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Qualidade dos produtos de terapias avançadas: requisitos de células extensamente manipuladas usadas em terapias celulares e em bioengenharia
Quality of advanced therapy products: requirements of extensively manipulated cell used in cell therapy and bioengineering
Vigilância Sanitária em Debate, vol. 6, núm. 1, pp. 84-95, 2018
INCQS-FIOCRUZ

ARTIGO


Recepção: 29 Setembro 2017

Aprovação: 31 Janeiro 2018

DOI: https://doi.org/10.22239/2317-269X.01048

RESUMO

Introdução: O preparo de produtos para terapias avançadas inclui, frequentemente, a manipulação extensa de células primárias in vitro , o que pode acarretar em alterações da população celular final. A padronização dos métodos de obtenção das culturas, seguindo as regras das Boas Práticas de Fabricação, com a realização dos controles de qualidade do processo e do produto final, é essencial para garantir a segurança do paciente e a comparabilidade dos resultados clínicos obtidos.

Objetivo: Este estudo buscou identificar os ensaios, prevalentemente citados na literatura científica ou em normas sanitárias, aplicados na avaliação da qualidade de células primárias humanas, passíveis de serem inseridos na rotina dos Centros de Processamento Celular.

Método: Foi realizado o levantamento de artigos científicos e de normas sanitárias que tratassem de terapia celular e dos ensaios de qualidade associados.

Resultados: Foi evidenciado que as normas regulamentares direcionadas a produtos com base em células cultivadas in vitro não detalham os ensaios de qualidade, o que torna urgente a discussão dessa matéria.

Conclusões: Evidenciamos a necessidade de preparo do produto na forma de um lote de células, que deve ser controlado para a qualidade, a partir de amostras representativas do todo e propomos a realização de uma bateria de ensaios, que definem a qualidade do produto de terapia avançada, a base de células cultivadas in vitro, com detalhamento dos pontos em que estes devem ser realizados, organizados como fluxogramas de processamento.

Palavras chave: Centro de Processamento Celular, Biotecnologia, Cultivo Primário, Cultura de Células, Controle de Qualidade.

ABSTRACT

Introduction: Preparations of products for advanced therapies include an extensive manipulation stage of the cell primary culture, which can lead to changes in the final cellular population. Standardization of the technique for obtaining the cellular cultures, in complying with Good Manufacturing Practices (GMP), and carrying out quality controls of process and final product, are essential to ensure patient safety and comparability of clinical outcomes.

Objective: The purpose of this study was to identify the most prevalent trials cited in the scientific literature or in health standards applied to the evaluation of the quality of human primary cells, which could be inserted in the routine of the Cell Processing Centers.

Method: A survey was carried out of scientific articles and health standards related to cell therapy and associated quality assays.

Results: This study showed that the advanced cellular therapy products regulation do not specify the tests that should be used for quality control or, when specified, do not define acceptance or rejection ranges for the products, which makes urgent the discussion of such matter.

Conclusions: In this article, we highlight the need to prepare the product in the form of a single batch that should be quality-controlled from samples representative of the whole. In addition, we mention some of the trials that define the quality of the advanced cellular therapy product, detailing the points at which they are to be performed in the flowchart.

Keywords: Cell Processing Center, Biotechnology, Primary Culture, Cell Culture, Quality Control.

INTRODUÇÃO

Células obtidas de tecidos humanos e cultivadas in vitro podem ser utilizadas em pesquisas clínicas ou em terapias e, até mesmo, serem disponibilizadas comercialmente, dependendo da regulação sanitária do país de origem.

Globalmente, para avaliar propostas de uso terapêutico de células, as agências regulatórias exigem que as células sejam preparadas em atendimento às Boas Práticas de Fabricação (BPF – Good Manufacturing Practices) e que tenham comprovação de segurança, reprodutibilidade e eficácia do uso1 , 2. Além disso, dão tratamento regulatório diferenciado de acordo com o processamento laboratorial ao qual as células são submetidas, sendo este classificado em manipulação mínima ou manipulação extensa. A diferença básica para estes dois tipos de processamentos é a possibilidade da ocorrência de alterações significativas das características celulares fisiológicas, funcionais ou propriedades estruturais, relevantes para o uso pretendido, como estado de diferenciação, potencial de proliferação e atividade metabólica, para a manipulação extensa e a não possibilidade, para a manipulação mínima. Todo tipo de cultivo celular caracteriza manipulação extensa e atos como cortar, separar, centrifugar caracterizam a manipulação mínima. O segundo aspecto que dá tratamento diferenciado ao produto baseado em células é o uso, quando este é direcionado para que as células exerçam função diferente daquela de origem. Desta forma, células extensamente manipuladas in vitro ou células cuja função na terapia é diferente da sua função de origem, são classificadas como produtos de terapia avançada.

No Brasil, o uso clínico de células cultivadas in vitro é, atualmente, permitido apenas em pesquisas, desde que sejam aprovadas pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), ou em terapias, quando autorizadas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) ou Conselho Federal de Odontologia (CFO), e desde que tais células tenham sido manipuladas em laboratórios autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), os Centros de Processamento Celular, conforme determinado pela Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) no 214, de 7 de fevereiro de 2018 ou pelas resoluções que venham a substituí-la3. Em condições excepcionais, o uso clínico das células cultivadas também é permitido, quando representa a única oportunidade de melhora do paciente que apresenta risco de morte. Sendo chamada terapia de compaixão, autoridades médicas e legais autorizam o uso proposto, num prazo muito curto, com base em dados publicados na literatura científica e na experiência do grupo clínico envolvido.

Em outros países, como nos EUA e Canadá, os produtos de terapia avançada são classificados como “Produtos de Terapia Avançada da Medicina Regenerativa”, regulamentados pela Seção no351 do Ato de Serviço de Saúde Pública dos EUA e podem ser disponibilizados comercialmente, após aprovação pela agência reguladora Food and Drugs Administration (FDA), por comprovação de segurança e eficácia. O primeiro produto de terapia avançada aprovado nos EUA foi o Carticell (condrócitos autólogos), em 1997, o qual foi seguido por outros, como Laviv (fibroblastos autólogos) e Gentuit (queratinócitos e fibroblastos alogênicos). O primeiro produto baseado em terapia celular e gênica, CAR-T, teve aprovação inicial pela Sociedade Internacional de Terapia Celular (SITC) em agosto de 2017 e segue em análise pela FDA.

Na União Europeia (UE), as terapias que fazem uso de células cultivadas in vitro são classificadas como Produtos Médicos de Terapia Avançada (PMTA) e reguladas pela diretiva UE no1.394/2007. Essa é aplicável a todos os países membros da Comunidade Europeia e contém as regras para autorização, inspeção e requerimentos técnicos relacionados às características e informações dos produtos, preparados na indústria ou em instituições acadêmicas. O Comité para Terapias Avançadas (CAT – Committee for Advanced Therapies ), da agência reguladora European Medicines Agency (EMA), centraliza as autorizações para comercialização dos PMTA. Em 2014, a EMA aprovou a primeira terapia baseada em células-tronco adultas, retiradas da córnea, cultivas in vitro e aplicadas na regeneração da córnea do próprio paciente doador, o Holoclar .

Da mesma forma que é variável para cada comunidade, de acordo com sua estrutura regulatória, o entendimento de produtos de terapia avançada baseados em células cultivadas in vitro , também é variável a exigência da qualidade do produto final. Por unanimidade, as agências reguladoras afirmam que tais produtos devem ter qualidade, segurança e eficácia garantidas, mas não definem quais os ensaios de qualidade devem ser aplicados a cada situação. A escassez de detalhes acerca dos ensaios de qualidade que devem ser realizados, incluindo seus limites de aceitação, torna urgente sua discussão. É necessária sua descrição com definição dos requisitos de liberação das células para uso, o que será fundamental para a comparação dos resultados clínicos obtidos, tanto na pesquisa clínica, como na terapia.

Assim, nosso interesse segue no sentido de definir os ensaios que possam ser aplicados, de forma direta, às células preparadas para o uso clínico, e que estes se tornem uma ferramenta capaz de definir e harmonizar os produtos finais, estabelecendo a equivalência entre os lotes produzidos. Os ensaios deverão ser aplicados a todos os lotes de células preparadas, especialmente para aqueles que são criopreservados, descongelados e retornam ao cultivo in vitro , até o momento em que são solicitados para o uso clínico.

O presente estudo descreve uma bateria de ensaios que definem a qualidade do produto de terapia avançada, sempre que um dos componentes contenha as células cultivadas in vitro, e detalha os pontos em que estes devem ser realizados. Um fluxograma de processamentos para cada uma das principais situações de manipulação de células está proposto, e deve guiar tanto a aplicação de células extensivamente manipuladas in vitro em estudos clínicos quanto o seu uso em procedimentos terapêuticos.

MÉTODO

Este estudo foi conduzido pelo levantamento de artigos científicos, com o objetivo de identificar os principais ensaios realizados para o controle de qualidade de células primárias humanas, cultivadas in vitro . A pesquisa de literatura científica foi realizada por consulta à base de dados PubMed (empregando palavras-chave como: quality control, Cell Processing Center; Biotechnology; Primary Culture, Cell Culture, Cell Therapy ). O levantamento realizado incluiu o período de 1990 até 2018. A pesquisa das exigências de realização de ensaios de controle de qualidade de produto e processo, definidas pela Anvisa, foi feita no sítio http://portal.anvisa.gov.br/legislacao.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Cultivo de células primárias – matéria-prima para as terapias celulares

As células progenitoras mesenquimais (MSC) são consideradas atualmente o tipo celular mais frequentemente cultivado in vitro com a finalidade de uso em aplicação clínica. O primeiro pesquisador a isolar e caracterizar estas células a partir de amostra de medula óssea foi Friedenstein4. Desde então, outros tecidos foram utilizados como fonte, entre eles, o tecido adiposo, o cordão umbilical e a polpa dentária5 , 6 , 7, devido ao grande interesse em seu potencial terapêutico em doenças isquêmicas, degenerativas, ou inflamatórias, como acidente vascular cerebral (AVC)8, isquemias de membros inferiores9, úlceras crônicas10, degeneração dos tecidos musculoesqueléticos11 , 12, imunomodulação da doença enxerto versus hospedeiro, doença grave que acomete pacientes após a realização do transplante alogênico de células progenitoras hematopoiéticas13, entre outras. Os benefícios clínicos do uso sistêmico das MSC são resultantes da combinação dos diferentes mecanismos de ação possíveis delas. Essas células progenitoras mostram o potencial de diferenciação em várias células do tecido lesionado: osteoblastos, condrócitos, adipócitos, células de vasos sanguíneos, de músculo esquelético ou do tendão. Elas produzem as citocinas que promovem a angiogênese e/ou atraem novas células progenitoras teciduais ou, ainda, atuam na modulação e redução da atividade inflamatória local14. Estes processos dependem do tipo da lesão original, da qualidade do leito tecidual e da sua evolução, antes e depois do tratamento, fazendo que a compreensão e a comprovação da eficácia da terapia alcançada com o uso de MSC seja um desafio, tanto para os pesquisadores, quanto para as organizações regulatórias.

Muitos outros tipos celulares cultivados in vitro também possuem aplicação clínica, como os queratinócitos e melanócitos da pele humana, combinados ou não com fibroblastos e células mesenquimais, utilizados principalmente em terapias como queimadura, vitiligo, ulcerações crônicas10 , 15. Já os condrócitos cultivados são utilizados em lesões da cartilagem16.

O ponto comum é que os protocolos clínicos de terapia celular e bioengenharia necessitam de elevado número de células. Assim, a possibilidade de aumento do número de células por meio do cultivo in vitro é uma grande vantagem, pois viabiliza o uso autólogo ou alogênico de células obtidas a partir de um pequeno volume de tecido doador, quando comparado à doação de tecido para transplante imediato. Entretanto, a fase de cultivo in vitro pode ter consequências complexas, ocasionalmente desastrosas. A maioria das culturas primárias são heterogêneas e os tipos celulares constituintes possuem capacidades proliferativas peculiares às características do tecido, do doador e/ou das condições ambientais. Os tipos que apresentam a taxa de proliferação maior tendem a dominar a cultura. As condições de cultivo em baixas densidades celulares podem ter como consequência uma seleção clonal. Uma das maiores preocupações é a possível deriva de células cultivadas em células potencialmente neoplásicas, causando o crescimento celular canceroso depois da sua implantação terapêutica em organismo receptor. Além disso, as culturas podem apresentar contaminações, microbiológicas ou químicas, alterar a taxa normal de proliferação e diferenciação celular e entrar em senescência, num procedimento natural do esgotamento da sua capacidade de replicação, ou em resposta a condições sub-ótimas do sistema. Ou seja, o sistema de cultivo celular é complexo, dinâmico e de difícil padronização, o que torna o produto de terapia avançada a base de células cultivadas diferente dos produtos terapêuticos com bases químicas definidas.

Quando é alcançado o número desejado de células para a terapia, estas são, geralmente, criopreservadas em ultrabaixas temperaturas (menor que 135oC negativos), e assim permanecem mantendo as suas capacidades vitais até que sejam solicitadas para o uso clínico.

Os produtos de terapia avançada, a base de células cultivadas in vitro , devem ser preparados na forma de um lote homogêneo, viabilizando, desse modo, a utilização de pequena parte como amostra representativa do todo nos ensaios de controle de qualidade.

Ensaios de qualidade celular

O cultivo de células deve ser padronizado e acrescido dos controles de qualidade pertinentes, desde a obtenção da cultura primária até o lote preparado de células a ser liberado para uso. Diante de tantas variáveis e das possíveis adversidades do sistema, os controles devem assegurar a qualidade e possibilitar consequentemente a harmonização do produto de terapia avançada, e a definição das modificações clínicas resultantes da sua aplicação. Para uso de cada produto de terapia avançada são necessárias, minimamente, as informações sobre as propriedades listadas em seguida.

Pureza

A pureza compreende o resultado negativo para os ensaios de detecção de fungos, bactérias, incluindo os micoplasmas, e endotoxinas. São utilizados os ensaios recomendados pela farmacopeia nacional, para liberação de produtos estéreis.

Para a questão da pureza quanto à presença de vírus, as legislações sanitárias brasileira e da UE possuem uma lista pré-estabelecida de testes diagnósticos a serem realizados para a coleta de tecidos com finalidades terapêuticas. Entretanto, não há exigência para a realização de ensaios diagnósticos de patógenos virais, potencialmente presentes nos produtos de células cultivadas.

A RDC-Anvisa no 214/2018, que regula os Centros de Tecnologia Celular, no Brasil, apresenta no artigo 60 os ensaios de qualidade e segurança de células cultivadas in vitro autólogas e alogênicas, sendo:

IV – para células (que não CPH-MO, CPH-SP ou CPH-SCUP, para fins de transplante convencional) e Produtos de Terapias Avançadas, em amostra do Produto Final: a) contagem do total de células relevantes; b) teste de identidade ou fenotipagem apropriado para o produto e quantificação das populações celulares presentes; c) viabilidade celular; d) teste de pureza: inclui, quando couber, a verificação de substâncias ou células que possam ser prejudiciais ao Receptor e, no caso de Manipulação Extensa, obrigatoriamente a verificação da presença de endotoxinas; e) testes microbiológicos: deve-se seguir o disposto no art. 49 desta Resolução e, quando aplicável, realizar a repetição dos respectivos testes no Produto Final, e, em caso de Manipulação Extensa, incluir também o teste para detecção de contaminação por micoplasma; f) detecção de ácido nucleico dos vírus CMV, HIV-1 e HIV-2, HTLV-I e HTLVII, EBV, HBV, HCV e B19, e, caso aplicável, de outros agentes virais de relevância clínica em humanos, somente em caso de Manipulação Extensa para uso alogênico; g) citogenética, somente em caso de Manipulação Extensa; e h) teste de potência, quando couber: a atividade biológica relevante das células, caso conhecida, ou dos produtos sintetizados pela célula deverá ser definida e quantificada.

O FDA-USA exige que o produto final contendo células, quando destinado para uso como produto terapêutico, seja testado para os patógenos Citomegalovírus (CMV), Vírus da Imunodeficiência Humana tipos I e 2 (HIV-1 e 2), Vírus Linfotrópico da Célula Humana tipos 1 e 2 (HTLV-1 e 2), Vírus Epstein-Barr (EBV), Vírus da Hepatite B (HBV), Vírus da Hepatite C (HCV), Eritrovírus B19 (B19) e, ainda, orienta que sejam avaliadas as condições gerais do processo, para identificação da necessidade da pesquisa de outros patógenos17.

O motivo da indicação da pesquisa de vírus, ao término do cultivo, deve-se ao fato de que muitos deles possuem a propriedade de manterem-se em estado de latência no organismo infectado. Pode ser citada, como exemplo, a família dos herpes vírus (Herpes simplex vírus – HSV), na qual estão incluídos o herpes oral (HSV tipo I), o Varicela-Zoster e o CMV. Depois da infecção primária, que pode ocorrer com ou sem sintomas, os herpes vírus podem permanecer latentes no interior de células por um período indeterminado e reativar sua replicação causando doença, devido à baixa imunológica do portador18 , 19. As condições de cultivo celular podem ser propícias à reativação da atividade proliferativa dos vírus, presentes no tecido de origem da cultura primária. As infecções que as células, como produto terapêutico avançado, podem causar são potencialmente severas e até mesmo letais, de acordo com a condição geral do paciente receptor.

Aparência morfológica

A avaliação da qualidade das culturas primárias começa pela observação rotineira, ao microscópio ótico invertido e com contraste de fase, para determinar as suas características morfológicas. Esta prática permite ao manipulador habituar-se aos aspectos normais das culturas e perceber, precocemente, a ocorrência de eventos indesejados, como a presença de células morfologicamente distintas ou com aspecto indicativo de sofrimento. São exemplos de eventos indesejados para o cultivo a presença de contaminações químicas e/ou microbiológicas e o uso de materiais ou reagentes de baixa qualidade ou pureza.

As culturas primárias devem ter, portanto, acompanhamento rotineiro para a aparência morfológica, para observação dos seguintes aspectos:

  • Verificação da presença de células com morfologia convencional, esperada em função da sua origem tecidual;

  • Verificação do percentual de confluência da monocamada;

  • Presença de sujidades ( debris ) e/ou células soltas e/ou mortas no sobrenadante, que é indício de aplicação de sistema de cultivo insatisfatório ou presença de contaminações químicas ou microbiológicas.

  • Verificação da presença de células com morfologia modificada para: aumento do citoplasma celular com bordas irregulares, serrilhadas e mal definidas, aumento de organelas ou inclusões citoplasmáticas, aumento de vacúolos citoplasmáticos que são indícios de senescência celular, ou presença de micronúcleos que são indícios de apoptose;

  • Verificação da presença de microrganismos, como fungos e bactérias (incluindo micoplasmas); alguns contaminantes podem ser observados ao microscópio ótico, mas são facilmente confundidos com outras sujidades. O ideal é o acompanhamento da cultura com ensaios específicos para detecção de contaminações microbiológicas.

Caracterização da população celular

A caracterização de uma cultura primária é feita pela evidência de uma ou mais características peculiares da população, como expressão de genes, presença de proteínas da membrana plasmática, do citoesqueleto ou de proteínas secretadas, atividade metabólica, capacidade funcional, entre outras. Esses procedimentos podem incluir manipulações laboratoriais complexas e, sempre que possível, o método eleito deve ser o de menor custo e complexidade, desde que resulte em informação satisfatória.

A caracterização populacional faz-se necessária, uma vez que os tecidos são heterogêneos, contendo vários tipos celulares, com a possível exceção da cartilagem. O processo de cultivo in vitro é capaz de alterar as características originais das populações celulares primárias. Na medula óssea humana, por exemplo, as MSC representam 0,001%20, enquanto que, no tecido adiposo, 2%21. No entanto, após o período de cultivo e expansão in vitro , as MSC podem alcançar o percentual > 95%22, independentemente do tecido de origem.

Muitos tipos celulares possuem características que podem ser reconhecidas diretamente por uso de ensaios colorimétricos ou de fluorescência, como os linfócitos e macrófagos. Essas características se definem com uso de anticorpos específicos para as proteínas, lipídeos ou glicoconjugados de membrana geralmente definidos com os cluster definition (CD) antigens , as proteínas do citoesqueleto ou componentes nucleares, pela presença das atividades metabólicas, ou pela produção in vitro da matriz extracelular.

Outros tipos celulares necessitam da combinação de marcadores de exclusão e/ou de métodos para sua caracterização. São exemplos, as células progenitoras hematopoiéticas e as células MSC. Para as MSC, foi estabelecido um consenso entre os pesquisadores para os requisitos mínimos que a cultura celular deve apresentar, os quais foram adotados pela SITC, sendo eles: aderência ao plástico quando mantidas em condições padrões de cultivo, mais de 95% das células com expressão dos marcadores CD73, CD90, CD105 e não expressão de (< 2%) CD45, CD34, CD14 ou CD11b, CD79α ou CD19, e HLA-DR, e capacidade de diferenciação, quando expostas às condições necessárias, em células das linhagens osteogênica, condrogênica e adipogênica23.

Quantificação celular e determinação do percentual de células viáveis

A citometria de fluxo é atualmente uma técnica amplamente usada na quantificação de células associada com a sua fenotipagem, por agregar exatidão, reprodutibilidade e rastreabilidade. É utilizada em pesquisas clínicas e em ensaios diagnósticos, na quantificação de populações celulares específicas, o que é garantido pela disponibilidade comercial de kits para este fim. O uso associado de marcadores permite, simultaneamente, contar e subdividir as populações celulares em células vivas, mortas, senescentes e apoptóticas. A Anexina V, por exemplo, é uma proteína que possui alta afinidade pelo fosfolipídio de membrana celular fosfatidilserina, o qual é exposto nas fases iniciais da atividade de apoptose. Devido a esta característica, a conjugação da Anexina V a um fluorocromo, possibilita sua utilização como marcador para células que estão no início do processo de apoptose. Complementarmente, seu uso associado a corantes de ácido nucleicos, como o iodeto de propídio ou o 7-amino-actinomicina (7-AAD), possibilita a identificação de células na fase avançada de apoptose ou de células mortas. As células com membranas íntegras excluem estes corantes e as membranas danificadas, são permeáveis.

Células coletadas da medula óssea, sangue periférico ou sangue do cordão umbilical e placentário, que expressam o CD34, utilizadas para o transplante de células progenitoras hematopoiéticas, são quantificadas e têm seu percentual de viabilidade determinado por meio da técnica de citometria de fluxo, com uso do marcador de viabilidade celular 7-AAD, seguindo a recomendação da SITC.

No entanto, a contagem manual de células, com uso da câmara de Neubauer (ou hemocitômetro), é o método utilizado, rotineiramente, pelos laboratórios de cultivo celular, por ser um método rápido, de baixo custo, simples e direto24. O uso da câmara de Neubauer, associado ao corante de exclusão Azul de Tripan, permite a obtenção do percentual de células mortas. Portanto, a menos que seja necessária a determinação de células em atividade apoptótica, o uso da câmara de Neubauer e do corante Azul de Tripan permite a obtenção de resultados confiáveis, do número total de células e seu percentual de viabilidade. A acurácia desta técnica está diretamente relacionada ao cuidado do manipulador para o preparo da suspensão celular e diluição da amostra.

Capacidade proliferativa: tempo de duplicação e progressão do ciclo celular

O aumento progressivo do tempo de geração das células normais (ou diploides) cultivadas in vitro é esperado, conforme o limite de Hayflick25. As células aumentam seu tempo de geração após um período ativo de replicação, independentemente de haver outras causas contribuindo para este fato, como a restrição de nutrientes ou a presença de contaminantes. No entanto, este aumento do tempo de geração também ocorre quando as células se encontram em condições insatisfatórias de cultivo. Portanto, para os produtos de terapia avançada a base de células que passam por manipulação extensa, é fundamental a determinação do potencial de proliferação celular. O tempo de geração (G) pode ser calculado com uso da fórmula G = 3,322 (log Y-log I) , sendo (Y) o valor total de células obtidas com o subcultivo e (I) o valor total de células utilizadas no início da cultura.

Outra forma de acompanhar o estado proliferativo da cultura celular é através da análise da progressão do ciclo celular, por meio do método de Vindelov. Este é um método simples, quantitativo, com rastreabilidade possível, relevante para a comparação de condições de cultivo pela quantificação de células em várias fases do ciclo celular. Utiliza a análise do conteúdo de DNA de células, identificando as paradas em fase de G0/G1, comparando-as com células na fase ativa da duplicação do DNA (fase S), e com as que entraram na fase G2, já com o DNA integralmente duplicado. A quantificação do DNA/célula é feita por citometria de fluxo26 , 27 , 28.

Ensaios para determinação do potencial maligno de células cultivadas

Ainda não há consenso científico ou médico sobre o desenvolvimento de tumores em humanos, em consequência do uso de células somáticas humanas normais submetidas ao prolongado cultivo primário in vitro . As terapias podem ser categorizadas como seguras, mas as células que passam pela manipulação extensa devem ser monitoradas para detecção de potenciais transformações malignas. Tradicionalmente, é realizado o ensaio de cariótipo, para identificar algum tipo de instabilidade genética29. Este ensaio deve ser considerado de baixa sensibilidade, uma vez que analisa uma pequena quantidade de células e a sua relevância é consequentemente limitada30.

De forma complementar, o ensaio de formação de colônias celulares em soft agar é utilizado para a detecção de crescimento clonal de células em gel de agar, que não sustenta a adesão celular. Com exceção de células das linhagens linfo e mielopoiéticas, todas as células humanas normais são dependentes para a sua proliferação de ancoragem num substrato sólido, e não podem formar colônias em soft agar . A conversão de células humanas normais em células cancerosas aufere a capacidade de crescimento em gel não aderente31. Consequentemente, o cultivo em condições clonogênicas de soft agar pode ser aplicado a uma amostra relativamente grande de células cultivadas, e a presença de uma única colônia pode ser indicativa da presença de uma célula potencialmente neoplásica.

O resultado positivo do ensaio deve ser verificado pela coleta do clone suspeito e a sua potencial identificação como pertencente às linhagens hematopoiéticas, o que representa um resultado falso-positivo. Uma coloração com os corantes tradicionais para essas células, como o May-Grünwald-Giemsa ou Peppenheim, é suficiente. Entende-se que na coleta original do tecido a ser cultivado, o sangue do doador pode ter sido introduzido na cultura. Alguma célula normal de linhagens sanguíneas pode ter sido mantida ao longo do cultivo, e ela pode gerar um resultado falso-positivo. Por outro lado, as células cancerosas ocultas endógenas podem também circular no sangue do doador, como as células individuais ou como as micro-metástases32. Elas serão também potencialmente identificadas pelo ensaio de soft agar . A sua identificação pode ser importante para uma nova avaliação e revisão da saúde do doador de células, no caso de ausência de informações prévias sobre a presença de um processo neoplásico. Elas serão relevantes também quando uma terapia avançada se dirige, num contexto autólogo, para uma aplicação em procedimentos de tratamento das lesões iatrogênicas associadas ao tratamento prévio de câncer. É o caso de restauração das ablações teciduais extensas, como uma mastectomia, ou tratamento das lesões de difícil cicatrização, como lesões teciduais consecutivas à quimio ou à radioterapia. A detecção de células neoplásicas circulantes nesses casos também pode ser relevante para a revisão da saúde e das intervenções terapêuticas no paciente.

Capacidade funcional

Além da sua capacidade proliferativa que deve garantir a quantidade de células para o seu uso terapêutico, a potencial função de células cultivadas in vitro, a serem usadas em terapias avançadas, depende das propriedades relativas à sua origem e da manutenção ao longo do cultivo celular da sua capacidade natural em organização, reparo e regeneração tecidual. A necessidade da determinação da capacidade funcional dos produtos de terapia avançada, contendo as células cultivadas in vitro , é unanimidade para todas as agências regulatórias. No entanto, os ensaios não foram definidos, bem como os limites de aceitação para os resultados esperados. Recomenda-se que sejam aplicados os ensaios apropriados ao uso pretendido do produto. São exemplos de ensaios funcionais os da capacidade de diferenciação de células progenitoras nas linhagens osteogênicas, condrogênicas, adipogênicas, neurogênicas ou hematopoiéticas, os de absorção de antígenos por células dendríticas, entre outros. A interpretação deve ser, entretanto, ponderada em função da origem do tecido e das características das suas ações esperadas no paciente. Um dos exemplos é a já citada recomendação da SITC sobre os ensaios necessários à avaliação das populações de células mesenquimais, propostas para utilização em terapias. Quando expostas às condições específicas, as células mesenquimais devem se diferenciar em células das linhagens adipogênica, condrogênica e osteogênica. Entretanto, para a aceitação de seu uso específico, devem ser capazes de diferenciar em, pelo menos, duas destas três linhagens23.

Os Ensaios de Qualidade Celular manipuladas in vitro, descritos nas seções anteriores, devem ser realizados sob a responsabilidade do Centro de Processamento Celular, que deve garantir essencialmente a ausência de efeitos potencialmente adversos no paciente em todas as terapias. Por outro lado, as definições das propriedades funcionais de células se dirigem essencialmente à questão da manutenção ou da modificação dos efeitos terapêuticos esperados ao longo do cultivo de células. Consequentemente, a documentação que acompanha o registro formal de um produto de terapia avançada deve conter a descrição detalhada e completa dos ensaios de controle da capacidade funcional do produto. O Centro de Processamento Celular deve receber e integrar esses ensaios à sua capacidade operacional, já que os mesmos deverão ser realizados paralelamente aos ensaios de qualidade celular, em todos os lotes a serem produzidos e disponibilizados para uso clínico.

Proposta da organização e realização dos ensaios de qualidade e de capacidade funcional de células destinadas às terapias avançadas

Produtos de terapias avançadas, a base de células cultivadas in vitro , devem ser preparados de forma padronizada, criteriosa, rastreável e controlada, para garantir a qualidade final, alcançando dois propósitos principais: (1) garantir a qualidade do produto, com a consequente segurança do paciente tratado e (2) garantir a possibilidade de alcançar os resultados clínicos e terapêuticos desejados. A concordância de pesquisadores e agências regulatórias sobre este fato resultará em uma definição dos ensaios que devem ser aplicados especificamente para cada uma das categorias de culturas celulares, assim como dos limites de aceitação para seus resultados.

A RDC nº 214/2018 dispõe sobre as Boas Práticas em Células Humanas para Uso Terapêutico e Pesquisa Clínica e se aplica a todos os Centros de Processamento Celular, aptos para a manipulação extensa de vários tipos de células humanas, gerando produtos de terapias avançadas. Essa nova denominação inclui os Laboratórios de processamento de medula óssea e sangue periférico, os bancos de sangue de cordão umbilical e placentário e os centros de tecnologia celular e define as especificidades para o fornecimento de produtos à base de células e aos produtos de terapias avançadas, com objetivo de garantir a qualidade e segurança dos produtos fornecidos para uso terapêutico e pesquisa clínica e minimizar os riscos aos pacientes. Esses produtos compreendem: (1) produtos de terapia celular avançada; (2) produtos de engenharia de tecidos; e (3) produtos de terapia gênica constituídos por ou à base de células. As três categorias serão liberadas para uso somente depois de se analisar, individualmente, cada uma delas, associando as características do produto final com os procedimentos da sua obtenção. Nesse momento, os controles de qualidade específicos para cada um deles serão exigidos, analisados e aplicados. Como as três categorias de produtos contemplam a manipulação de células, a qualidade dessa manipulação será exigida e verificada especificamente para cada caso. Ao longo do desenvolvimento e liberação de novos produtos e dos processos de manipulação associados, essas exigências poderão ser usadas como precedentes para estabelecimento dos parâmetros de qualidade a serem exigidos. Cumulativamente, eles poderão constituir um valioso elenco das qualidades a serem requeridas para garantir os produtos de terapias avançadas, colocados à disposição da população nacional. A consulta pública nº 416/2017, que segue em análise pela Anvisa, trata da regulação de ensaios clínicos, para fins de comprovação de segurança e eficácia, a serem realizados com produtos de terapia avançada investigacionais, passivos de registro, no Brasil, e exige a manipulação de células e produtos de terapias avançadas em Centros de Processamento Celular autorizados pela Anvisa33.

Há, atualmente, um consenso de que a potencialidade das células para gerar os benefícios das terapias realizadas com os produtos de terapia avançada depende da quantidade de células disponíveis34. A eficiência terapêutica do produto dependerá das condições com quais as células são expandidas in vitro e criopreservadas. Consequentemente, o lote de células a ser usado em uma terapia poderá ser obtido em culturas paralelas ou cumulativas ao longo do tempo, com a sua criopreservação parcial ou global. Cada lote deverá ser submetido aos controles adequados, no momento da sua liberação para o uso. Essa exigência será atendida em três contextos, descritos em seguida.

  • Recepção, manipulação extensa e expansão de células em cultura primária, até a obtenção da quantidade necessária para o procedimento terapêutico, e a sua liberação para o uso. É o procedimento de terapias celulares autólogas com a expansão básica das células ( Figura 1 ).


    Figura 1
    Fluxograma do processamento do material biológico humano, que passa por manipulação extensa, seguida por preparação e envio das células para o uso (caso I); indicação dos pontos de retirada de amostra, para realização dos ensaios de controle de qualidade. CQ: controle de qualidade.

  • Recepção, manipulação extensa e expansão de células em cultura primária, obtenção da quantidade necessária para o procedimento terapêutico, seguida de criopreservação. O lote preservado será usado em um segundo tempo, para atender ao paciente, no momento apropriado para o uso terapêutico, e nos tempos subsequentes, quando podem ocorrer tratamentos repetidos, com uso do mesmo lote de células. Depois do descongelamento, as células serão mantidas em cultivo por tempo limitado, para voltar à viabilidade adequada e para acondicioná-las, adequadamente, com o veículo de administração ( Figura 2 ).


    Figura 2
    Fluxograma do processamento do material biológico humano, que passa por manipulação extensa, seguida por criopreservação das células, sendo estas células descongeladas, imediatamente, para o uso ou descongeladas, para retorno ao cultivo in vitro , por uma ou duas passagens, e então, são preparadas e enviadas para o uso (caso II); indicação dos pontos de retirada de amostra, para realização dos ensaios de controle de qualidade. CQ: controle de qualidade.

  • Recepção, manipulação extensa e expansão de células em cultura primária, criopreservação e estocagem das células num Master Bank para uso futuro. Sempre quando necessário, um lote do Master Bank será descongelado e, novamente, expandido, para ser fornecido para o uso clínico ou para uma nova expansão do Master Bank . Nesse caso, cada nova expansão gera um novo lote que deve passar pelos controles de qualidade necessários. É o procedimento mais complexo, que se aplica ao uso de células alogênicas, produtoras de mediadores parácrinos ou associadas com os produtos de bioengenharia ( Figura 3 ).


    Figura 3
    Fluxograma do processamento do material biológico humano, que passa por manipulação extensa, seguida por criopreservação das células, descongelamento e segunda etapa de expansão (expansão do Master Bank ), e então, são preparadas e enviadas para o uso (caso III); indicação dos pontos de retirada de amostra, para realização dos ensaios de controle de qualidade. CQ: controle de qualidade.

Em todos os casos, na recepção deve ser realizado o Controle de Qualidade 1 (CQ1), para verificar a presença de contaminantes microbiológicos. Para este ensaio pode ser usada a amostra de veículo utilizado no acondicionamento do material. Uma amostra representativa deve ser guardada para uso futuro, caso necessário.

O Controle de Qualidade 2 (CQ2) é o principal controle de qualidade de células manipuladas e expandidas in vitro. Ele será realizado ao longo da expansão primária de células, concluindo-o no momento de sua liberação para uso ou para a criopreservação. Ele é composto da seguinte bateria de exames:

  • Contagem das células;

  • Capacidade proliferativa;

  • Apoptose/Necrose e Ciclo Celular, ambos por citometria de fluxo;

  • Caracterização populacional ou Fenotipagem, apropriadas ao produto de terapia avançada;

  • Viabilidade celular (azul de tripan);

  • Impurezas: inclui a verificação da presença de endotoxinas e outras substâncias ou células que possam ser prejudiciais ao receptor;

  • Controle microbiológico (contaminantes fungos, bactérias e micoplasmas);

  • Cariótipo e Crescimento celular em soft agar (ensaio in vitro para detecção de eventual presença de células cancerosas);

  • Potência: Ensaio funcional, quando couber, apropriado ao produto final de terapia avançada: a atividade biológica relevante das células, caso conhecida, ou dos produtos sintetizados pela célula deverá ser definida e quantificada. A não realização deste teste deve ser justificada.

No caso I ( Figura 1 ), as células devem ser testadas para a bateria de ensaios de controle de qualidade, acima listada, em passagem anterior à liberação para uso. Caso os resultados não tenham sido liberados, antes do preparo para o uso, o médico responsável deve estar ciente e se responsabilizar pela liberação.

No caso II ( Figura 2 ), as células devem ser testadas para a bateria de ensaios de controle de qualidade, acima listada, em passagem anterior ao processo de criopreservação (antes da adição de crioprotetores); e amostra(s) de células representativa(s) do(s) lote(s) criopreservado(s) deve(m) ser testada(s) para a presença de contaminantes (fungos, bactérias e micoplasmas), contagem de células e viabilidade (com uso de corante de exclusão azul de tripan).

No caso III ( Figura 3 ), as células devem ser testadas para a bateria de ensaios de controle de qualidade, acima listada, em passagem anterior ao processo de criopreservação (antes da adição de crioprotetores); e amostra(s) de células representativa(s) do(s) lote(s) criopreservado(s) deve(m) ser testada(s) para a presença de contaminantes (fungos, bactérias e micoplasmas), contagem de células e viabilidade (com uso de corante de exclusão azul de tripan). Para cada etapa de expansão (expansão do Master Bank) , as células devem ser, novamente, testadas para os ensaios de controle de qualidade (bateria de ensaios descrita acima) em passagem anterior ao processo de criopreservação (antes da adição de crioprotetores); e amostra(s) de células representativa(s) do(s) lote(s) criopreservado(s) deve(m) ser testada(s) para a presença de contaminantes (fungos, bactérias e micoplasmas), contagem de células e viabilidade (com uso de corante de exclusão azul de tripan).

As Figuras de 1 a 3 apresentam os fluxogramas de processamento do material biológico humano para a obtenção da cultura primária de células e preparo do produto de terapia avançada e indica os pontos de retirada de amostras para a realização dos ensaios de controle de qualidade, para os casos I, II e III, conforme acima descrito.

Na liberação das células para uso, em qualquer das situações, as células preparadas devem ser testadas para a presença de contaminantes microbiológicos, fungos e bactérias, além de serem quantificadas e de terem seu percentual de viabilidade determinado.

CONCLUSÕES

A fim de contribuir para a qualidade do produto final, oferecido para o uso do paciente, e favorecer a comparabilidade dos resultados clínicos obtidos com produtos de terapia avançada, que usam as células cultivadas in vitro , propomos que estes produtos sejam preparados na forma de lotes e que estes sejam, necessariamente, controlados para a qualidade, com realização dos ensaios: Contagem das células; Capacidade proliferativa; Apoptose/Necrose e Ciclo Celular; Caracterização populacional ou Fenotipagem, apropriadas ao produto de terapia avançada; Viabilidade celular (azul de tripan); Presença de endotoxinas; Controle microbiológico (contaminantes fungos, bactérias e micoplasmas); Cariótipo e Crescimento celular em soft agar ; e Ensaio funcional, quando couber, apropriado ao produto de terapia avançada.

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Autor notes

* E-mail: rosanabizon@gmail.com

Declaração de interesses

Conflito de Interesse

Os autores informam não haver qualquer potencial conflito de interesse com pares e instituições, políticos ou financeiros deste estudo.



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