Perfil, sintomas e tratamento realizado em neonatos diagnosticados com sepse
Profile, symptoms and treatment performed in newborns diagnosed with sepsis
Perfil, síntomas y tratamiento realizado en neonatos diagnosticados con sepsis
Perfil, sintomas e tratamento realizado em neonatos diagnosticados com sepse
Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 9, núm. 3, pp. 220-226, 2019
Universidade de Santa Cruz do Sul

Recepção: 23 Outubro 2018
Aprovação: 03 Julho 2019
Resumo: Justificativa e objetivos. A sepse neonatal representa uma das principais causas de morbimortalidade em recém-nascidos. O presente estudo objetivou conhecer o perfil, os sinais, sintomas e o tratamento realizado em neonatos diagnosticados com sepse, segundo quadro clínico final (cura ou óbito). Métodos: pesquisa retrospectiva, quantitativa. Os dados foram coletados de prontuários físicos de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) de um Hospital Universitário (n=62). Os neonatos foram divididos em dois grupos: os que sobreviveram e os que vieram a óbito. Depois, foram comparados segundo características demográficas e de vida do neonato; sinais e sintomas; identificação de microrganismos e uso de medicamentos. Os dados foram analisados pelo teste Exato de Fisher (p≤0,05). Resultados: Dos neonatos com diagnóstico de sepse, 82% sobreviveram, dos quais prevaleceram significativamente os com mais de 30 semanas, que permaneceram na UTIN por mais de oito dias (p<0,05). Os neonatos de até 30 semanas que vieram a óbito permaneceram na UTIN por até uma semana. Dentre os sinais e sintomas, apenas a hipotensão foi estatisticamente significativa para o desfecho de óbito (p<0,007). Os microrganismos mais prevalentes foram Staphylococcus coagulase negativa (p>0,05). Para tratamento, 60% usaram a combinação de três ou mais antibióticos, principalmente Gentamicina, Ampicilina, Oxacilina e Amicacina (p>0,05). Conclusão: Os achados reforçam o conhecimento sobre o perfil dos neonatos com sepse e a importância do investimento em intervenções transversais durante o pré-natal, pós-parto e período neonatal, com vistas a reduzir as infecções neonatais e suas consequências.
Palavras-chave: Perfil de saúde, Sepse, Sepse neonatal, Recém-nascido.
Abstract: Background and Objectives: Neonatal sepsis represents one of the main causes of morbidity and mortality in newborns. The aim of the present study was to know the profile, signs, symptoms and treatment performed in newborns diagnosed with sepsis, according to the final clinical condition (cure or death). Methods: retrospective, quantitative study. Data were collected from physical medical records of a Neonatal Intensive Care Unit (NICU) of a University Hospital (n=62). The newborns were divided into two groups: those who survived and those who died. Then, they were compared according to demographic and life characteristics of the newborn; signs and symptoms; identification of microorganisms and use of medicines. Data were analyzed by Fisher’s Exact test. (p≤0,05) and complied with the ethical guidelines (nº 2.133.726). Results: Of the newborns diagnosed with sepsis, 82% survived, of which those aged more than 30 weeks who remained in the NICU for more than eight days prevailed significantly (p<0.05). The newborns who died were aged up to 30 weeks and remained in the NICU for up to one week. Among the signs and symptoms, only hypotension was statistically significant for the outcome of death (p<0.007). The most prevalent microorganisms were coagulase negative Staphylococcus (p>0.05). For treatment, 60% used a combination of three or more antibiotics, mainly Gentamicin, Ampicillin, Oxacillin and Amikacin. Conclusion: the findings reinforce the knowledge about the profile of newborns with sepsis and the importance of investing in cross-sectional interventions during prenatal, postpartum and neonatal periods, in order to reduce neonatal infections and their consequences.
Keywords: Health Profile, Sepsis, Neonatal Sepsis, Infant, Newborn, Nursing.
Resumen: Justificación y objetivos: la sepsis neonatal representa una de las principales causas de morbimortalidad en los recién nacidos. El objetivo de esta investigación fue conocer el perfil, signos, síntomas y tratamiento realizado en neonatos diagnosticados con sepsis, de acuerdo con el cuadro clínico final (cura o muerte). Métodos: investigación retrospectiva, cuantitativa realizada en prontuarios físicos de una Unidad de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) de un Hospital Universitario (n=62). Los neonatos fueron divididos en dos grupos: sobrevinientes y muertos, y fueron comparados según características demográficas y de vida del neonato; signos y síntomas; identificación de microorganismos y uso de medicamentos. Los datos fueron analizados por la prueba exacta de Fisher (p≤0.05) y la investigación cumplió con los preceptos éticos (No. 2.133.726). Resultados: De los neonatos con diagnósticos de sepsis, un 82% sobrevivió, de éstos prevalecieron significativamente los con más de 30 semanas, que permanecieron en la UTIN por más de ocho días (p<0,05). Los recién nacidos de hasta 30 semanas que murieron, permanecieron en la UCIN durante una semana. Entre los signos y síntomas, solo la hipotensión fue estadísticamente significativa para el resultado de la muerte (p<0,007). Los microorganismos más prevalentes fueron los estafilococos coagulasa negativos (p>0.05). Para el tratamiento, 60% usaron la combinación de tres o más antibióticos, principalmente la Gentamicina, Ampicilina, Oxacilina y Amicacina. Conclusiones: los hallazgos refuerzan el conocimiento sobre el perfil de los recién nacidos con sepsis y la importancia de invertir en intervenciones transversales durante el período prenatal, posparto y período neonatal, con miras a reducir las infecciones neonatales y sus consecuencias.
Palabras clave: Perfil de Salud, Sepsis, Sepsis Neonatal, Recién Nacido.
INTRODUÇÃO
Globalmente, a sepse neonatal representa uma das importantes causas de morbimortalidade em recém-nascidos (RN).1 De acordo com os dados da Agência das Nações Unidas, estima-se que esta doença seja responsável por 7% das mortes de crianças menores de 5 anos.1 No Brasil, ela corresponde a uma das principais causas de mortalidade no período neonatal.2
A sepse é definida como uma disfunção orgânica causada por uma resposta sistêmica desregulada do indivíduo à infecção, com potencial desfecho de óbito.3 Com relação aos critérios diagnósticos para sepse em recém-nascidos, principalmente em prematuros, muito tem se discutido, no entanto, não há um consenso globalmente aceito, o que tem dificultado a implementação de critérios nas instituições de saúde.4
O isolamento do microrganismo e exames coadjuvantes, como testes hematológicos e imunológicos, têm sido utilizados para o diagnóstico de sepse, bem como sinais clínicos que incluem: “instabilidade térmica, dificuldade respiratória, hipotonia e convulsões, irritabilidade e letargia, sintomas gastrintestinais, icterícia idiopática, palidez cutânea, sinais de sangramento e até uma avaliação subjetiva (recém-nascido que parece não estar bem)”.5 Contudo, os sinais clínicos são inespecíficos, têm início silencioso e muitas vezes são confundidos com condições próprias da idade, assim como decorrentes da prematuridade, levando muitos casos de sepse a serem tratados por suspeita clínica e infecção não confirmada.
O diagnóstico de sepse se divide em precoce e tardio, de acordo com o tempo de vida do neonato. Os principais fatores de risco à sepse neonatal precoce envolvem fatores maternos, gestacionais e condições imunológicas do recém-nascido. A sepse neonatal tardia está relacionada à assistência à saúde, ou seja, necessidade de intervenções e/ou não cumprimento das normas que previnem as infecções relacionadas à assistência.6
É importante ressaltar que alguns fatores importantes e inerentes ao quadro de sepse neonatal o tornam oneroso para o sistema de saúde, incluindo a demanda por antibióticos de amplo espectro, tempo prolongado de internamento hospitalar e aumento da necessidade de procedimentos invasivos e de alta complexidade.7
A dificuldade diagnóstica de sepse, associada às altas taxas de mortalidade neonatal e ao alto custo à saúde, demonstram a relevância do objetivo deste estudo, que busca conhecer o perfil, os sinais, sintomas e o tratamento realizado em neonatos diagnosticados com sepse segundo quadro clínico final (cura ou óbito).
MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa descritiva, retrospectiva e quantitativa realizada em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) do Hospital Universitário Regional dos Campos Gerais (HURCG), localizado no município de Ponta Grossa, Paraná. Esta unidade é constituída por seis leitos e dois leitos de cuidados intermediários neonatais e é referência para toda a região dos Campos Gerais, que concentra 12 municípios.
Para o estudo, considerou-se o interstício de quatro anos (dezembro de 2013 a dezembro de 2017), relativo ao tempo existente da UTIN em investigação. Foram investigados 330 prontuários eletrônicos de neonatos internados na UTIN, dos quais 268 não se encaixaram e 62 se enquadraram nos critérios de elegibilidade. Deste modo, 19% (n=62) do total de atendidos no referido setor apresentaram os critérios de inclusão e passaram a compor os sujeitos do estudo.
Os critérios de inclusão foram: a) recém-nascidos de 00 a 28 dias de vida; b) ambos os sexos; c) sepse comprovada segundo diagnóstico médico descrito em prontuário; d) nascidos no hospital local do estudo e internados na UTI neonatal e) recém-nascidos transferidos para o hospital de estudo em menos de 24 horas de vida, afim de não perder nenhum sinal clínico que prejudicasse a coleta e precisão dos resultados; e) notificação do Setor de Controle Infecção Hospitalar. Como critérios de exclusão, ponderou-se: a) sem sinais de sepse (n=258); b) sepse provável (n=2) c) óbitos com menos de 24 horas de vida devido à falta de informações relevantes (n=2); d) transferência como desfecho (n=6).
Inicialmente, levantou-se os recém-nascidos que tiveram diagnóstico comprovado de sepse a partir dos prontuários eletrônicos, por meio da evolução médica. Não foram utilizados outros critérios clínicos e de diagnóstico para caracterizar a sepse neonatal, apenas o diagnóstico médico. Como não há consenso mundial acerca do diagnóstico de sepse neonatal, a equipe médica do HURCG leva em consideração os sinais clínicos preconizados pela Anvisa: instabilidade térmica, bradicardia, apneia, intolerância alimentar, piora do desconforto respiratório, intolerância à glicose, instabilidade hemodinâmica e hipoatividade/letargia e exames laboratoriais.2
Em posse das informações de identificação destes sujeitos, partiu-se para a coleta de dados em prontuário impresso. Este contém os exames laboratoriais e dados mais completos que não ficam contidos no sistema online, já que os dados foram angariados por meio das evoluções realizadas pela equipe de enfermagem, médica e de fisioterapia. Para tanto, foi montada uma tabela em Excel contendo todas as variáveis inerentes à pesquisa. Os dados foram coletados nos meses de janeiro a junho de 2018.
O quadro clínico final (cura ou óbito) foi considerado como variável dependente e as variáveis independentes foram: características demográficas e de vida do neonato (sexo, idade gestacional; peso ao nascer; dias de vida; tempo de internação) sinais e sintomas; identificação de microrganismos e uso de medicamentos.
Para classificação do peso ao nascer, foi utilizado o critério da Organização Mundial da Saúde., que classifica como baixo peso (crianças com menos de 2500 g), peso insuficiente (2500 g a 2999 g), peso adequado (3000 g a 3999 g) e excesso de peso (4000 g ou mais). Na análise, foram apresentados os dados classificados em baixo peso (crianças com menos de 2500 g) e em outros, as demais categorias.
Os dados foram lançados em planilha de Excel, analisados descritivamente por meio de frequência absoluta e relativa, e de forma analítica por meio do teste Exato de Fisher considerando o nível de significância de 5%. A análise foi realizada pelo Programa SPSS 18.0.
A pesquisa teve aprovação Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Ponta Grossa, sob o parecer número 2.133.726 CAAE: 69738617.6.0000.5689 e atendeu a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.
RESULTADOS
Verificou-se que 82% dos neonatos diagnosticados com sepse sobreviveram. Entre os sobreviventes, prevaleceram neonatos com mais de 30 semanas e que permaneceram na UTIN por mais de oito dias (p<0,05). No que tange os que vieram a óbito, este foi mais frequente em prematuros de até 30 semanas e que permaneceram na UTIN por até uma semana (p<0,05) (Tabela 1).

Dentre os sinais e sintomas de neonatos internados com diagnóstico de sepse, também foi observada a relação da hipotensão com o desfecho de óbito (p<0,007) (Tabela 2).

A maioria dos neonatos não teve o patógeno causador da sepse identificado. Dos que tiveram (35%), os principais foram o do gênero Staphylococcus coagulase negativa, com destaque para a espécie Staphylococcus epidermidis, mas sem diferença significativa (p>0,05). Para tratamento da sepse, 60% usaram a combinação de três ou mais antibióticos, com destaque para a Gentamicina, Ampicilina, Oxacilina e Amicacina (Tabela 3).

DISCUSSÃO
O presente estudo encontrou alta frequência (82%) de sobrevivência de neonatos com sepse. No entanto, em estudo realizado no Peru, 76,47% dos recém-nascidos diagnosticados com sepse sobreviveram9, enquanto no estudo realizado em hospital da Bélgica, a prevalência foi maior, de 89,47%.10
A heterogeneidade na sobrevida dos neonatos diagnosticados com sepse pode estar relacionada a diferentes aspectos considerados em cada estudo, a saber: divergência e inespecificidade do diagnóstico de sepse, escolha do tratamento empírico, a gravidade clínica dos recém-nascidos incluídos no estudo, fatores maternos que antecederam o nascimento, assistência prestada e condições socioeconômicas dos locais dos estudos em comparação.4,7,10-14.
Neste estudo, a idade gestacional mostrou-se um fator importante relacionado ao óbito, pois 64% dos óbitos dos RN diagnosticados com sepse ocorreram naqueles com idade gestacional menor que 30 semanas, classificados como prematuros extremos. A literatura mostra que a prematuridade é um fator de risco para o desenvolvimento de sepse15,16, assim como a sepse neonatal e a própria prematuridade são fatores de risco para óbitos neonatais.1,12 A predisposição de prematuros a infecções está relacionada à incompleta capacidade de defesa do organismo contra patógenos, pela vulnerabilidade para hipotermia, e a imaturidade do sistema imunológico e da barreira epidérmica.17,18
Além disso, apesar de não ter dado diferença significativa, 91% dos RN que evoluíram para o óbito pesavam menos que 2.500 g. Esses dados são um sinal de alerta para o risco de óbito nos pacientes com sepse, uma vez que a literatura aponta que o risco para infecções e óbito é maior quando há relação destas duas, principalmente infecções de corrente sanguínea relacionadas ao serviço de saúde.12 A razão é que o peso ao nascer demanda, em sua maioria, internações prolongadas e procedimentos e dispositivos invasivos.17
Quanto ao tempo de internamento, os resultados mostraram que em 45% dos RN que foram a óbito, este tempo foi inferior a sete dias. A sepse está entre as morbidades que contribuem para o aumento da internação hospitalar.19 No entanto, a literatura aponta que no período neonatal precoce (zero-seis dias de vida), as condições do parto e a prematuridade são as condições mais relacionadas com óbito, enquanto no período neonatal tardio (sete-27 dias de vida), as infecções são as mais comuns.20 Portanto, a relação encontrada entre óbitos e tempo de internação de até sete dias deve ser vista com cautela, já que pode estar mais relacionada com a prematuridade do que com a sepse, condição que coaduna com os achados supracitados.
Com relação àqueles que ultrapassaram o período neonatal precoce, o tempo de internamento ultrapassou 31 dias para 45% dos pacientes. Em outro estudo19, 90% dos RN com diagnóstico de sepse permaneceram internados pelo menos até o 40º dia de vida. Apesar da diferença entre os dados, em ambos os grupos foi observado elevado tempo de internação em decorrência do quadro de sepse, o que resulta em aumento dos custos com procedimentos, tratamento e dias de hospitalização. Isso ocorre devido à dificuldade de diagnóstico precoce e condições inerentes ao próprio tratamento do RN.4,6 Daí a sugestão de investimentos em implementação de protocolos para diagnósticos precoce, tratamentos mais específicos e eficazes, e ações preventivas oportunas, adequadas e efetivas.4,6
Sobre sinais e sintomas dos RN com sepse, a hipotensão, isoladamente, representou um sinal preditivo ao óbito, e dentre os sinais e sintomas, foi o único que apresentou associação ao desfecho. Este fato pode ser explicado pela hipotensão ser um sinal importante de choque hipotensivo, neste caso séptico, e diante deste quadro, a evolução ao óbito pode ocorrer em minutos. A hipotensão arterial pode levar à hipoperfusão tecidual, a qual inclui acidose lática, oligúria ou alteração aguda do estado mental21. Deste modo, é importante que nos primeiros sinais de queda da pressão arterial, a atuação da equipe de saúde seja rápida para reversão precoce do choque séptico neonatal e a adoção das práticas voltadas para a recuperação hemodinâmica precoce, com ressuscitação volumétrica e drogas vasoativas, visando uma melhor taxa de sobrevida21.
Ainda em relação aos sinais e sintomas encontrados, sem comparar o desfecho clínico, houve maior frequência de taquipneia, palidez cutânea, letargia, distensão abdominal, êmese e resíduo gástrico/dificuldade de aceitação alimentar. No Brasil, a Anvisa determinou critérios diagnósticos para sepse incluindo a instabilidade térmica, bradicardia, apneia, intolerância alimentar (resíduos gástricos, êmese, distensão abdominal ou alças visíveis no abdome), piora do desconforto respiratório, intolerância à glicose, instabilidade hemodinâmica (palidez cutânea, má perfusão periférica, extremidades frias, redução do débito urinário) e hipoatividade/letargia.2 Esses critérios condizem com aqueles encontrados nos pacientes deste estudo, contudo, alguns deles foram descritos com menor frequência, o que pode ser explicado pela ausência de registro dessas informações em prontuário17 e pela própria inespecificidade dos sinais e sintomas de sepse. Portanto, quando os profissionais de saúde se depararem com RN apresentando estes sinais e sintomas, devem tomar medidas imediatas, realizar monitoramento ainda mais intensificado e seguir protocolos adequados para manejo efetivo destes pacientes.
Apesar de não haver diferença significativa em relação ao desfecho, os microrganismos mais prevalentes encontrados nos RN com sepse foram os Staphylococcus coagulase negativa (SCN), o que coaduna com estudos apresentando as bactérias gram-positivas como as maiores causadoras de sepse neonatal, em especial a SCN.9,10,17
Das espécies de SCN, o Staphylococcus epidermidis – que apareceu com maior frequência neste estudo – é uma bactéria predominante na microbiota da pele. A alta prevalência deste patógeno na sepse pode ser decorrente de inúmeros procedimentos invasivos e longos tratamentos necessários em recém-nascidos internados em UTIN, principalmente prematuros, que destroem a integridade da pele, o que, juntamente com a capacidade reconhecida da referida bactéria em formar o biofilme em dispositivos invasivos, facilita sua entrada na corrente sanguínea.
Embora tenham sido identificados microrganismos, os dados mostram que 65% dos diagnósticos de sepse não tiveram o patógeno identificado. Tal condição demonstra a necessidade de a instituição investir na implementação de protocolos que tornem obrigatória a realização da hemocultura em todos os pacientes com suspeita de sepse, com o devido registro do resultado no prontuário. Isto se justifica pela hemocultura ser considerada padrão ouro para o diagnóstico de sepse.
No entanto, os resultados de cultura necessitam de pelo menos 48 a 72 horas para o crescimento do microrganismo, e além disso, frequentemente apresentam resultados falso-negativos pela coleta inadequada, principalmente com relação à quantidade insuficiente de sangue das amostras.15,21 Diante desses fatores, o tratamento com antimicrobianos é comumente iniciado de forma empírica, levando em consideração os fatores de risco perinatais ou sinais clínicos sugestivos de sepse e utilizando marcadores que auxiliam na tomada de decisão quanto ao tratamento mais adequado.15
Assim como os microrganismos, os antibióticos não mostraram associação com o desfecho, pois em 98% dos pacientes diagnosticados com sepse, a escolha pelo antimicrobiano iniciou com a combinação de ampicilina e gentamicina. No entanto, a combinação de oxacilina e amicacina também foi utilizada por 52% dos pacientes. Esses dados revelam que aproximadamente metade dos pacientes que iniciaram tratamento com ampicilina e gentamicina não apresentaram melhora clínica/laboratorial, o que demandou a troca de antibióticos. Situação similar foi encontrada em estudo do Peru, em que a troca de antibioticoterapia aconteceu em 58% dos neonatos por não apresentarem melhora.9 Um dos motivos que levam a esta troca é a escolha empírica pelo esquema de tratamento com antimicrobianos, principalmente na sepse precoce. Nessa situação, considera-se a etiologia dos patógenos a partir de estudos epidemiológicos da região/localidade/hospital em questão, mas a terapia pode não ser eficaz. A certeza do tratamento pode vir com o resultado da hemocultura e antibiograma, indicando a troca ou permanência do antibiótico mais adequado para o patógeno em questão.23
A associação de penicilina ou ampicilina e gentamicina é recomendada pela Organização Mundial de Saúde como a mais adequada para o tratamento empírico de sepse relacionada à gestação e a complicações no parto, reiterando que o objetivo desta recomendação está em combater os principais patógenos relacionados à sepse precoce (B streptococcus e Escherichia coli).24 Para a sepse tardia, em que as infecções estão relacionadas à assistência, recomenda-se o tratamento empírico com a combinação de oxacilina e amicacina como primeira opção, e vancomicina e cefepima como segunda opção.25 Por fim, o uso do metronidazol ou da anfotericina são as escolhas para quadros de sepse com confirmação ou suspeita de infecção fúngica.
Os dados do presente estudo devem ser vistos com cautela, uma vez que são representativos de único hospital e um número pequeno de sujeitos foi avaliado, condição que dificulta maior precisão nas análises estatísticas. Contudo, o estudo não perde seu grau de importância por sua contribuição com o conhecimento sobre a sepse neonatal, abordagem ainda pouco explorada no campo científico. Deste modo, sugere-se que novas pesquisas sejam intensificadas neste contexto, especialmente em caráter nacional, com vistas a potencializar o conhecimento sobre o assunto, promover estratégias preventivas e qualificar a equipe de atenção à saúde para uma assistência mais efetiva, com redução cada vez maior do número de óbitos neonatais por sepse.
Essas intervenções incluem, entre outros, condições adequadas de alimentação materna, triagem e tratamento de infecções maternas e vacinação em tempo oportuno no pré-natal; garantia de assistência segura no parto e profilaxia com antibióticos, quando em presença de colonização bacteriana; aleitamento materno exclusivo e uso de antibiótico profilático para o recém-nascido com risco para sepse precoce.
Os achados do presente estudo reforçam o conhecimento sobre o perfil dos neonatos com sepse e a importância do investimento em intervenções transversais durante o pré-natal, o pós-parto e o período neonatal, com vistas à redução das infecções neonatais e suas consequências.
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