
Recepción: 13 Noviembre 2019
Aprobación: 11 Febrero 2020
DOI: https://doi.org/10.17058/jeic.v1i1.14476
Resumo: Justificativa e objetivos: descrever o perfil epidemiológico das violências interpessoais e/ou autoprovocadas atendidas em um hospital público do Paraná entre 2014 e 2018. Métodos: estudo descritivo de fonte de dados secundários, coletados a partir do banco de dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e notificados pelo Núcleo de Vigilância Epidemiológico Hospitalar (NVEH). Resultados: foram notificados 1645 casos de violência. Destes, 1488 (90,4%) casos foram considerados interpessoais e 157 (9,6%) autoprovocados. A faixa etária predominante foi de 1 a 4 anos (26,6%) e a cor/raça branca (83,2%) predominou. O tipo de violência predominante foi negligência/abandono e prevaleceram violências ocorridas na residência. O grau de parentesco com a vítima predominante foi pai e mãe. Conclusão: O tipo de violência predominante foi negligência/abandono. Quanto às características da vítima, não houve diferença entre masculino e feminino, incluiu indivíduos predominantemente brancos, escolaridade não informada, idades entre 1 e 4 anos e residentes na área urbana. Quanto ao autor da violência, prevaleceram os casos em que a mãe foi notificada como autora, e o meio da agressão foram os casos caracterizados como outro tipo de agressão.
Palavras-chave: Violência, Sistema de Informação em Saúde, Epidemiologia, Vigilância em Saúde Pública.
Abstract: Justification and Objective: describe the epidemiological profile of interpersonal violence and/or self-harm treated at a public hospital in Paraná between 2014 and 2018. Methods: descriptive study of secondary data sources collected from the database of the Information System on Diseases of Compulsory Declaration (Portuguese acronym: SINAN) notified by the Hospital Center of Epidemiological Surveillance (Portuguese acronym: NVEH). Results: the total of 1645 cases of violence were reported, out of which 1488 (90.4%) cases of interpersonal violence and 157 (9.6%) of self-harm. The age group of 1 to 4 years (26.6%), and white color (83.2%) predominated. The predominant type of violence was neglect/abandonment and violence occurring at home prevailed. The predominant degree of kinship with the victim was father and mother. Conclusion: the predominant type of violence was neglect/abandonment. The victims’ characteristics showed no difference between male and female, predominance of white individuals, uninformed schooling, age between 1 and 4 years old, residents in the urban area. As for the perpetrator of violence, cases in which the mother was notified as the author prevailed, and the means of aggression were cases characterized as ‘other type of aggression’.
Keywords: Violence, Health Information System, Epidemiology, Public Health Surveillance.
Resumen: Justificación y objetivos: describir el perfil epidemiológico de la violencia interpersonal y/o autoinfligida en un hospital público de Paraná entre 2014 y 2018. Métodos: un estudio descriptivo de fuentes de datos secundarias, recopilado de la base de datos del Sistema de Información de Enfermedades de Declaración Obligatoria (Acrónimo en portugués: SINAN) notificado por el Centro de Vigilancia Epidemiológica del Hospital (Acrónimo en portugués: NVEH). Resultados: se reportaron 1645 casos de violencia, de los cuales 1488 (90,4) interpersonales y 157 (9,6%) autoinfligidos. El grupo de edad predominante fue de 1 a 4 años (26,6%), y predominó el color blanco de la piel (83,2%). El tipo de violencia que predominó fue abandono/negligencia y prevaleció la violencia ocurrida en el hogar. El grado de parentesco con la víctima predominante fue padre y madre. Conclusión: el tipo predominante de violencia fue abandono/negligencia. En cuanto a las características de la víctima, no hubo diferencia entre hombres y mujeres, ya que se componía de individuos predominantemente blancos, con escolarización no informada, entre las edades de 1 a 4 años, que vivían en el área urbana. En cuanto al autor de la violencia, prevalecieron los casos en que se notificó a la madre como autor, y los casos se caracterizaron como otro tipo de agresión como medio de agresión.
Palabras clave: Violencia, Sistema de Información en Salud, Epidemiología, Vigilancia de Salud Pública.
INTRODUÇÃO
Conforme a Portaria nº 1.271, de 6 de junho de 2014, define-se por violência todo e qualquer tipo de dano à integridade física ou mental que provoque agravos nocivos, como acidente, intoxicações por substâncias químicas, abuso de drogas ou lesões por violências autoprovocadas, agressões e maus tratos1.
Segundo dados apresentados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), no ano de 2016, houve 62.517 homicídios, equivalendo a uma taxa de 30,3 mortes por cada 100 mil habitantes e a 30 vezes a taxa da Europa. Nas regiões Nordeste e Norte do Brasil, predominam as maiores taxas em relação às demais regiões do país, com índices que variam entre 46,9 a 64,7 por 100 mil habitantes2.
O panorama global dos dados de homicídios vem caindo, como na Ásia e Europa, enquanto nas Américas e África Ocidental, esses dados ainda refletem de forma elevada a necessidade de políticas públicas em defesa dos direitos das minorias, como, raça, cor e gênero, desigualdades sociais, desigualdades salariais, entre outras. 2-3
Sobre as lesões autoprovocadas, a saúde mental é parte fundamental do bem-estar geral do indivíduo e seu papel na sociedade, dado que doenças mentais são responsáveis por elevados graus de incapacidade, que por sua vez, elevam as taxas de mobilidade e mortalidade. O suicídio é uma das dez principais causas de morte, principalmente entre a faixa etária dos 15-29 anos e considerado a segunda principal causa de morte no mundo4.
Políticas públicas que garantam os direitos das populações vulneráveis têm sido assunto em reuniões e congressos nas discussões traçadas sobre o tema. Dentre essas, destacamos a implantação de leis específicas e incorporação a pautas de temas de interesse público, como a Lei da Palmada5, implantada em 2014, o Estatuto da Criança e do Adolescente6 e alterações nas investigações de Violência Interpessoal/Autoprovocada, a qual inclui definições de orientação sexual e identidade de gênero, contribuindo para garantia social desta população1.
Os impactos sociais causados pela violência em qualquer grupo social merecem prioridade na sensibilização coletiva, tanto nos serviços de saúde, quanto no acolhimento das vítimas deste agravo. Pensando neste pressuposto, a investigação por parte dos profissionais que atendem vítimas de violência é necessária, pois a subnotificação ainda é um dos grandes fatores que determinam a falta de conhecimento e atuação para combater tal problema7.
Definida como Notificação Compulsória por meio da Portaria nº 104 de 25 de janeiro de 20117, a Violência Interpessoal/Autoprovocada é de notificação obrigatória a qualquer serviço de saúde e a identificação e investigação podem ser realizadas por qualquer profissional de saúde que preste assistência à vítima. Dessa forma, estas se transformam nas principais ferramentas no atendimento à vítima, proporcionam o conhecimento sobre a ocorrência e auxiliam no conhecimento epidemiológico da situação em saúde.
A violência nos últimos tempos tem sido tema de várias discussões ao redor do mundo, com o objetivo principal de analisar os principais fatores que contribuem para sua ocorrência, a fim de elaborar planos de ação para seu combate.
Diante do exposto, a pesquisa em questão norteou-se através da seguinte indagação: qual o perfil dos casos de violência interpessoal/autoprovocada atendidos em um hospital público no interior do Paraná? A fim de responder a indagação, este estudo descreveu as características epidemiológicas das violências interpessoal/autoprovocada notificadas junto ao Núcleo de Vigilância Epidemiológica Hospitalar em um hospital público de ensino no período de 2014 a 2018.
MÉTODOS
Estudo descritivo, retrospectivo, de abordagem quantitativa. Foi realizado em um hospital público universitário do Paraná, precisamente junto ao Núcleo de Vigilância Epidemiológica Hospitalar (NVEH). Os dados foram coletados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), de Violência Interpessoal/Autoprovocada através de fichas de investigação instituídas pela Portaria GM/MS nº 1.271, de 06 de junho de 2014 como notificações compulsórias, incluídas no SINAN no período de janeiro de 2014 a dezembro de 2018. Essas fichas incluem dados sociodemográficos da vítima e do autor, preenchidos pelo profissional de saúde que presta o primeiro atendimento. Os dados são coletados para caracterizar o agravo, de maneira pré-estabelecida, em ordem cronológica, com informações de múltipla escolha.
Para delimitar o estudo, as variáveis estudadas relacionadas com a vítima foram: sexo; faixa etária; raça/cor; escolaridade; zona de residência. Quanto ao ato da violência, foram selecionadas as variáveis: local de ocorrência; vínculo/grau de parentesco; tipo de violência; meio de agressão; sexo do provável autor da violência e idade do autor.
Os dados foram coletados e tabulados em planilhas no Excel, e realizadas análises descritivas (frequência simples e relativas).
Este estudo faz parte de um projeto de pesquisa mais amplo que incluiu a caracterização do perfil das doenças e agravos de notificações obrigatória e das infecções relacionadas com a assistência em saúde, o qual foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa que Envolve Seres Humanos, conforme parecer número 2.751.985 e CAAE 90600318.3.0000.0107, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE, respeitando as diretrizes da Resolução 466 de 2012.
RESULTADOS
No período de estudo, foram notificados 1645 (100%) casos de violência interpessoal/autoprovocada no NVEH, das quais 1488 (90,4%) foram violência interpessoal e 157 (9,5%) foram lesões autoprovocadas. Em relação ao tipo de violência, ocorreram 1006 (61,1%) notificações de negligência/abandono, seguidas por 606 (36,8%) casos de violência física; 92 (5,5%) casos de violência sexual; 82 (4,9%) casos classificados como outras violências; 41 (2,4%) casos de violência psicológica/moral; nove (0,5%) casos de violência financeira; oito (0,4%) de tráfico infantil e quatro (0,2%) de tortura.
Não houve diferença na frequência de casos notificados em relação ao sexo. Em relação à distribuição por faixa etária, foram 439 (26,6%) casos entre indivíduos 1 a 4 anos e 221 (13,4%) entre 5 e 9 anos (Tabela 1).
Para raça/cor, prevaleceu a branca com um total de 1370 casos (83,2%). Quanto à escolaridade, predominou a variável não se aplica, com 711 casos (43,2%), em seguida, de 5ª a 8ª série com 218 casos (13,1%), seguidos pelo ensino médio incompleto com 138 casos (8,3%). Sobre a área de residência, houve predomínio da área urbana com 1503 casos (91,36%). O ano de 2017 apresentou 386 casos (94,1%) notificados, seguido do ano de 2014 com 319 (94,3%) e o ano de 2018 teve 310 casos (87,5%).

Ao analisar o tipo de violência conforme as faixas etárias predominantes, prevaleceram os casos de negligência/abandono entre crianças de 1 a 4 anos, sendo 415 (94,5%) do total para essa faixa etária. Entre as idades 5 a 9 anos, esse tipo de violência também prevaleceu, com um total de 201 (90,9%) do total de notificações, e entre 10 a 14 anos de idade, esse tipo de violência também se sobressaiu, com 127 (75,1%) das notificações.
A violência física foi o segundo tipo de violência predominante e ocorreu em maior frequência entre jovens e adultos, sendo 66,6% na faixa etária de 15 a 19 anos. Em 21,7% dos casos, o autor era desconhecido, em 16,3% o autor era a mãe e em 13% dos casos, o pai.
Quanto ao sexo do provável autor da violência, predominaram os casos que envolveram ambos os sexos, com 592 casos (35,9%), seguidos daqueles causados pelo sexo feminino com 456 (27,7%) casos, e o sexo masculino com 453 (27,5%) dos casos. Casos onde o campo foi ignorado ou não preenchido totalizaram 143 (8,6%).
Quando analisamos o sexo do autor para os dois tipos de violências predominantes, em 555 (55,1%) de 1006 (100%) casos de negligência/abandono, ambos os sexos predominaram, seguidos do sexo feminino em 344 (34,1%) casos e do sexo masculino em 78 (7,7%) casos; em 29 (2,8%) casos não foi possível identificar o sexo do autor da violência. Para os casos de violência sexual, o sexo do autor que predominou foi o masculino, com 319 (52,7%) de 605 casos (100%) para esta violência, seguido do gênero feminino com 93 (15,3%) casos, e após, ambos os gêneros com 83 (13,6%) casos, e em 110 (18,1%) casos, esse dado foi ignorado.

Quando correlacionados os vínculos predominantes dos autores da violência e as faixas etárias predominantes no estudo, em 393 (89,5%) casos, a mãe foi o autor da violência em casos da faixa etária de 1 a 4 anos. Entre a faixa etária 5 a 9 anos, 183 (82,8%) casos foram causados pela mãe e 136 (61,5%) pelo pai. Entre 15 a 19 anos, sobressaíram 65 (30%) casos em que o autor foi a mãe, e 58 (26,8%) que tiveram o pai como autor da violência dos 216 (100%) casos nessa faixa etária.
O meio utilizado para violência é descrito na tabela 3, a seguir:

Nos casos em que predominou outro tipo de agressão, houve predominância de negligência/abandono, com 548 (69,3%) deste total, seguido de 73 (9,2%) para envenenamento/intoxicação e 169 (21.3%) para outros. Das violências caracterizadas como físicas, em um total de 243 (81,2%) casos de 299 (100%), foi utilizada força corporal/espancamento como meio de agressão, seguidos de 56 (18,7%) que utilizaram objeto perfurocortante como meio da agressão.
DISCUSSÃO
Na análise do tipo de violência predominante e da idade da maioria das vítimas, as reflexões apontam contextos sociais similares aos de estudos em que a negligência foi a violência prevalente entre crianças. Possíveis agravantes foram, na maioria dos casos, a mãe ser o único guardião legal ou quem passa a maior parte do tempo com a criança, além de, na maioria dos casos, o vulnerável encontrar-se sem escolhas e suscetível a sofrer algum tipo de acidente ou violência por causas internas ou externas8. A presença ou ausência da figura paterna contribui diretamente como fragilidade e acarreta diversos agravantes, como a violência doméstica. Elos frágeis podem prejudicar laços afetivos entre pais e filhos e propiciar um ambiente insalubre para convivência9.
Um estudo aponta que na maioria dos casos de violência, a falta de saúde e proteção configuram 35% e 26,1%, respectivamente, entre os maiores agravantes de complicações relacionados à violência/negligência8.Neste contexto, podemos ressaltar os resultados apresentados pelo tipo de violência, onde a variável ‘outro tipo de agressão’ caracteriza 790 (48%) casos notificados. Tais agressões são muitas vezes definidas por luxações, contusões, entorses e fraturas, resultados que, sem intenções, configuram cerca de 31,5% dos casos entre crianças.10 Estima-se que a violência física esteja presente em cerca de 6024 (43,5%) dos casos, seguida de violência emocional com 4613 (33,3%)11 casos, ou seja, uma variável abrangente para caracterizar o meio da violência contra a vítima.
Neste estudo, não foi encontrada prevalência entre os sexos das vítimas, o que representou aproximadamente 50% do total dos casos para ambos os sexos. Estes dados igualam-se a estudos realizados sobre perfis epidemiológicos de violências dentre diferentes faixas etárias.12-14
Existe uma distribuição significativa entre os anos de idades na faixa etária de 5 a 34 anos, com observância para as faixas etárias que marcam o início e final da vida adulta. Neste estudo, a predominância foi dos casos de violência interpessoal, mas não podemos excluir as lesões autoprovocadas, que ainda vagam por um universo imensurável. O boletim que registra o perfil epidemiológico dos casos de violência autoprovocada e óbitos por suicídio entre jovens de 15 a 29 anos no Brasil entre os anos de 2011 e 2018, descreve que 52.444 (34,0%) casos foram classificados como tentativas de suicídio, com concentração nas faixas etárias de 15 a 29 anos de idade. O estado do Paraná apresentou 15.683 (10,1%) das notificações nesse período, e foi o terceiro estado com o maior número de tentativas de suicídio no Brasil.15
Na variável raça/cor, houve predomínio da cor branca. Este resultado pode ser explicado pela região onde foi realizado o estudo, colonizada por imigrantes alemães e italianos, que prevalecem como a população atual residente.16
A faixa etária da vítima que prevaleceu foi de 1 a 4 anos, seguida por 5 a 9 anos e 15 a 19 anos. Outro estudo, de 2011, registrou 17.900 casos de violência infantil na faixa etária de 2 a 5 anos (6.401), correspondendo a um percentual de 35,8% das violências.13Outro estudo analisou o perfil das violências contra crianças no ambiente familiar e relatou uma média de idade parecida, que permeava entre 4,61 e 6,72 anos de idade.14-17
Sobre a escolaridade das vítimas de violências, a distribuição mais frequente foi o campo ‘não se aplica’, com 711 casos (43,2%). Este achado justifica-se pela prevalência da distribuição das agressões por faixa etária entre menores não escolarizados, seguida de 218 (13,1%) casos para 5ª a 8ª série incompleta e 138 (8,3%) para ensino médio incompleto. Em um estudo, a faixa etária predominante da vítima foi de 0 a 1 ano, incluindo cerca de 5.909 (62,4%) do total das violências. Essa faixa etária é uma fase da vida ainda não escolarizada e um dado corroborado por este estudo. Na sequência, está a faixa etária de 6 a 9 anos, idade em que a vítima está no ensino fundamental.18
Baseado na área de residência da vítima, a maior concentração foi na área urbana, caracterizada como crítica no aspecto diferenciação político social, maior concentração de pessoas e famílias e propensão para identificar a grande maioria dos casos de violência.18
Correspondente ao local de ocorrência da violência, neste estudo, 62% dos casos aconteceram na residência, seguidos de 20,8% em via pública, em consonância com estudos realizados sobre o mesmo tema e com a mesma variável analisada, os quais expressaram ocorrência de 60 a 75% dos casos no domicílio.11,18-20 Estes dados podem ser correlacionados com o vínculo/grau de parentesco, no qual prevaleceram duas variáveis (pai e mãe), e expressados também em outros estudos sobre violência, que apresentaram pai e mãe como os principais autores de violência nos casos de negligência em 50% dos casos (média).21 Um dos fatores que influenciam diretamente essas características e encontrado em análise da situação familiar nos casos de violência doméstica, foi a evidência de que filhos de pai desempregado tinham 2,8 vezes mais chances de serem vítimas de abuso físico.17
Com base nas variáveis que expressam dados do autor da violência, pode ser analisada a predominância em ambos os sexos, com 35,9% dos casos notificados. Houve atuação de dois suspeitos nos casos de violência e equiparação entre feminino e masculino em casos onde apenas um foi o autor do agravo, com 27,5 e 27,7% dos casos, consecutivamente. Grande parte dos estudos traz um percentual mais elevado ao comparar os agressores, com a mãe como possível autor predominante em cerca de 42,9% dos casos, e o pai em 33,3%. Este dado retrata o perfil da constituição da família, em que na maioria dos casos, apenas a mãe e a criança vivem no domicílio.13-17
Além disso, as vítimas de famílias monoparental possuem cerca de quatro vezes mais chances de sofrer abusos físicos, em comparação com vítimas de famílias contendo ambos os pais. Estaria mais relacionado ao fato, a punição ser um dos preditores para acontecimento da violência. Particularmente, a investigação sobre maus tratos à criança demonstra consistentemente que a forma mais comum de violência física contra crianças é a punitiva, causada por um cuidador como medida disciplinar.17-23
Este estudo buscou conhecer as características das vítimas de violência interpessoal/autoprovocada e com isto, suscitar uma discussão urgente e relevante em saúde pública: informações sobre as populações que necessitam de intervenções preventivas e os fatores de risco e de proteção. A violência impõe uma carga pesada no bem-estar social e econômico da população, é um fenômeno universal sem limites culturais, sociais, ideológicos ou geográficos e envolto por um pacto de silêncio, o principal responsável pelo ainda tímido diagnóstico e reduzido número de notificações. A subnotificação esteve presente nos achados deste estudo, o que dificultou a construção do real perfil da população vítima de violência. Apesar da notificação ser uma obrigatoriedade de todo profissional de saúde, nada impede que o cidadão denuncie, relate e ajude todo caso de suspeita de violência. A violência não constitui somente um problema de saúde ou social, vai muito além e envolve outras áreas de atuação e saberes.
Este estudo mostrou que os pais são os maiores causadores da violência, principalmente contra crianças menores de cinco anos, e a mãe destaca-se como a maior agressora. A violência precisa cada vez mais sair da invisibilidade, vencer as inúmeras dificuldades vivenciadas no seu enfrentamento e superar a gravidade da sua natureza.
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