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Uso e conhecimento sobre rotulagem de alimentos ultraprocessados entre estudantes universitários
Patrícia Fernandes da Silva Gomes; Raquel de Almeida Alvarenga; Daniela Silva Canella
Patrícia Fernandes da Silva Gomes; Raquel de Almeida Alvarenga; Daniela Silva Canella
Uso e conhecimento sobre rotulagem de alimentos ultraprocessados entre estudantes universitários
Use and knowledge of ultra-processed food labeling among university students
Vigilância Sanitária em Debate, vol. 7, núm. 2, pp. 75-81, , 2019
INCQS-FIOCRUZ
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RESUMO

Introdução: Alimentos ultraprocessados são formulações industriais que apresentam em sua composição uma série de aditivos alimentares. A rotulagem de alimentos é uma ferramenta para a tomada de decisão dos consumidores.

Objetivo: Analisar o uso e conhecimento sobre rotulagem de alimentos ultraprocessados por estudantes universitários.

Método: Estudo transversal utilizando questionário eletrônico autoaplicável. A amostra foi composta por 129 estudantes de universidade pública do Rio de Janeiro de cursos de graduação da área da saúde e de outras áreas. As variáveis estudadas relacionadas ao uso de rotulagem de alimentos ultraprocessados e ao conhecimento sobre 12 tipos de aditivos alimentares e/ou ingredientes foram descritas para o conjunto da população e estratificadas por área de curso.

Resultados: Mais da metade dos indivíduos referiu ler rótulos. Os itens mais lidos foram: número de calorias (40,3%), todas as informações (22,4%) e lista de ingredientes (17,8%). A principal diferença entre os estudantes se refere ao conhecimento de ingredientes e/ou aditivos, sendo mais conhecidos pelos da área da saúde. Os ingredientes e/ou aditivos mais conhecidos foram os mesmos: frutose e glucose – saúde: 84,5% (72,5; 91,8) e outras áreas: 50,7% (39,0; 62,2) – e aspartame – saúde: 65,5% (52,2; 76,7) e outras áreas: 40,8% (29,9; 52,7). Estudantes da área da saúde deixariam de comprar alimentos na presença de algum dos aditivos e/ou ingredientes estudados com maior frequência.

Conclusões: Verificou-se alta frequência de estudantes que leem o rótulo de alimentos e, apesar de conhecerem poucos ingredientes e/ou aditivos, a presença destes influencia sua decisão de compra. Assim, a rotulagem nutricional é importante para as escolhas alimentares.

PALAVRAS-CHAVE: Alimentos Ultraprocessados, Rotulagem Nutricional, Aditivos Alimentares, Saúde, Estudantes.

ABSTRACT

Introduction: Ultra-processed foods are industrial formulations that present several food additives in their composition. Food labeling is an important tool for making decisions about these foods.

Objective: To analyze usage and knowledge of ultra-processed food labeling by university students.

Method: Cross-sectional study using a self-administered electronic questionnaire. The sample consisted of 129 students from a public university in Rio de Janeiro of undergraduate courses in health and other areas. The studied variables related to the usage of ultra-processed food labeling and the knowledge of 12 types of food additives and/or ingredients were described for the population as a whole and stratified by area of undergraduate course.

Results: More than half of the individuals reported reading labels. The most read items were: number of calories (40.3%), all information (22.4%) and list of ingredients (17.8%). The main difference between students refers to the knowledge of ingredients and/or additives, being better known by those from the health area. The most well-known additives and/or ingredients were the same: fructose and glucose – health area students: 84.5% (72.5; 91.8) and other areas: 50.7% (39.0; 62.2) – and aspartame – health area students: 65.5% (52.2; 76.7) and other areas: 40.8% (29.9; 52.7). The frequency of health area students that would stop buying food in the presence of some of the additives and/or ingredients studied was higher.

Conclusions: We verified a high frequency of students that read labels and, despite knowing a few additives and/or ingredients, their presence influences the students purchase decision. Thus, food labeling is important for food choices.

KEYWORDS: Ultra-processed Foods, Nutritional Label, Food Additives, Health, Students.

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ARTIGO

Uso e conhecimento sobre rotulagem de alimentos ultraprocessados entre estudantes universitários

Use and knowledge of ultra-processed food labeling among university students

Patrícia Fernandes da Silva Gomes
Instituto de Nutrição, Brasil
Raquel de Almeida Alvarenga
Instituto de Nutrição, Brasil
Daniela Silva Canella
Instituto de Nutrição, Brasil
Vigilância Sanitária em Debate, vol. 7, núm. 2, pp. 75-81, 2019
INCQS-FIOCRUZ

Recepção: 12 Dezembro 2018

Aprovação: 10 Maio 2019

INTRODUÇÃO

Mudanças nos padrões alimentares vêm ocorrendo rapidamente em países economicamente emergentes, como o Brasil 1, 2. Nas áreas metropolitanas brasileiras verifica-se aumento uniforme e significativo da contribuição calórica dos alimentos ultraprocessados em pouco mais de 20 anos (1987 a 2009), passando de 18,7% para 29,6% 3.

Alimentos ultraprocessados são formulações industriais cuja fabricação envolve diversas etapas e técnicas de processamento e o uso de vários ingredientes, muitos deles de uso exclusivamente industrial, como os aditivos alimentares. Alguns exemplos destes alimentos são: refrigerantes, biscoitos recheados, salgadinhos de pacote, macarrão instantâneo, sorvetes, balas e guloseimas em geral, cereais matinais, barras de cereal, iogurtes e bebidas lácteas adoçados e aromatizados, embutidos 2. O consumo destes alimentos está associado à obesidade, síndrome metabólica, dislipidemia e outros desfechos em saúde 4, 5, 6.

Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde, de 2000 a 2013, a venda per capita de alimentos ultraprocessados aumentou expressivamente na América Latina, estando fortemente relacionada ao aumento do índice de massa corporal médio da população 1. Em resposta a este cenário, o Guia Alimentar para a População Brasileira recomenda que se evite o consumo de alimentos ultraprocessados 2. Para aumentar a autonomia dos indivíduos em suas escolhas alimentares, é essencial o acesso a informações confiáveis e consistentes, respeitando a identidade e a cultura alimentar da população, pois, a despeito do volume de informações sobre alimentação disponível, poucas são de fontes confiáveis 2, 7. Neste sentido, o rótulo dos alimentos pode ser uma importante ferramenta para a tomada de decisão e para as escolhas alimentares.

A rotulagem nutricional é destinada a informar ao consumidor sobre as propriedades nutricionais de um alimento e a resolução RDC n° 360, de 23 de dezembro de 2003, a torna obrigatória no Brasil 8. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é o órgão brasileiro responsável pela regulação da rotulagem de alimentos, determinando as informações que um rótulo deve possuir, com vistas à garantia da qualidade do produto e à saúde do consumidor 9. São componentes da rotulagem obrigatória: denominação do produto; identificação da origem; conteúdo líquido; instruções de preparo, quando necessário; prazo de validade; lote; e lista de ingredientes, na qual estão os aditivos alimentares utilizados 10.

Amplamente utilizados em alimentos ultraprocessados, os aditivos alimentares são, segundo a Anvisa, quaisquer ingredientes adicionados intencionalmente aos alimentos, sem propósito de nutrir, com o objetivo de modificar as características físicas, químicas, biológicas ou sensoriais, durante a fabricação, processamento, preparação, tratamento, embalagem, acondicionamento, armazenagem, transporte ou manipulação de um alimento 11. Os efeitos gerados no organismo em decorrência do consumo dos aditivos ainda estão sendo pesquisados, mas há evidências sobre sua relação com casos de alergias, câncer, distúrbios no sistema digestório, urticária, angioedema, broncoespasmo, dentre outras doenças 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, como pode ser visto no Quadro.

Quadro
Aditivos e/ou ingredientes relacionados aos alimentos e sua associação com os desfechos em saúde.

Fonte: Cruz et al., 2015 13; CSPI, 2012 14; Polônio e Peres, 2009 15; Scheibler JR et al., 2013 16; Ferreira, 2015 17; Ministério da Saúde, 2016 18; Jovanovski et al., 2015 19.

O Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil de 2011 a 2022 20 incluiu entre suas ações a revisão e o aprimoramento da rotulagem de alimentos embalados, atendendo a critérios de legibilidade e visibilidade, e facilitando a compreensão do consumidor. Alguns estudos mostram que a população apresenta interesse na informação dos rótulos, porém essas informações não são claras 21.

Nesse contexto, o estudo teve como objetivo analisar o uso e o conhecimento sobre rotulagem de alimentos ultraprocessados por estudantes universitários. Adicionalmente, também foi verificada a existência de diferença nesses resultados entre estudantes de cursos da área de saúde e estudantes de cursos de outras áreas.

MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal, realizado via internet, com estudantes de uma universidade pública do estado do Rio de Janeiro, de maio a junho de 2017.

A população escolhida para a pesquisa foi selecionada por conveniência, englobando alunos dos cursos de graduação da área da saúde e de outras áreas. Os estudantes considerados “da área da saúde” pertenciam aos cursos: nutrição, medicina, enfermagem, educação física e odontologia; já os estudantes dos demais cursos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) foram considerados “de outras áreas”, dentre os participantes estão alunos de: administração, arqueologia, artes visuais, ciências atuarias, biologia, ciências contábeis, comunicação, direito, economia, engenharia, física, geografia, história, letras, matemática, oceanografia, pedagogia, psicologia e relações internacionais. Para o cálculo do tamanho da amostra a ser utilizada no estudo considerou-se como parâmetros que 50% dos indivíduos costumam ler o rótulo dos alimentos 21, intervalo de confiança de 95% e poder estatístico de 90%, o que resultou em uma amostra mínima de 96 indivíduos. A amostra final do estudo foi composta por 129 alunos.

A pesquisa foi divulgada em páginas de rede social, amplamente acessadas pelos estudantes desta universidade, e os dados foram coletados por meio da ferramenta Formulário do Google Apps. Nesse caso os estudantes acessaram o instrumento, e já na página de rosto era observado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, dizendo que as informações fornecidas seriam utilizadas para pesquisas e que o anonimato das respostas seria garantido. Aqueles que aceitaram esses termos, depois de clicarem no comando “aceito participar da avaliação”, responderam o questionário.

Para o desenvolvimento do instrumento de coleta de dados foram utilizadas duas estratégias: 1) para explorar o uso da rotulagem, partiu-se de estudo prévio conduzido pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) 21 e consultou-se uma especialista no tema para revisão do instrumento; 2) em relação ao conhecimento sobre aditivos alimentares e ingredientes, foi realizada uma pesquisa de campo, em um grande supermercado, onde foram identificados os tipos mais comuns presentes em alimentos ultraprocessados. O instrumento de coleta de dados era composto por 13 questões fechadas e três questões abertas que abordavam: 1) caracterização da população; 2) razões para escolha de alimentos; 3) uso de rotulagem de alimentos ultraprocessados (entendida no presente estudo como o costume de ler rótulos e o motivo da leitura); 4) conhecimento – reconhecer em rótulos (Quais desses ingredientes você já leu em algum rótulo de alimento?) e conhecer ou ter alguma informação (Quais destes ingredientes você sabe o que é?) – sobre 12 tipos de aditivos alimentares e ingredientes. Adicionalmente, por meio de pergunta aberta, os estudantes foram questionados sobre a justificativa para não comprar alimentos ultraprocessados.

O banco de dados para a análise foi gerado pela ferramenta Google Apps. As variáveis foram descritas por meio de frequência e seus respectivos intervalos de confiança (IC95%) para o conjunto da população estudada e estratificada para cursos da área da saúde e outras áreas. Diferenças significativas entre os estudantes das áreas da saúde e outras foram identificadas a partir da comparação dos IC95%. Utilizou-se para as análises o software Stata 14.2. As respostas para a pergunta aberta foram descritas no texto.

O estudo iniciou-se após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Pedro Ernesto da UERJ (CAAE:64143616.0.0000.5259) e aceitação do termo de consentimento livre e esclarecido pelos estudantes.

RESULTADOS

A amostra estudada foi composta por 129 estudantes (45,0% da área da saúde), sendo a idade média da população estudada de 23,1 anos e a maior parte composta por não cotista (64,3%) e por indivíduos do sexo feminino (57,4%). Destes, 10,1% referiram ter alguma doença que interfere na saúde. Em relação ao sexo, houve diferença significativa entre os estudantes da área da saúde e de outras áreas, sendo na saúde, a maior parte (88,0%) mulheres. Não foram verificadas outras diferenças significativas ( Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização da população estudada, segundo área de estudo. Rio de Janeiro, 2017.

Quanto à leitura dos rótulos e a razão para escolha de alimentos, não houve diferença significativa entre os dois grupos de estudantes, como pode ser observado na Tabela 2.

Tabela 2
Distribuição dos estudantes, segundo área de estudo, em relação às razões para escolha de alimentos e leitura dos rótulos. Rio de Janeiro, 2017.

Os itens mais citados como razão para a escolha dos alimentos pelos estudantes da área da saúde foram: saúde (34,4%), prazer (25,8%) e preço (22,4%), e pelos estudantes de outras áreas: prazer (35,2%), preço (26,7%), conveniência (18,3%) e saúde (18,3%). Em relação ao motivo principal da leitura, saber o número de calorias foi escolhido pela maioria em ambos os grupos (40,3% no total) ( Tabela 2).

Mesmo sem diferença significativa no costume de leitura dos rótulos entre os estudantes dos diferentes cursos ( Tabela 2), pode-se observar que aqueles da área da saúde mencionaram reconhecer com maior frequência os ingredientes ou aditivos perguntados quando comparados aos estudantes de outras áreas. Os ingredientes ou aditivos mais reconhecidos (lidos) nos rótulos em alimentos pelos estudantes da área da saúde foram: glutamato monossódico (75,9%), frutose e glucose (72,4%) e maltodextrina (70,7%). Em relação ao relato de conhecer (ter informações sobre) ingredientes ou aditivos, os mais frequentes foram: frutose e glucose (84,5%), aspartame (65,5%) e maltodextrina (58,6%). Para os estudantes das outras áreas, os itens reconhecidos com maior frequência foram: frutose e glucose (66,2%), aspartame (53,5%) e amido modificado (40,8%); enquanto os mais conhecidos são: frutose e glucose (50,7%), aspartame (40,8%), maltodextrina (23,9%) e caramelo IV (23,9%). Nem sempre os ingredientes reconhecidos em rótulos foram também conhecidos pelos estudantes ( Tabela 3).

Tabela 3
Distribuição dos estudantes, segundo área de estudo, em relação ao reconhecimento nos rótulos e conhecimento sobre ingredientes e aditivos alimentares. Rio de Janeiro, 2017.

Quando perguntado se os estudantes deixariam de comprar algum alimento ultraprocessado pela presença dos ingredientes e/ou aditivos citados, observou-se que 69,8% do total respondeu que não deixaria de comprar, sem diferença significativa entre as áreas. Entre os estudantes da área da saúde os ingredientes e aditivos mais mencionados como razão para não comprar um alimento foram: glutamato monossódico (27,6%) e nitrito e nitrato (24,1%); já os mais mencionados pelos demais estudantes foram: caramelo IV (12,7%) e aspartame (9,9%) ( Tabela 4).

Tabela 4
Distribuição dos estudantes, segundo a área de estudo, em relação à influência negativa da presença de ingredientes e aditivos alimentares na compra de alimentos ultraprocessados. Rio de Janeiro, 2017.

Como justificativa para não comprar alimentos ultraprocessados com tais ingredientes foram citados os potenciais riscos à saúde. Foi citado que o consumo dos ingredientes e aditivos estudados estaria associado ao risco de desenvolvimento de câncer e que estes ingredientes e aditivos poderiam resultar em impacto negativo para o organismo, independentemente de valor calórico.

DISCUSSÃO

Os resultados encontrados no presente estudo mostram que mais da metade dos estudantes universitários que participaram do estudo relataram ter o costume de ler rótulos, com pouca diferença no uso dos rótulos de alimentos ultraprocessados entre estudantes de cursos da área da saúde e de outras áreas. A principal diferença entre os estudantes se refere ao conhecimento sobre ingredientes e/ou aditivos, sendo mais conhecidos pelos estudantes da área da saúde. Apesar da diferença de frequência, os ingredientes e/ou aditivos mais conhecidos por estudantes de todas as áreas foram os mesmos: frutose e glucose e aspartame. Estudantes da área da saúde deixariam de comprar alimentos na presença de algum dos aditivos e/ou ingredientes citados com maior frequência, apesar do baixo percentual geral.

A frequência de estudantes universitários avaliados que relataram ter o costume de ler os rótulos (59,6%) é superior à de estudo realizado com mulheres de 20 a 65 anos, de quatro capitais brasileiras, no qual quase metade (46%) das entrevistadas alegou ler às vezes a rotulagem nutricional de alimentos ultraprocessados. Em relação às principais preocupações na escolha dos alimentos, os resultados também foram similares aos deste estudo, no qual saúde, preço e prazer tiveram maior destaque na tomada de decisão 21. Como no grupo da área da saúde predominaram mulheres e no das outras áreas, os homens, podendo de certa forma, sugerir que os homens têm menos interesse em ler os rótulos, confirmando os achados de revisão sistemática sobre uso da rotulagem nutricional 22.

Avaliação sobre o hábito de leitura dos rótulos entre consumidores de uma rede de supermercados verificou que a maior parte dos consumidores liam os rótulos sempre (48%) ou às vezes (24%), sendo a maioria mulheres (76% contra 59% entre os homens), mas destacou-se que nem sempre o rótulo é bem compreendido. Ressalta também a importância da rotulagem na função de orientar os consumidores sobre os constituintes dos alimentos, promovendo escolhas alimentares criteriosas e mais saudáveis 23.

Estudo realizado com adolescentes norte-americanos mostrou que o uso do rótulo está relacionado a práticas alimentares mais saudáveis, como menor consumo de bebidas açucaradas e maior consumo de frutas e hortaliças. Considerando este resultado, os autores apontaram que estratégias de intervenção devem incluir esforços para ensinar sobre o uso dos rótulos para fazer escolhas alimentares saudáveis 24. Em estudo brasileiro, verificou-se que indivíduos portadores de doenças crônicas apresentaram maior preocupação com saúde em suas escolhas alimentares 21. Pressupõe-se que o grupo de indivíduos com doenças crônicas recebe algum tipo de orientação nutricional por profissionais de saúde 11, sendo, neste sentido, similar aos estudantes da área da saúde avaliados no presente estudo, que se preocupam mais com esse aspecto (saúde) do que os das outras áreas. Estes achados estão em concordância com um estudo brasileiro no qual os participantes tiveram mudança positiva na atitude em relação ao uso de informações nutricionais nos rótulos de alimentos e uma maior compreensão delas quando expostos a orientação nutricional 25.

Entre mulheres brasileiras, apenas 21% referem compreender totalmente o conteúdo das informações do rótulo. Aspectos como letras pequenas e alegações nutricionais podem contribuir para a dificuldade de compreensão dessas informações 21. Revisão sistemática também aponta para a dificuldade de compreensão dos rótulos, indicando que, apesar do uso relatado do rótulo nutricional por vezes ser alto, medidas objetivas revelam que o uso real pode ser muito menor. Evidências sugerem que os consumidores que consultam os rótulos podem entender alguns dos termos usados, fazer cálculos e comparações simples, mas são confundidos por outros tipos de informação. Os autores sugerem, então, que melhorias na rotulagem nutricional poderiam trazer uma pequena e importante contribuição para tornar o ambiente de compra mais propício à seleção de escolhas saudáveis 22.

No escopo de ações que compõem a agenda regulatória que visa contribuir com a promoção da alimentação saudável, o tema da rotulagem, com destaque para a rotulagem frontal com modelo de advertência, tem ganhado força 26. Neste sentido, países como Chile e Uruguai desenvolveram modelos de rotulagem frontal para deixar informações relacionadas a nutrientes críticos mais claras 27, 28. No Brasil, o modelo de rotulagem nutricional está em discussão no âmbito da Anvisa 29.

Os resultados do presente estudo mostram que o número de estudantes que deixariam de comprar alimentos contendo os aditivos e/ou ingredientes perguntados é baixo, mesmo entre os estudantes que alegaram conhecê-los. Esse dado é preocupante considerando os possíveis efeitos desses ingredientes e aditivos sobre a saúde 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19. Porém, apesar do baixo percentual total no número de estudantes que não deixariam de comprar algum alimento na presença dos ingredientes citados, quando comparamos os dois grupos, podemos perceber que os estudantes da área da saúde deixariam de comprar mais do que os estudantes das outras áreas. Com isso, pode-se inferir que o conhecimento sobre rotulagem nutricional faz diferença na hora da compra, mostrando que são necessários mais estudos que explorem essa temática e subsidiem o desenvolvimento de atividades educativas em espaços como unidades básicas de saúde, em escolas e em restaurantes universitários, por exemplo, para que esse tema possa ser abordado diante de um contexto do alto consumo de alimentos ultraprocessados associado ao aumento de doenças crônicas não transmissíveis 30. Desde 2008, existe um manual de orientação aos consumidores sobre rotulagem nutricional obrigatória, elaborado pela Anvisa, que é pouco divulgado e explorado pelos profissionais de saúde e pela população. Este pode ser uma ferramenta útil para estimular e facilitar a compreensão da população sobre rotulagem 9.

O estudo realizado apresenta limitações. O instrumento utilizado não foi submetido à avaliação de validade e reprodutibilidade. No entanto, consultou-se uma especialista na temática de rotulagem para discutir a pertinência e conteúdo das questões. Quanto à amostra utilizada, esta foi restrita a adultos jovens, estudantes de uma única universidade. Contudo, destaca-se que o estudo apresenta uma amostra heterogênea, com representação de homens e mulheres de diferentes cursos e de estudantes de diferentes níveis de renda (estudantes cotistas e não cotistas), o que reforça sua relevância, e que o tamanho final da amostra foi superior ao número de estudantes previsto no cálculo amostral. Sua importância é também destacada por não ter sido encontrado nenhum estudo que avalie conhecimento sobre aditivos e/ou ingredientes e a importância de se explorar isso em um contexto de aumento do consumo de alimentos ultraprocessados e dos problemas decorrentes deste consumo.

CONCLUSÕES

Verificou-se no presente estudo uma alta frequência de estudantes universitários que leem o rótulo de alimentos e, apesar destes conhecerem poucos ingredientes e/ou aditivos, sua presença parece influenciar na decisão de compra da população estudada, sendo a rotulagem nutricional importante para as escolhas alimentares. Estes achados, principalmente sobre conhecimento, reforçam a importância de modelos de rotulagem de mais simples compreensão e deste assunto ser abordado em diferentes contextos para capacitar os indivíduos a utilizar os rótulos como ferramenta para a tomada de decisão sobre as compras de alimentos.

Material suplementar
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.Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa. Relatório preliminar de análise de impacto regulatório sobre rotulagem nutricional. Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2018[acesso 17 maio 2019]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2977862/An%C3%A1lise+de+Impacto+Regulat%C3%B3rio+sobre+ Rotulagem+Nutricional_vers%C3%A3o+final+3.pdf/2c094688-aeee-441d-a7f1-218336995337
.Bielemann RM, Motta JVS, Minten GC, Horta BL, Gigante DP. Consumo de alimentos ultraprocessados e impacto na dieta de adultos jovens. Rev Saude Publica. 2015;49 https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005572.
Notas
Declaração de interesses
Conflito de Interesse

Os autores informam não haver qualquer potencial conflito de interesse com pares e instituições, políticos ou financeiros deste estudo.

Autor notes

* E-mail: daniela.canella@uerj.br

Quadro
Aditivos e/ou ingredientes relacionados aos alimentos e sua associação com os desfechos em saúde.

Fonte: Cruz et al., 2015 13; CSPI, 2012 14; Polônio e Peres, 2009 15; Scheibler JR et al., 2013 16; Ferreira, 2015 17; Ministério da Saúde, 2016 18; Jovanovski et al., 2015 19.
Tabela 1
Caracterização da população estudada, segundo área de estudo. Rio de Janeiro, 2017.

Tabela 2
Distribuição dos estudantes, segundo área de estudo, em relação às razões para escolha de alimentos e leitura dos rótulos. Rio de Janeiro, 2017.

Tabela 3
Distribuição dos estudantes, segundo área de estudo, em relação ao reconhecimento nos rótulos e conhecimento sobre ingredientes e aditivos alimentares. Rio de Janeiro, 2017.

Tabela 4
Distribuição dos estudantes, segundo a área de estudo, em relação à influência negativa da presença de ingredientes e aditivos alimentares na compra de alimentos ultraprocessados. Rio de Janeiro, 2017.

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