Conhecimento, imunização contra hepatite B e uso das medidas de biossegurança por estudantes da área da saúde em uma universidade no interior de Minas Gerais, Brasil
Knowledge, immunization against hepatitis B and use of biosafety measures by students of the health area at a University in the interior of Minas Gerais, Brazil
Conocimiento, imunización contra hepatites B y uso de las medidas de bioseguridad por estudiantes del área de la salud em uma Universidad em el interior de Minas Gerais, Brasil
Conhecimento, imunização contra hepatite B e uso das medidas de biossegurança por estudantes da área da saúde em uma universidade no interior de Minas Gerais, Brasil
Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, vol. 10, núm. 1, pp. 38-45, 2020
Universidade de Santa Cruz do Sul

Recepción: 03 Julio 2019
Aprobación: 26 Septiembre 2019
Resumo: Justificativa e Objetivo: O vírus da hepatite B tem alta prevalência mundial, com forte impacto na saúde pública, o que justifica as estratégias de vigilância e prevenção dos possíveis agravos. O risco da exposição ao vírus entre os estudantes e profissionais de saúde constitui uma grande preocupação mostrando-se baixa a adesão desse público as medidas de biossegurança. O objetivo foi avaliar o conhecimento, imunização contra hepatite B e uso das medidas de biossegurança por estudantes da área da saúde em uma universidade no interior de Minas Gerais, Brasil. Métodos: Estudo transversal, descritivo, com aplicação de questionário, de autopreenchimento, a estudantes da área da saúde composto por variáveis sociodemográficas e referentes ao tema biossegurança. Resultados: Dentre os 540 estudantes que participaram do estudo, 37,2% declararam não ter conhecimento sobre biossegurança, e desse total, 28,9% não foram vacinados contra a hepatite B, 32,4% dos estudantes consideraram que não estavam expostos ao vírus da hepatite B, e desses 25,7% não eram vacinados. Ainda o estudo mostrou que 13,3% dos estudantes não usavam luvas e destes 41,7% não eram vacinados. Conclusão: Verificou-se que existem lacunas em relação ao conhecimento e uso das medidas de biossegurança, entre estas, a falha da imunização contra hepatite B. Neste sentido, faz-se necessária a adoção de políticas de educação permanente com inclusão sistemática do tema biossegurança e adoção de mecanismos que garantirão a imunização desses estudantes.
Palavras-chave: Contenção de Riscos Biológicos, Biossegurança, Hepatite B, Educação permanente.
Abstract: Rationale and Objective: The hepatitis B virus has a high global prevalence, with a strong impact on public health, which justifies strategies for surveillance and prevention of possible diseases. The risk of exposure to the virus among students and health professionals is a major concern showing that public adherence to biosafety measures is low. The objective was to evaluate knowledge, immunization against hepatitis B and use of biosafety measures by students of the health area at a university in the interior of Minas Gerais. Methods: Cross - sectional, descriptive study with self - filling questionnaires to health students composed of sociodemographic variables and about biosafety. Results: Of the 540 students who participated in the study, 37.2% declared that they did not know about biosafety, and of that total, 28.9% were not vaccinated against hepatitis B, 32.4% of the students considered that they were not exposed to biosafety hepatitis B virus, and of these 25.7% were not vaccinated. Still the study showed that 13.3% of the students did not use gloves and of these 41.7% were not vaccinated. Conclusion: It was verified that there are gaps in the knowledge and use of biosafety measures, among them, the failure of immunization against hepatitis B. In this sense, it is necessary to adopt policies of permanent education with systematic inclusion of biosafety and the adoption of mechanisms that will guarantee the immunization of these students.
Keywords: Containment of Biohazards, Hepatitis B, Education Continuing.
Resumen: Justificación y Objetivos: El virus de la hepatitis B tiene alta prevalencia mundial, con fuerte impacto en la salud pública, lo que justifica las estrategias de vigilancia y prevención de los posibles agravios. El riesgo de exposición al virus entre los estudiantes y los profesionales de la salud constituye una gran preocupación por la baja de la adhesión de este público a las medidas de bioseguridad. El objetivo fue evaluar el conocimiento, inmunización contra hepatitis B y el uso de las medidas de bioseguridad por estudiantes del área de la salud en una universidad en el interior de Minas Gerais. Métodos: Estudio transversal, descriptivo, con aplicación de cuestionario, de auto-relleno, a estudiantes del área de salud compuesto por variables sociodemográficas y sobre el tema bioseguridad. Resultados: Entre los 540 estudiantes que participaron en el estudio, el 37,2% declaró no tener conocimiento sobre bioseguridad, y de ese total, el 28,9% no fueron vacunados contra la hepatitis B, el 32,4% de los estudiantes consideró que no estaban expuestos al riesgo, virus de la hepatitis B, y de ese 25,7% no eran vacunados. Aún el estudio mostró que el 13,3% de los estudiantes no usaban guantes y de los 41,7% no eran vacunados. Conclusión: Se verificó que existen lagunas en relación al conocimiento y uso de las medidas de bioseguridad, entre éstas, el fallo de la inmunización contra hepatitis B. En este sentido, se hace necesaria la adopción de políticas de educación permanente con inclusión sistemática del tema bioseguridad y la adopción de mecanismos que garantizarán la inmunización de esos estudiantes.
Palabras clave: Contención de Riesgos Biológicos, Hepatitis B, Educación Continua.
INTRODUÇÃO
A infecção pelo Vírus da Hepatite B (VHB) é a principal causa de quadros de hepatite crônica, cirrose hepática e carcinoma hepatocelular, sendo que a transmissão do agente infeccioso se dá por contato sexual, por material contaminado de uso de assistência à saúde ou serviços de estética, por infusão de sangue e derivados como também por transmissão vertical.1-3 Nos ambientes assistenciais de saúde a taxa de incidência de infecção pelo VHB é alta devido, principalmente, ao risco associado à exposição ocupacional4.
O VHB foi responsável por 1,34 milhão de mortes em 2015, sendo este dado compatível às mortes causadas por tuberculose e HIV. De acordo com a Organização Pan Americana de Saúde, as hepatites virais são consideradas um grande desafio para a saúde pública.5,6 As principais estratégias utilizadas no combate a infecção pelo VHB incluem, principalmente, (i) a vacinação de estudantes e profissionais da área da saúde, (ii) o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e (iii) o gerenciamento pós-exposição.5,7 Porém, sabe-se que a população não atende às recomendações e que a maioria dos indivíduos vacinados não realiza o acompanhamento da imunização por meio de exames laboratoriais, que confirmem ou não a eficácia da imunização, como marcadores séricos de imunidade (anti-HBs) e, ou a avaliação da presença do antígeno de superfície do VHB (HBsAg) e a quantificação do vírus na corrente sanguínea (carga viral/VHB-DNA)2.
Estima-se que 257 milhões de pessoas estejam infectadas pelo VHB vírus da hepatite B5. A prevalência da hepatite B é mais alta na Região Ocidental do Pacífico e na Região Africana, onde 6,2% e 6,1%, respectivamente, da população adulta estão infectadas. Nas Regiões do Mediterrâneo Oriental, do Sudeste da Ásia e da Europa, estima-se que, 3,3%, 2,0% e 1,6%, respectivamente, da população geral esteja infectada6. Na Etiópia, estudo realizado com estudantes de cursos da saúde mostrou que apesar da maioria (>80,0%) relatar conhecimento sobre o processo infeccioso, a transmissão e a prevenção relacionados ao VHB, apenas 50% executavam práticas seguras em relação ao risco ocupacional de infecção.. Semelhantemente, em estudo realizado com alunos do curso de odontologia observou-se que apenas 45,0% dos estudantes eram vacinados, ainda que 86% deles tenha demonstrando conhecimento sobre o processo de infecção do VHB6. Resultados similares foram encontrados em estudos realizados na Austrália, Irã e Nigéria.1-3
No Brasil, a Secretaria de Vigilância em Saúde registrou a ocorrência de 218.257 casos de infecções pelo VHB em 2017, com um aumento de 6,5 para 11,9 casos por 100.000 habitantes na comparação aos dados de 20169. Entre estudantes de medicina Antunes et al. constataram que 55,2% não conhecem as precauções universais e, de forma preocupante, 13,89% não eram vacinados contra o VHB, sendo que 10% declararam algum tipo de acidente com risco biológico.10
O risco da exposição ao VHB entre os estudantes e profissionais de saúde é uma grande preocupação, sendo que os diferentes estudos sobre adesão às medidas de segurança apontam que ela é baixa e alguns indivíduos até mesmo as desconhecem.10 Dentre os diferentes acidentes relatados por profissionais dos serviços de saúde, a lesão por materiais perfurocortantes é o acidente mais prevalente sendo essa uma forma de possível exposição ao VHB.2,8 Nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo avaliar o conhecimento, imunização contra hepatite B e uso das medidas de biossegurança por estudantes da área da saúde em uma Universidade no interior de Minas Gerais.
MÉTODOS
Um estudo transversal, descritivo, foi conduzido em uma universidade no interior de Minas Gerais, Brasil, durante o período de novembro de 2017 a abril de 2018, com todos os estudantes regularmente matriculados nos cursos de Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia da Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde (FCBC) e Medicina da Faculdade de Medicina (FAMED). Os alunos matriculados no primeiro período dos referidos cursos foram excluídos do estudo.
Os estudantes responderam a um questionário estruturado, de autopreenchimento, voluntário e autônomo. A abordagem foi realizada durante as aulas regulares dos alunos com a autorização prévia do docente e leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecidos (TCLE). Foram realizadas três tentativas de coleta dos dados. O tempo gasto para o preenchimento do questionário foi de aproximadamente 20 minutos. Nele foram avaliadas variáveis (i) sociodemográficas (Faixa etária; Sexo; Período de matrícula no curso) e (ii) referentes ao tema biossegurança (Conhecimento e uso das medidas de biossegurança; Relato sobre imunização contra a hepatite B; Risco de exposição ao VHB e HIV; Trabalho com material contaminado; Relato de acidentes; Descarte de material perfurocortante; Uso de equipamentos de proteção individual).
A análise estatística dos dados foi realizada utilizando programas EpiData versão 3.1 e Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) 22.0. Foram calculadas as frequências absolutas e relativas das variáveis, sendo realizado teste de Qui-quadrado de Pearson para avaliar a associação entre os dados. O nível de significância considerado foi de 5% (p < 0,05).
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFVJM, Diamantina, Minas Gerais, sob o número de parecer 1.906.279, CAAE 61212816.7.0000.5108. A pesquisa foi desenvolvida com observância dos preceitos éticos de pesquisa.
RESULTADOS
De um total de 874 estudantes regularmente matriculados nos cursos de Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia e Medicina, 85,4% (746) foram elegíveis e 14,6% (128) não participaram do estudo por cursarem o primeiro período do curso, conforme um dos critérios de exclusão. Entre os elegíveis, 72,4% (540) participaram da pesquisa e responderam ao questionário, onde 16,3%, 24,3%, 29,4% e 30% pertenciam aos cursos de enfermagem, farmácia, fisioterapia e medicina, respectivamente. Considerando as variáveis sociodemográficas, a maior parte dos estudantes pertencia ao sexo feminino 76,1% (411) e à faixa etária de 21-30 anos (66,9%) (Tabela 1).
Em relação à imunização contra hepatite B, o número de estudantes não vacinados variou, onde 23,3% (37), 21,4% (28) e 18,5% (30) dos estudantes dos cursos de Fisioterapia, Farmácia e Medicina, respectivamente, não estavam vacinados. A menor prevalência foi observada entre estudantes do curso de Enfermagem (12,5%), no qual apenas 11 estudantes de um total de 88 não eram vacinados (Figura 1).
Quanto ao sexo, a maior porcentagem de estudantes do sexo masculino (26,4%) não estava vacinada em comparação com as estudantes do sexo feminino (17,5%). A porcentagem de imunização entre as faixas etárias variou de 71,4 a 84,8%, com maior valor para a faixa de maior concentração de estudantes (21-30 anos).
Quanto ao período, a maioria dos estudantes (19,6%) estava no segundo enquanto que a minoria (14,1%) estava no nono período (Tabela 1). A maior porcentagem de alunos vacinados foi encontrada nos últimos períodos dos cursos (82,6-95,6%), enquanto que, a maior porcentagem de não vacinados, foi encontrada nos períodos iniciais (24,5-31,7%).


Em relação ao conhecimento básico sobre medidas de biossegurança, 37,2% (201) dos estudantes declararam não ter conhecimento sobre as medidas e, desse total, 28,9% não foram vacinados contra a hepatite B (Tabela 2). Já para aqueles que declararam conhecimento (62,8%), uma menor porcentagem (14,2%) não estava vacinada contra o VHB. Considerando o uso das medidas de biossegurança (Tabela 2), 23,3% (126) não as usam e, destes, 34,1% (43) não estavam vacinados. Já para os que usavam as medidas (45,4%), a porcentagem de não vacinados caiu para 9,8% (24).
Um total de 62,6% dos participantes não realizou teste para verificar a eficácia da imunização contra a hepatite B ou não se recordavam (24,4%) (Tabela 2). Do total de estudantes que não avaliaram a imunização, 82,5% estavam vacinados (279). Mesmo entre os não vacinados, 32,6% dos indivíduos responderam “não me lembro” para a mesma pergunta.
32,4% dos estudantes considerou que não estavam expostos ao vírus VHB ou HIV durante o curso, sendo que desses 25,7% (45) não eram vacinados contra o VHB. Quando perguntados se trabalham com material contaminado (Tabela 2), 64,6% (349) responderam que “não” e, desse total, 23,5% (82) não eram vacinados contra hepatite B.
Do total de estudantes, 90,4% (488) disseram não utilizar celular ou bebedouro calçados com luvas (Tabela 2). Em relação a acidentes com perfurocortantes, 11,5% (62) dos estudantes sofreram acidentes com algum material e 4,1% (22) afirmaram que já espirrou sangue ou fluidos nos seus olhos. Em relação ao descarte de agulhas ou outro material cortante, 13,3% (72) relataram que descartavam esses materiais em sacos plásticos. Para essas questões não foi observada associação estatisticamente significativa (p>0,05), em relação à prevalência de vacinados ou não vacinados.
Neste bloco de perguntas o questionário finalizou com a questão “você julga as informações que recebe sobre biossegurança suficientes” (Tabela 2) e 67% (362) responderam que não eram suficientes. Desse total, apenas 22,7% (82) eram vacinados contra o VHB, enquanto entre os que achavam suficientes (33,0%), 86,5% (154) eram vacinados contra VHB.

A tabela 3 apresenta os resultados para utilização de quatro diferentes EPI’s. Observou-se que a maioria dos estudantes (86,7 e 94,8%, respectivamente) calçam luvas usam jaleco ou avental, sendo alta a prevalência de imunizados (83,8 e 81,3%, respectivamente). Dentre os 72 (13,3%) estudantes que não calçavam luvas nas práticas acadêmicas, 41,7% (30) não eram vacinados. A porcentagem de estudantes que não utilizavam máscara e óculos foi 61,5% (332) e 82,4% (445), respectivamente, sendo que aproximadamente 23% deles não eram imunizados (Tabela 3).

DISCUSSÃO
A vacinação contra hepatite B é essencial para que estudantes da área da saúde tenham segurança ao iniciarem suas atividades em aulas práticas e, ou estágios. Nos EUA, em 2002, o Center for Disease Control and Prevention reafirmou a diretriz que destacou o compromisso ético das universidades e instituições de saúde para realizarem vigilância ativa de estudantes e profissionais antes do início de atividades curriculares em estabelecimentos assistenciais.11 No Brasil, conforme a portaria 597 do Ministério da Saúde, as instituições de ensino têm papel fundamental na fiscalização da situação vacinal de seus estudantes, tornando obrigatória a vacinação contra VHB como requisito básico para a matrícula em instituições de ensino.12 Assim, políticas administrativas nas instituições de ensino devem garantir que os estudantes recebam as três doses da vacina, seja disponibilizando-as no ambiente universitário, seja realizando campanhas na universidade para estimular a imunização e os testes para avaliar a soroconversão.
No presente estudo, a maioria dos estudantes (80,4%) declarou ter realizado a imunização contra o HBV. Entretanto, não foi questionado o número de doses cumprido do esquema vacinal (3 doses). Em estudo anterior foi verificado que apesar de 68,4% dos estudantes de medicina de uma universidade pública brasileira estarem vacinados, apenas 48,9% receberam as três doses necessárias.13 De forma semelhante, outros autores verificaram que apesar de 93,9% dos estudantes relatarem a vacinação ao ingressarem na escola de medicina, na Arábia Saudita, apenas 59,5% haviam completado o esquema de três doses.14 Profissionais da saúde da administração municipal de uma cidade da Etiópia relataram que somente 10% dos entrevistados haviam recebido uma ou mais doses de vacinação contra a hepatite B e 69,2% relataram algum tipo de acidente ocupacional com exposição de sangue em mucosas e pele desprotegidas.15
Quando questionados sobre o teste para verificar a eficácia da imunização contra o VHB, grande parte dos estudantes declarou não o ter realizado (62,6%) ou não se lembravam de tê-lo feito (24,4%). Sabe-se que após o cumprimento das três doses é necessário um teste sorológico para avaliação da soroconversão (anti-HBsAG≥10 UI/ml), sendo que uma das condutas para um resultado negativo é, após a terceira dose, repetir o esquema (zero, um e seis meses).16
Maior porcentagem de estudantes entrevistados foi do sexo feminino (76,1%), sendo a maioria vacinada (82,5%), com predomínio da faixa etária de 21 a 30 anos. O estudo de Souza e Teixeira realizado com estudantes de medicina também observou predominância de participantes que se declararam do sexo feminino (59,7%), porém com menor prevalência de vacinação entre elas (49,6%) e média de idade de 22,8 anos.13 Considerando o relato de acidentes entre estudantes e profissionais de saúde, foi constatado que 70% dos indivíduos se declararam do sexo feminino, com média de 21 a 30 anos de idade,17 A maior porcentagem de vacinação entre estudantes do sexo feminino pode ser explicada pela menor procura de indivíduos do sexo masculino por serviços de saúde.18 Já o predomínio de estudantes vacinados na faixa etária de 21 a 30 anos se justifica pelo histórico de implementação do esquema vacinal contra o VHB no Brasil. A vacina de DNA recombinante da hepatite B surgiu no ano de 1986. A oferta da vacina foi gradativamente implementada para menores de 20 anos no Brasil, sendo que, alcançou 30% dessa população no ano de 2001, 30% em 2002 e 40% em 2003.19
Considerando as medidas de biossegurança, a maioria dos estudantes afirmou conhecê-las (62,8%) e usá-las (45,4%). Entretanto, número grande de indivíduos afirmaram que não estavam imunizados contra o VHB. A porcentagem de alunos imunizados aumentou ao longo dos períodos, isso porque provavelmente o maior contato com disciplinas profissionalizantes os alerta quanto à necessidade do cumprimento do esquema vacinal preventivo. Conhecer os riscos do ambiente em que se realiza o trabalho, principalmente relacionados a hepatite B, uma doença de rápida soroconversão, minimiza a exposição a este vírus, ao HIV e a outros agentes biológicos que estão relacionados aos riscos das atividades práticas.20
Quando questionados sobre estarem ou não, sob risco, de exposição aos vírus VHB e HIV (32,4%) acreditavam não estar expostos, sendo considerável a prevalência de não vacinados entre eles (25,7%). Em estudos semelhantes, avaliando a educação para a biossegurança em laboratórios de análises clínicas, observou-se que o apoio institucional para a capacitação permanente dos profissionais proporciona práticas seguras com a redução de acidentes laborais.21 Entre estudantes do curso de Odontologia da mesma instituição foco do presente trabalho, foi observado que 11,5% e 17,9% dos estudantes não faziam uso de medidas de biossegurança e uso completo de EPI, respectivamente, mesmo conhecendo as medidas de biossegurança.22 Esses autores, de forma semelhante ao presente estudo (67%), observaram que grande parte dos estudantes (48,7%) considerou insuficiente o ensino sobre o tema biossegurança durante a formação acadêmica.
Os acidentes com materiais perfurocortantes têm especial importância devido à maior exposição ao VHB. Observou-se um índice preocupante (11,5%) de acidentes com perfurocortantes entre estudantes não vacinados, que geralmente se justificam devido à menor experiência prática, o nervosismo e a insegurança durante os procedimentos.23 Em estudo realizado com profissionais da área da saúde, foi constatado que 40,5% sofreram acidentes com perfurocortante, sendo que destes, 14,6% não eram vacinados.24
Apesar dos EPIs serem, em primeira análise, equipamentos fundamentais para a prevenção de acidentes com perfurocortantes, verifica-se que existe falta de conhecimento em relação ao uso dos mesmos.23 No presente estudo foi alta a prevalência de estudantes que declararam não utilizar máscara e óculos durantes as atividades acadêmicas que exige o uso dos respectivos EPIs. Ignorar estes equipamentos aumenta o risco de contaminação e agrava os acidentes de trabalho. Ainda entre esses indivíduos foi alta a prevalência de não vacinados contra a hepatite B, ou seja, indivíduos altamente vulneráveis à exposição acidental, que, de forma semelhante ao presente estudo (aproximadamente 23%), atingiu a prevalência de 28,6% entre estudantes de medicina na Etiópia.24
No processo de aprendizagem os docentes são essenciais no ensino da prevenção contra acidentes. O tema biossegurança deve ser trabalhado sistematicamente em disciplinas existentes nos currículos dos cursos, desde os períodos iniciais para que haja uma educação permanente. Já os estudantes que estão expostos à infecção devem cumprir o esquema de vacinação contra o VHB. A imunização protege o acadêmico e, além disso, é uma precaução para o paciente, uma vez que o discente pode também transmitir infecções e acarretar agravos à saúde dos mesmos.25
Por se tratar de um estudo transversal, não é possível estabelecer relação entre causa e consequências. Apesar dos estudantes terem fornecido informações a partir do autorrelato, devido ao viés de memória, podem haver dados que não condizem com a real situação da soroconversão. Sendo assim, sugere-se que sejam realizados novos estudos com a execução de teste de soroconversão.
Este estudo abordou um relevante problema de saúde pública que deve ser discutido e explorado na comunidade acadêmica avaliada. Verificou-se que existe uma escassez de dados sobre as medidas de biossegurança, tanto em relação à estudos de pesquisa quanto em relação ao ensino desse tema nos cursos da área da saúde. Na universidade local foi verificado apenas um estudo sobre biossegurança entre os estudantes do curso de odontologia.22 Neste sentido, o presente trabalho contribuiu com o diagnóstico situacional por abranger os demais cursos da área da saúde possibilitando ações baseadas em dados reais para permitir a mudança desse cenário.
O diagnóstico realizado trouxe embasamento científico que permitiu identificar lacunas em relação ao conhecimento e uso das medidas de biossegurança, entre estas, a falha da imunização contra hepatite B entre os estudantes. Neste sentido, se faz necessária a adoção de políticas de educação permanente com inclusão sistemática do tema biossegurança nos currículos dos cursos da área da saúde. Além disso, docentes devem ser estimulados a realizarem capacitação periódica sobre o tema. Ainda faz- se necessário a adoção de mecanismos que garantirão a imunização desses alunos como uma ação obrigatória para o ingresso na universidade.
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