Avaliação da profilaxia antimicrobiana cirúrgica em um hospital de ensino

Evaluation of surgical antimicrobial prophylaxis in a Teaching hospital

Evaluación de la profilaxia antimicrobiana quirúrgica em um hospital escuela

Matheus Santos Melo
Universidade Federal de Sergipe, Brasil
Thialla Andrade Carvalho
Universidade Federal de Sergipe, Brasil
Maria Cláudia Tavares Mattos
Universidade Federal de Sergipe, Brasil
Maria Pontes Aguiar Campos
Universidade Federal de Sergipe, Brasil
Simonize Barreto Mendonça
Hospital Universitário de Sergipe, Brasil
Iza Maria Fraga Lobo
Hospital Universitário de Sergipe, Brasil

Avaliação da profilaxia antimicrobiana cirúrgica em um hospital de ensino

Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 9, núm. 1, pp. 75-80, 2019

Universidade de Santa Cruz do Sul

Recepção: 12 Agosto 2017

Aprovação: 01 Novembro 2018

Resumo: Justificativa e Objetivos: Diante da relevância e escassez de estudos realizados na região nordeste do Brasil, este estudo tem o objetivo de avaliar a profilaxia antimicrobiana no perioperatório de cirurgias eletivas realizadas em um hospital de ensino de Sergipe. Métodos: Estudo descritivo a partir da coleta de dados contidas em formulários de vigilância de eventos adversos da instituição, no período de janeiro a dezembro de 2015. As variáveis analisadas foram relacionadas à caracterização dos pacientes, procedimentos cirúrgicos realizados e profilaxia antimicrobiana cirúrgica. Para as variáveis categóricas foi realizada análise por distribuição de frequência e para as variáveis quantitativas, as medidas de tendência central e de dispersão correspondentes no software Epi-Info 7, após atender os preceitos éticos. Resultados:Foram avaliadas 752 fichas de vigilância de eventos adversos e complicações pós-operatórias. A profilaxia antimicrobiana foi utilizada em 78,80% das cirurgias, seguiu à padronização do serviço de controle de infecção quanto a seleção do antibiótico (91,80%), administrada no momento ideal (10,90%) e considerada adequada (escolha do antibiótico, momento da administração e duração da profilaxia) (4,40%). A classe de antibiótico de maior escolha foi a das cefalosporinas (93,60%) e o repique foi realizado em somente 22,20% das cirurgias que tinham indicação. Conclusão: A maior parte do uso da profilaxia antimicrobiana não cumpre as diretrizes recomendadas pelos guidelines nacionais . internacionais. Achado que reforça a necessidade de realizar intervenções que levem a mudanças no processo de trabalho das equipes cirúrgicas e garantam a qualidade da assistência e segurança do paciente.

Palavras-chave: Infecção da Ferida Cirúrgica, Antibioticoprofilaxia, Segurança do Paciente.

Abstract: Background and Objectives: In view of the relevance and scarcity of studies carried out in the northeastern region of Brazil, this study aims to evaluate the antimicrobial prophylaxis in the perioperative period of elective surgeries performed at a teaching hospital in Sergipe. Methods: Descriptive study, with collection of information contained in forms of surveillance of adverse events of the institution, from January to December 2015. The data were collected and entered by a nursing student in an Epi-Info 7 software data base between November 2015 and February 2016. The variables analyzed were related to the characterization of patients, the surgical procedures performed and the surgical antimicrobial prophylaxis. Categorical variable were analyzed by frequency distribution and for the quantitative variables, the corresponding central tendency and dispersion measures. The study respected the ethical precepts. Results: We evaluated 752 chips for the surveillance of adverse events and post-operative complications. Antimicrobial prophylaxis was used in 78.80% of the surgeries, followed by the standardization of the infection control service for antibiotic selection (91.80%), was administered at the ideal time (10.90%) and considered adequate (antibiotic choice, timing of administration, and duration of prophylaxis) (4.40%). The highest antibiotic class was cephalosporin (93.60%) and the peal was performed in only 22.20% of the surgeries that had been indicated. Conclusion: The majority of antimicrobial prophylaxis of this study does not meet the guidelines recommended by the national and international guidelines. This finding reinforces the need to carry out interventions that lead to changes in the work process of the surgical teams and guarantee the quality of patient care and safety.

Keywords: Surgical Wound Infection, Antibiotic Prophylaxis, Patient Safety.

Resumen: Justificación y Objetivos: Ante la relevancia y escasez de estudios realizados en la región nordeste de Brasil, este estudio tiene el objetivo de evaluar la profilaxis antimicrobiana en el perioperatorio de cirugías electivas realizadas en un hospital de enseñanza de Sergipe. Métodos: Estudio descriptivo, con recolección de informaciones contenidas en formularios de vigilancia de eventos adversos de la institución, del período de enero a diciembre de 2015. Las variables analizadas estuvieron relacionadas con la caracterización de los pacientes, los procedimientos quirúrgicos realizados y la profilaxis antimicrobiana quirúrgica. Para las variables categóricas se realizó análisis por distribución de frecuencia y para las variables cuantitativas, las medidas de tendencia central y de dispersión correspondientes. El estudio respetó los preceptos éticos. Resultados: Fueron evaluadas 752 fichas de vigilancia de eventos adversos y complicaciones postoperatorias. La profilaxis antimicrobiana fue utilizada en el 78,80% de las cirugías, siguió a la estandarización del servicio de control de infección en cuanto a la selección del antibiótico (91,80%), fue administrada en el momento ideal (10,90%), y considerada adecuada (elección del antibiótico, momento de la administración y duración de la profilaxis) (4,40%). La clase de antibiótico de mayor elección fue la de las cefalosporinas (93,60%) y el repique fue realizado en sólo el 22,20% de las cirugías que tenían indicación. Conclusión: La mayor parte de la profilaxis antimicrobiana no cumplió las directrices recomendadas por los guidelines nacionales y internacionales. Hallazgo que refuerza la necesidad de realizar intervenciones que lleven a cambios en el proceso de trabajo de los equipos quirúrgicos y garanticen la calidad de la asistencia y seguridad del paciente.

Palabras clave: Infección de la Herida Quirúrgica, Profilaxis Antibiótica, Seguridad del Paciente.

INTRODUÇÃO

O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) estima que por ano, 2 milhões de pacientes adquirem infecções relacionadas a assistência à saúde e que destas 14 a 16% são atribuídas às infecções de sítio cirúrgico (ISC), sendo consideradas como uma das mais importantes causas de complicações pós-operatórias.1 No Brasil, estudos relatam incidências de ISC que variam de 3,40 a 13,26%.2-4

As evidências apontam que 60% das ISC são evitáveis e que a adoção de medidas simples pode reduzir a incidência desta afecção.5 Dentre as medidas mais utilizadas na prevenção da ISC está o uso racional de antimicrobianos profiláticos no perioperatório. Entretanto, sua eficácia está diretamente relacionada com a forma como é administrado.6

A adequação da profilaxia cirúrgica relaciona-se a escolha de uma droga com baixa toxicidade, de baixo custo e que tenha ação esperada contra a flora residente do sítio cirúrgico. A droga deve ser administrada via endovenosa, na dose correta, no momento adequado (30 a 60 minutos antes da incisão) e não deve ser estendida por mais de 24 horas. Uma dose adicional do antimicrobiano (ATM) deve ser administrada durante o transoperatório em cirurgias que tenham duração duas vezes maior que a meia vida da droga utilizada.7

Apesar de simples, a profilaxia é muitas vezes inadequada, particularmente quanto ao momento de administração do ATM, a repetição de doses no transoperatório e a duração prolongada no pós-operatório. Essa inadequação pode estar relacionada ao uso empírico e dificuldades de manutenção de rotinas institucionais que englobem o uso do ATM antecedendo a cirurgia no período preconizado. Esses fatores contribuem para a elevação da incidência de ISC, do tempo de internamento, dos custos hospitalares e da resistência microbiana.8-10 Estas consequências acarretam prejuízos para pacientes, familiares e instituições.

Nesse sentido, este estudo objetivou avaliar a profilaxia antimicrobiana no perioperatório de cirurgias eletivas realizadas em um hospital de ensino de Sergipe.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo realizado em um hospital universitário, localizado na região nordeste, conveniado ao Sistema Único de Saúde e que possui 123 leitos de internamento. Este realiza aproximadamente 200 cirurgias eletivas por mês e possui um serviço de vigilância continua dos eventos adversos em pacientes cirúrgicos. A busca ativa diária de eventos adversos é realizada diariamente por enfermeiras do Serviço de Controle de Infecção e por residentes em Epidemiologia Hospitalar utilizando um formulário padronizado na instituição para registro.

A população foi composta por 752 pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos no período de janeiro a dezembro de 2015 e que atendiam aos critérios do National Healthcare Safety Network (NHSN), ou seja, pacientes submetidos a um procedimento dentro do centro cirúrgico, que consistia em pelo menos uma incisão e uma sutura, em regime de internação superior a 24 horas, excluindo-se procedimentos de desbridamento cirúrgico, drenagem, episiotomia e biópsias que não envolviam vísceras ou cavidades.11

Os dados foram coletados por meio do formulário de vigilância de eventos adversos da instituição, e digitados em um banco de dados no software Epi-Info 7 por um graduando de enfermagem previamente treinado. Utilizou-se um manual de padronização para a entrada de dados entre novembro de 2015 e fevereiro de 2016, com o intuito de auxiliar no preenchimento do banco de dados, como para treinamento dos pesquisadores.

Foram incluídas variáveis de caracterização dos pacientes (idade, sexo, classificação da American Society of Anesthesiologist - ASA), procedimentos cirúrgicos (topografia, classificação da ferida operatória, índice de risco cirúrgico, uso de órtese e prótese, cirurgia por vídeo) e profilaxia antimicrobiana cirúrgica (uso de profilaxia antimicrobiana, adequação da profilaxia aos protocolos institucionais, tipo de antibiótico, momento de administração, duração da profilaxia e repique).

A variável ASA corresponde ao escore de predição de risco de óbito para avaliação pré-operatória, classificando o paciente em seis possíveis estados físicos: sem doença orgânica (ASA I), com distúrbio sistêmico moderado (ASA II), com doença sistêmica grave (ASA III), com doença sistêmica que ameace a vida (ASA IV), com risco iminente de morte (ASA V) e paciente em morte encefálica (ASA VI), conforme seu estado clínico geral a partir da presença ou ausência de doença sistêmica.11

Para classificação da ferida operatória foi utilizada a estratificação do Ministério da Saúde em cirurgias limpas, potencialmente contaminadas e contaminadas.12

O índice de risco cirúrgico refere-se à combinação de três variáveis – grau de contaminação da ferida operatória, risco anestésico pela American Society of Anaesthesiologists (ASA) e duração do procedimento (percentil 75 para cada grupo de cirurgia), como definido pelo sistema NHSN11. Foram excluídos da análise das variáveis ASA e índice de risco cirúrgico, os pacientes que não tinham registro no prontuário do valor do ASA ou de outra variável que impedisse calcular o valor do índice de risco cirúrgico.

A indicação do antibiótico foi considerada correta quando seguiu a padronização estabelecida pelo Serviço de Controle de Infecção da instituição. O momento da administração foi considerado apropriado quando a profilaxia microbiana foi administrada entre 30 e 60 minutos antes da incisão cirúrgica e para a prescrição do antibiótico profilático quando administrado no momento certo (30 e 60 minutos antes da incisão) e de acordo com o indicado pela padronização institucional.

A necessidade de repique, administração de dose adicional de antibiótico durante o transoperatório, foi avaliada utilizando como parâmetro o tempo de meia vida da droga administrada. Para a cefalotina, uma dose adicional deve ser administrada a cada 2 horas, para a cefazolina e ciprofloxacino a cada 4 horas e para o metronidazol a cada 6 horas7.

Para as variáveis categóricas foi realizada análise por distribuição de frequência e para as variáveis quantitativas, medidas de tendência central e de dispersão correspondentes. As frequências das variáveis apresentadas nos resultados divergiram em virtude da falta de alguns registros nos prontuários.

O estudo integra o projeto de mestrado intitulado “Riscos e Complicações associadas à Infecção do Sítio Cirúrgico: um estudo de coorte” e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe, conforme número do parecer 1.346.978 (CAAE: 50133315.8.0000.5546).

RESULTADOS

Foram avaliados 752 formulários de vigilância de eventos adversos e complicações pós-operatórias. A mediana de idade da população estudada foi de 45 anos, mínimo de 25 e máximo de 96 anos. A maioria dos pacientes era do sexo feminino (64,10%), e não possuía alteração sistêmica (48,51%) ou possuía em grau leve (47,17%). As principais cirurgias acompanhadas foram: 23,27% cirurgia de abdome sem envolver trato gastrintestinal ou biliar (Xlap); 21,81% intra-abdominal (IAB); 10,91% do trato gastrintestinal (TGI); 9,84% do aparelho reprodutor masculino ou feminino (Orep) e 9,71% de mama (Mama). A maior parte dos procedimentos foi classificada como zero para o Índice de Risco cirúrgico (60,95%), não utilizou a técnica videolaparoscópica (83,38%) e não fez uso de órtese ou prótese (87,75%) (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição das variáveis relacionadas aos pacientes e às cirurgias. Aracaju, 2015.
Distribuição das variáveis relacionadas aos pacientes e às cirurgias. Aracaju, 2015.
*Mediana em anos; **Mediana em dias

Legenda: Min = mínimo; Máx = máximo; ASA I = sem doença orgânica; ASA II = com distúrbio sistêmico moderado; ASA III = com doença sistêmica grave; ASA IV = com doença sistêmica que ameace a vida; Índice de Risco Cirúrgico = escore que varia de 0 a 3 e indica risco intrínseco crescente de desenvolver ISC; TGI = trato gastrointestinal; Mama = mastite, cirurgia ou abscesso de mama; IAB = intra-abdominal, não especificada em outro local [vesícula, fígado (exceto hepatites), baço, pâncreas, peritônio, espaço sub diafragmático, rim e outros]; Orep = outras do aparelho reprodutor masculino ou feminino (episiotomia, cirurgia vaginal, epidídimo, testículo, próstata, útero e outros tecidos pélvicos); Xlap = cirurgia do abdômen (sem envolver trato gastrointestinal ou sistema biliar).

A profilaxia antimicrobiana foi administrada em 70,55% dos procedimentos considerados limpos e a não realização em 9,38% dos contaminados e em 6,85% dos potencialmente contaminados (Tabela 2).

Tabela 2
Uso de antibiótico profilático conforme grau de contaminação da ferida operatória. Aracaju, 2015.
Uso de antibiótico profilático conforme grau de contaminação da ferida operatória. Aracaju, 2015.

As cefalosporinas foram os antibióticos mais empregados, administrou-se cefazolina ou cefalotina em 93,60% dos procedimentos. A indicação do antibiótico foi realizada conforme a padronização da instituição em 91,80% das cirurgias; em 10,90% o antibiótico foi administrado no momento ideal (entre 30 e 60 minutos antes da incisão), realizado o repique em apenas (25) 22,12% dos procedimentos que tinham indicação de dose adicional e mantida prescrição por mais de 48h em 5,70%. Quando analisada a adequação da profilaxia cirúrgica considerando os três critérios (escolha do antibiótico, momento da administração e duração da profilaxia), em apenas 4,40% dos procedimentos foi adequada (Tabela 3).

Tabela 3
Principais características da profilaxia antimicrobiana. Aracaju, 2015.
Principais características da profilaxia antimicrobiana. Aracaju, 2015.
* Conforme padronização do Serviço de Controle de Infecção.

** Considerando a escolha do antibiótico, o momento da administração e a duração da profilaxia.

DISCUSSÃO

A profilaxia antimicrobiana cirúrgica é indicada para procedimentos classificados como potencialmente contaminados ou contaminados. Os procedimentos limpos não necessitam de profilaxia, a menos que comorbidades estejam presentes ou próteses sejam usadas; já nos procedimentos considerados infectados usa-se antibiótico terapêutico e não profilático.6-7

Em discordância com as diretrizes para prevenção de ISC, observou-se neste estudo a não administração do antibiótico em pequeno percentual das cirurgias contaminadas e um excesso de uso em cirurgias limpas, já que a amostra é composta em sua maior parte por pacientes sem alterações sistêmicas graves e sem colocação de órtese ou prótese.

Dados que se assemelham aos relatados em pesquisa do sul do país nas quais o antibiótico profilático foi usado em 76,6% das cirurgias limpas e em 66,7% das contaminadas.13 Informações relevantes pois, levando em consideração o grau de contaminação da ferida operatória e a classificação da condição clínica dos pacientes estudados, sugerem uso inadequado dos ATM.

Como a profilaxia antimicrobiana é uma das medidas indispensáveis na prevenção das ISC, a não administração nos casos que possuem indicação é inaceitável e pode contribuir para o aumento da incidência das infecções relacionadas à assistência à saúde e comprometer a qualidade da assistência e a segurança do paciente. Do mesmo modo, a administração indiscriminada de profilaxia antimicrobiana na ausência de indicação, pode contribuir para o crescimento da resistência antimicrobiana que é considerado um problema de saúde pública.14

Quanto a seleção da droga, os antibióticos mais utilizados neste estudo foram as cefalosporinas de segunda geração, dado compatível com as diretrizes contemporâneas e com pesquisa realizada na região Sudeste do Brasil.7,15 Estas são efetivas contra muitos microrganismos gram-positivos e gram-negativos, seguros e de baixo custo e por isso amplamente utilizadas no Brasil e no mundo.14

Com relação à administração do antibiótico profilático, foi realizada conforme a indicação do protocolo institucional para a maioria dos procedimentos (91,83%), resultado semelhante ao encontrado em estudos na Malásia (78,2%) e em outras regiões do Brasil (88,5% e 100%) e distinto aos observados em pesquisas realizadas em países subdesenvolvidos como a Palestina (18,5%) e o Sudão (6,7%).3,14-18 A variabilidade das taxas encontradas nos estudos pode ser um reflexo do processo de implantação dos protocolos nas diferentes instituições, fato que deve ser considerado, uma vez que são baseados no perfil antimicrobiano da instituição e em evidências que aumentam a segurança do paciente e diminuem a resistência antimicrobiana.

Quanto ao momento de administração da profilaxia antimicrobiana foi encontrada uma taxa de conformidade (10,83%) superior às demonstradas na África (1,8%), e na Ásia (4,6%); porém inferior às do sul brasileiro (33,4%), China (78,2%) e do Oriente médio (59,8%).13,16-19 Observa-se assim, que as taxas de adesão ao tempo correto variam bastante nos diversos países, independente de condição econômica e encontra-se abaixo do recomendado em várias instituições. Inconformidade essa que compromete a segurança do paciente, pois a concentração adequada de antibiótico no tecido deve estar presente no momento da incisão e durante todo o procedimento para efetiva profilaxia e prevenção das ISC14. Sugere-se que sejam realizadas intervenções multifacetadas com o intuito de adequar os processos de trabalho das equipes que laboram no centro cirúrgico aos protocolos baseados em evidências.

No que diz respeito à avaliação da duração da profilaxia, observou-se que em 94,3% dos procedimentos a administração foi descontinuada em até 48 horas, conforme preconizado pelo protocolo institucional. Achado também evidenciado em estudos realizados na China, Malásia e Kuwaite de grande relevância já que o prolongamento da profilaxia antimicrobiana após a cirurgia aumenta o risco de resistência bacteriana, de reação à droga, de incidência de infecção e colonização por microrganismos resistentes, além de elevar os custos. 14,16,19-20

Com relação à administração de dose adicional do antibiótico (repique) nos procedimentos que ultrapassaram duas vezes o tempo de meia vida da droga de escolha, observou-se a não administração em 77,80% dos casos. Realidade preocupante, que contraria as recomendações baseadas em evidências e distinta das demonstradas em estudos realizados no sudeste brasileiro e sudeste asiático em que a omissão da nova dose ocorreu em 33,30% e 27,60% respectivamente.7,14-16. Portanto, faz-se necessário a realização de intervenções a nível institucional para que ocorram mudanças nos processos de trabalho das equipes cirúrgicas e para que fundamentem suas práticas nas melhores evidências existentes.

Quando avaliado conjuntamente a seleção, o momento da administração do antibiótico e a duração da profilaxia, foi observado um elevado percentual de inadequação da profilaxia antimicrobiana. Dado que merece reflexão e planejamento de estratégias de intervenção. As evidências apontam que estratégias como a observação contínua, educação em serviço, os feedbacks para as equipes cirúrgicas aumentam a conformidade com as diretrizes e reduzem as taxas de ISC.21

Resultado de estudo de intervenção que utilizou como estratégias a realização de rodas de conversa com as equipes, distribuição de material educativo e retorno sobre desempenho individual para os prescritores apontam o aumento da adequação no uso da profilaxia antimicrobiana de 42,10% para 97,10% após a intervenção.19

A maior parte do uso da profilaxia antimicrobiana não cumpre as diretrizes dos guidelines.7,14 Esses recomendam que a administração da profilaxia antimicrobiana não seja realizada nos casos de cirurgia limpa, sem prótese, eletivas e em pacientes de baixo risco. Além disso, indicam que a mesma seja realizada dentro dos 120 minutos antes da incisão cirúrgica, considerando o tempo de meia-vida da droga de escolha (60 minutos antes da incisão para os antibióticos de meia-vida curta como a cefazolina e a cefoxitina e de 120 minutos antes para as fluorquinolonas e vancomicina) e que o reforço intra-operatório seja administrado quando a cirurgia ultrapassar a meia-vida estimada da droga ou ocorrer grande perda sanguínea. Na instituição estudada usa-se desnecessariamente profilaxia antimicrobiana em cirurgias limpas realizadas em pacientes de baixo risco, o antibiótico é administrado no momento inadequado e a dose adicional da droga é omitida na maioria dos casos indicados.

Assim, faz-se necessário o planejamento e a implantação de ações educativas no centro cirúrgico estudado para aumentar as conformidades e consequentemente reduzir as taxas de infecção do sítio cirúrgico. Por se tratar de um hospital escola é importante que o tema segurança do paciente cirúrgico e uso racional de antimicrobianos profiláticos esteja presente nos cursos de graduação dos profissionais que compõem as equipes multidisciplinares.

Destaca-se como limitação, a subnotificação de dados nos prontuários para variáveis duração e momento de administração da profilaxia. Sugere-se que esta pesquisa seja replicada em outras unidades hospitalares, no intuito de sensibilizar os profissionais acerca da temática e melhorar a compreensão do atual cenário da prevenção de infecções relacionadas à assistência em saúde, fornecendo subsídios para o fortalecimento das políticas de segurança do paciente.

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