiro uso, como supracitado.14

No tocante às complicações resultantes da administração da insulina, o acometimento cutâneo foi relatado por 66,7% da amostra. Oriundo de alterações vasculares, o eritema apresentou frequência superior; notadamente o hematoma e o sangramento perceptíveis foram complicações encontradas que indicavam relação com a aplicação da insulina, não obstante causado por distúrbios fisiopatológicos predisponentes no diabético, como disfunção endotelial e aumento da permeabilidade da membrana basal. O aumento da perfusão microcirculatória foi observada após administração de insulina, sugerindo como a função endotelial contribui para esse aumento, com ausência de alterações da função parassimpática, aumento da resposta estimulada pela acetilcolina e diminuição das glicoproteínas de adesão.15-16

Nessa pesquisa não foram encontradas evidências clínicas de infecções, entretanto, há achado científico que comporta tal possibilidade, inclusive associados a abscesso, lipodistrofia e hiperemia. O S. aureus, encontrado em amostras contaminadas, foi apontado em outra pesquisa como mais prevalente em diabéticos (8,69%) em relação às pessoas não diabéticas (5,85%), assim como a proporção de cepas de S. aureus multirresistentes em diabéticos (52,17%) foi maior que na população não diabética (28%), incluindo a colonização por Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (MRSA). Quando combinados a taxa consideravelmente maior de colonização – especialmente de usuários de insulina – com o comprometimento funcional dos leucócitos, esse grupo de doentes crônicos se torna mais propensos a infecções estafilocócicas.17-19

Linhagens agressivas de S. aureus tem uma capacidade extraordinária de penetrar o tecido epitelial e formar abcessos, regulado por dois processos, o conexo à célula por um viés pró-inflamatório constitutivo da interleucina 1β (IL-1β) produzida por queratinócitos, e outro bacteriano da α-toxina do S. aureus que ativa o inflamassoma, culminando ambos na piroptose, morte celular de queratinócitos mediados pela caspase 1. A pele não estando intacta pode permitir a disseminação de estafilococos por tecidos adjacentes, inclusive pelo sanguíneo. Em estudo de caso-controle, a bacteremia por S. aureus adquirida na comunidade foi descrita como tendo o risco aumentado em pessoas diabéticas, com risco mais pronunciado nas do tipo I.20-21

A identificação dos estafilococos coagulase-negativos nas culturas aferidas por esse trabalho reafirmam os dados obtidos por outra pesquisa no que concerne à preeminência entre os contaminantes de perfurocortantes reutilizados na insulinoterapia. A literatura apontou o S. epidermidis como o mais prevalente, indicando que mesmo após a primeira injeção essa espécie já está presente na agulha.22

O patógeno supradito é bem descrito na literatura por estar associado à bacteremias relacionadas à cateteres, com capacidade inata de formar biofilmes, e com genótipos circulantes dessa espécie, carregando genes de virulência, como o mecA, que se adaptam com facilidade a ambientes hospitalares e causam infecções graves, resistindo a diversos antibacterianos, como a meticilina.23

Uma pesquisa integrou um modelo de dose-resposta com o teste de eficácia preservativa, calculando os riscos de infecções por estafilococos após a contaminação inicial de insulina pela uso de agulha reutilizada em duas aplicações, utilizando o S. aureus como micro-organismo de referência, o modelo analisou o risco máximo considerando que toda flora bacteriana da derme (área de superfície dérmica = 2 x 106 mm2, com população microbiana de 1 x 1012 unidades formadoras de colônias, e de S. aureus 1 – 10 UFC / mm2 ) foi transferida em uma injeção subcutânea para a área superficial penetrante da agulha, hipoteticamente, assumindo o risco de inoculação de 7500 UFC na insulina. Como resultado, o risco de infecção foi relativamente alto após as duas primeiras aplicações depois da contaminação, com declínio gradual, sendo a média geométrica do risco total de 0,0007%, 0,0009%, 0,0007%, 0,0003%, 0,0005%, 0,0004%, 0,0004%, 0,0010% e 0,0008%, para 3, 4, 4, 7, 9, 9, 5, 5 e 5 aplicações respectivamente, de diferentes tipos de insulina.24

Pode inferir-se dessa pesquisa, que existem riscos potenciais a processos infecciosos pelo gênero Staphylococcus, após observadas práticas de risco no autocuidado descritas pela clientela diabética e tendo em vista que os perfurocortantes utilizados são artigos críticos que penetram tecidos subcutâneos isentos de flora bacteriana própria. Contudo, pela falta de evidências clínicas e escassez na literatura pesquisada, esses riscos podem ser considerados baixos. Destaca-se a fragilidade desse trabalho no que concerne a uma amostra pequena, fazendo-se necessário diversos níveis de evidências científicas conclusivas que respaldem os profissionais de saúde em suas orientações e em processos contínuos de educação em diabetes.

Agradecimientos

À Faculdade Santa Maria e ao bioquímico Américo Alexandre.

REFERÊNCIAS

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